Discurso durante a 214ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro do transcurso hoje do Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra.

Autor
Ângela Portela (PT - Partido dos Trabalhadores/RR)
Nome completo: Ângela Maria Gomes Portela
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM, DISCRIMINAÇÃO RACIAL.:
  • Registro do transcurso hoje do Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra.
Publicação
Publicação no DSF de 21/11/2012 - Página 62102
Assunto
Outros > HOMENAGEM, DISCRIMINAÇÃO RACIAL.
Indexação
  • REGISTRO, HOMENAGEM, COMEMORAÇÃO, DIA NACIONAL, CONSCIENTIZAÇÃO, NEGRO, IMPORTANCIA, DATA, REFERENCIA, RELEVANCIA, MOBILIZAÇÃO, GRUPO ETNICO, EVOLUÇÃO, COMBATE, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, DESIGUALDADE SOCIAL.

            A SRª ANGELA PORTELA (Bloco/PT - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Senador Anibal; Srs. Senadores; Srªs Senadoras, hoje, no plenário do Senado, registramos e vivenciamos a passagem do Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra. Esta data, estabelecida pela Lei nº 10.639, no dia 9 de janeiro de 2003, é uma merecida homenagem que fazemos ao grande líder negro Zumbi dos Palmares. Falo, Srs. Senadores, de um destemido negro que, no período do Brasil Colonial de nossa história, lutou até a morte contra a escravidão e pela liberdade do seu povo.

            A morte de Zumbi se deu no dia 20 de novembro de 1695, no Quilombo dos Palmares, uma comunidade localizada no Nordeste brasileiro, notadamente na Serra da Barriga, que fica na divisa entre os Estados de Pernambuco e de Alagoas. Refúgio para os escravos que conseguiram escapar de fazendas, de prisões e de senzalas, o Quilombo dos Palmares era uma espécie de república, que chegou a ter mais de 30 mil habitantes. Símbolo da resistência ao sistema escravista, os quilombos representavam uma forma alternativa de manutenção da cultura africana.

            Último País a abolir a escravidão, o Brasil foi a segunda maior nação escravista nos últimos séculos. Alcançou o título de maior importador de escravos da história moderna.

            Os negros que foram trazidos ao Brasil da costa ocidental da África deram enorme contribuição à nossa história. Na religião, na vida social e cultural, na gastronomia e na política, enfim, em tudo, há a presença negra enriquecendo nosso processo de formação como nação e como sociedade.

            Porém, em contrapartida a toda essa contribuição histórica, econômica e cultural, nós temos, sim, uma dívida social muito grande com a raça negra. Alimentamos um racismo ainda velado, que responde por todo tipo de discriminação e de violência que são praticadas contra os negros.

            Ações existem, é claro, mas ainda são insuficientes. Por toda a sua representatividade histórica, o 20 de Novembro, que já é feriado em mais de 500 Municípios do País, foi incluído no calendário escolar.

            A Lei n° 10.639, de 9 de janeiro de 2003, também estabelece a obrigatoriedade do ensino sobre a história e a cultura afro-brasileiras nas escolas do nosso País.

            No âmbito do Governo Federal, ao criar a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial da Presidência da República (Seppir), os governos do ex-presidente Lula e da Presidenta Dilma têm adotado ações afirmativas como forma de reconhecimento às lutas históricas do movimento negro brasileiro.

            A política de ação afirmativa conhecida por Lei de Cotas garante percentuais mínimos de vagas em universidades federais, em instituições federais de ensino técnico e de nível médio para estudantes pretos, pardos, indígenas e de famílias de rendas menores, egressos das escolas públicas do nosso País.

            Ainda na esfera legislativa, aprovamos a Lei nº 12.288, de 2010, que criou o Estatuto da Igualdade Racial. Esse instrumento direcionou o Plano Plurianual (PPA 2012 - 2015) e resultou na criação do programa Enfrentamento ao Racismo e Promoção da Igualdade Racial.

            Neste ano, marcando o dia com gestos concretos, a Presidenta Dilma anunciará, amanhã, ações voltadas às 2.176 comunidades remanescentes de quilombos já identificadas, além das 1.886 certificadas pela Fundação Palmares. São ações importantes para a população negra, são ações que integram o Brasil Quilombola, lançado em 2004, para consolidar os marcos da política de Estado.

            Avaliando a mudança dos tempos, pensamos que fizemos muita coisa. Porém, tudo o que foi feito até então ainda é pouco diante da enorme dívida social e histórica que a Nação tem sobre seus ombros, diante da violência secular praticada contra os negros.

            Uma amostra dessa violência está evidenciada na pesquisa “Violência contra a juventude negra no Brasil”, realizada pelo DataSenado. Essa pesquisa revelou que a maioria dos homicídios que ocorrem no Brasil atinge mais as pessoas jovens. Conforme os dados, do total de vítimas em 2010, cerca de 50% tinham entre 15 e 29 anos. Mas o recorte de raça revela que, desses, 75% são jovens negros.

            Realizada em outubro último, em 123 Municípios do País, a pesquisa alcançou 1.234 pessoas com 16 anos ou mais e com acesso a telefone fixo. A maioria dos entrevistados (66,9%) afirmou serem os negros as principais vítimas de violência, apenas 14,8% disseram serem os brancos, 3% apontaram os indígenas, e 1,1%, os asiáticos.

            Por isso, eu queria encerrar o meu pronunciamento com um texto de Joaquim Nabuco, um abolicionista que, ao entrar para a Câmara Federal, trouxe para a cena política nacional a campanha pelo Abolicionismo:

A escravidão permanecerá por muito tempo como a característica nacional do Brasil. Ela espalhou por nossas vastas solidões uma grande suavidade; seu contato foi a primeira forma que recebeu a natureza virgem do País, e foi a que ele guardou; ela povoou-o como se fosse uma religião natural e viva, com os seus mitos, suas legendas, seus encantamentos; insuflou-lhe sua alma infantil, suas tristezas sem pesar, suas lágrimas sem amargor, seu silêncio sem concentração, suas alegrias sem causa, sua felicidade sem dia seguinte... É ela o suspiro indefinível que exalam ao luar as nossas noites do norte.

            As palavras de Joaquim Nabuco ainda prevalecem no cenário de nosso País, mas alimento o sonho de ver um tempo curto para o racismo velado e cruel que, infelizmente, ainda existe em nossa sociedade.

            Portanto, Srs. Senadores, a exemplo da escola, a atividade política não pode prescindir de suas responsabilidades de também promover mudanças sociais e culturais no que se refere ao racismo, ao preconceito e à discriminação racial.

            Era isso, Sr. Presidente, que eu tinha a dizer.

            Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/11/2012 - Página 62102