Discurso durante a 207ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a proposta de unificação do ICMS.

Autor
Casildo Maldaner (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/SC)
Nome completo: Casildo João Maldaner
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FISCAL.:
  • Considerações sobre a proposta de unificação do ICMS.
Aparteantes
Ana Amélia.
Publicação
Publicação no DSF de 09/11/2012 - Página 59891
Assunto
Outros > POLITICA FISCAL.
Indexação
  • COMENTARIO, PROPOSTA, GOVERNO FEDERAL, UNIFICAÇÃO, ALIQUOTA, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), COMBATE, CONFLITO, NATUREZA FISCAL, ESTADOS, IMPORTANCIA, REFORMA TRIBUTARIA, PAIS, OBJETIVO, IGUALDADE, DESENVOLVIMENTO REGIONAL.

            O SR. CASILDO MALDANER (Bloco/PMDB - SC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Nobre Senador Tomás Correia, que preside esta sessão, e caros colegas, eu serei breve, apenas vou fazer alguns comentários sobre a ideia da unificação do ICMS, do encontro que houve com os governadores e representantes de governadores com o Ministro Mantega, ontem, aqui em Brasília.

            Eu vou discorrer sobre alguns assentamentos que realizei, em função dessa circunstância. Sem dúvida alguma, a ideia da unificação, de evitar a guerra fiscal entre os Estados é salutar, não há dúvida nenhuma.

            Mas, se analisarmos mais profundamente, ouvindo alguns Secretários de Fazenda, alguns governadores, embora o Governo prometa a compensação para chegar nisso dentro de 4 ou 8 anos, de certo modo ela cria uma circunstância que, unificando o ICMS, por exemplo, no Brasil, entre os Estados, vamos oferecer um tratamento igualitário entre os desiguais. Queiramos ou não, não há outro instrumento para tentar aquecer a economia de Estados ou regiões que tenham IDH diferentes. De certo modo isso fica manietado nas mãos... Se se vai tratar igualmente todo mundo, os desiguais com o mesmo tratamento, unificando?

            Não vejo como investidores internacionais, ou mesmo dentro do País, se estabelecerão em regiões em que a logística já favorece; não só a logística das empresas, o transporte, a produção, mas também do consumo. Se não houver um incentivo de descentralizar o desenvolvimento, não vai levar porque tem uma logística mais cara, o consumo depois terá de percorrer outras regiões, porque o pessoal não vai morar lá para consumir. Quer dizer, nós vamos ter uma concentração de logística, e aí fica uma coisa meio complicada.

            O Governo acena com compensação. Muito bem, a compensação porque esses Estados que vão perder com isso, quando não vão ter incentivos, ou mesmo perdendo, vão ter a compensação. A compensação é conhecida. O pessoal não crê muito nisso. Nós conhecemos a Lei Kandir há tempo. Há tempo é conhecida a Lei Kandir, da compensação.

            O nosso Estado, por exemplo, Santa Catarina, que é exportador por excelência, isso vem há anos, com prejuízos enormes à exportação. Daí vem a compensação, trabalha e não recebe, mas manda para exportar, para fomentar, para o Governo Federal ter o equilíbrio da balança, mas a compensação para o Estado vem a conta-gotas, e olha lá, viu. Tem que implorar com chapéu na mão, para largar um pouquinho, não tem como programar o orçamento, não tem como se decidir.

            Então, trago algumas considerações. A guerra fiscal ninguém quer. Nós temos que cuidar disso. O Governo Federal, por exemplo, quer que se faça isso, ele tira aqui, tira ali, ele retém 20% do IPI, ele retém 20% para o seu, retém também dos Estados, dos Municípios, que é o Fundo de Participação, do FPM e também do FPE. Ele retira dos Estados e dos Municípios aquela cota, que fica concentrada e faz a seu bel-prazer. Ele joga onde quer. Ele tem essa liberdade e fica a critério do Governo Federal. Como se usa na gíria, quem “beija melhor a mão”, tem um privilégio de buscar um quinhão, mas não há política mais ou menos uniforme, não há uma isonomia no tratamento dessas questões.

            Daí depende de marcar, de pedir, de ver se tem o privilégio ou não tem para anunciar a boa nova e faz quorum e traz comissões, reúne muita gente. Olha, gasta-se só em função disso e daquilo. É uma loucura para conseguir algum valor na base da imploração, acaba sendo essa verba extra que vai por uma espécie de favor, de tantas idas e vindas, acaba sendo caro isso. Acaba sendo caro isso. Não se tem como realizar uma política estruturada. Ela é difícil, não é fácil! Acho que nós temos que acabar com esse sistema. Eu acho que tem que descentralizar, é um parâmetro.

            Isso aí está determinado e vamos respeitar. Eu acho que o Estado, com as suas assembleias, eles têm tribunais de contas e têm que decidir o que é melhor para a sua região. Os Municípios têm que ter a sua independência, de analisar e pensar também para não estar...Olha, é uma loucura de vindas, e vindas, audiências, manda papel, vem, vamos analisar se dá, vamos ver se até o fim do ano e aí fica aquela expectativa.

            Olha, torna-se caro. Torna-se caro, mas acho que não é fácil isso, não. Não é fácil isso, não! Antes de fazer as colocações que tenho apontadas aqui, a essência é essa. Eu vejo que a Senadora Ana Amélia deseja fazer uma manifestação e, antes de prosseguir, ouço V. Exª.

            A Srª Ana Amélia (Bloco/PP - RS) - Bem rapidamente, Senador Casildo, até porque estou disfônica ainda. Mas para elogiar a pauta que V. Exª traz ao Plenário do Senado. Essa é a Federação esfacelada, na palavra do Presidente da Comissão de Notáveis que examinou o Pacto Federativo por iniciativa do nosso Presidente, José Sarney, Nelson Jobim. Federação esfacelada. E gostei muito de ouvir de V. Exª que não se pode aplicar uma regra igual, no caso o ICMS, em Estados desiguais. Todos nós não queremos guerra fiscal, mas não se pode fazer uma mudança tão radical quanto essa que está sendo feita. Mais ainda, V. Exª diz muito bem, prefeitos e governadores tem que deixar de vir de chapéu na mão pedir esmola, eu diria, ao governo central. Parece que nós estamos vivendo a época de D. João VI, em que era assim. O rei recebia as benesses e as visitas, ele era o concessionário dos benefícios. Mas a época é outra, e nós temos que valorizar os municípios, descentralizar, empoderar a municipalidade, porque é no Município que as pessoas moram, é onde elas vivem. Então, essa situação está cada vez mais... Em vez de corrigir a distorção da Federação esfacelada, ela está apenas, com essa medida, agravando, porque a dependência vai continuar maior. E, só para concluir, com a medida que o Governo trouxe para a questão da energia elétrica, a companhia do meu Estado, segundo o secretário Beto Albuquerque, vai perder 600 milhões, e a arrecadação de ICM no Estado será de 500 milhões a menos, anualmente. Então, dá para ver que há outras medidas colaterais que também vão impactar a receita dos Estados. Cumprimentos mais uma vez, Senador Casildo Maldaner.

            O SR. CASILDO MALDANER (Bloco/PMDB - SC) - Eu recolho o aparte de V. Exª, Senadora Ana Amélia. Sei que a voz está afônica, mas é que V. Exª também é uma das primeiras a chegar, assim que clareia o dia, aqui no Senado, uma das últimas a sair. Tem que ponderar um pouco, aconselho a moderar um pouco e recuperar-se, porque é muito importante para o Senado e para o Brasil, sem dúvida alguma. Mas recolho o aparte de V. Exª.

            As ponderações são nessa linha, essa é a preocupação, Sr. Presidente, caros colegas. Isso foi ontem ainda, eu falo aqui. O Governo deu mais um importante passo, não há dúvida, no sentido de tentar fazer essa reforma fatiada. Ele quer buscar caminhos. E a questão do ICMS, reduzir, unificar em 4% no Brasil. De um certo modo, se isso imperar dessa forma, os Estados perdem o princípio federativo, o direito de fazer análise.

            Perde um pouco hoje, mas traz a empresa, investe em seu Estado, vai produzir, com isso vai gerar produto. Além de gerar produto, vai gerar emprego, é a política estipulada, e, além do emprego, como é o produto, sobre o produto, na circulação, vão incidir os impostos, e ele vai acabar tendo resultados. E faz-se a descentralização. Essa é a política do incentivo, é um instrumento de cada Estado da Federação, é um princípio constitucional que é inserido a ele. Ele tem que pensar em fazer um incentivo para ver se vai compensar, não pode fazer alguma coisa que já existe. Se ele vai fazer o que já existe, vai concorrer com aqueles que já estão localizados. E aí vai criar concorrência, vai prejudicar os que já estão estabelecidos. Mas, às vezes, num tipo de produto em que ele pode trazer, gerar - o seu Estado tem a matéria-prima-, ele pode industrializar, pode trazer investidores e, com isso, pode desenvolver uma região que possa ter até um IDH baixo. Se ele não tiver o instrumento que hoje constitucionalmente é conferido aos Estados, se ele não puder fazer esse tipo de política, quem é que vai a um lugar que tem o IDH mais baixo, que tenha a questão logística diferenciada?

            Pegue o exemplo da grande Campinas, em São Paulo. Ainda ontem um amigo me dizia: “Isso aqui está virando o quinto PIB nacional” - Campinas. Quem é que vai deixar de ir à fronteira com a Argentina, no oeste do meu Estado, onde ainda falta o negócio do gás, na divisa do Brasil com a Bolívia, onde falta estrada de ferro, que é uma grande luta que se tem, que se faz, de vir dos centros produtores para trazer os grãos e desenvolver o gás também, e entrar também para o Rio Grande do Sul, para aquela região mais ocidental do Brasil, quer dizer, aquecer aquela região? Quem é que vai deixar de optar entre a grande Campinas, por exemplo, que tem uma logística extraordinária - depende do setor -, desenvolver ali - para consumir ali também é um grande mercado, e a logística favorece - para ir lá não sei aonde, para depois industrializar lá, perdendo dinheiro? A empresa vai botar do dinheiro dela para depois locomover, para trazer para vender no centro consumidor? Não vai fazer, não. Tem que motivar, levar o desenvolvimento para as pessoas irem morar lá, descentralizar. E um modelo desse vale para o Brasil. Esse negócio de centralizar o Brasil... Ocupar o Brasil racionalmente no seu desenvolvimento, harmoniosamente, até para evitar o êxodo - até para evitar o êxodo! Isso vale para a educação, para a saúde e na questão da indústria. Isto vale fomentar tem que ter incentivos, se não vamos fazer um país desequilibrado. E a responsabilidade disso os seus Estados têm os instrumentos. Agora, se unificar, sem ter outros meios. E o Governo Federal como já detém 20% de tudo que arrecada, está nas mãos dele, retém dos Estados e Municípios, do próprio IPI, assim por diante. Se depender de algum favor para ir buscar, vir aqui, para levar, para tentar aquecer um projeto nessa linha, é muito difícil, não é fácil!

            Acho que não é uma política moderna, não é algo eficiente que temos que implantar no Brasil hoje. O Governo Federal tem que ficar como regulador das questões nacionais e claro que os Estados cuidar para que não haja uma guerra desleal e para isso tem que ter normas, mas tem que ser algo balizado.

            A proposta obviamente causa uma justificada polêmica, como digo aqui. Quero até citar o que diz o jornalista Gustavo Patu, da Folha de S.Paulo, na edição de hoje: “O ICMS é o tributo mais complexo do mais complexo sistema tributário do mundo” Não há dúvida. O imposto é arrecadado pelos Estados e pelo Distrito Federal, o que implica em 27 legislações diferentes - não há dúvida - que, de forma geral, variam de acordo com os incentivos, de acordo com as circunstâncias. Além disso, o tributo é cobrado tanto no Estado fabricado quanto no consumidor, depois que gerar a mercadoria.

            A proposta do governo é de unificar as alíquotas interestaduais, fixando-as em 4%, paulatinamente, ao longo de oito anos.

            Para compensar as perdas, propõe criar um fundo de desenvolvimento regional, propõe a questão da compensação. Quanto à compensação, o pessoal fica com a pulga atrás da orelha. Como será feita, porque a Lei Kandir já vem há anos e só o meu Estado tem alguma dezenas de milhões de reais de crédito de compensação da Lei Kandir, isso depois de muitas idas e vindas, marca, pede, suplica, para ir a conta gotas. Não se tem como organizar e isso não é só no meu Estado, com certeza nos outros também.

            Além disso, a proposta inclui também a criação de um fundo de compensação...Já falei.

            Apesar de a proposta merecer nosso reconhecimento, especialmente em fazer caminhar uma reforma que se arrasta há 20 anos ou mais de 20 anos, ela tem que ter uma discussão séria. É uma pauta do federalismo brasileiro.

            Ao mexer com tributos como o ICMS, a exemplo do que ocorreu em abril, com a aprovação da Resolução nº 72 por exemplo, o governo diminui a margem de manobra dos Estados, preservando a sua própria. Diminui dos Estados mas a dele não mexe no meu!

            Promove reformas importantes, mas com o chapéu alheio - como diz o outro - mantendo a dependência de Estados e municípios e aprofundando a já excessiva concentração da arrecadação tributária.

            E aí, como já falei, ele trata os desiguais igualmente. É muito difícil tratar os desiguais igualmente. Não tem como.

            Ao retirarmos incentivos concedidos, além de lançarmos o País em uma onda de insegurança jurídica, como será feita a motivaçao de desenvolvimento de regiões economicamente deprimidas, com baixo IDH, como já comentei?

            Não podemos tratar igualmente os desiguais, também fiz esse comentário. Obviamente, não defendemos a manutenção da guerra. Não, pelo contrário, porque o conceito popular reza, sabiamente, que numa guerra não há vencedores ou vencidos - todos são derrotados. Numa guerra, eu sei, nessas circunstâncias tem que haver limites. Agora, não pode unificar sem ter o direito de pensar em descentralizar o Brasil e aquecer algumas regiões deprimidas. Se os Estados não têm algum direito de mexer, fica uma espécie de um súdito do Governo Federal, dependendo de alguma benesse ou outra. Mas tem nada concreto, não pode decidir, não pode orçar. Fica manietado.

            A situação ideal seria que todos os Estados tivessem as mesmas condições de desenvolvimento e atração de investimento privado. Mas essa é uma situação irrealista, impossível de se concretizar, até mesmo pelas diferenças geográficas.

            As leis econômicas indicam o caminho do investimento privado: instalar-se em lugares onde o custo de produção seja menor - especialmente pelos fatores logísticos - e o mercado consumidor seja maior. Assim, mantemos uma perversa concentração em regiões já consolidadas - ainda falei há pouco, dei até exemplos -, relegando os outros à estagnação e até à depressão econômica.

            Os mecanismos de compensação, historicamente, não têm se mostrado efetivos. Fundos de desenvolvimento regional mostram eficácia duvidosa; os de compensação, igualmente deixam muito a desejar.

            Está aqui escrito, coloquei no papel. O exemplo clássico é o da Lei Kandir. Santa Catarina, já disse, é um exemplo.

            Para que não provoquemos danos e prejuízos ainda maiores, não podemos tomar decisões precipitadas, muito menos aceitar soluções forçadas. O exemplo da tramitação...

            (Soa a campainha.)

            O SR. CASILDO MALDANER (Bloco/PMDB - SC) - ... da Resolução 72, nesta Casa - estou concluindo, Sr. Presidente -, onde alguns entes foram atropelados, não pode se repetir.

            A discussão acerca da revisão das normas tributárias e do fim da guerra fiscal é das mais relevantes para o desenvolvimento do nosso País.

Está na base fundamental do crescimento de longo prazo, juntamente com investimento em infraestrutura. Mas não pode correr apartada do âmbito de um novo Pacto Federativo, que garanta benefícios e oportunidades para todos, sob pena de aprofundarmos ainda mais o fosso de desigualdade que secularmente impera em nosso País.

            São essas, Sr. Presidente e nobres Colegas, algumas considerações que trago sobre o encontro havido ontem entre governadores e representantes dos Estados com S. Exª, o Ministro da Fazenda, para tratar da unificação do ICMS no Brasil, sobre essa questão.

            Muito obrigado, Sr. Presidente e caros Colegas.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/11/2012 - Página 59891