Discurso durante a 199ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Análise dos resultados das eleições municipais.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES, REFORMA POLITICA.:
  • Análise dos resultados das eleições municipais.
Publicação
Publicação no DSF de 30/10/2012 - Página 56787
Assunto
Outros > ELEIÇÕES, REFORMA POLITICA.
Indexação
  • COMENTARIO, RESULTADO, ELEIÇÃO MUNICIPAL, CRITICA, SISTEMA ELEITORAL, BRASIL, MOTIVO, POSSIBILIDADE, FORMAÇÃO, COLIGAÇÃO PARTIDARIA, AUSENCIA, DEFINIÇÃO, PROGRAMA POLITICO, DEFESA, NECESSIDADE, IMPLEMENTAÇÃO, REFORMA POLITICA, OBJETIVO, COMBATE, CORRUPÇÃO, PAIS.

            O SR. ALVARO DIAS (Bloco/PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Anibal Diniz, Srªs e Srs. Senadores, cabe continuar avaliando o resultado das eleições deste ano.

            Antes eu gostaria de destacar que respeito todas as opiniões. É evidente que seria até dispensável fazer essa afirmação, mas considero importante, porque certamente as minhas opiniões não avalizam muitas daquelas que foram expostas durante esses dias na análise do resultado eleitoral. Creio que as urnas falaram. O eleitor deu o seu recado.

            Não é fácil a interpretação. O que deseja o eleitor brasileiro? Eu confesso humildemente que, quanto mais permaneço na atividade pública, os anos passam, e eu confesso que cada vez entendo menos o eleitor do País. Não é fácil entendê-lo, porque certamente ele também tem dificuldade de entender as suas lideranças. Com razões de sobra para essa dificuldade.

            O que é visível é o desencanto. Há um desencanto enorme campeando pelo País. Um terço do eleitorado brasileiro deixou de votar positivamente. Quase 10% de votos brancos e nulos. Eleitores que compareceram, mas votaram em branco ou anularam o voto, e quase 20% dos eleitores ausentes. É uma manifestação contundente de desencanto num sistema de voto obrigatório. Cabe refletir sobre essa constatação. Obviamente é uma reação contrária ao sistema vigente no País, ao modelo político superado, retrógrado, tão combatido, com um debate que se prolonga, mas não chegamos a conferir ao País um novo modelo compatível com as aspirações da nossa sociedade.

            Ontem e hoje ouvimos de jornalistas, comunicadores, analistas, cientistas políticos e políticos, de forma geral, a citação dos partidos. Hoje mesmo ouvimos muito aqui os partidos: os partidos elegeram, o partido ganhou, o partido perdeu. Fico com a impressão de que estamos falando de algo distante do eleitor, porque, durante a campanha eleitoral, não ouvi falar em partidos. Fui a vários pontos do País, participei da campanha em várias capitais, em grandes cidades brasileiras, e em nenhuma delas vi a sigla partidária estampada na publicidade dos candidatos. Eu via o número e, no rodapé da propaganda, aquilo que se chama popularmente de sopa de letrinhas, as siglas partidárias; e, de forma talvez até envergonhada, colocadas como obrigação só, por imposição legal, mas sem que permitisse a leitura. Portanto, o eleitor não ligou o candidato ao partido.

            As coligações estapafúrdias, contraditórias, inadequadas, sem nenhum conteúdo programático, sem nenhum estímulo programático; coligações que são, muitas vezes, concretizadas desonestamente, porque, naquele período que antecede as convenções partidárias, instala-se um balcão de negócios para aquisição de siglas partidárias, a fim de se ampliar o espaço do candidato no rádio e na televisão. Essas siglas - e repito: siglas - não são partidos. Os partidos desapareceram. São siglas para registro de candidaturas. Eu tenho dificuldade até de falar em exceção à regra porque há uma generalização em matéria de dispensa do programa partidário. Não há apelo programático na aliança que se concretiza com siglas que vendem o tempo de televisão. Não vendem nem mesmo o patrimônio eleitoral, porque quase sempre não o possuem. Vendem o horário de televisão, e a corrupção começa, portanto, nesse momento: quem tem mais recursos adquire um número maior de siglas, ampliando o tempo de televisão. Campanha caríssima!

            Quando o Congresso Nacional adotou medidas para reduzir custo de campanha, gerou-se a falsa expectativa de que as despesas no processo eleitoral seriam reduzidas, e nós estamos verificando que é o contrário: as despesas aumentaram. E pior: as despesas, nesse momento, não são contabilizadas. Portanto, aí há desonestidade, aí há corrupção. É a reprodução do sistema de administração pública no País que deu origem ao mensalão. O mensalão está sendo condenado no Supremo Tribunal Federal, mas o sistema é vigente. Ele não foi destruído.

            Este é o maior desafio: destruir esse sistema promíscuo que exige a instalação do balcão de negócios para governar, como se fosse impossível governar sem instalar um balcão de negócios para a compra de apoio político no Congresso, para a cooptação de partidos políticos. O que ocorre nesse período pré-eleitoral é a cooptação de partidos políticos através de uma estratégia corrupta. Portanto, é a reprodução do sistema vigente da administração pública brasileira, mas vamos chegar a ele ainda. Antes, é preciso dizer que os partidos políticos foram ignorados por trata-se de eleição municipal. A conjuntura local determinou a formatação das alianças, mas houve também o interesse estadual. Aqui e ali, governadores que pensaram no projeto próprio e buscaram realizar alianças, colocando o próprio partido como moeda de troca em nome de um projeto escuso. Eu posso dar como exemplo o meu próprio Estado. O Governador acabou fortalecendo a base de apoio ao Governo Federal, ou seja, fortaleceu o projeto de nação daqueles que hoje detêm o poder no País. O Governo do Paraná - o Governador do Paraná - fortaleceu a candidatura petista para 2014, porque deu sustentação a alianças quase sempre com candidatos situacionistas que fizeram a pregação do atual sistema. Não houve contribuição para a derrota do sistema que deu origem ao mensalão, que está sendo julgado no Supremo Tribunal Federal. Por isso, dizem: “O mensalão não influiu nas eleições”. Não é o que penso. Até alguns Senadores que participaram do pleito foram derrotados de forma até surpreendente. Certamente, reflexo houve do julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal. Seria muito triste se esse julgamento não provocasse impacto na população do País. Seria lastimável se nós não constatássemos existir ainda capacidade de indignação na sociedade brasileira. O que houve foi ausência de debates sobre o mensalão na campanha eleitoral - com raríssimas exceções. Talvez, em São Paulo, tenha-se discutido um pouco, mas, por onde andei, não assisti, em local algum, a debates sobre causas e consequências do julgamento do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal, marco histórico para o País. Não houve o debate por constrangimento, em razão das alianças. Colocaram no mesmo palanque governistas e oposicionistas pelo País afora. Como nós queremos conquistar credibilidade junto ao povo brasileiro com esse sistema político promíscuo?

            A reforma política é indispensável a partir da construção de verdadeiros partidos. É bom dizer que é impossível essa afirmação, do meu ponto de vista, ter respaldo na realidade. Ganhou esse partido, ganhou aquele partido.

            Os partidos todos perderam, porque a população simplesmente os ignorou. Se encomendarmos uma pesquisa, em qualquer cidade brasileira, indagando do eleitor em que partido votou, ele não saberá afirmar majoritariamente. É uma constatação que tem de ser feita. A maioria esmagadora do eleitorado votou no candidato, e não no partido. Se indagarmos, vamos conferir que a maioria esmagadora não sabe de que partido o candidato eleito é. Por exemplo, na minha cidade, Londrina, no Paraná, o candidato eleito é Alexandre Kireeff. Ele não é um político; é um empresário. Foi presidente da Sociedade Rural e filiou-se ao PSD para disputar a eleição. O seu Partido apresentou oito candidatos à Câmara de Vereadores. Não elegeu nenhum. Ele foi eleito prefeito da cidade, uma cidade importante, uma das maiores cidades do Sul do País. Uma reação da cidade a escândalos que a envergonharam nos últimos anos.

            O que conseguimos identificar nessa campanha eleitoral foi também o desejo do eleitor em buscar uma postura inovadora, uma postura distante de grupos de poder, distanciada, liberta, independente, portanto.

            Poderíamos citar aqui vários exemplos, o eleitor buscando, desde o início do processo eleitoral, uma candidatura que pudesse configurar a postura de independência, ou seja, de desatrelamento de esquemas viciados da tradicional política brasileira. Vou poupá-los de citar os exemplos, até porque creio ser importante propugnar não apenas pela reforma política, mas, sobretudo, neste momento, pela destruição deste modelo permissivo que foi idealizado em Brasília, que foi implantado em Brasília. É certo que alguns dirão: “Não, mas essa prática já ocorria antes, a prática do loteamento, da estrutura da Administração Pública”.

            É possível que barganhas acontecessem antes da posse do Presidente Lula, da ascensão do PT ao poder no País. É possível, mas não com essa intensidade, não nessa dimensão, não com essa dramaticidade. Porque jamais se viu, na História deste País, algo semelhante. O aparelhamento do Estado brasileiro, a barganha permanente, o balcão de negócios, a relação de promiscuidade, o mensalão é apenas o símbolo, porque a prática é ampliada. Os partidos políticos cobram o apoio, ocupando espaços significativos na estrutura da administração direita e indireta, obrigando quem governa a ampliar essas estruturas, a estabelecer paralelismos, impondo a superposição de ações, com a criação de ministérios, de secretarias, diretorias, departamentos, cargos comissionados, empresas estatais, esgotando a energia financeira do Poder Público, que passa a investir menos produtivamente, comprometendo a qualidade dos serviços públicos, estabelecendo gargalos intransponíveis no sistema logístico nacional, com a destruição do patrimônio, da infraestrutura brasileira.

            Fica caro para o povo brasileiro esse sistema que gera mensalões, que obriga, para atender o apetite fisiológico dos que o apóiam, a prática do superfaturamento de obras. Por isso o Brasil se transformou no paraíso do superfaturamento.

            Olha, não é difícil afirmar, sem medo de errar, que seria possível fazer três, quatro, quem sabe cinco vezes mais do que se faz no Brasil com o mesmo dinheiro, em matéria de obras públicas e também na área de serviços.

            É por isso que eu afirmo: quanto pior o governo, maior é o apoio político que angaria. Porque, sem dúvida, há uma larga margem de desonestidade na atividade política. E os desonestos, os fisiológicos, se juntam a incompetentes que se aproximam do poder exatamente na busca de benesses, de favores, de benefícios escusos. E o Governo passa a ter então um apoio ampliado. Com isso, reduz o espaço oposicionista, limita a oposição. São poucos os que fiscalizam, os que denunciam, os que criticam. E o Governo sente-se instalado confortavelmente para errar, para ser incompetente, para ser desonesto. E mais: gasta uma fortuna com a publicidade oficial, para vender uma imagem fraudada através de propaganda enganosa, iludir a população e alcançar altos índices de popularidade.

            Este é o sistema brasileiro, que tem que ser destruído. Eu não vejo futuro sem a destruição deste sistema. Se há uma modesta contribuição que nós que somos poucos na oposição podemos oferecer ao Brasil é a de combatermos de forma implacável esse sistema.

            É evidente que não vamos alcançar os índices de desenvolvimento compatíveis com as potencialidades brasileiras se preservarmos um sistema que tem na promiscuidade a sua marca indelével. Não tenho esperanças de avanços significativos no Brasil com esse sistema corrupto. E ele foi transplantado, como eu disse, para Estados e Municípios e tornou-se suprapartidário.

            Sem a injustiça da generalização, ele está presente em quase todos os Estados e em muitos Municípios brasileiros. Essa prática foi assimilada até pela imprensa nacional. Isso é normal, isso é rotina, é o preço da governabilidade, como se fosse impossível imaginar alguém chegando à presidência da República e destruindo esse balcão de negócios, governando com postura republicana, tratando o Congresso Nacional com respeito, valorizando a atividade política, mas sem barganha, sem corrupção, sem desonestidade.

            Enfim, creio ser essa a nossa tarefa essencial. Essa é a conclusão que recolho da voz das urnas. Talvez até sem a identificação exata da fotografia desse modelo o eleitor o repudia. E quero, em homenagem aos brasileiros decentes, afirmar que não concordo com aqueles que destacam que o mensalão não teve influência alguma. Ora, nós é que não tivemos talvez competência para mostrar ao povo brasileiro que há um sistema perverso e que aqueles que lubrificam ou alimentam a engrenagem desse sistema são responsáveis pela sua manutenção, portanto, não deveriam ser premiados com o voto nas eleições.

            Esse era um ponto essencial que deveria ter sido colocado nessa campanha eleitoral, mas eu não vi isso acontecendo, pelo menos de forma didática, de forma a fazer com que o brasileiro entendesse com facilidade que o voto avalizando esse sistema é um voto contra o interesse do País.

            Mas é nosso dever fazer esta pregação. É nosso dever travar este combate, independentemente do fato de trazer vitória ou derrota. Não quero fazer conjecturas em relação a 2014, se esta postura, se este discurso nos leva à vitória ou à derrota. Este é o discurso correto, esta é a postura adequada, portanto, é assim que devemos agir.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/10/2012 - Página 56787