Discurso durante a 205ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Expectativa sobre a eleição presidencial nos Estados Unidos da América; e outro assunto.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES. POLITICA INTERNACIONAL. ECONOMIA INTERNACIONAL.:
  • Expectativa sobre a eleição presidencial nos Estados Unidos da América; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 07/11/2012 - Página 59108
Assunto
Outros > ELEIÇÕES. POLITICA INTERNACIONAL. ECONOMIA INTERNACIONAL.
Indexação
  • EXPECTATIVA, RELAÇÃO, ELEIÇÃO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), REGISTRO, REFERENCIA, CANDIDATO, PARTIDO POLITICO, DEMOCRACIA.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, VALOR ECONOMICO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), RELAÇÃO, PROPOSTA, COMBATE, CRISE, ECONOMIA, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), SEMELHANÇA, PROPOSIÇÃO, AUTORIA, ORADOR, REFERENCIA, IMPLEMENTAÇÃO, PROGRAMA, RENDA MINIMA, CIDADANIA, BRASIL.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Presidente Waldemir Moka.

            Considero importante o projeto do Senador Romero Jucá sobre os taxistas aqui do Distrito Federal, pelo que o cumprimento.

            Gostaria, Sr. Presidente, de hoje falar sobre a importância das eleições nos Estados Unidos, inclusive para nós, brasileiros, e da expectativa da grande maioria dos povos, em todos os países, na Europa, na África, na Ásia, aqui na América Latina e no Brasil, relativamente à eleição do Presidente Barack Obama, conforme ainda há pouco, no início da sessão, ouvimos o Senador Pedro Simon também colocar essa aspiração.

            No meu entender, o Presidente Barack Obama continua com o seu propósito de levar adiante os grandes anseios de Martin Luther King Jr. Aliás, foi exatamente esse um dos temas principais quando ele aceitou sua primeira incumbência pelo Partido Democrata, em 28 de agosto de 2008, ocasião em que recordou os 45 anos do belo discurso “Eu tenho um sonho”, de Martin Luther King Jr.

            E gostaria também de aqui assinalar que o economista Paul Krugman, Prêmio Nobel de Economia, tem apontado em inúmeros artigos, alguns dos quais publicados na imprensa brasileira, o quão importante será a reeleição de Barack Obama. Por exemplo, no seu artigo intitulado “Fim de programa de Saúde de Obama pode deixar 45 milhões de americanos sem assistência”, ele ressalta que:

(...) uma coisa está clara: se ele [Mitt Romney] ganhar, o Medicaid -programa que atualmente abrange mais de 50 milhões de norte-americanos, e que o Presidente Barack Obama pretende expandir ainda mais, como parte de sua reforma para a área da saúde - enfrentará cortes gigantescos. As estimativas sugerem que uma vitória de Romney impediria que aproximadamente 45 milhões de pessoas tivessem acesso à assistência médica, e dois terços desse total perderiam seus planos de saúde, devido aos cortes no Medicaid. Caso Romney perca a eleição, aí sim as pessoas vão manter a sua cobertura.

            Em outro artigo, o laureado com o Nobel de Economia, Paul Krugman, ressalta que:

Mitt Romney, discursando diante de doadores de verbas em Boca Raton, Flórida, descartou quase metade do país - os 47% de americanos que não pagam imposto de renda -, declarando que não se preocupa com eles.

            Ora, segundo Paul Krugman, enquanto Barack Obama, na convenção de seu partido, confere sempre ênfase especial aos trabalhadores, especialmente os trabalhadores beneficiados pelo resgate do governo no setor automobilístico e outros, em geral as declarações de Romney revelam a crença generalizada de que os impostos sobre a classe trabalhadora são, na verdade, baixos demais. Na verdade, ele pouco tem do ponto de vista de atenção para com a maior parte do povo, em especial dos trabalhadores.

            Mas, além de aqui dizer da minha torcida para que o Presidente Barack Obama seja eleito nos Estados Unidos pelo povo norte-americano, também, hoje, gostaria de analisar um artigo do brilhante economista Luiz Gonzaga de Mello Beluzzo, publicado hoje no Valor Econômico, sob o título “Bernanke e a política monetária”, que aqui desejo comentar.

No Eu&Fim de Semana da última quinta-feira, André Lara Resende ofereceu ao leitor do Valor Econômico uma excelente narrativa dos dilemas e aporias que infestam a política econômica nos Estados Unidos. André concentra suas considerações nos limites da política de ‘relaxamento monetário’ (quantitative easing, QE), cuja terceira rodada Ben Bernanke anunciou em Indianápolis.

(...) Bernanke procurou explicar à seleta plateia que, em circunstâncias normais, o Federal Reserve executa a política monetária mediante o manejo da taxa de juros de curto prazo. O propósito é afetar a curva de juros formada no mercado e, portanto, elevar os preços dos ativos.

A crise de 2008, no entanto, nasceu das exuberâncias financeiras e produtivas do capitalismo desenfreado, ou seja, entregue a si mesmo. O superendividamento das famílias foi fomentado pelo elástico crescimento da dívida intrafinanceira e acompanhado da geração de capacidade produtiva excedente nas áreas dinâmicas do planeta. Ainda que, nos países centrais, a taxa de investimento tenha sido modesta, foi mais do que compensada pela vigorosa expansão da formação de capital fixo nas economias emergentes asiáticas.

A fecundação entre os três movimentos - endividamento das famílias, alavancagem financeira e construção acelerada de capacidade dos emergentes - está nas entrelinhas da fala de Bernanke, quando ele justifica os quantitative easings 1, 2, e 3. Na ressaca dos excessos, observadores atentos da cena econômica concluíram que não se tratava de uma crise de liquidez, senão de insolvência de famílias e bancos, seguida do inevitável mergulho do consumo e do investimento.

Na crise de 2008, ocorreu um colapso keynesiano das convenções que comandavam as avaliações dos proprietários e administradores da riqueza. A reversão das expectativas, outrora exuberantes, derrubou os preços dos ativos reais e financeiros. Os métodos habituais que permitem avaliar a relação risco/rendimento dos ativos sucumbiram diante da obscuridade total que paralisou os mercados de dívida e de direitos de propriedade, bloqueando os novos fluxos de gasto.

Na posteridade do colapso, a tentativa de redução do endividamento e dos gastos de empresas e famílias em busca da liquidez e do reequilíbrio patrimonial - uma decisão “racional” do ponto de vista microeconômico - tornou-se danosa para o conjunto da economia, pois levou à ulterior deterioração dos balanços, aí incluída a relação dívida/PIB dos governos empenhados em impedir a depressão.

Em tais circunstâncias, diz Bernanke, não há outra solução senão abrir o balanço do Banco Central para impedir a ruptura das relações débito-crédito. A compra pelo Fed de securities de emissão publica e privada cumpriu seu papel ao manter baixas as taxas de juros.

O propósito do QE é recuperar os preços dos ativos, particularmente dos imóveis residenciais, uma tentativa de reanimar o consumo mediante um “efeito-riqueza” em tempos de penúria. Desgraçadamente, os esforços da política monetária foram contidos pelos consumidores empenhados em reduzir as dívidas e pelas famílias assustadas com as perspectivas do mercado de trabalho.

A liquidez injetada pelo Quantitative Easing empoça nas reservas dos bancos e adormece no caixa das empresas. Atoladas em capacidade ociosa, as empresas estão reticentes em mobilizar seu aparato produtivo diante do consumo claudicante e do mortiço animal spirits dos parceiros-competidores. A taça transbordante do “relaxamento monetário” não derramou o líquido nos lábios sedentos do desemprego e da capacidade ociosa. A generosa liquidez do estímulo quantitativo vazou para as gargantas insaciáveis da “armadilha da liquidez”.

Nos Estados Unidos, as expectativas de bancos, empresas e famílias são típicas de um quadro depressivo. Trata-se de uma depressão não realizada, apenas bloqueada pelas intervenções do Banco Central. Bernanke adverte que, na atual conjuntura, a política monetária não pode mais do que faz, e a política fiscal faz menos do que pode. Quanto à inflação, as sobras de capacidade global e os mercados de trabalho frouxos não recomendam essa aposta.

            Eu peço, Sr. Presidente, um pouco de tolerância para concluir o pensamento, com mais 3 minutos, se possível.

Em meio às ousadias da política monetária e à tibieza da política fiscal, o ex-editor do “Times” de Londres, hoje colunista da “Reuters”, Anatole Kaletsky, sugeriu que a grana do quantitative easing fosse depositada diretamente nas contas das famílias consumidoras e das empresas dispostas a dar emprego aos trabalhadores. “Imagine”, diz Kaletsky, “se o Federal Reserve decidir usar os US$40 bilhões - agora destinados ao mercado de títulos - para depositar todo o mês US$130 nas contas das famílias e das empresas até que a economia se aproxime do pleno emprego... Caiu o tabu que impedia os bancos centrais de enfrentar a questão do emprego: a adoção de políticas monetárias radicais é uma questão de tempo”.

A proposta de Kaletsky equivale à sugestão de Keynes que recomendava, em situações depressivas como a atual, a contratação de trabalhadores que receberiam salários para abrir e tapar buracos. O gasto com os salários dos trabalhadores “improdutivos” deveria inflar a renda nominal e alentar diretamente o consumo, colocando em movimento os recursos “livres” de capital e trabalho, sem agregar nova capacidade à já instalada e excessiva.

A sugestão radical escandalizou os bem pensantes. Seja como for, os resultados do Quantitative Easing e a argumentação de Bernanke dão azo a propostas como a formulada por Kaletsky. Na verdade, ela revela um conhecimento profundo da estrutura monetário-financeira da moderna economia capitalista de mercado e do modo de integração da moeda no circuito gasto-produção-rendimentos.

No entanto, se não peca pela lógica estritamente econômica, a proposta esbarra nas relações de apropriação da renda e da riqueza no capitalismo de todos os tempos. Essas relações impõem limites às escolhas das sociedades e dos governos, ainda que as condições “técnicas” para a sua adoção tenham sido criadas pela própria “socialização” capitalista das formas de controle da riqueza.

            Quero assinalar que a proposta de Kaletsky corresponde a justamente...

(Soa a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - ...realizar o propósito de se instituir uma renda básica incondicional para todos os habitantes. No caso dos Estados Unidos, há uma experiência concreta de mais de 30 anos, no Alaska, onde seus 700 mil habitantes têm recebido, desde quando eram 300 mil, no início dos anos 80, a cada ano, um dividendo igual, pago a toda a população, incondicionalmente.

            Isso também é algo que já foi aprovado como lei pelo Congresso Nacional brasileiro, sancionado pelo Presidente Lula. Um dia, nós teremos a renda básica incondicional como um direito à cidadania para todos os brasileiros e brasileiras. E isso tem, na análise de Luiz Gonzaga Mello Belluzzo e de Anatole Kaletsky,...

(Interrupção do som.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - ...uma reflexão adequada e coerente (Fora do microfone.).

            Inclusive, o maior economista do século XX, John Maynard Keynes, em 1939, em How to Pay for the War, propôs que 2% do produto doméstico bruto da Inglaterra fossem destinados a se pagar uma renda básica a todos os habitantes da Inglaterra ou do Reino Unido.

            Assim, Sr. Presidente, cumprimento Luiz Gonzaga Belluzzo, que foi Presidente do Banco Central e que foi um dos principais assessores de política econômica de diversos governos, pela sua análise muito interessante, que traz à luz essa proposta, para todos a conhecerem melhor.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

            Espero que Barack Obama leia também a proposta feita por Luiz Gonzaga Belluzzo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/11/2012 - Página 59108