Discurso durante a 202ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão sobre os dois anos de existência do Estatuto da Igualdade Racial; e outros assuntos.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DISCRIMINAÇÃO RACIAL. POLITICA SOCIAL. POLITICA INDIGENISTA.:
  • Reflexão sobre os dois anos de existência do Estatuto da Igualdade Racial; e outros assuntos.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, João Capiberibe, Tomás Correia.
Publicação
Publicação no DSF de 02/11/2012 - Página 58320
Assunto
Outros > DISCRIMINAÇÃO RACIAL. POLITICA SOCIAL. POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • REGISTRO, ANIVERSARIO, INICIO, VIGENCIA, ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL, COMENTARIO, IMPLEMENTAÇÃO, PROGRAMA DE GOVERNO, OBJETIVO, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, ENFASE, SETOR, EDUCAÇÃO, SAUDE, SEGURANÇA.
  • COMENTARIO, REALIZAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, LOCAL, COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS (CDH), SENADO, OBJETIVO, DEBATE, DEMARCAÇÃO, TERRAS INDIGENAS, REFERENCIA, CONFLITO, PRODUTOR RURAL, INDIO, LOCALIDADE, MINISTERIO DA SAUDE (MS).

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Anibal, Senador Suplicy, Senador Tomás Correia, Senador Alvaro Dias, fiz ontem, aqui da tribuna, lá pelas 21h30, uma reflexão e mostrei toda a indignação dos aposentados e pensinistas em relação ao não reajuste dos seus vencimentos, à não votação do fator, e ainda comentei a situação desesperadora dos aposentados e pensionistas do Aerus.

            Reflexão feita, remeti o discurso a inúmeras entidades de aposentados e pensionistas que o solicitaram, e o vídeo está na Internet.

            Hoje, Sr. Presidente, faço uma reflexão sobre os dois anos do Estatuto da Igualdade Racial, Lei Federal nº 12.228, de 2010, de minha autoria.

            No dia 20 de julho de 2010, após longa e dificultosa tramitação, o Congresso enfim aprova o Estatuto da Iguladade, para combater que neste País ninguém, ninguém seja discriminado pela cor da pele.

            Lei promulgada nº 12.228. Estava consagrada a criação do Estatuto da Igualdade, criado para garantir à população discriminada, povo negro, a igualdade de oportunidades, a defesa de seus direitos e combatendo todo tipo de discriminação.

            Transcorridos dois anos de sua vigência, iniciada 90 dias após a data da sua publicação, não faltaram na época, lembro-me, críticos que se apressavam em afirmar que o Estatuto não seria implementado.

            A reflexão que fazemos hoje, após dois anos, tem fundamento, como diziam também, o Estatuto do Idoso, também de nossa autoria não seria aplicado. Hoje todo mundo bate palmas por eu ter apresentado e aprovado o Estatuto do Idoso.

            E a pergunta que faço: será que o árduo trabalho que nós todos realizamos ao longo de mais de 10 anos, enfrentando incompreensão, não tem hoje o resultado positivo? Eu digo que sim.

            O cerne da proposta que viria a se tornar o Estatuto da Igualdade sobreviveu a todas as investidas das forças conservadoras por um motivo muito claro: são aqueles mesmos que lá na África do Sul queriam manter o apartheid, em que negro andava numa rua e branco, na outra; nas escolas, onde brancos estudavam, não podiam estudar negros. Rompemos isso.

            Os que defendiam o apartheid, hoje se submetem e admitem que nós temos razão. Os negros e brancos passaram a ocupar espaços nas universidades, no serviço público, em outras áreas, como por exemplo, por que não lembrar, nos próprios partidos políticos.

            Os que se enganaram é porque não entenderam que a nossa proposta se assentava sobre uma base histórico-social muito legítima, e que o percurso da população negra neste País, nossa multissecular experiência de espoliação, de discriminação, de exclusão estava rompendo essas barreiras.

            Apesar dos recuos que tivemos de fazer para aprovar o Estatuto, surgiu na realidade um instrumento jurídico-social e político no nosso País como um relevante documento forte, exatamente por ter suas raízes firmemente cravadas na experiência histórica das mulheres e homens que não admitem o preconceito.

            Como é bom poder dizer isso! Agora, ao avaliarmos os dois primeiros anos de vigência, não há como deixar de perceber um primeiro e muito importante avanço assegurado pelo Estatuto. Graças ao Estatuto conseguimos que a situação de desigualdade vivida pela população negra, explicitada e formalmente reconhecida no Brasil, passou a ser um eixo de debate do próprio Estado, do Governo da Presidenta Dilma, para diminuir as desigualdades.

            Graças ao Estatuto da Igualdade Racial, vamos conseguindo, ao longo dos últimos dois anos, que a transversalidade da questão étnico-racial seja considerada no planejamento das mais diversas políticas governamentais, como na área da educação. Estão aí as cotas. Talvez muitos não saibam, mas quando aprovamos o Estatuto, nós sabíamos que ali não estavam escritas as cotas, mas estavam as ações afirmativas que diziam que os negros teriam que ter acesso às universidades. E foi baseado no Estatuto que o próprio Supremo reconhece a legitimidade das cotas. Foi baseado no Estatuto que, num segundo momento, o Congresso aprova as cotas e hoje elas são fato, são realidade.

            Nas mais diversas políticas - eu dizia -, seja na área da educação, da saúde, do trabalho, do emprego, da comunicação, da segurança, do acesso à justiça, do esporte, da cultura, do desenvolvimento agrário, do meio ambiente, das políticas para as mulheres e para a juventude. Podemos inclusive afirmar que, com o Estatuto, as ações afirmativas se escreveram como parte do projeto geral da superação das desigualdades e da pobreza em nosso País.

            Hoje, é só olharmos a LDO - Lei de Diretrizes Orçamentárias, é só olharmos o Plano Plurianual - PPA, e veremos que os programas de governos, os objetivos, as ações estão calcados em iniciativas constantes lá no Estatuto, porque essas diretrizes de combate à desigualdade de fundo étnico agora têm um instrumento legal, que permite aos ministérios apontarem caminhos de investimento para que todos - negros, brancos e índios - tenham direitos iguais. Isso é novo. E isso é efeito do Estatuto.

            Com o Estatuto, estamos começando a vencer o desafio de incluir perspectiva que não mais permita que, nas políticas públicas, alguns tenham tudo e outros não tenham nada.

            Passam a existir orientações orçamentárias, por exemplo, específicas para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, o BNDES, para o Banco do Brasil, para a Caixa Econômica Federal, para o Banco da Amazônia, para o Banco do Nordeste do Brasil.

            Tudo isso é um impacto que está lá, no art. 56 do Estatuto. Gradativamente, documentos importantes do Governo vão assimilando com maior profundidade e introduzindo em suas orientações a ideia da promoção definitiva da igualdade racial.

            Sr. Presidente, Senador Anibal, o Plano Plurianual 2012-2015 incorpora 25 Programas Temáticos - de um total de 65 -, que contêm indicadores, iniciativas e metas que fazem referência à questão étnico-racial, ou seja, ao combate a esse preconceito. Por vezes, são dispositivos especificamente relacionados ao tema racial; outras vezes são dispositivos mais genéricos, que mencionam medidas especiais para contemplar o combate ao preconceito.

            No conjunto desses 25 Programas Temáticos, há 63 objetivos, 96 metas e 51 iniciativas que apontam que a promoção da igualdade racial é fundamental e ali é explícita.

            A análise do PPA 2012-2015 deixa claro que suas diversas disposições que mencionam a população negra atendem à preocupação transversal do artigo 40 do Estatuto, o qual prevê uma série de mecanismos para promover a participação da população negra na sociedade brasileira em condição de igualdade de oportunidades.

            Sendo o PPA 2012-2015 o primeiro formulado sob a vigência do Estatuto da Igualdade Racial, houve, no momento de sua elaboração, um esforço sistemático e bem-sucedido da Seppir, Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, de auxiliar os órgãos de Governo na formulação de proposições que contemplassem as previsões legais do Estatuto em todas as áreas de política pública.

            Cito, aqui, dois exemplos. Dentro do tema juventude, a questão da mortalidade da juventude negra, no programa temático intitulado Autonomia e Emancipação da Juventude, prevendo, inclusive, a construção de um Plano Nacional de Enfrentamento à Mortalidade da Juventude Negra. E por que isso? De cada dez jovens assassinados, oito são negros. É necessário que o Governo tenha políticas para essa área. Por isso, programas temáticos, como Segurança Pública e Cidadania e Cidadania e Justiça, e a inclusão da temática racial na formação de agente de segurança pública e privada, uma reeducação que me lembra, quando eu era jovem ainda, li no muro de uma academia: negro parado é suspeito, negro correndo é culpado. Coisas como essa, aqui no Brasil, estamos superando: a inclusão da temática racial na formação, ou seja, na educação de agente de segurança pública e privada, e a promoção de um programa de combate ao racismo institucional, nas corporações de segurança pública.

            Também, na atual Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO, a questão racial está explicitada em diversos itens, todos de destacada importância para a melhoria nas condições de vida da nossa população.

            Enganam-se aqueles que pensam que, se você investe na população negra ou na índia, está deixando de lado a população branca. Um grande engano de quem não entende as políticas humanitárias. Quando você investe na população -negros, brancos e índios - o conjunto ganha. Se você combate a pobreza, se você investe na educação, se você investe na distribuição de renda, você está diminuindo a violência do nosso País. E qualquer pesquisa realizada mostra que a população brasileira tem três grandes preocupações: educação, que é fundamental para negros, brancos e índios; saúde, que é mortal, eu diria, para negros, brancos e índios; e segurança, que é mortal, também, para todos.

            Lembro aqui, também, no § 7º, desse mesmo artigo, fica estabelecido “A elaboração e a execução dos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social” - lá, onde está saúde, previdência e assistência - “deverão obedecer à diretriz de redução das desigualdades regionais” - sim, regionais -, “de gênero” - sim, porque é grande o preconceito contra as mulheres -, “raça e etnia”.

            No capítulo LDO, referente à Política de Aplicação de Recursos das Agências Financeiras Oficiais de Fomento, ficou estabelecido como prioridade para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, que é o BNDES, “financiamento de programas de Plano Plurianual, especialmente as atividades produtivas que propiciem a redução das desigualdades regional, de gênero e étnico-raciais”.

            Ainda no item LDO, referente ao BNDES, estão estabelecidos lá, como prioridade, o “financiamento para o apoio à expansão e ao desenvolvimento (...) dos empreendimentos afro-brasileiros e indígenas” e “o financiamento à geração de renda e de emprego por meio do microcrédito, com ênfase nos empreendimentos protagonizados pelos pobres brancos, afro-brasileiros, indígenas, mulheres ou pessoas com deficiência”.

            Como vemos, o Estatuto avançou, e muito, apesar dos pessimistas de sempre. A prioridade de redução das desigualdades sociais, de gênero, étnico-raciais é também estabelecida na LDO para os bancos regionais, tais como Banco da Amazônia, Banco do Nordeste do Brasil, além do Banco do Brasil. Tem que ter política de combate aos preconceitos.

            Nas ações hoje em curso, nos mais diversos Ministérios, observa-se, também, uma convergência de propósitos com dispositivos que vão na linha do que norteia o Estatuto da Igualdade Racial.

            No caso do Ministério da Educação, há algumas ações que, em função de seu desenho, têm grande incidência sobre essa população discriminada. Menciono aqui o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec); o Programa de Educação Tutorial (PET) Conexão de Saberes; e o ProJovem Urbano, que garante espaço para a população negra.

            Este último, por exemplo, apesar de não possuir especificamente um recorte étnico-racial, trabalha com a meta de que 75% dos atendidos sejam os mais pobres e, dentre os mais pobres, vocês vão ver que 75% são negros.

            Vale destacar, e vou passar em seguida ao aparte do meu querido amigo Senador Tomás Correia, que o Pronatec, que é inspirado no Fundep - que eu apresentei há mais de 10 anos aqui, que é um fundo de investimento no ensino técnico, e me lembro quando criaram o Pronatec ainda disseram o seguinte: não pode ser Fundep, porque Fundep é o projeto do Paim, senão fica o mesmo nome, mas a intenção que importa é a mesma -, e o Projovem Urbano são programas com grande escala, voltados a atender dezenas de milhares de pessoas por ano, com alto nível de prioridade dentro do Governo e já em curso.

            No Ministério da Saúde, devo citar duas grandes linhas de ação que, entre outras, beneficiam os mais pobres, a população negra.

            A primeira delas é a efetivação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra nas esferas estadual e municipal.

            A segunda é o acordo de cooperação celebrado entre o Ministério da Saúde e a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR), visando à implementação de ações conjuntas que assegurem a efetivação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, por meio da adesão desse Ministério à Campanha da SEPPIR intitulada “Igualdade Racial é pra Valer”.

            Senador Tomás Correia.

            O Sr. Tomás Correia (Bloco/PMDB - RO) - Senador Paulo Paim, na verdade, temos no Brasil a igualdade formal, que está no capítulo da nossa Carta Constitucional, notadamente no art. 5º, que trata dos Direitos Fundamentais. Ali está dizendo que todos são iguais perante a lei, e isso já vem da Constituição anterior, que vinha da anterior e da anterior. Praticamente todas as Constituições do Brasil vinham trazendo um capítulo sobre a igualdade entre todos os brasileiros. Mas a igualdade real é muito diferente. Veja V. Exª, a maioria dos brasileiros somos negros. Quantos negros há no Parlamento? Aqui no Senado e na Câmara dos Deputados? Aqui no Senado, só V. Exª. Aliás, o Rio Grande do Sul está de parabéns nesse aspecto, não só por tê-lo conduzido para cá, um excelente Senador representando a raça negra, mas lá também eu conheço outras figuras também negras, como é o caso do Carlos Santos, que foi Deputado Federal, meu amigo, Alceu Colares, que foi Governador também do Estado do Rio Grande, negro, então um excelente exemplo de participação de negros no Rio Grande do Sul. Mas veja V. Exª, quantos Deputados negros na Câmara dos Deputados? No Supremo Tribunal Federal, há quantos Ministros negros? Um só e, por sinal, vem demonstrando um trabalho extraordinário, demonstrando que não é a cor, não é a raça, isso não diferencia ninguém, as qualidade não estão na cor de ninguém, nem na raça, estão na garra e na inteligência, na questão ética. Também nas Assembleias, no Judiciário, não se vê quase nenhum Desembargador negro. Parece que há um caso que é até tido com certa admiração e, realmente, é extraordinário, há uma Desembargadora negra acho que na Bahia.

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - É amiga pessoal do Senador Suplicy, que tive a alegria de, por intermédio do Senador Suplicy, conhecê-la.

            O Sr. Tomás Correia (Bloco/PMDB - RO) - E eu a conheci, pela televisão, uma pessoa extraordinária, que tem demonstrado a sua importância no contexto. Então, quero dizer que o Brasil deve muito, ainda, a essa questão. Um Brasil que teve escravidão, e não faz muito tempo, historicamente, ainda hoje, estamos lidando com essa chaga, tentando tirar isso, de uma vez por todas, mas não conseguimos ainda, Senador Paulo Paim, nos libertar do preconceito. Somos um País, ainda, lamentavelmente - tenho que dizer isso, porque é verdade - preconceituoso. Então, precisamos dar esse passo, mas ter política efetiva. Quero cumprimentar V. Exª pela Lei das Cotas. Lamentavelmente, tem que haver a Lei de Cotas, pelo Estatuto da Igualdade, que, lamentavelmente, tem que haver. Não precisaria haver, bastava que tivéssemos o entendimento de que todos somos iguais, bastaria isso, mas, lamentavelmente, tem que haver. Mas é importante que haja, para criarmos essa cultura, remodelarmos essa cultura e trazermos um conceito realmente adequado, para que nos coloquemos todos, efetivamente e do ponto de vista material, do ponto de vista real, como pessoas iguais, como cidadãos iguais. Muito obrigado a V. Exª pelo discurso que faz. Parabéns a V. Exª!

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Agradeço ao Senador Tomás Correia, V. Exª foi feliz, no conjunto do aparte.

            Temos, no Brasil, hoje, em torno de umas 50 leis, para combater o preconceito. Precisaria tanta lei se não houvesse o preconceito? É Lei das Cotas, Lei do Estatuto, Lei do Percentual. É lei que penaliza aquele que comete, a Lei Caó, por exemplo, estava lembrando aqui; está na Constituição que o crime de racismo não prescreve e a pessoa vai para a prisão, quando cometer.

            Enfim, são em torno de 50 leis, para combater o preconceito. Então, não tem como alguém dizer para mim ou para nós que o preconceito não existe, senão o Congresso não teria construído tantas leis com o único objetivo de combater o preconceito contra, principalmente, negros e índios.

            Parabéns a V. Exª, Senador Tomás Correia.

            Senador Suplicy.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Paulo Paim, quero cumprimentá-lo por sua batalha para que possa efetivamente a igualdade racial se tornar algo real no nosso Brasil. V. Exª hoje faz um diagnóstico dos avanços das diversas iniciativas que têm promovido a igualdade racial, que tem tido resultados positivos. Mas, na conclusão de seu pronunciamento hoje, eu não poderia deixar de ressaltar que V. Exª, como Presidente da Comissão de Direitos Humanos, hoje, mais uma vez, lavra um tento notável ao convocar a audiência para debater a questão dos guarani-kaiowá, do Mato Grosso do Sul, inclusive com a presença de representantes do Cimi, da Presidenta, a Srª Marta, da Funai, e com os representantes, alguns dos principias líderes dos guarani-kaiowá e a presença de inúmeras pessoas daquela comunidade, de inúmeros Senadores, inclusive o Senador Delcídio do Amaral, que é do Mato Grosso do Sul. V. Exª...

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - SP) - Tomás Correia, Capiberibe, Deputada Janete também, Rodrigo Rollemberg, Delcídio do Amaral, que presidiu uma parte, porque é Senador do Mato Grosso...

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Tomás Correia, Capiberibe, Deputada Janete, Rodrigo Rollemberg, Delcídio do Amaral e outros que estivemos lá. V. Exª, que tem feito audiências tão significativas, ainda na terça-feira, sobre as questões relativas à igualdade racial, que foi excelente, com representantes da Bahia, o Secretário de Segurança da Bahia, mas hoje foi um dia muito especial porque os índios guarani-kaiowá estavam já há muito querendo a oportunidade de trazer a sua problemática para um fórum onde, de fato, eles pudessem ser ouvidos, inclusive por pessoas como nós, membros do Congresso Nacional, que poderemos agora, diante das sugestões, realizar uma visita bem organizada e, se possível, até ter a cooperação do Governador André Puccinelli. A própria Srª Marta, Presidenta da Funai, nos garantiu que estará junto, numa possível visita ali, para verificar como avançar na direção de resolução mais rápida daquela problemática de um povo que, segundo depoimento de seus líderes, às vezes se veem em estados quase à morte para que os seus sucessores possam continuar a batalha pelo direito à vida, com dignidade. Meus parabéns a V. Exª.

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Obrigado, Senador.

            Eu lembro o Senador Randolfe Rodrigues também, que apresentou uma proposta da Comissão, que foi fundida com outras e nós transformamos numa comissão mista, por iniciativa também da Deputada Janete Capiberibe, de Câmara e Senado, para visitarmos o Mato Grosso do Sul.

            Senador Capiberibe, o aparte.

            O Sr. João Capiberibe (Bloco/PSB - AP) - Senador Paulo Paim, nós acompanhamos, junto com o Senador Suplicy, com o Senador Correia, com o Senador Randolfe, com a Deputada Janete, um depoimento comovente e preocupante...

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - O Senador Cristovam, estou lembrando aqui, também estava lá.

            O Sr. João Capiberibe (Bloco/PSB - AP) - Com o líder dos kaiowás, que participou da audiência pública. Mas o que me deixou extremamente preocupado foi a judicialização dos processos demarcatórios e de homologação das terras indígenas. Foi-nos informado que algumas dessas terras indígenas estão homologadas há muitos anos e estão pendentes de decisão judicial. Essa foi...

(Interrupção do som.)

            O Sr. João Capiberibe (Bloco/PSB - AP) - Pelo Judiciário brasileiro. A Constituição é clara. O povo indígena tem direito às suas terras, onde eles habitavam. E nós tivemos a oportunidade de ouvir um ofício encaminhado no dia 12 de outubro de 1941, por um chefe de posto do antigo Serviço de Proteção ao Índio, comunicando a um superior hierárquico que, na margem do Rio Naviraí, creio, na região do Sul do Mato Grosso do Sul, com um grupo de civilizados... Ele usa o termo civilizados.

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Exatamente. Eu me lembro.

            O Sr. João Capiberibe (Bloco/PSB - AP) - Armados de armas longas, fuzis e mosquetões, teriam expulsado 80 almas, ou seja, algumas famílias indígenas que habitavam havia muitos anos aquela região. E ele pedia providência. Então, fica muito claro que as terras hoje requeridas pelos índios é um direito legitimo que lhes cabe. Portanto, o Estado brasileiro precisa fazer respeitar a Constituição e a lei. Essa é minha preocupação. Eu conheço essa situação, acompanho isso. Observo que há um setor da sociedade que insiste em descumprir as determinações legais. É como se as leis no País valessem para uns e não valessem para outros. Isso me parece um desrespeito, na medida em que a Justiça demora a decidir - dizem que justiça que tarda não é justiça, é injustiça - e a gente pode testemunhar isto, que há uma situação de injustiça pela delonga, pela demora nas decisões judiciais, e a gente precisa levantar a situação de cada processo que envolve a demarcação e homologação de terras indígenas, para que então a gente tome providências no sentido de fazer respeitar a Constituição e a lei. Muito obrigado.

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Muito bem, Senador Capiberibe, eu faço questão, na mesma linha do que os senhores falaram...

            Aquela frase do líder indígena que diz que lá, naquela região, há até pouco tempo, índio não era considerado ser humano. Isso está documentado lá. Há até pouco tempo. “Não, aqueles são índios, e os humanos estão trabalhando para que eles saiam de lá.” Quer dizer, não considerar o ser humano como humano... A que ponto nós chegamos.

            Por isso, a Comissão cumpriu o seu papel e há de cumprir muito mais ainda na linha de garantir a titularidade definitiva da terra que de direito é dos povos indígenas. É bom porque a Comissão encaminhou na linha - e o Ministério Público e o Promotor que estava lá também - de que ninguém está desconhecendo aqueles que, na época de Getúlio Vargas, ganharam o título da terra e foram para lá plantar; que sejam indenizados. E aí a União tem que entrar. E nós trabalhamos com a ideia de colocar verba no Orçamento para indenizar aqueles que possuem o título, mas que a terra fique então com aqueles de direito.

            Sr. Presidente, só por uma questão de justiça - e vou terminar e não vou ler, naturalmente, tudo o que pesquisamos -, quero dizer que o Ministério do Trabalho também já tem, baseado no Estatuto, política de combate à desigualdade racial.

            O Ministério das Comunicações, também baseado no Estatuto, já aplica políticas de igualdade racial.

            Eu diria que o Ministério da Justiça também possui políticas de combate à desigualdade racial. Eu diria que, praticamente, todos os Ministérios passaram a trabalhar nessa linha de combater os preconceitos.

            Eu lembro aqui que os repasses financeiros para as entidades e para os setores que lutam na linha de combate aos preconceitos vão beneficiar de imediato. É grande o número de jovens que são assassinados - 4.200.

            É claro que aqui eu destaco também o trabalho da SEPPIR e quero destacar também o trabalho da Justiça; os diversos órgãos da Justiça, baseados no Estatuto, já começaram a tomar medidas na linha de combater os preconceitos.

            Por fim, Sr. Presidente, quero apenas dizer que, conforme estudo feito pela SEPPIR, somente 20% de tudo que está no Estatuto depende de regulamentação. Todos os outros artigos, ou seja, 80%, são dispositivos autoaplicáveis.

            Meus cumprimentos ao Governo por essas iniciativas que vieram na linha de dizer que o Estatuto é para valer e ele está sendo aplicado no dia a dia.

            Quero, ainda, destacar que para nós é muito importante dizer que eu sou o Relator, na Comissão de Assuntos Sociais, do Estatuto da Juventude, que também trabalha na linha de combater todos os preconceitos. O Senador Randolfe Rodrigues é Relator, por indicação minha, na Comissão de Direitos Humanos.

            Os argumentos que outros setores usam, Sr. Presidente, aqui eu não vou destacá-los; eu vou destacar os argumentos propositivos, afirmativos. Estamos vendo agora que, mais do que nunca, nós caminhamos para ser um povo, efetivamente, de igualdade, de oportunidades para todos. Claro que não chegamos lá, mas, a partir do Estatuto e pela vontade que percebo no Governo, é possível que a gente possa, um dia, dizer que não há mais necessidade de nenhuma política, de nenhuma lei que vá na linha de combater os preconceitos porque os preconceitos não existem mais. Claro que é sonho, mas eu sou daqueles que sempre pensam e sonham que um dia isso pode ser uma realidade.

            Para ser fiel ao que eu falei ontem, Sr. Presidente, acho que ainda há um preconceito muito grande no nosso País em relação aos idosos, porque, até hoje, nós não conseguimos derrubar o fator previdenciário e não temos uma política permanente de valorização dos benefícios dos aposentados e pensionistas.

            Era isso, Sr. Presidente.

            Agradeço a V. Exª e peço que considere na íntegra o meu pronunciamento.

 

SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR PAULO PAIM.

            O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no dia 20 de julho de 2010, após longuíssima e dificultosa tramitação no Congresso Nacional, foi promulgada a Lei no 12.228, que institui o Estatuto da Igualdade Racial, criado para garantir à população negra a igualdade de oportunidades, a defesa dos seus direitos e o combate à discriminação.

            Transcorridos dois anos da sua vigência, iniciada noventa dias após a data de sua publicação, não faltam críticos que se apressam em afirmar que o Estatuto não está sendo implementado.

            Será que existe fundamento para essa avaliação negativa? Será que o árduo trabalho que realizamos, ao longo de dez anos, enfrentando tanta incompreensão, não vem rendendo frutos?

            O cerne da proposta que viria a se tornar o Estatuto da Igualdade Racial sobreviveu a todas as investidas das forças conservadoras por um motivo muito claro.

            É que nossa proposta se assentava sobre uma base histórico-social muito legítima, que é o percurso da população negra deste País, nossa multissecular experiência de espoliação, de discriminação, de exclusão.

            Apesar dos recuos que tivemos de fazer, o Estatuto da Igualdade Racial surgiu na realidade jurídico-social do País como um documento muito forte e relevante exatamente por ter suas raízes firmemente cravadas na experiência histórica das mulheres e dos homens negros do Brasil.

            Agora, ao avaliarmos seus dois primeiros anos de vigência, não há como deixar de perceber um primeiro e muito importante avanço assegurado pelo Estatuto: graças a ele, conseguimos que a situação de desigualdade vivida pela população negra fosse plena, explícita e formalmente reconhecida como uma área de atuação do Estado para incidência das políticas públicas.

            Graças ao Estatuto da Igualdade Racial, vimos conseguindo, ao longo dos últimos dois anos, que a transversalidade da questão étnico-racial seja considerada no planejamento das mais diversas políticas governamentais, seja na área da educação, da saúde, do trabalho e emprego, das comunicações, da segurança pública e do acesso à Justiça, do esporte, da cultura, do desenvolvimento agrário, do meio ambiente, das políticas para as mulheres ou para a juventude.

            Podemos inclusive afirmar que, com o Estatuto, as ações afirmativas se inscreveram como parte do projeto geral de superação das desigualdades brasileiras.

            Hoje, se nos debruçarmos sobre a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), sobre o Plano Plurianual (PPA) 2012¬-2015, veremos que os programas de governo, os objetivos, as ações, as iniciativas neles constantes estão atravessados por essa diretriz de combater a desigualdade de fundo étnico-racial.

            Isso é novo. E isso é efeito do Estatuto da Igualdade Racial.

            Com o Estatuto, estamos começando a vencer o desafio de incluir a perspectiva racial nas políticas públicas.

            Passam a existir orientações orçamentárias específicas para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para o Banco do Brasil, para a Caixa Econômica Federal, para o Banco da Amazônia, para o Banco do Nordeste do Brasil.

            Tudo isso é um impacto do artigo 56 do Estatuto. Gradativamente, documentos importantes do Governo vão assimilando com maior profundidade e introduzindo em suas orientações a idéia da promoção da igualdade racial.

            Sr. Presidente, o Plano Plurianual 2012-2015 incorpora 25 Programas Temáticos - de um total de 65 -, que contém indicadores, iniciativas e metas que fazem referência à questão étnico-racial.

            Por vezes, são dispositivos especificamente relacionados ao tema racial, outras vezes, são dispositivos mais genéricos que mencionam medidas especiais para contemplar a população negra.

            No conjunto desses 25 Programas Temáticos, há 63 objetivos, 96 metas e 51 iniciativas em que a promoção da igualdade racial é mencionada de forma explícita.

            A análise do PPA 2012-2015 deixa claro que suas diversas disposições que mencionam a população negra atendem à preocupação transversal do artigo 4º do Estatuto, o qual prevê uma série de mecanismos para promover a participação da população negra na sociedade brasileira em condição de igualdade de oportunidades.

            Sendo o PPA 2012-2015 o primeiro formulado sob a vigência do Estatuto da Igualdade Racial, houve, no momento de sua elaboração, um esforço sistemático e bem sucedido da Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) de auxiliar os órgãos do Governo Federal na formulação de proposições que contemplassem as previsões legais do Estatuto em cada área de política pública.

            Para citar apenas dois exemplos, destaco, no PPA, dentro do tema juventude, a questão da mortalidade negra no Programa Temático intitulado “Autonomia e Emancipação da Juventude”, prevendo inclusive a construção de um Plano Nacional de Enfrentamento à Mortalidade da Juventude Negra; e, nos Programas Temáticos “Segurança Pública e Cidadania” e “Cidadania e Justiça”, a inclusão da temática racial na formação de agentes de segurança pública e privada, e a promoção de Programas de Combate ao Racismo Institucional nas corporações de segurança pública.

            Também na atual Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), a questão racial está explicitada em diversos itens, todos de destacada importância para a melhoria nas condições de vida da população negra.

            Entre eles, destaco o parágrafo 1º do artigo 17, que exige a apresentação de um “relatório anual, referente ao exercício anterior, de impacto dos programas voltados ao combate das desigualdades nas dimensões de gênero, raça, etnia...”.

            Já no parágrafo 7º desse mesmo artigo, ficou estabelecido que “A elaboração e a execução dos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social deverão obedecer à diretriz de redução das desigualdades regionais, de gênero, raça e etnia”.

            No Capítulo da LDO referente à Política de Aplicação dos Recursos das Agências Financeiras Oficiais de Fomento, ficou estabelecido como prioridade para o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) o “financiamento de programas do Plano Plurianual 2012-2015, especialmente as atividades produtivas que propiciem a redução das desigualdades de gênero e étnico-raciais”.

            Ainda no item da LDO referente ao BNDES, estão estabelecidos como prioridade o “financiamento para o apoio à expansão e ao desenvolvimento (...) dos empreendimentos afro-brasileiros e indígenas” e “o financiamento à geração de renda e de emprego por meio do microcrédito, com ênfase nos empreendimentos protagonizados por afro-brasileiros, indígenas mulheres ou pessoas com deficiência”.

            A prioridade de redução das desigualdades sociais, de gênero, e étnico-raciais é também estabelecida, na LDO, para os bancos regionais, tais como Banco da Amazônia e Banco do Nordeste do Brasil, além do Banco do Brasil.

            Srªs e Srs. Senadores, nas ações hoje em curso nos mais diversos Ministérios, observa-se também uma convergência de propósitos com os dispositivos do Estatuto da Igualdade Racial.

            No caso do Ministério da Educação, existem algumas ações que, em função de seu desenho, têm grande incidência sobre a população negra.

            Menciono, aqui, o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), o Programa de Educação Tutorial (PET) Conexão de Saberes e o Projovem Urbano.

            Este último, por exemplo, apesar de não possuir um recorte étnico-racial, trabalha com a meta de que 75% dos atendidos sejam jovens negros.

            Vale destacar que o Pronatec e o Projovem Urbano são programas com grande escala, voltados a atender dezenas de milhares de pessoas por ano, com alto nível de prioridade dentro do Governo e já em curso.

            No Ministério da Saúde, devo citar duas grandes linhas de ação que, entre outras, beneficiam a população negra.

            A primeira delas é a efetivação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra nas esferas estadual e municipal.

            A segunda, é o acordo de cooperação celebrado entre o Ministério da Saúde e a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (SEPPIR) visando à implementação de ações conjuntas que assegurem a efetivação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, por meio da adesão desse Ministério à Campanha da SEPPIR intitulada “Igualdade Racial é pra Valer”.

            Embora o acordo de cooperação firmado entre o Ministério da Saúde e a SEPPIR esteja no início de sua execução, será possível, a partir dele, atingir diversos resultados esperados em função do disposto no Estatuto da Igualdade Racial.

            Com efeito, o que se observa é existir, no caso da saúde, todo um arcabouço legal e administrativo preparado para viabilizar a implementação da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra e, portanto, do Estatuto da Igualdade Racial.

            No Ministério do Trabalho, menciono a previsão de estímulo à promoção de empresários negros que encontra possibilidade de se concretizar por meio dos Projetos Especiais de Qualificação de Trabalhadores e Trabalhadoras para Empreendedores Afrodescendentes (PROESQ/Afrodescendentes).

            No Ministério das Comunicações, tem destaque o acordo de cooperação firmado entre a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) e a SEPPIR. Por meio desse acordo, a ECT aderiu à campanha “Igualdade Racial é Pra Valer”.

            Entre os compromissos assumidos com essa adesão, estão, entre outros, a identificação do perfil étnico-racial de seus empregados, a divulgação e o cumprimento do Estatuto, e a inserção, no uniforme dos carteiros, do selo em homenagem ao Ano Internacional dos Povos Afrodescendentes, comemorado em 2011.

            Como um primeiro resultado do acordo entre a ECT e a SEPPIR, foi produzido o selo “Heróis da Revolta dos Búzios”, que representa uma importante ação no sentido de promover a valorização da herança cultural e da participação da população negra na história do País, conforme previsto no Estatuto da Igualdade Racial.

            No âmbito do Ministério da Justiça, devo ressaltar o Projeto FAROL - Oportunidade em Ação, que tem foco específico em jovens negros em situação de vulnerabilidade.

            O repasse financeiro se deu por meio da celebração de convênios visando beneficiar 4.200 jovens.

            Não menos importante é o protocolo de intenções entre esse Ministério e a SEPPIR. O instrumento visa estabelecer ações conjuntas de mútuo interesse das duas instituições, com fins de elaborar e ajustar políticas públicas e medidas administrativas voltadas à população negra, visando assegurar o enfrentamento ao racismo e a promoção da igualdade racial.

            Essas políticas públicas e medidas administrativas englobam os campos da segurança pública, da política penitenciária, do acesso à Justiça, da política nacional sobre drogas, da melhoria dos serviços prestados pelas instituições do sistema de justiça.

            Na Secretaria de Política para as Mulheres, menciono o importante Programa Pró-Equidade de Gênero e Raça, que conta com adesão de 95 organizações, sendo 80 públicas e 15 privadas.

            Não posso deixar de fazer referência a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que vai ao encontro do Estatuto da Igualdade Racial. Falo da constitucionalidade do sistema de cotas para negros e afrodescendentes em universidades públicas.

            Da mesma forma, lembro que, logo em seguida, o Senado Federal aprovou o sistema de cotas.

            Sr. Presidente, esses são apenas alguns exemplos de ações em curso que asseguram a inclusão da perspectiva racial nas políticas públicas.

            Desejei dar conhecimento delas a este Plenário no contexto desta avaliação que faço do avanço na implementação do Estatuto da Igualdade Racial dois anos após sua promulgação.

            Outro aspecto que costuma ser alvo de críticas por aqueles que afirmam que o Estatuto não vem sendo implementado refere-se à suposta falta de regulamentação de seus dispositivos.

            Quanto a isso, reporto-me às conclusões de análise realizada pelo Grupo de Trabalho Interministerial encarregado de analisar e propor medidas necessárias para a implantação dos programas, das políticas e das ações previstas no Estatuto da Igualdade Racial (GT-EIR), criado por meio de Portaria da Ministra da SEPPIR, Luiza Bairros.

            De acordo com a minuciosa avaliação feita por esse Grupo, apenas 12, entre os 65 artigos que compõem o Estatuto da Igualdade Racial, necessitam de regulamentação para serem implementados.

            Apenas cerca de 20%, portanto, do que está previsto no Estatuto exige definições regulamentares.

            Desse percentual, a metade será contemplada pelo Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Sinapir), previsto no Título III do Estatuto e em fase de implementação na SEPPIR.

            Fica claro, assim, que a suposta falta de regulamentação do Estatuto não chega a se constituir num problema mais grave, na medida em que 80% de seus dispositivos são auto-aplicáveis, não requerendo sua execução qualquer regulamentação, mas, sim, estratégias de implementação.

            Como vimos, os órgãos públicos já tratam vários pontos da Lei em seus programas e projetos, muitos dos quais absorvidos pela via da institucionalização, na última década, de demandas e mobilizações da sociedade civil. Esse aspecto está evidenciado, inclusive, num conjunto inédito de metas e iniciativas direcionadas ao enfrentamento do racismo e das desigualdades raciais incorporadas ao Plano Plurianual 2012-2015.

            No sentido de impulsionar a plena efetivação do Estatuto da Igualdade Racial, o Grupo de Trabalho criado pela Ministra da SEPPIR sugeriu nada menos que trinta e quatro diferentes estratégias de implementação, algumas das quais já estão sendo executadas. Entre elas, destacam-se: as iniciativas de articulação com os demais órgãos do Governo Federal, com os Poderes Legislativo e Judiciário e o Ministério Público, com os Governos Estaduais e Municipais, com entidades da sociedade civil, e com os movimentos sociais; a ampla divulgação do Estatuto; a implantação do Sinapir; a elaboração de um guia para implementação do Estatuto direcionado a Estados, Distrito Federal e Municípios.

            Srªs e Srs., ao avaliarmos o avanço na implementação do Estatuto da Igualdade Racial dois anos após o início de sua vigência, o que fica claro é o gradativo aprofundamento do compromisso do Estado brasileiro com mudanças concretas, tendo em vista o combate ao racismo e a superação das desigualdades raciais em nosso País.

            Com sua previsão de ações afirmativas, o Estatuto serve de referência aos três níveis de Governo para que promovam ações em benefício da população negra.

            Para nós que tanto batalhamos pela aprovação do Estatuto da Igualdade Racial, o sentimento que hoje fica é o do dever cumprido, pois, graças a ele, vai-se consolidando em nossa sociedade a percepção de um conceito muito verdadeiro e importante, o conceito de que a promoção da igualdade racial é fundamental para o fortalecimento da nossa democracia.

            O Estatuto destaca-se, nesta segunda década do século XXI, como um instrumento que contribui para que possamos alcançar a sociedade divisada pelo Constituinte de 1988, uma sociedade livre, justa e solidária.

            Uma sociedade, portanto, democrática, fraterna, pluralista e sem preconceitos.

            É muito comum, no campo da retórica, a valorização da diversidade que caracteriza o nosso País.

            É frequente a lembrança de que temos o maior número de descendentes de japoneses fora do Japão, que temos o maior número de descendentes de africanos fora da África, que temos 25 milhões de descendentes de italianos, que temos descendentes de alemães, de árabes, de judeus.

            Agora, com o novo impulso de desenvolvimento que o Brasil tomou, novas ondas migratórias vêm sendo atraídas, para enriquecer ainda mais o fabuloso mosaico da nossa diversidade. De fato, o Brasil tem o Globo dentro de si.

            Está corretíssima a avaliação de que toda essa diversidade constitui a mais esplêndida riqueza deste País.

            É preciso pontuar, contudo, que a diversidade, por si só, não gera justiça.

            Temos falhado, até o presente, em responder de modo politicamente adequado à realidade implicada pelo mosaico étnico-racial que compõe o povo brasileiro.

            Em obediência ao espírito de nossa Carta Magna, que repudia, já em seu preâmbulo, os preconceitos de toda ordem, precisamos assegurar plenamente a igualdade de oportunidades para todos, o respeito à diversidade, o pluralismo, a tolerância, a solidariedade.

            Garantir oportunidades iguais para toda a rica diversidade étnica que a história nos concedeu significa, Sr. Presidente, dar o melhor aproveitamento a um fantástico manancial de talentos que, até hoje, vem sendo em grande parte desperdiçado.

            O Brasil não tem sabido, até o presente, usufruir adequadamente de todos os seus talentos, das suas melhores vocações.

            Isso porque as barreiras do preconceito e do racismo acabam por excluir talentos, vocações, possibilidades de realização que deveriam estar a serviço do engrandecimento da Nação.

            O País vive um momento extraordinário. É a sexta economia do mundo. Nesse contexto, o que precisamos ter claro é que o combate ao racismo é estratégico para o País, para o nosso futuro, para o aproveitamento do nosso potencial de desenvolvimento, para liberar nossa energia de realização, para assegurar o crescimento do nosso capital humano.

            O Estatuto da Igualdade Racial chama a atenção para o fato de que promover a igualdade racial é fortalecer nosso processo democrático, nosso desenvolvimento, nossa economia.

            Logo, promover a igualdade racial tem de ser um objetivo estratégico do Governo.

            Nessa medida, o Estatuto da Igualdade Racial vem contribuindo diretamente para a consecução de um objetivo estratégico do Governo Federal.

            Era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/11/2012 - Página 58320