Pronunciamento de Fernando Collor em 28/11/2012
Discurso durante a 220ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Considerações acerca do andamento da CPMI do caso “Cachoeira”.
- Autor
- Fernando Collor (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/AL)
- Nome completo: Fernando Affonso Collor de Mello
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO.:
- Considerações acerca do andamento da CPMI do caso “Cachoeira”.
- Publicação
- Publicação no DSF de 29/11/2012 - Página 64542
- Assunto
- Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO.
- Indexação
-
- SOLICITAÇÃO, DESTINAÇÃO, RELATOR, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, REINCORPORAÇÃO, PARTE, RELATORIO, DISCUSSÃO, CRITICA, PERIODICO, VEJA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), RELAÇÃO, MANIPULAÇÃO, DIVULGAÇÃO, INFORMAÇÃO, APURAÇÃO, CONDUTA, ROBERTO GURGEL, PROCURADOR GERAL DA REPUBLICA, REFERENCIA, ATUAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO.
O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco/PTB - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente desta sessão, Srªs e Srs. Senadores, a reunião de hoje, dia 28, da CPMI, foi destinada à leitura do relatório pelo Deputado Odair Cunha.
Após uma acalorada discussão sobre os procedimentos regimentais a serem seguidos no tocante à discussão e votação do documento final, S. Exª, o Relator, antes de iniciar a leitura, estranhamente retirou as partes 6 e 7 de seu documento. Esses dois tópicos tratam exatamente do indiciamento do jornalista Policarpo Junior, da revista Veja, e do encaminhamento das provas respectivas ao Conselho Nacional do Ministério Público para apuração da conduta do Procurador-Geral Roberto Gurgel dos Santos perante as investigações da operação Vegas da Polícia Federal.
Digo estranhamente, Sr. Presidente, porque o que se deve questionar hoje é o que de fato acontece ou o que de fato aconteceu entre a apresentação inicial do relatório, ocorrido no dia 28 deste mês, portanto há 10 dias somente, tão somente 10 dias, e a leitura resumida feita no dia de hoje. Afinal, que fatos levaram a relatoria a retirar exatamente as principais partes do seu contundente e detalhado relatório, consubstanciado -- vale frisar -- em mais de 5 mil páginas?
Para demonstrar a importância, a amplitude e o alcance das conclusões em relação a esses dois temas a que chegou o Deputado Odair Cunha, assessorado por uma competente e diversificada equipe técnica, basta reproduzir as palavras do próprio Relator na peça inicial publicada, divulgada e distribuída publicamente na semana passada.
Sobre o núcleo de imprensa, vale dizer, contido em 349 páginas do relatório -- 349 páginas foram dedicadas somente a tratar do chamado núcleo de imprensa --, disse o Relator Odair Cunha e abro aspas: “Não restam dúvidas de que o jornalista Policarpo Junior aderiu à organização criminosa de Carlos Cachoeira, colaborando intensamente para o êxito e a continuidade de suas atividades e a impunidade de seus líderes”. Fecho aspas.
Registrou, ainda, o Relator em seu documento as palavras do Juiz da 11ª Vara da Justiça Federal em Goiás, Dr. Paulo Augusto Moreira Lima, ao decretar a prisão do Sr. Carlos Cachoeira, nos seguintes termos, abro aspas -- palavras do Juiz da 11ª Vara da Justiça Federal em Goiás, especificamente em Anápolis:
Ademais, os meios de proteção ao esquema criminoso alcançaram a utilização e manipulação da própria imprensa, sempre mediante pagamento, tudo com o escopo de tentar desqualificar o trabalho desenvolvido por órgãos sérios de persecução e preservar negócios espúrios.
E continua o Sr. Juiz: “Detectaram-se, ainda, nas investigações os estreitos contatos da quadrilha com alguns jornalistas para a divulgação de conteúdo capaz de favorecer os interesses do crime.” Fecho aspas, para continuar novamente com as palavras do juiz citado pelo Relator em seu relatório hoje apresentado. “O poderio era tanto que a organização criminosa contava com o apoio de jornalistas para ‘bater’ em trabalhos sérios que poderiam atrapalhar os ‘negócios’.”
Ele aqui coloca entre aspas: “Há provas de que políticos abriram seus gabinetes para os criminosos, jornalistas venderam matérias, e empresários apoiaram e contaram com o apoio de membros da quadrilha.” Fecho novamente aspas. Palavras do Juiz da 11ª Vara, em Goiás, Paulo Augusto Moreira Lima, utilizadas no relatório da CPMI.
Além disso, às pp. 4.506 e 4.507, o Relator, especificamente sobre Policarpo Júnior, assevera que:
Nessa urdida engenharia criminosa, que tinha como apoio um braço midiático, Policarpo Júnior foi um dos profissionais da imprensa mais requisitados pelo líder da quadrilha. [E continua.] Carlos Cachoeira não era um informante privilegiado.
Isto aqui é do texto do Relator, do primeiro relatório apresentado semana passada aos integrantes da CPMI. Diz ele, continuando:
Carlos Cachoeira não era um informante privilegiado. Não abastecia jornalistas e profissionais da imprensa porque estava enlevado de um espírito cidadão. (...) Ele simplesmente os usava para atingir ou assegurar o êxito de seus objetivos criminosos. (...) Na quadra da realidade que se afirma, exsurge como aviltante da inteligência e da própria dignidade das cidadãs e dos cidadãos deste País justificar os cerca de 8 anos [8 anos!] que sustentam a relação Cachoeira x Policarpo, apenas como uma singela relação entre fonte e jornalista.
As investigações sobre esse profissional nos permitem divisar que Policarpo Júnior não mantinha com Carlos Cachoeira uma vinculação que se consubstanciava apenas na relação de jornalista e fonte. Estavam unidos em propósitos claros e adrede articulados durante muitos anos.
Fecho aspas para as palavras do Relator, Deputado Odair Cunha.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, pergunto a quem quer que seja se essas constatações são secundárias, como justificou o Relator para retirá-las do documento, apesar da contundência e clareza de sua própria argumentação no relatório. A gravidade desses fatos, vinculando setores da imprensa, mais particularmente a revista Veja, sempre ela, e seus servidores com o crime organizado, é ou não é de interesse da sociedade brasileira?
Sobre a conduta do Procurador-Geral da República, o Relator manifestou-se, em seu documento inicial, nos seguintes termos, dos quais destaco alguns trechos que, por si só, revelam o crime de prevaricação e de improbidade administrativa e o crime de responsabilidade, cometidos por Roberto Gurgel Santos. Disse o Relator -- abro aspas:
Apuraram-se fortes indícios de desvios de responsabilidade constitucional, legal e funcional praticados pelo Dr. Roberto Gurgel.
O PGR é livre para formar seu convencimento, mas, obrigatoriamente, ele deve tomar uma decisão fundamentada, seja ela qual for. Ele não pode permanecer inerte, obstando o prosseguimento de uma investigação policial.
Sem incorrer no risco de cometer exageros, as razões assinaladas pelo Dr. Roberto Gurgel, para justificar o sobrestamento, nas palavras dele, Gurgel, ao se justificar por escrito à CPMI da Operação Vegas, não se sustentam, em primeiro lugar porque simplesmente não existe o instituto do sobrestamento de inquérito policial -- trata-se de um termo inédito no processo penal brasileiro --; em segundo lugar, porque o PGR não efetuou nenhuma ação controlada, como também ele alegara, ele, o Procurador-Geral, na sua defesa.
Se os autos da Operação Vegas permaneceram paralisados em seu gabinete, não houve nenhuma ação tampouco controlada. Aliás, o próprio Dr. Roberto Gurgel admitiu que não fez ação controlada. Porém, ele recorre a esse instituto em seu ofício para justificar, para legitimar o seu discurso, ao alegar que o inexistente instituto do sobrestamento tem fundamentação análoga à da ação controlada. Portanto, o próprio Dr. Roberto Gurgel admitiu não ter feito nenhuma ação controlada, mas, sim, algo parecido com uma ação controlada, o qual ele chamou de sobrestamento.
Continuo lendo palavras colocadas pelo Relator Odair Cunha em seu relatório, apresentado há cerca de 10 dias:
Em terceiro lugar, ciente de que não estava fazendo nenhuma ação controlada, o Dr. Roberto Gurgel chegou a argumentar que decidiu sobrestar o inquérito no intuito de possibilitar a retomada das interceptações telefônicas e de investigação.
(Interrupção do som.)
O SR. FERNANDO COLLOR (Bloco/PTB - AL) - Obrigado, Sr. Presidente (Fora do microfone.).
Ora, como seria possível retomar a investigação e as interceptações telefônicas, se os autos em que se processava a investigação estavam totalmente paralisados em seu gabinete?
Segue o Relator, com inúmeros outros argumentos e fatos revelados, até concluir em seu relatório:
A suposta falta funcional cometida pelo Dr. Roberto Gurgel consiste, em tese, em uma conduta omissa.
O PGR é livre para convencer-se acerca da existência de indícios de crime ou não, para oferecer denúncia, para solicitar novas diligências, incluindo a instauração de inquérito policial, ou solicitar o arquivamento das peças de informação quanto aos Parlamentares e requerer o retorno dos autos ao juízo de origem. Todavia, ele é obrigado a tomar alguma atitude. Em hipótese alguma [diz o Relator], ele poderia ter sobrestado -- leia-se interrompido -- a investigação em face da organização chefiada por Carlos Cachoeira. Ao interromper as investigações sobre a Operação Vegas, o Dr. Roberto Gurgel deixou que continuassem as ilicitudes cometidas pela organização criminosa liderada por Carlos Cachoeira.
Destarte e diante de tudo que estamos a afirmar, recomendamos o envio das provas respectivas para o Conselho Nacional do Ministério Público.
Fecho aspas, reafirmando que, até aqui, essas são palavras do Relator contidas no relatório apresentado há 10 dias.
Aqui, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, volto a perguntar: será que esses fatos, essas conclusões do Sr. Relator são temas secundários? Nada disso interessa à sociedade brasileira? Nada disso é motivo de discussão e votação na CPMI?
Sinceramente, Sr. Presidente, não é possível compreender, menos ainda admitir, que, para o Relator e para alguns membros da CPMI, não haja gravidade ou relevância para se manter no relatório as partes 6 e 7. Alegar que são fatos e circunstâncias que não constituem o ponto central da CPMI, conforme declarou o Relator, parece-me que é inverter toda a lógica de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito na seara da representatividade e das prerrogativas do Congresso Nacional.
Digo isso, Sr. Presidente Jayme Campos, e aqui solicito a atenção de V. Exªs, por considerar e entender justamente o contrário. Estes dois pontos, a coabitação de setores da imprensa com o crime organizado e a conduta prevaricadora do Procurador-Geral da República, são exatamente o objetivo principal da CPMI, pois tratam de assuntos de âmbito nacional, de caráter federal e de natureza constitucional.
Aliás, foram esses dois grandes fatos os principais temas trazidos à luz da população pela CPMI. Foram essas abordagens, sistematicamente por mim tratadas e trabalhadas, as novidades que a Comissão permitiu que fossem descobertas. Lembro que os demais temas e fatos abordados na CPMI já foram objeto de investigação e que os inquéritos já estão em curso no âmbito da Justiça e do próprio Ministério Público.
O Sr. Carlos Cachoeira até preso e solto já foi, assim como muitos dos outros integrantes de seu grupo. Seus crimes e contravenções e suas relações políticas e empresariais já foram todos desmascarados antes mesmo de a CPMI iniciar seus trabalhos. Um Senador já foi julgado e cassado por esta Casa. Outros parlamentares federais já respondem na Câmara por suas supostas ligações com o Sr. Carlos Cachoeira. Os empresários envolvidos e as empresas utilizadas como laranjas estão todos mapeados e identificados, e a apuração de suas responsabilidades está em curso na Justiça, tanto no âmbito federal quanto nos âmbitos estadual e distrital.
Em relação ao suposto envolvimento de governadores com o grupo contraventor, trata-se de matéria de cunho e interesse estadual ou, quando muito, regional, que deve ficar a cargo e responsabilidade de apuração das respectivas assembleias legislativas, inclusive por meio de CPIs locais.
Diferente, contudo, Sr. Presidente Jayme Campos, é o que ocorre com autoridades federais, como é o caso do Procurador-Geral da República, Sr. Roberto Gurgel Santos, e com o envolvimento de setores da mídia, cujo interesse é notoriamente de alcance nacional, envolvendo questões até constitucionais. Esses pontos, esses aspectos maiores e personagens nacionais é que devem, sim, ser objeto de investigação de uma CPMI federal, ou seja, do Poder Legislativo da União, pois são de interesse direto de toda a sociedade, de todo o País.
Assim, Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, se esses dois temas retirados pelo Relator são por ele considerados secundários, é o caso, então, de perguntar: o que é, então, prioritário? O que já está sob julgamento da Justiça, cujos fatos, crimes e personagens todos já conhecem?
A verdade é que, se as partes 6 e 7 do relatório final não forem reintegradas ao texto, ficará demonstrado o que venho, de forma reiterada, alertando: o Congresso Nacional, como Poder da República, não se engrandece; ao contrário, ele se apequena, submetendo-se a um órgão subordinado, como a PGR, e a setores da mídia -- e a setores da mídia, Sr. Presidente! -- que trabalham sordidamente para manipular a política em torno de seus interesses escusos.
Por isso, nas minhas sugestões a S. Exª o Relator Odair Cunha, Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, vou propor a reinserção das duas partes retiradas, bem como a inclusão de outros integrantes do Ministério Público que, com ações deletérias, estão deslustrando o Ministério Público, esse instituto criado para defender a sociedade, que vem sendo conspurcado pela atuação criminosa do Sr. Roberto Gurgel Santos. Vou indicar, pedir a inclusão desses outros integrantes do Ministério Público Federal, como também de outros servidores dessa revista Veja -- um verdadeiro coito de bandidos ali se encontra.
Era o que tinha a dizer, por enquanto, Sr. Presidente Jayme Campos, Srªs e Srs. Senadores.
Agradeço a V. Exª, Sr. Presidente, pelo tempo extra que me foi concedido.
Muito obrigado.