Discurso durante a 215ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Destaque à emenda de autoria de S.Exa. ao projeto que reforma o código penal brasileiro.

Autor
Eduardo Lopes (PRB - REPUBLICANOS/RJ)
Nome completo: Eduardo Benedito Lopes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR. CODIGO PENAL. IGREJA CATOLICA.:
  • Destaque à emenda de autoria de S.Exa. ao projeto que reforma o código penal brasileiro.
Publicação
Publicação no DSF de 22/11/2012 - Página 62567
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR. CODIGO PENAL. IGREJA CATOLICA.
Indexação
  • REGISTRO, APRESENTAÇÃO, EMENDA, AUTORIA, ORADOR, REFERENCIA, PROJETO DE LEI, ALTERAÇÃO, CODIGO PENAL, OBJETIVO, GARANTIA, LIBERDADE DE CRENÇA, LIBERDADE DE EXPRESSÃO, RELAÇÃO, MANIFESTAÇÃO, REPUDIO, COMPORTAMENTO, HOMOSSEXUAL.

            O SR. EDUARDO LOPES (Bloco/PRB - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Sr. Presidente. Quero cumprimentar todos que nos acompanham agora pela TV Senado, pela Rádio Senado e também pela Internet, todos os presentes, Senadores, Senadoras e visitantes.

            Trago a esta tribuna, como fiz na semana passada, uma emenda de minha autoria, que diz respeito ao novo Código Penal. Na emenda que apresentei na semana passada, eu falava sobre a questão da venda de bebida alcoólica para maiores de 16 anos. A nossa emenda faz com que volte, que permaneça a venda aos 18 anos.

            Hoje, trago outro assunto também dentro da reforma do Código Penal. E, dentre os temas de grande relevo em discussão, merece destaque essa proposta do novo Código Penal.

            Faço esse destaque em razão de ser o Direito Penal o ramo da ciência jurídica que tradicionalmente protege os chamados “bens jurídicos fundamentais”, sintetizados pela tríade vida, liberdade e patrimônio, que são tutelados exclusivamente pelo Estado.

            Realmente, é basicamente por intermédio do Direito Penal que o Estado exerce o seu poder repressivo e punitivo, com medidas que podem alcançar até mesmo o corpo do infrator, com a supressão da sua liberdade.

            Dessa constatação importante é que resulta a minha inquietação com alguns temas em debate no PLS nº 236, de 2012, que propõe a instituição do novo Código Penal.

            Muito embora eu seja obrigado a registrar que o anteprojeto que deu origem à proposição partiu de penas brilhantes, de juristas de inegável renome, também não me passa despercebido que ele é alvo de duras críticas de parte da comunidade jurídica, o que sugere a adoção de redobradas cautelas no seu exame.

            Particularmente, perturbam-me, entre outras questões, a redução da idade mínima para aquisição de bebidas alcoólicas. Citei agora há pouco o fato de se permitir a venda de bebidas para pessoas acima dos 16 anos de idade. Este é um assunto que me preocupa: baixar a idade permitida para a compra de bebida alcoólica de maiores de 18 anos para maiores de 16 anos. Preocupam-me ainda a tolerância para a produção, porte e consumo de drogas ilícitas e a qualificação da injúria quando praticada com elementos sexistas.

            Quanto a essa injúria qualificada, que leva ao agravamento de pena, entendo que o PLS nº 236, de 2012, com a redação sugerida para o § 1o do seu art. 138, ao criminalizar manifestações contrárias a certos comportamentos sexuais, colide, entre outros valores, com o princípio da liberdade de consciência e de crença e o livre exercício dos cultos religiosos, que são garantidos pela Constituição Federal.

            Faço questão de deixar claro, por honestidade ao debate, que a comunidade cristã, a qual me honra integrar, não é avessa aos homossexuais. Dou meu testemunho disso. Nada temos contra aqueles que, por um ou outro motivo, trilham caminhos diversos dos nossos em suas vidas. Nós os respeitamos.

            Compreendo até a disposição dessas pessoas para a luta contra práticas abusivamente discriminatórias, que eu também abomino.

            Ademais, todos sabemos que a história é plena de injustiças e de perseguições contra homossexuais, como as condenações proferidas pelo Código Penal alemão de 1871, que equiparava o homossexualismo à zoofilia.

            Registro que no período nazista, mais precisamente a partir de 1935, a pena para esse “crime” foi agravada, causando mais de 40.000 condenações, grande parte delas geradas por denúncias anônimas, que levaram muitos aos campos de concentração.

            Apesar de sucessivas alterações, apenas em 1994, ou seja, somente há 18 anos, a Alemanha revogou definitivamente o crime de homossexualidade.

            Mas, por outro lado, também não me sinto obrigado a compartilhar a mesma visão dos simpatizantes da homossexualidade, que é, substancialmente, para nós, cristãos, um modo antinatural de viver a sexualidade, que se afasta dos nossos preceitos, como, de resto, também do de outras grandes tradições religiosas e legítimas concepções morais.

            Eis a divergência de fundo que me levou a apresentar emenda ao PLS nº 236. Não tenho interesse em desmoralizar ou ridicularizar os homossexuais. Essa é estratégia que, desde já, repudio e que não corresponde ao eixo central da minha argumentação.

            O que eu reivindico, sim, é o direito, diria mesmo o “dever”, de expressar e transmitir a mensagem cristã, que não se coaduna com a homossexualidade, mas que, nem por isso, se traduz em radicalismo homofóbico.

            Nós, cristãos, tememos, sinceramente, que a proposta em exame vá criminalizar, por exemplo, a liberdade de crença e o livre exercício do culto religioso, inibindo a ação daqueles que, por ofício de fé, dedicam-se a transmitir mensagens religiosas.

            Se examinarmos com isenção o texto sugerido no §1o do art. 138 daquela proposição, constataremos que ele pode, sim, resvalar pelo caminho da responsabilidade criminal de religiosos e até mesmo de pessoas com convicções morais contrárias à homossexualidade.

            E eu indago: uma pessoa deve ser responsabilizada criminalmente por manifestar a sua crença ou suas legítimas convicções morais ou filosóficas sobre esse tema? Óbvio que não.

            Infelizmente, o PLS nº 236 não oferece uma via intermediária entre liberdade de crença e a não discriminação com base na “identidade ou opção sexual”, nisso atentando a proposta contra direito fundamental constitucionalmente assegurado.

            Se aprovada a proposição, haverá indiscutível quebra do princípio constitucional da laicidade, segundo o qual o Estado está terminantemente proibido de “embaraçar” o funcionamento dos cultos religiosos e das igrejas.

            No momento em que a lei colocar uma mordaça nas pessoas, estabelecendo o que pode e o que não pode ser manifestado, como devem e como não devem se comportar os cristãos, haverá evidente constrangimento à liberdade de consciência e de crença e intromissão inconstitucional no conteúdo dos dogmas de cada religião.

            E para que não se diga que essa é uma preocupação exagerada e isolada, cito o eminente jurista Célio Borja. Com a autoridade de ex-Presidente da Câmara dos Deputados e ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal, ele comentou a tentativa de incluir na injúria preconceituosa questões ligadas à sexualidade, por via do PLC nº 122, de 2006. Diz ele:

(...) Portanto, o direito de não considerar natural, próprio e conveniente, ou de qualificar como moral, filosófica ou psicologicamente inaceitável o comportamento homossexual não seria mais tolerado. Os juízos morais, filosóficos ou psicológicos já não poderiam mais ser externados, embora a Constituição assegure a livre manifestação do pensamento. Essa norma poderia impedir que os pais eduquem seus filhos de acordo com o que entendem ser o comportamento mais natural e socialmente próprio. (...)

            São palavras, então, do jurista Célio Borja, referindo-se à mesma questão da injúria qualificada, ou injúria preconceituosa, que antes estava no PLC nº 122, de 2006, e agora está na reforma do Código Penal, criminalizando, então, a injúria qualificada por questões sexuais.

            Reitero que essa é a avaliação de um ex-ministro do mais alto tribunal do País, que, além de seu inegável saber jurídico, também carrega a experiência de presidente de uma alta Casa do Parlamento.

            Quanto à manifestação da religiosidade, quero enfatizar que, sendo a religião formada por um conjunto de princípios que dirigem o pensamento, as ações e as manifestações de adoração a Deus, ela compreende a crença, a liturgia, o culto, o dogma, e também a moral, etc.

            Assim, impõe-se reconhecer que iniciativas tendentes a restringir ou impedir essa manifestação religiosa representam atentado à diversidade democrática de ideias e filosofias.

            Eu defendo que estabeleçamos a conciliação entre o propagado radicalismo homofóbico e a intransigência teofóbica. Quer dizer, defendo que nós encontremos um consenso entre uma coisa e outra, entre o propagado radicalismo homofóbico e a intransigência teofóbica.

            Para isso, proponho criarmos mecanismos aptos a coibir manifestações preconceituosas.

            Contudo, que isso não seja imposto a qualquer preço, com o sacrifício de tradições imemoriais, que estão integradas em nosso patrimônio cultural e que gozam de proteção constitucional.

            Discordo dos que sugerem, como solução intermédia, que a imunidade da manifestação religiosa apenas alcance aquela promovida no ambiente doméstico ou nos templos.

            Discordo, pois essa proposta simplista se baseia em premissa equivocada, que desconsidera o significado do vocábulo "manifestação".

            Tal solução despreza a garantia constitucional da liberdade de manifestação religiosa para, em seu lugar, impor a liberdade de adoração, cujo exercício passaria a ser tolerado apenas na clausura e quando exercido de forma silenciosa.

            Ora, a garantia da liberdade religiosa, consagrada na Carta Cidadã, jamais será efetivada se outra que lhe é complementar não for assegurada. Falo da “manifestação”, que inclui o direito de fazê-la publicamente e angariar adeptos.

            Sr. Presidente e todos os que nos acompanham agora, é da gênese do nosso povo a vocação para uma sociedade harmônica, com respeito às individualidades e aos seus peculiares valores éticos e morais. Essa vocação é tão intensa que foi gravada no preâmbulo da nossa Constituição, que diz assim - abre aspas:

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.

            Esse é o preâmbulo da nossa Constituição Federal, que fala dos valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista, sem preconceitos, fundada na harmonia. Então, esse é ponto de equilíbrio de que eu falo.

            Esse Preâmbulo não tem força de lei, mas ele é o documento de intenções da Lei Maior, representa a proclamação de princípios que demonstram suas justificativas, objetivos e finalidades. Ele serve de fonte interpretativa para dissipar as obscuridades das questões práticas e de rumo para o governo e para a sociedade.

            Eu proponho emenda ao PLS nº 236 para estabelecer um pacto de convivência harmônica que assegurará a proteção clamada por determinados grupos sociais, mas sem que isso importe na supressão de garantias constitucionais e na negação de dogmas milenares, integrados à nossa cultura e protegidos por nossa Constituição.

            A minha emenda propõe incluir no rol das exclusões de ilicitude para os crimes em questão a manifestação pacífica de pensamento, quando fundada em convicção religiosa, filosófica ou moral, ficando ao juiz a tarefa de aferir o contexto das ocorrências concretas. Ou seja, a minha emenda coloca fora do rol das ilicitudes a manifestação de pensamento quando ela tem por base convicção religiosa, filosófica ou moral. Isso em qualquer lugar, seja num culto religioso, seja na pregação, seja em algum ato público, enfim. É o direito daqueles que se colocam numa posição contrária ao homossexualismo de também expressarem o seu pensamento.

            É claro, eu sou totalmente contra qualquer tipo de violência, da agressão gratuita ao homossexual, como temos tomado conhecimento pela tevê, pelos jornais. Quer dizer, é incabível, é inaceitável a violência gratuita, a agressão física que causa problemas, sequelas e até morte. Temos casos de mortes causadas por essa violência gratuita, só porque o outro ou é homossexual ou se presume que é homossexual.

            Eu me lembro aqui de um caso dos dois irmãos que, numa festa, não conseguindo ninguém para dançar, se abraçaram, brincando, e pensaram que esses irmãos eram homossexuais; e depois, na saída do baile, foram brutalmente agredidos. Eu não concordo com isso de maneira alguma, com essa homofobia gratuita.

            Mas, por outro lado, temos de respeitar a posição. Se a minha convicção de fé, de moral diz que eu não aceito o homossexualismo ou que eu coloco o homossexualismo como uma prática não aceitável, eu tenho de ser respeitado por isso, como também aqueles que praticam querem ser respeitados. Então, é uma questão de respeito.

            Por isso, a minha emenda, Sr. Presidente, tira do rol de ilicitudes, ou seja, o artigo do PL, como está, hoje, o artigo para a reforma do Código Penal, criminaliza a injúria qualificada, por questão também de sexo agora. Então, a minha emenda tira do rol de ilicitudes qualquer manifestação de pensamento por convicção religiosa, moral ou filosófica que trate contrário à homossexualidade ou ao homossexualismo.

            E eu proponho estabelecer um critério coerente com a liberdade de consciência e de crença assegurada pela lei maior e com os dogmas milenares das religiões, doutrinas e também convicções morais.

            Finalizo, conclamando os meus nobres pares a apoiarem a emenda. Adotada, ela propiciará a necessária salvaguarda à diversidade sexual, mas sem reprimir o direito sagrado e consagrado dos que pacificamente dela discordam.

            Muito obrigado pela atenção de todos.

            Sr. Presidente, era o que eu tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/11/2012 - Página 62567