Discurso durante a 232ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre a violência contra a mulher no Brasil, por ocasião do transcurso do Dia Internacional dos Direitos Humanos, no dia 10 último.

Autor
Ângela Portela (PT - Partido dos Trabalhadores/RR)
Nome completo: Ângela Maria Gomes Portela
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS, SEGURANÇA PUBLICA, FEMINISMO.:
  • Reflexão sobre a violência contra a mulher no Brasil, por ocasião do transcurso do Dia Internacional dos Direitos Humanos, no dia 10 último.
Publicação
Publicação no DSF de 12/12/2012 - Página 68921
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS, SEGURANÇA PUBLICA, FEMINISMO.
Indexação
  • APRESENTAÇÃO, HISTORIA, CRIAÇÃO, DOCUMENTO, DEFESA, DIREITOS HUMANOS, MUNDO, REGISTRO, VISITA, COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUERITO, COMBATE, VIOLENCIA, MULHER, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DE RORAIMA (RR), COMENTARIO, RELAÇÃO, PRECARIEDADE, ATENDIMENTO, ORGÃO, PROTEÇÃO, VITIMA, FATO, NECESSIDADE, ATUAÇÃO, GOVERNO ESTADUAL, OBJETIVO, RESOLUÇÃO, PROBLEMA.

            A SRª ANGELA PORTELA (Bloco/PT - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Srªs e Srs. Senadores da República, mais de 155 mil denúncias de violações aos direitos humanos, foram registrados este ano, pela Secretaria de Direitos Humanos (SEDH), da Presidência da República, por meio do ‘Direitos Humanos-Disque 100’.

            Instituído há nove anos, este serviço recebeu até agora, quase 400 mil denúncias, oriundas de todo o país, concernentes às violações aos direitos humanos de pessoas de grupos sociais vulneráveis, como crianças, adolescentes, idosos, população em situação de rua e de pobreza bem como pessoas com deficiência, entre outras.

            Instituído em 2003, a partir da criação da Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH), o Disque 100 funciona 24 horas, todos os dias, inclusive fins de semana e feriados. Os números de denúncias divulgados ontem(10), pela SEDH, marcaram a passagem do Dia Internacional dos Direitos Humanos, do qual venho aqui falar.

            Nobres colegas, o Dia Internacional dos Direitos Humanos foi estabelecido em 1950, pela Organização das Nações Unidas (ONU), em memória à Declaração Universal dos Direitos, adotada por esta organização internacional, na Assembleia Geral, realizada no dia 10 de dezembro de 1948, em Paris.

            Na Declaração Universal dos Direitos Humanos está posta a responsabilidade que “todos os povos e todas as nações”, devem ter para, por meio “do ensino e da educação”, promover o respeito aos direitos e liberdades de toda pessoa humana.

            Sua existência de 64 anos, não é nenhuma dádiva. Mas a junção de esforços de todos - governos, nações e povos - que, percorrendo um longo caminho, resolveram enfrentar resistências, reagir a controvérsias e assumir posturas, diante de discriminações, injustiças e violências.

            Assim, a partir de janeiro de 1947, um comitê de elaboração do qual participaram representantes de oito países - Austrália, Chile, China, EUA, Franca, Líbano, Reino Unido e União Soviética -, deu à declaração um formato, posteriormente aprovado pela maioria dos membros de governos presentes.

            Hoje, cabe a todos os governos e povos a adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, que assegurem o reconhecimento e a observância universal e efetiva, dos direitos humanos “tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição”, como diz trecho desta declaração.

            Isto porque, os Direitos Humanos são parâmetros fundamentais para a constituição do Estado de Direito - que não pode aceitar exclusão, desigualdade, pobreza, violência e opressão. Práticas estas, manifestas em suas mais diversas faces.

            Uma destas práticas, senhoras e senhores senadores, é a violência contra a mulher; um mal que, nos mostram estudos, afetam cerca de 70% das mulheres e meninas em todo o planeta. No mundo há um ainda não contabilizado número de mulheres, que todos os dias de suas vidas sofrem as mais terríveis formas de violência.

            No Brasil, nos últimos 30 anos, mais de 92 mil mulheres foram assassinadas pelos seus companheiros, revelando a face cruel de violação aos direitos humanos das mulheres.

            Meu Estado aparece no Mapa da Violência 2012, elaborado pelo Instituto Sangari/Ministério da Justiça, com uma taxa de homicídios da ordem de 5,0 assassinatos para grupo de 100 mil mulheres, portanto, acima da média nacional, que é de 4,6.

            A capital, Boa Vista, ocupa a 18ª posição no ranking das capitais mais violentas do País, em homicídios de mulheres, ostentando uma taxa de 5,6 assassinatos para grupo de 100 mil mulheres.

            Por oportuno, tenho a grata satisfação de informar aos senhores, sobre a visita que a CPMI de Combate à Violência contra a Mulher, realizou ontem, em Boa Vista, para investigar as condições de aplicação da Lei Maria da Penha.

            Representada pela senadora Ana Rita (PT/ES), a CMPI visitou a Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM), o Centro Humanitário de Apoio à Mulher (Chame) e o Ministério Público dos Direitos da Mulher, Juizado Especial, Defensoria Pública e a Casa Abrigo de Boa Vista.

            Acompanhadas de integrantes do movimento de mulheres da capital, de membros do Ministério Público e de juizados especiais, eu e a senadora Ana Rita, constatamos com tristeza que as mulheres estão totalmente desprovidas dos direitos básicos a que devem têm acesso todos os cidadãos do mundo, independentemente de raça, etnia, gênero, origem, religião, idade, situação civil, condição de saúde, ou qualquer outra forma de diferenciação.

            Foi triste testemunharmos que as mulheres vitimadas pela violência de gênero, enfrentam sérios problemas nos órgãos de atendimento. Faltam, conforme constatado, pessoal especializado, capacitação de funcionários, instalação de unidades no interior para atender às mulheres indígenas, inquéritos parados e muito sentimento de desamparo.

            A única delegacia especializada de atendimento à Mulher fica em Boa Vista e não tem plantão nem funciona aos finais de semana, período em que tradicionalmente acontecem as agressões. Nesta DEAM, que não tem telefone nem acesso a internet, constatou a CPMI, seis mil dos mais de oito mil inquéritos em tramitação, estão parados por falta de funcionários para darem o encaminhamento devido.

            Além da Capital, Roraima só conta com mais uma delegacia especializada, que é na cidade de Caracaraí, que não foi visitada, mas, certamente, deve ser, também desprovida de infraestrutura.

            No âmbito do Poder Judiciário, a situação também é difícil: há apenas um Juizado Especializado de atendimento à mulher vítima de violência no Estado e a falta de pessoal capacitado impossibilita o atendimento adequado.

            O Ministério Público e a Defensoria Pública também sofrem com a falta de profissionais. Os atendimentos às mulheres vítimas de violência são feitos por delegados não especializados e que atuam fora da unidade exclusiva para o atendimento às mulheres. Todo este estado de caos levou o Poder Judiciário a denunciar o caso ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

            Roraima tem uma realidade não muito diferente do que a CMPI vem verificando em outros Estados da federação no tocante à estruturação da rede de serviços especializados de proteção às vítimas de violência doméstica e sexual. Todavia, dá a impressão de que o caos instalado nos espaços de proteção à mulher é uma coisa institucionalizada. Ou seja, o Governo do Estado conhece a situação, mas nada faz para mudá-la. Estou convicta de que aquele Estado de coisas não pode perdurar, enquanto as mulheres morrem todos os dias.

            O Governo do Estado tem a obrigação política e administrativa de adotar medidas necessárias à efetiva proteção das vítimas de violência de gênero; desta feita, direcionando recursos para resolver essa situação o mais rapidamente possível.

            Por fim, no cenário nacional, como todos os demais administradores dos espaços públicos em nosso país, nós, senadores e senadoras, também temos a obrigação moral e política de fazermos valer o que diz o Artigo Segundo da Declaração Universal dos Direitos Humanos:

            “Toda pessoa tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração, sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição.”

            Encerro, portanto, este pronunciamento de registro do Dia Internacional dos Direitos Humanos, citando o Artigo Final, do “Estatuto do Homem”; um “Ato Institucional Permanente”, do poeta amazonense Thiago de Mello, datado de abril de 1964, quando ele estava exilado em Santiago do Chile.

            “Fica proibido o uso da palavra liberdade, a qual será suprimida dos dicionários e do pântano enganoso das bocas. A partir deste instante a liberdade será algo vivo e transparente como um fogo ou um rio, e a sua morada será sempre o coração do homem”.

            É o registro que faço hoje.

            Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/12/2012 - Página 68921