Discurso durante a 188ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Críticas às altas taxas de juros cobradas pelos cartões de crédito; e outros assuntos.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA NACIONAL. BANCOS.:
  • Críticas às altas taxas de juros cobradas pelos cartões de crédito; e outros assuntos.
Publicação
Publicação no DSF de 12/10/2012 - Página 53582
Assunto
Outros > ECONOMIA NACIONAL. BANCOS.
Indexação
  • REGISTRO, APREENSÃO, GOVERNO FEDERAL, SITUAÇÃO, BAIXA, CRESCIMENTO, ECONOMIA NACIONAL, NECESSIDADE, UNIÃO FEDERAL, COMPENSAÇÃO, ESTADOS, MUNICIPIOS, REFERENCIA, DESONERAÇÃO TRIBUTARIA, OBJETIVO, COMBATE, CRISE, ECONOMIA.
  • CRITICA, EXCESSO, COBRANÇA, TAXAS, JUROS, BANCOS, BRASIL, COMENTARIO, REQUERIMENTO, AUTORIA, ORADOR, ESCLARECIMENTOS, EMPRESA, CARTÃO DE CREDITO, FATO, PREJUIZO, POPULAÇÃO, PAIS.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Caro Presidente Paulo Paim, Srªs e Srs. Senadores, nossos telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, servidores desta Casa, nós temos nos deparado com a questão econômica cada dia com maior preocupação. Não apenas em função das incertezas que o mercado internacional oferece, mas, sobretudo, em função do que a economia do nosso País, que engrenou para a estabilidade e o crescimento, pode sofrer diante desse cenário incerto e não-sabido, especialmente na Europa, mas também na Ásia, porque a globalização tornou nosso País muito dependente do relacionamento comercial com a Ásia, com a Europa e com a América do Norte.

            Então, em todos os momentos, os ministros, especialmente os da área econômica, como aconteceu ontem no contato dos prefeitos municipais com a Ministra Ideli Salvatti, manifestam essa preocupação. A Ministra, aliás, alertava para o fato de que a crise se agrava e o Governo está muito preocupado com isso. Claro, nós, parlamentares que temos a responsabilidade de fazer o equilíbrio na discussão dos temas nacionais, também nos preocupamos com isso.

            Temos debatido aqui também uma questão que interessa muito aos consumidores brasileiros, que é a questão relacionada à taxa de juros cobrada nos cartões de crédito. Infelizmente, ainda, os juros cobrados pelos cartões de crédito são verdadeiramente exorbitantes.

            Não consigo entender como um país como o nosso, que conseguiu reduzir ontem de 7,5% a taxa básica de juros, a famosa Selic, para 7,25% - a mais baixa dos últimos 14 anos e uma das mais baixas da história da economia brasileira -, ainda convive com exageros nos juros cobrados pelos cartões de crédito.

            Estudos bem recentes da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor mostraram que os juros do cartão de crédito no Brasil são, em média, de 338% ao ano - vou repetir, 338% ao ano -, o percentual mais elevado de todo o Planeta. Quase nenhum país, desenvolvido ou em desenvolvimento, tem taxas tão elevadas quanto as nossas. Esse percentual é 46 vezes superior ao da taxa básica, que caiu ontem, novamente, em 0,25%, por decisão do Comitê de Política Monetária do Banco Central, o famoso Copom.

            Os bancos privados vêm reduzindo gradativamente as taxas cobradas pelos serviços do cartão de crédito ou débito. Mais recentemente, os bancos oficiais anunciaram reduções dessas mesmas taxas. São atitudes positivas, não há dúvida, mas ainda não resolveram o grave problema. No caso do crédito rotativo - e é nele que está o problema e o grande perigo -, aquele sistema muito comum no comércio, que permite, por meio do cartão, o pagamento máximo e mínimo de uma fatura, os juros são realmente mais do que extorsivos, são abusivos: 878% ao ano é o que se paga anualmente pela utilização desse serviço, segundo a associação Proteste.

            Para tentar ilustrar o tamanho dessa anormalidade, basta uma conta básica de matemática: se uma blusa comprada por uma consumidora é vendida na loja por R$20,00, por exemplo, ela poderá custar até R$175,60, se a consumidora usar o limite do cartão rotativo como opção de compra. São valores anormais, claro, sem explicação lógica!

            Os cálculos do Banco Central e da própria Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac) são mais conservadores: 11% ao mês é o que se gasta pelo uso desse serviço. Mesmo assim, são valores muito elevados para um país que está com a atual taxa básica e com um crescimento econômico em ritmo bem mais lento.

            Nenhum consumidor deveria, a propósito, entrar no crédito rotativo, porque é muito difícil sair dele. Para mim, esse sistema de pagamento mínimo da fatura funciona como uma espécie de areia movediça ou de um perigoso pântano. Depois de se botar o pé ali, afunda-se e dele não se sai mais.

            É um risco sério porque o juro mais pesado se esconde nesse crédito rotativo, principalmente para aqueles que não sabem usar esse sistema de pagamentos. É preciso, portanto, que o consumidor conheça as razões desse juro tão elevado. Estaremos sendo mais didáticos se conseguirmos cobranças mais justas e condizentes com a renda da população.

            Recentemente, apresentei à Comissão de Assuntos Econômicos um requerimento para pedir explicações sobre os cartões de crédito e os juros cobrados. A Comissão de Assuntos Econômicos, presidida pelo nosso colega Delcídio do Amaral, já aprovou meu requerimento, e vamos definir, em breve, a data dessa audiência pública. Precisamos, portanto, de mais explicações dos representantes das empresas operadoras de cartão de crédito e, claro, também do Banco Central.

            Infelizmente, o comprador de renda mais baixa não entende essa anomalia. Se nós, Senadores, que temos mais acesso a todo tipo de informação, às vezes, não conseguimos filtrá-la, o que dirá aquele consumidor menos informado e com menos acesso à educação de consumo e ao planejamento de suas contas e também à informação na hora de usar o cartão de crédito?

            O brasileiro, pelo menos a grande maioria, quer pagar a conta em dia e ter a certeza de que suas obrigações financeiras estão sendo cumpridas, sem nome nos cadastros de proteção ao crédito. Obviamente, existem aqueles que são descontrolados, o que é uma minoria, e que fazem mau uso do cartão de crédito, contribuindo para o problema do endividamento.

            Mas não há dúvidas de que o impacto de juros altos na vida do cidadão comum, que usa esse dinheiro de plástico, representa queda na renda e também menos reais no bolso ou na respectiva conta bancária. Ou seja, menos para poupar ou para fazer girar a própria economia. São, portanto, recursos que, infelizmente, ainda estão sendo "corroídos" com o pagamento de juros e das dívidas do cartão ou débito.

            Srªs e Srs. Senadores, verifiquem o nível de endividamento das famílias! Vejam como essa questão se torna ainda mais aguda e preocupante. Uma pesquisa do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) apontou que 41% dos brasileiros têm ou tiveram seus nomes bloqueados para fazer compras a prazo. A maioria dos endividados são das classes C e D. Significa que, além de arcar com juros elevadíssimos, o consumidor precisa ainda lidar com a inadimplência que inevitavelmente bate à porta quando as despesas são maiores que as receitas.

            Por isso, além de reduzir os juros e taxas bancárias e de estimular formas mais adequadas sobre o uso desses meios de pagamentos, é preciso melhorar também a relação entre instituições financeiras e os que necessitam de crédito.

            Muitos, mesmo cumprindo a cartilha da boa prática financeira, da boa gestão das contas pessoais, não conseguem acessar o crédito - ainda que com juros exorbitantes - simplesmente porque uma lista interna de chamados "maus pagadores" é usada por algumas instituições para não autorizar o financiamento ou a aquisição de algum produto financeiro ou mesmo um produto de consumo quando a relação for de uma loja.

            Sou autora de um projeto, o PL 209/12, em tramitação nesta Casa, que inclui penalidades para quem deixar de eliminar, pontualmente, dos cadastros ou bancos de dados, informações negativas superiores ao prazo de cinco anos. Faço aqui uma defesa do Código do Consumidor. É necessário ampliar os direitos de quem compra e multar a instituição que limitar o crédito, indevidamente, para aqueles que têm condições de arcar com os custos da operação, ainda que, no passado - este é o problema -, tenham tido alguma dificuldade na liquidação de suas dívidas. Mas no momento em que liquidam a dívida ou fazem acordo com a instituição financeira, tudo começa da estaca zero e eles têm que limpar a sua ficha definitivamente. Essa é uma questão de justiça e que atende o que está escrito no Código de Defesa do Consumidor.

            Aliás, preciso fazer justiça, pois esse projeto foi inspirado numa correspondência que recebi de um ex-bancário do Estado de Tocantins, que conhece bem o funcionamento das operações financeiras. Ele, em determinado momento, teve essa dificuldade. Resolvida a questão, após pagar, em uma negociação com o banco, nunca mais teve acesso ou mesmo a informação para justificar por que ele não tinha condições de operar com aquela instituição financeira com que, em determinada época, ele fez um acordo para liquidar sua dívida.

            Ora, as pessoas têm em algum momento alguma dificuldade. Feito o acordo ou a liquidação, não há nenhum motivo lógico nem justo para que ela fique eternamente numa lista negra. E aí vale para bancos públicos e bancos privados; vale para lojas, para a venda do comércio, para o varejo de um modo geral ou para outros prestadores de serviço. O grave é que, em geral, não há nenhuma informação ao consumidor sobre as razões que levam uma instituição a negar o crédito a essa pessoa ou mesmo à pessoa jurídica, porque muitos casos envolvem também pessoas jurídicas.

            Sou autora deste projeto, portanto, e tive a felicidade de receber o apoio de um consumidor do Estado de Tocantins, dando a sugestão dessa proposta que apresentei e que já foi apreciada.

            Defendo isso, porque sei que muitos bons pagadores que já ficaram com o nome sujo, no passado, devido a alguma pendência, não estão conseguindo contrair crédito algum, mesmo estando em situação regular perante a lei e em condições financeiras de continuar fazendo operações regulares e normalmente.

            Aliás, o Presidente do Banco Central, o Ministro Alexandre Tombini, esteve recentemente na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), e tratamos, brevemente, sobre esse assunto que abordei no questionamento a ele, e ele se mostrou também bastante preocupado com essa questão - lembro, aliás, que o próprio Supremo Tribunal Federal reconheceu que o Código de Defesa do Consumidor é aplicável, sim, na relação dos clientes com o Sistema Financeiro.

            Portanto, precisamos de uma atenção redobrada sobre esse tema e de uma vigilância constante, para que tenhamos respostas mais claras sobre um problema que atinge a todos - a mim, Senadora; aos Srs. Senadores; a qualquer cidadão que compra ou precisa de crédito. Somente focados na solução desse problema, que o Brasil vai sair da lista dos países mais desiguais do Planeta. Aliás, fazer isso é dar um tratamento injusto e desigual a um consumidor.

            Infelizmente, ainda estamos entre os 12 países mais desiguais, segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - Ipea, mesmo com a evolução social e a evolução da renda experimentada pelo nosso País na última década.

            Quando as eleições municipais terminarem - e temos praticamente duas semanas para que isso ocorra; 17 dias contados a partir de hoje para acontecer o 2º turno, em algumas cidades e capitais -, as preocupações sobre os rumos da nossa economia devem, claro, aumentar muito mais, porque, talvez, até lá, tenhamos um cenário mais claro do que está acontecendo num mundo tão conturbado, especialmente na Velha Europa.

            Teremos que nos preocupar com o orçamento público e avaliar se as medidas do Governo para estimular a indústria, a renda, o consumo e a abertura de vagas no mercado de trabalho vão surtir os efeitos esperados, considerando exatamente esse cenário internacional preocupante.

            E aí exatamente volto ao tema, que foi objeto de análise há pouco pelo Senador Ricardo Ferraço, em relação à questão federativa.

            As medidas que o Governo adotou foram positivas para os consumidores, mas elas lesaram as receitas dos Estados e Municípios, especialmente Municípios, porque, quando o Governo reduz o IPI, ele reduz a parcela que entra do IPI na composição do Fundo de Participação dos Municípios, e, como eu disse, a maior parte dos Municípios brasileiros de até cinco mil habitantes, que é a maioria deles, tem o FPM como a sua principal fonte de receita.

            Se não puderem cumprir os compromissos assumidos, porque o Governo, além de ter reduzido essa receita para os Municípios, ainda não cumpre os chamados Restos a Pagar, aumentando ainda gravemente as dificuldades financeiras das administrações municipais que estão encerrando os seus mandatos nesse dezembro de 2012 e repassando aos sucessores, no caso de novos prefeitos, as responsabilidades pelo acerto de conta, aí vem mais: Lei de Responsabilidade Fiscal, vem o controle do Ministério Público, vêm todas as conseqüências advindas pelo não fechamento de contas. E não fechar as contas não é culpa do gestor municipal, do prefeito; é por culpa dessa situação anômala da Federação brasileira, em que a União pode tudo; os Estados, mais ou menos; e os Municípios podem nada. E a maioria deles depende dessa receita, que é o Fundo de Participação. E é exatamente aí que está o grave problema.

            Nós precisamos reexaminar essa matéria.

            Espero que, na semana que vem, quando teremos um novo esforço concentrado, possamos debruçar-nos sobre essas matérias tão relevantes e aguardar que o Governo Federal, rapidamente, dê uma resposta adequada, como fez lá, em 2008, quando o ex-Presidente Lula socorreu os Municípios para compensar exatamente a queda na receita provocada pela medida do Governo Federal na desoneração do IPI. Agora, da mesma forma, repete-se a mesma medida, e é necessário, portanto, que a Presidente Dilma Rousseff tome a mesma decisão de aportar o recurso necessário, estimado em R$1,5 bilhão, para compartilhar com os Municípios, no caso do Fundo de Participação dos Municípios. Caso contrário, será uma situação muito complicada, até porque o gestor municipal que não estiver absolutamente em dia corre o risco de ficar com a ficha suja e inelegível nas próximas eleições, e isso é uma injustiça que não se pode cometer. Não podemos concordar com isso. O risco quem corre são 3,8 mil prefeitos municipais que estão nessa difícil situação.

            Penso que nós precisamos dar mais atenção a toda e qualquer forma não só de redução dos custos, mas também de auxiliar neste debate, especialmente envolvendo os direitos que as prefeituras municipais, os Municípios brasileiros têm nesse aspecto, porque são os chamados primos pobres da Federação. Como Senadora municipalista, não me vou cansar-me de continuar cobrando essas questões do Poder federal, até porque a União, a prima rica, fica com 60% de tudo o que é arrecadado; os Estados, em torno de 23%; e os Municípios, com o que resta disso.

            Muito obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/10/2012 - Página 53582