Discurso durante a 224ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Analogia entre a história do ouro e da riqueza no Brasil e o uso dos royalties do pré-sal.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • Analogia entre a história do ouro e da riqueza no Brasil e o uso dos royalties do pré-sal.
Aparteantes
Aloysio Nunes Ferreira.
Publicação
Publicação no DSF de 04/12/2012 - Página 65545
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, DISTRIBUIÇÃO, ROYALTIES, PETROLEO, ANALOGIA, HISTORIA, COLONIZAÇÃO, BRASIL, ATIVIDADE EXTRATIVA, OURO, DEFESA, PROJETO DE LEI, DESTINAÇÃO, RECURSOS, PRE-SAL, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, muito gente comenta o que precisa um político ter como formação. Já houve até tentativa de impedir que o Deputado recentemente eleito, o Deputado Tiririca, tomasse posse, porque se supunha que ele não era alfabetizado. Creio que isso não é o fundamental. O fundamental não é ser doutor, o fundamental não é ser economista, como hoje em dia está na moda, ou advogado, como sempre se disse.

            Agora, há uma coisa que o político precisa saber, sendo alfabetizado ou não, é se ele sabe, se ele conhece história. A história de um país é a base para qualquer desempenho de uma atividade pública, olhando o futuro. Não há como pensar bem o futuro sem conhecer bem a história.

            Aqui, quero chamar atenção de um fato da história do Brasil que é preciso ser retomado: precisamos entender e nos debruçar sobre o que aconteceu, quando este País exportou dezenas de toneladas de ouro e prata, e nada ficou aqui. É preciso saber e entender por que, pois este País, em certo momento, era o centro da riqueza mundial, porque aqui, especialmente nas Minas Gerais, em Goiás, em São Paulo, na Bahia, produzia-se ouro com uma quantidade que dava para o Brasil ser o País mais rico do mundo, do ponto de vista da renda, Senador Paim. O que aconteceu com esse dinheiro?

            Primeiro, nós não éramos independentes. Éramos colônia de Portugal. Esse dinheiro tinha que ir para Portugal. O que fez Portugal com esse dinheiro? Gastou. Gastou consumindo vinhos, tecidos, construindo atividades não produtivas, financiando as mordomias da Corte. E o resultado? O resultado é que o ouro do Brasil serviu para industrializar a Inglaterra, e não se deixou nada em Portugal e no Brasil, salvo alguns altares bonitos que merecem nossa reverência pela espiritualidade e pela estética. Nada mais ficou.

            Por que não ficou? Porque o centro de desenvolvimento científico e tecnológico daquele momento era a Inglaterra, e o dinheiro, quando chegava lá, desenvolvia as indústrias que ali estavam sendo criadas pelos tecnólogos, pelos cientistas, pelos educados.

            Tudo isso, Senador Paim, seria completamente diferente se Portugal tivesse pego aquele dinheiro do ouro e investido na educação de seu povo, já lá atrás, nos séculos XVIII e XIX. Se isso tivesse acontecido, os próprios cientistas da Inglaterra viriam para Portugal, e Portugal, que tinha tido a competência de desenvolver a tecnologia das grandes navegações, antes dos outros países, certamente teria desenvolvido tecnologias industriais e seria o país que teria dado o salto no momento exato em que a industrialização começava, no momento exato da revolução tecnológica, que levou à industrialização. Mas Portugal não fez isso, e o resultado é que - não vou dizer hoje - ele tem sido um dos países mais pobres da Europa. E, nisso, o Brasil também.

            Eu lembro essa história, Senador Paim, porque esta Casa vai ter que tomar decisão sobre o que vamos fazer com o petróleo do pré-sal. E eu gostaria que cada um de nós se lembrasse do ouro, ao decidir o que fazer com o pré-sal.

            Felizmente, na semana passada, na sexta-feira, a Presidente Dilma vetou parte do projeto aprovado na Câmara sobre o uso dos royalties e declarou, tanto ela quanto o ex-Senador e atual Ministro Mercadante, que mandaria para cá uma medida provisória que dirigiria todos os recursos de royalties do pré-sal para a educação de base, fazendo agora o que devíamos ter feito 200 anos atrás ou 150 anos atrás, quando se esgotou o ouro.

            Eu espero que essa ideia seja cumprida do ponto de vista da decisão de disponibilizar todos os recursos do petróleo, todos os royalties na educação de base.

            Mas quero dizer que não precisaria de medida provisória. Primeiro, porque não há essa urgência toda, pois não é amanhã que vamos ter recursos do pré-sal. Segundo, porque já existem aqui, nesta Casa, projetos de lei que visam a isso. Em abril de 2008, eu apresentei o Projeto de Lei nº 116, exatamente com esta ideia: destinar os recursos do pré-sal para a educação. Em julho daquele ano, eu fiz uma evolução graças a uma parceria com o Senador Tasso Jereissati. Elaboramos um projeto segundo o qual o dinheiro iria todo para educação, mas não imediatamente. Ele, antes, passaria para um fundo. Esse fundo aplicaria o dinheiro, e a rentabilidade iria para a educação.

            Qual é a vantagem desse novo Projeto, diferentemente do anterior, o nº 268, em relação ao nº 116? É que, se se gastar todo o dinheiro, mesmo na educação, ele se acaba. Mas, se você puser esse dinheiro em fundo, como a Noruega vem fazendo, e se esse fundo for administrado, gerando rentabilidade, ele ficará permanente.

            Imaginem se lá atrás, nesses últimos 200 anos, Portugal tivesse criado um fundo com o valor que adquiria do ouro do território brasileiro. Até hoje esse fundo existiria. Imaginem o tamanho que teria esse fundo! E, se aplicasse isso em educação, certamente seria o país mais rico de todo o mundo.

            Esse projeto que fiz com o Senador Tasso Jereissati foi arquivado já em 2011. Arquivado, Senador! E o que fizemos? Eu e o Senador Aloysio Nunes apresentamos um novo Projeto, o nº 594, em que juntos, em 2011, colocamos a ideia do fundo e da aplicação dos recursos. 

            Vejam as vantagens. Primeiro, esse dinheiro fica permanentemente. Segundo, ele é aplicado em educação. Terceiro, resolve-se um problema da Federação: quem recebe e quanto. Porque, pelo projeto que nós apresentamos, os royalties seriam distribuídos a todas as cidades e Municípios, na proporção do número de crianças na escola. Com isso, ninguém pode dizer que o dinheiro não está sendo aplicado corretamente, do ponto de vista da União, da Federação. E, mais do que isso, o Rio de Janeiro, que é o Estado que tem tido maior quantidade de poços de petróleo produzidos pela Petrobras, é um dos Estados mais favorecidos por essa minha proposta e do Senador Aloysio Nunes, porque é o Estado que tem o maior número de crianças na escola, depois de São Paulo.

            A impressão que eu tenho é que o Brasil ganha, que cada Estado, que cada Município ganha, mas, sobretudo, que o futuro ganha.

            A Presidenta merece nosso respeito, pelo fato de ter assumido essa ideia de - pelo menos comunicado - os recursos serem aplicados em educação. Mas eu volto a insistir: em vez de medida provisória, o projeto do Senador Aloysio Nunes e meu poderia, perfeitamente, viabilizar esse propósito que ela tem de uma maneira muito mais tranquila, de maneira mais eficiente, bastando que as bases do Governo manifestassem urgência nesse projeto.

            Eu quero concluir dizendo que a decisão parece ter sido tomada corretamente. O caminho é que, talvez, não seja ainda, pelo que se conhece, o mais favorável.

            Eu gostaria muito, como brasileiro, de ver que o Brasil tomou a decisão séria agora, diferentemente da decisão de 200 anos atrás; a decisão séria de não desbaratar, de não desperdiçar, de não jogar fora esse novo ouro que a natureza nos deu, que são os recursos do pré-sal.

            E gostaria muito também, como Congressista, como Senador, e, não posso negar, como autor do projeto de lei junto com o Senador Aloysio Nunes, como antes apresentei com o Senador Tasso Jereissati, de ver que a aprovação fosse feita no Congresso. Não de uma medida provisória, mas de um projeto de lei.

            Eu vim aqui lembrar, Senador Aloysio, que a história é a única disciplina importante para um político; para dizer que fico satisfeito de ver a Presidenta e o Ministro Mercadante falando em todos os recursos dos royalties para a educação. E finalmente que não precisa de medida provisória. O projeto está aqui e pode ser aprovado sem muita demora, até porque o pré-sal e seus recursos vão demorar muito mais do que o tempo de aprovar esse projeto.

            Sobre isso, quero falar depois de passar a palavra, em um aparte, ao Senador Aloysio Nunes.

            O Sr. Aloysio Nunes Ferreira (Bloco/PSDB - SP) - Senador Cristovam Buarque, eu, como V. Exª, recebi com alegria a notícia de que a Presidente Dilma havia decidido, ao vetar uma parte do projeto de lei que trata dos royalties do petróleo, abraçar a ideia da destinação dos recursos que virão, os recursos futuros, à educação, segundo uma fórmula pela qual V. Exª vem batalhando há muito tempo, na legislatura passada, como V. Exª acaba de lembrar, ao lado do Senador Tasso Jereissati, que, diga-se de passagem, contou, no momento em que foi submetido à deliberação desta Casa, com o apoio do atual Ministro da Educação, na época o Senador Aloisio Mercadante, com o qual, aliás, estivemos para pedir apoio à nossa iniciativa. Veio medida provisória. O projeto de lei está aqui ainda tramitando. Quando li a notícia do jornal, Senador Cristovam, imediatamente me programei para procurar V. Exª hoje, logo na abertura da sessão, para propor a V. Exª algo que seguramente V. Exª haverá de aceitar: apresentarmos o texto do nosso projeto como emenda à medida provisória, cuja tramitação já se iniciou. É uma emenda que se encaixa perfeitamente no objeto da medida provisória. Não se trata daqueles penduricalhos e contrabandos que nós estamos habituados aqui a verberar inutilmente, mas, pelo contrário, é algo que diz respeito à essência do projeto e que vai contribuir para aprimorá-lo, à medida que nele está incluído um mecanismo, que é o mecanismo da construção de um fundo, alimentado pelas receitas de royalties, que será gerido pela União e cujo rendimento apenas - sem bulir, sem tocar no principal - será destinado a despesas de educação, segundo os critérios já consagrados do Fundeb. Eu penso que esse será o aprimoramento da medida, iniciativa feliz da Presidente Dilma Rousseff, e que vem bem a calhar. Vamos aproveitar uma saudável carona. É uma carona e um passageiro que tem tudo a ver com o rumo que a medida provisória deve tomar. Muito obrigado.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Senador Aloysio, confesso que, quando tomei conhecimento disso, não tive a sua generosidade. Tanto que vim aqui pedir que em vez da medida provisória se continuasse o procedimento normal da nossa lei. Mas não posso deixar de subscrever sua proposta, tomando carona na sua generosidade, porque cada um de nós que passa por aqui quer ver suas leis aprovadas com nossos carimbos. Mas o importante - o senhor tem razão - é que essa lei seja aprovada.

            Eu não tenho nenhum problema de, junto com o senhor, fazer essa sugestão. Querem fazer medida provisória? Aqui já está pronta toda legislação, que foi muito bem-estudada por nossos assessores, com muito cuidado. É um trabalho muito cuidadoso.

            Mas eu queria aproveitar, nessa mesma linha, e dizer que, apesar de ser autor da primeira, em 2008, junto com o Senador Aloysio agora e antes com o Tasso Jereissati, não tenho ilusão de que esse dinheiro pode nem vir. Isso porque ninguém tem certeza do que vai acontecer com as reservas do pré-sal; ninguém tem certeza do tamanho delas; ninguém tem certeza da viabilidade tecnológica de tirar lá de baixo; ninguém tem certeza do preço que terá o petróleo daqui a 20 anos.

            Por isso, embora eu seja autor da ideia, seja autor do projeto - e vou brigar por ele -, eu peço que, por favor, não subordinemos a educação a recursos do pré-sal. Eles têm que vir como um adicional, como algo a mais. Por favor, querer colocar a educação brasileira na espera dos royalties do pré-sal é um gravíssimo erro; talvez mais grave até do que não colocar os royalties do petróleo comprometidos com a educação. Não colocar os royalties do petróleo para a educação é um erro gravíssimo, do tipo que nós cometemos com o ouro. Mas esperar pelos royalties para fazer aquilo que a educação brasileira precisa começar a fazer já, porque já deveria ter feito, será um erro também. Os royalties do petróleo têm que ser um adicional. Quando eles chegarem, mas muito antes, desde já, é preciso começar a trabalhar e colocar mais recursos.

            E aí eu concluo, dizendo: sabendo onde colocar, porque a ideia pura e simples de elevar a contribuição do Brasil à educação a 10% do PIB pode não dar bons resultados, pode ser frustrante, porque esse dinheiro pode ser mal-aplicado.

            Chovendo no quintal de uma escola, na primeira chuva, o dinheiro vira lama. É preciso saber, Senador Capiberibe, como é que esse dinheiro caminha até chegar à cabeça de cada criança. Há que se saber qual é o caminho, e o PNE não formulou o caminho; formulou apenas intenções e um determinado valor de recursos a ser aprovado.

            Nenhum de nós vai ficar contra 10%. Não há a menor justificativa para ficar contra. Mas nenhum de nós pode se contentar com que o PNE se limite a isso e às suas intenções. Há que se dizer como esse dinheiro vai ser gasto. Eu venho defendendo: criando uma carreira nacional do magistério. O Governo Federal assumindo a responsabilidade pela educação de base e começando já. E, quando houver o dinheiro do pré-sal, que ele seja todo aplicado na educação.

            Fica aqui, concluindo, a minha aceitação da generosa sugestão do Senador Aloysio, de que abramos mão da autoria do Projeto. Entreguemos à Presidenta da República o nosso Projeto, e ela o transforma em medida provisória, pela qual nós vamos aqui lutar para aprovar.

            É isso, Sr. Presidente, o que eu tinha para colocar.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/12/2012 - Página 65545