Discurso durante a 196ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações acerca da revisão do pacto federativo, destacando a necessidade de mudanças nos critérios de distribuição do Fundo de Participação dos Estados.

Autor
Cidinho Santos (PR - Partido Liberal/MT)
Nome completo: José Aparecido dos Santos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DEMOCRATICO.:
  • Considerações acerca da revisão do pacto federativo, destacando a necessidade de mudanças nos critérios de distribuição do Fundo de Participação dos Estados.
Publicação
Publicação no DSF de 24/10/2012 - Página 56024
Assunto
Outros > ESTADO DEMOCRATICO.
Indexação
  • REGISTRO, APRESENTAÇÃO, COMISSÃO, SENADO, ANTEPROJETO, SUGESTÃO, REDUÇÃO, DESEQUILIBRIO, FINANÇAS, UNIDADE, FEDERAÇÃO, ENFASE, ASSUNTO, DISTRIBUIÇÃO, ROYALTIES, PETROLEO, FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS ESTADOS E DO DISTRITO FEDERAL (FPE), DIVIDA, ESTADOS.

            O SR. CIDINHO SANTOS (Bloco/PR - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Presidente.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado e ouvintes da Rádio Senado, inicio meu pronunciamento, hoje, para falar um pouco sobre pacto federativo e a preocupação já aqui demonstrada, há poucos instantes, pelo Senador Tomás Correia e por outros Senadores que ocuparam a tribuna, ontem, para falar sobre a questão do Fundo de Participação dos Estados.

            No início deste ano, Sr. Presidente, o Presidente José Sarney designou uma comissão para fazer um trabalho sobre o pacto federativo. Essa comissão está prestes a entregar um trabalho conclusivo a respeito da matéria, com algumas sugestões para reduzir o desequilíbrio financeiro entre as unidades da Federação. Essas sugestões estarão reunidas sob a forma de anteprojetos de lei, abordando os quatro temas priorizados pela comissão: distribuição de royalties do petróleo, Fundo de Participação dos Estados (FPE), guerra fiscal e dívida dos Estados.

            Já não era sem tempo, Sr. Presidente, que o Senado da República tomasse uma providência para tentar restabelecer o equilíbrio federativo. Aliás, essa é a sua principal missão constitucional. Não pode haver uma Federação forte, na qual seus membros estejam, o tempo todo, envolvidos em guerras fiscais para atrair investimentos e onde haja profundos desequilíbrios decorrentes da arrecadação e repartição tributária.

            Portanto, Sr. Presidente, vêm em muito boa hora essas sugestões da comissão, colocando novamente na pauta, na Ordem do Dia, a questão do equilíbrio federativo em nosso País.

            Uma dessas sugestões tem mais urgência, Srªs e Srs. Senadores, e é justamente a ela que gostaria de dedicar meu tempo na tribuna no dia de hoje. Refiro-me à mudança dos critérios de distribuição dos recursos do FPE, do Fundo de Participação dos Estados.

            Desde 1989, quando foi aprovada a Lei Complementar nº 62, vem sendo adotado, provisoriamente, o critério de aplicação de coeficiente fixo para todos os Estados da Federação. Contudo, em 2010, o Supremo Tribunal Federal considerou inconstitucional essa sistemática, por entender que ela não permitia que o Fundo atingisse seu objetivo maior, qual seja, o de promover o equilíbrio entre os Estados da Federação, atenuando as desigualdades de suas receitas. Por esse motivo, determinou o prazo de 31 de dezembro de 2012 para que o Congresso Nacional fixasse outro critério para a repartição dos recursos do FPE.

            E aqui reside minha preocupação, Senador Tomás, conforme o senhor colocou agora há pouco, e também o Sr. Presidente.

            Sabemos que o montante a ser distribuído pelo FPE já está previamente determinado pela Constituição Federal e corresponde a 21,5% da arrecadação da União com o Imposto de Renda e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Portanto, qualquer modificação nos critérios de distribuição das fatias desse bolo gerará perdas e ganhos significativos para esse ou aquele Estado, já que não temos como aumentar o tamanho do bolo a ser distribuído. Como já disse: 21,5% da arrecadação do Imposto de Renda e também do IPI.

            E, neste momento, em virtude da desoneração de alguns itens que o Governo fez em função da crise, como material de construção, produtos da linha branca e também automóveis, entendo que necessários, esses recursos estão bastante deficitários com relação ao montante que se passa aos Estados e Municípios.

            Além de não termos como aumentar o tamanho desse bolo, o fato é que ele vem diminuindo ao longo do tempo, se considerarmos sua relação com as receitas totais da União. Em 1985, os recursos do Imposto de Renda e do IPI representavam 75% da arrecadação tributária da União; hoje, eles respondem por apenas 45% dessa arrecadação, o que é partilhado com Estados e Municípios.

            Muito dessa diminuição se deve ao fato de que, ao longo dos últimos anos, o Governo Federal tem criado vários impostos, em forma de contribuição, com o simples objetivo de não repassar a Estados e Municípios a participação nesses impostos. Na verdade, são impostos porque estão aí e de forma definitiva, mas quando criados em forma de contribuição, como a Cide, a Cofins e, até pouco tempo atrás, a CPMF, os Estados e os Municípios não têm participação nessas contribuições. Ao longo do tempo, o Imposto de Renda e o IPI, que representavam 75% do bolo tributário da União, hoje representam apenas 45%.

            Quanto da definição da regra atual, a dos coeficientes fixos, nosso Estado de Mato Grosso ficou com apenas 2.38% dos recursos do Fundo, o que, em valores corrigidos, geram, aproximadamente, R$1,616 bilhão em receita para o Estado, ante os R$70 bilhões do montante líquido total, em dados atuais, aproximadamente 1,4% do PIB.

            Ora, o Estado do Mato Grosso apresenta uma relação de 10% entre recursos provenientes do FPE e a Receita Corrente Líquida. Isso quer dizer, Sr. Presidente, que cerca de 10% da receita do Estado se origina dos repasses do FPE. É certo que não somos um Estado com 46% de dependência dos recursos do FPE, como é o caso do Amapá, ou 44%, como é o de Roraima, mas, de qualquer forma, perder 10% de nossas receitas, do dia para a noite, é profundamente preocupante, geraria uma situação dramática no Estado, com impactos irreversíveis na saúde, na educação e na gestão das contas públicas do Estado do Mato Grosso.

            Então, essa é a nossa grande preocupação, de nós Parlamentares e de toda a população mato-grossense.

            Ao que me consta, no decorrer dos trabalhos, a Comissão do Pacto Federativo ponderou entre dois critérios distributivos para o FPE: os critérios paramétricos, que consideram variáveis como população e renda per capita, e os critérios de equalização das receitas, que incluem as diferenças de receita entre os Estados de menor arrecadação em relação aos de maior arrecadação.

            Ambos atendem ao que determinou o STF, sendo que os critérios paramétricos já possuem metodologia bastante conhecida por se aproximarem dos antigos critérios do Código Tributário Nacional, sendo de simples aplicação e maior viabilidade política. Todavia, apesar de dinâmicos, eles não possuem flexibilidade em relação às variações de receitas, que podem ocorrem em razão de perda de arrecadação de um Estado por algum fator imprevisto, como, por exemplo, citei há pouco, a questão da desoneração do IPI em alguns setores, que o Governo tem feito provisoriamente.

            Já os critérios de equalização pecam por possuir uma metodologia mais complexa, mas atacam frontalmente o problema das desigualdades, funcionando como uma válvula que regula a transferência dos recursos aos Estados que mais precisam. É o modelo adotado em países como a Alemanha, Canadá e Austrália.

            O fato, Srªs e Srs. Senadores, é que a adoção de qualquer um dos critérios implicará perdas e ganhos para um ou outro Estado. Ademais, outro problema que está na raiz, na gênese mesma, do FPE, é o que diz respeito à fonte financiadora do Fundo, os recursos do Imposto de Renda e do IPI. Como são impostos que tendem a ter volumes mais expressivos em tempos de bonança, o FPE recebe mais recursos em tempos de crescimento econômico; nas crises, o valor do Fundo se reduz.

            Isso tem gerado sérias dificuldades para o equilíbrio fiscal nos Estados, como ocorreu em 2010, quando o Governo Federal distribuiu cerca de R$1,2 bilhão para Estados e Municípios para suprir as perdas naquele ano do FPE e também do FPM, decorrentes da queda da arrecadação federal durante a crise econômica de 2009.

            E agora, novamente, tivemos, esses dias, a presença de vários prefeitos, mais de mil prefeitos do Brasil todo, cobrando o apoio do Governo Federal para ressarcir aos Municípios recursos do FPM que estão perdendo, em função da desoneração do IPI, neste momento de crise por que também atravessa o mundo e, consequentemente, o Brasil.

            Segundo dados da Confederação Nacional dos Municípios, as transferências para Estados e Municípios encerrarão o ano de 2012 com um valor de R$17,4 bilhões abaixo do inicialmente projetado no Orçamento da União.

            Portanto, Sr. Presidente, a bem da disciplina fiscal, seria interessante também que o montante do FPE não oscilasse ao sabor do ciclo econômico.

            Embora não esteja ligado diretamente ao FPE, há mais um assunto que me preocupa no âmbito da redefinição do pacto federativo. Refiro-me à polêmica Proposta de Súmula Vinculante nº 69/2012, do STF, cuja motivação é eliminar a chamada guerra fiscal, em função das inúmeras leis estaduais que insistem na concessão de vários incentivos fiscais, sem o prévio amparo em convênio aprovado por unanimidade no âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz). Se aprovada essa súmula pelo STF, isso significará um grave retrocesso dos ganhos econômicos e sociais, representando considerável perda do PIB estadual. Isso, porque, de uma forma abrupta, liquida 23 Estados da Federação, rompendo os benefícios fiscais e tributários que foram concedidos ao longo de dezenas de anos, o que conduz à desindustrialização dos Estados. Isso é inaceitável.

            O que quero dizer é que essa decisão, a Súmula Vinculante, praticamente coloca em dificuldades alguns Estados da Federação, principalmente os do Centro-Oeste e o Paraná, que, ao longo dos últimos anos, vêm oferecendo incentivos fiscais para que indústrias saiam de São Paulo e de outros Estados da Federação e se instalem nesses Estados produtores. A decisão do STF, nessa Súmula Vinculante, pode significar a perda de atratividade para esses Estados e, sobretudo, as empresas que já estão lá hoje podem perder o interesse nesses Estados e se instalar em outros Estados que contam com uma logística melhor e condições de modal, de transporte, mais fáceis para escoar sua produção.

            Então, Sr. Presidente, com relação à Súmula Vinculante, trata-se de outra grande preocupação que tenho no momento. E que esta Casa, o Congresso Nacional como um todo retome os debates sobre o pacto federativo.

            O fundamental, quero deixar bem claro, é que não haja perdas para os Estados. Se o nosso Estado do Mato Grosso tiver de abrir mão de alguma parcela dos recursos do FPE, entendo que isso deva ser compensado com outra fonte de recursos, como, por exemplo, os royalties do petróleo, não de forma imposta, mas negociada, como deve ser num autêntico pacto federativo, democrático, no qual as decisões são tomadas em conjunto.

            Falo em nome do Estado do Mato Grosso, mas também creio que as Srªs e os Srs. Senadores de outros Estados podem ter entendimento parecido com o meu. Afinal, estamos todos no mesmo barco, por assim dizer.

            A Comissão do Pacto Federativo fez o seu papel: estudou detidamente a matéria e propôs as soluções que considera viáveis para o País. É a palavra das maiores autoridades na questão. Isso do ponto de vista técnico. Agora, do ponto de vista político, compete a nós, Senadores e Deputados Federais, decidirmos o que é melhor para a Federação, para os Estados, para a União. Temos essa prerrogativa e esse dever constitucional perante a Nação brasileira.

            O fato é que o critério do coeficiente fixo não pode mais continuar. Tem data certa para acabar, que é 31/12/2012. Se não mudarmos essa regra até lá, no ano que vem, corremos o risco de não contarmos com qualquer respaldo jurídico para os repasses da União ao FPE, o que poderá gerar o caos na Federação brasileira.

            Que nós, Senadores e Deputados, reunidos no Congresso Nacional a partir do mês de novembro, possamos encontrar o melhor caminho para essa matéria tão urgente e tão importante, para que não haja prejuízos nem para o Estado do Mato Grosso, nem para outro Estado da Federação. Esse é o meu maior desejo neste momento.

            Agradeço. Era o que tinha a dizer.

            Muito obrigado e uma boa tarde a todos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/10/2012 - Página 56024