Discurso durante a 238ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão sobre a tragédia ocorrida no Estado de Connecticut, nos Estados Unidos.

Autor
Sergio Souza (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
Nome completo: Sergio de Souza
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Reflexão sobre a tragédia ocorrida no Estado de Connecticut, nos Estados Unidos.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 20/12/2012 - Página 74925
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, GRAVIDADE, VIOLENCIA, HOMICIDIO, ALUNO, ESCOLA PUBLICA, LOCAL, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), REFERENCIA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, BRASIL, DESARMAMENTO, REGISTRO, FREQUENCIA, CRIME, MOTIVO, ARMA DE FOGO, ENFASE, NECESSIDADE, DEBATE, ASSUNTO, AMPLIAÇÃO, OBSTACULO, ACESSO, COMERCIO, OBJETO.

            O SR. SÉRGIO SOUZA (Bloco/PMDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho à tribuna do Senado esta tarde refletir sobre o trágico massacre ocorrido no último dia 14, nos Estados Unidos da América, quando um jovem de apenas 20 anos matou a tiros 28 pessoas, incluindo ele próprio, e feriu outros tantos inocentes.

            Antes de tudo, gostaria de hipotecar minha integral solidariedade e respeito aos familiares de todas as vítimas, à população da cidade de Newtown, no Estado de Connecticut, onde a tragédia ocorreu, Sr. Presidente, e a todo o povo daquele Estado.

            O ocorrido na última sexta-feira deixa a todos nós perplexos. Afinal foram assassinadas 20 crianças entre 6 e 7 anos de idade, que simplesmente encontravam-se na escola, local onde supostamente estariam protegidas com a finalidade de serem educadas e preparadas para crescer e viver. Nada mais triste, nada mais absurdo: privar a vida tão breve daqueles cuja inocência é indiscutível, Sr. Presidente!

            Se não fosse pelo ato heróico de algumas professoras que perderam suas vidas defendendo seus alunos, os números da tragédia poderiam ser ainda piores.

            Enfim, Srªs e Srs., sem qualquer pretensão de tratar de assunto cuja decisão é responsabilidade exclusiva da sociedade norte-americana, gostaria de refletir sobre o desarmamento e a violência ligada a essa questão. E certamente não apenas nos Estados Unidos da América, mas também aqui no Brasil.

            A questão do desarmamento foi objeto de referendo no Brasil no ano de 2005. Em verdade, no ano de 2003 foi sancionado o Estatuto do Desarmamento, que já promoveu avanços importantes no controle das armas de fogo no País.

            Contudo, o art. 35 da Lei proibia a comercialização de arma de fogo e munição em todo o território nacional, porém seu §1º indicava que, para entrar em vigor, a proibição dependia de aprovação mediante referendo popular, a ser realizado em outubro de 2005.

            O resultado final da consulta pública e democrática foi de 59.109.265 votos rejeitando a proposta (63,94% dos votantes), enquanto 33.333.045 votaram pelo "sim", ou seja, pelo desarmamento.

            Porém, Srªs e Srs. Senadores, independentemente do que foi decidido em 2005 aqui no Brasil, ou do que reza a lei de cada país, tragédias como essa da cidade de Newtown, ou mesmo aquela que ocorreu em Realengo, no Rio de Janeiro, no ano passado, quando 11 crianças foram mortas, aconteceram exclusivamente pelo fato de que os assassinos possuíam armas de fogo.

            É evidente que cada caso tem suas particularidades, e talvez distúrbios ou problemas mentais nos autores dos crimes seriam o que há de mais comum entre os crimes, se não fosse pelo fato de que, em todas as ocorrências, pelo menos uma - ou, em alguns casos, mais de uma - arma de fogo foi responsável pelas mortes.

            Os casos de tiroteios com inúmeras vítimas têm sido os mais frequentes nos Estados Unidos da América, mas, repito, também têm ocorrido aqui no Brasil, ou na Europa, como foi a tragédia da Noruega, quando 77 pessoas foram assassinadas por tiros, ou mesmo em outras partes do Planeta.

            Entretanto, chama a atenção o fato de que no país em que possivelmente há o maior número de armas de fogo nas mãos da população comum, os fatos se repitam com maior frequência. Pior, muitas das tragédias têm ocorrido em escolas ou em locais de trabalho.

            Recapitulamos: em 20 de abril de 1999, em Littleton, no Colorado, quando dois estudantes do ensino médio abrem fogo no colégio Columbine. Doze estudantes e um professor são mortos. Os dois jovens assassinos cometeram suicídio na sequência; em 29 de julho de 1999, depois de matar a esposa e os dois filhos, um especulador da bolsa, de 44 anos, abre fogo em duas firmas de corretagem em Atlanta, na Geórgia, matando nove pessoas, e depois também comete suicídio; em 21 de março de 2005, em Red Lake, no Minnesota, um adolescente de 16 anos mata, em sua escola, 9 pessoas, entre elas, 5 estudantes de ensino médio, e depois comete suicídio; em 16 de abril de 2007, um aluno de 23 anos de origem coreana mata 32 pessoas antes de se suicidar na Universidade da Virgínia, no Estado da Virgínia - o massacre é o pior da história dos Estados Unidos da América em tempos de paz -; em 20 de janeiro de 2010, um homem mata oito pessoas durante um tiroteio na Virgínia e se rende após a cassada humana da qual participaram 150 policiais; em 3 de agosto de 2010, um homem que tinha problemas com seus empregadores mata 8 colegas em uma empresa de distribuição de cerveja em Connecticut, no nordeste, antes de se suicidar; em 20 de julho de 2012, 12 pessoas foram mortas e 50 ficaram feridas em um tiroteio num cinema que exibia o terceiro episódio da série Batman, em Aurora, Denver, no Colorado.

            Entre outros, casos igualmente trágicos. Contudo, em todos eles as armas de fogo foram a causa das mortes de inocentes, promovidas por pessoas claramente perturbadas, que acabaram por se suicidar ao final dos episódios.

            Srªs. e Srs. Senadores, tenho consciência das principais justificativas que levaram a maioria dos brasileiros a votarem contra a proibição da comercialização de armas no Brasil em 2005, e que em outros países também mantém a venda de armas acessível ao cidadão comum, sendo o principal deles o direito de se defender.

            Porém, penso que, diante da repetição de tantas tragédias, sem falar naqueles que permanecem anônimos, pois se tratam de crimes passionais ou domésticos, mas também envolvem armas de fogo, é preciso refletir. Talvez considerar o fato de que a inexistência de armas representa a ausência de tiros e, assim, maiores chances de redução de mortes por disparos.

            O direito de defender-se e a preocupação com o fato de que os bandidos estarão armados são legítimos, mas também é legítimo indagar se possuir uma arma sem ser bandido ou defender a manutenção da comercialização tem realmente protegido o cidadão de bem; ou, ao contrário, tem aumentado sua insegurança.

            Não tenho resposta imediata para tais questões, mas convido a todos para esta reflexão.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Sérgio, agradeço se puder obter um aparte.

            O SR. SÉRGIO SOUZA (Bloco/PMDB - PR) - Por favor, Senador Suplicy, concedo-lhe, com muita honra, um aparte.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Prezado Senador, quero cumprimentá-lo por sua reflexão a respeito da tragédia ocorrida nos Estados Unidos, em Connecticut, onde um jovem resolveu matar a sua própria mãe e um número tão grande de pessoas, acho que um total de 28, a maior parte das quais crianças entre 6 e 10 anos. Não fosse a presteza e a iniciativa de algumas professoras, uma das quais inclusive protegeu da morte uma criança brasileira... Mas é importante a reflexão de V. Exª. Também me solidarizo com o povo norte-americano e com as famílias que sofreram. V. Exª assinala inúmeras outras ocorrências em que pessoas, nos Estados Unidos da América, nestes últimos anos, resolveram atirar em pessoas inocentes, às vezes dentro de um cinema ou num ambiente escolar, numa escola privada ou numa universidade. Isso é uma verdadeira tragédia! Mas acho importante a reflexão que V. Exª faz no sentido de que se possam evitar essas tragédias e pensar em quais os instrumentos utilizar, dentre os quais, por exemplo, a não comercialização fácil de armas. O próprio Presidente Barack Obama e a Associação dos Produtores de Rifles nos Estados Unidos, desta vez, ficaram tão impressionados que estão dispostos a dialogar melhor a respeito da regulamentação da venda de armas. Mas acho que, aqui no Brasil, nós não devemos facilitar a venda de armas entre as pessoas porque, normalmente, ela acaba resultando em mortes como as que efetuadas nesta tragédia. Meus cumprimentos a V. Exª.

            O SR. SÉRGIO SOUZA (Bloco/PMDB - PR) - Obrigado, Senador Suplicy.

            Eu chamo V. Exª, assim como todos os meus Pares e a sociedade brasileira a uma reflexão: será que dificultar mais ainda o acesso às armas de fogo não representa redução das mortes por disparo?

            Que fique muito claro, Sr. Presidente, que a violência no Brasil é muito diferente do que ocorre nos Estados Unidos da América e merece muito mais atenção. Não poderia negar tal fato, pois, segundo números recolhidos por um relatório do Escritório da ONU contra Drogas e Crimes, em 2007, o Brasil possuía 15 milhões de arma de fogo contra 270 milhões dos EUA. E mesmo com tamanha diferença, em 2010, 3,7 vezes mais pessoas morreram de tiro no Brasil do que nos EUA.

(Interrupção do som.)

            O SR. SÉRGIO SOUZA (Bloco/PMDB - PR) - Para concluir, Sr. Presidente.

(Soa a campainha.)

            O SR. SÉRGIO SOUZA (Bloco/PMDB - PR) - Foram 36 mil brasileiros contra 9.960 vítimas fatais de tiros norte-americanas.

            Enquanto nos EUA a taxa de óbitos por arma de fogo é de 3,2 a cada 100 mil habitantes, no mesmo ano, em 2010, os brasileiros contavam 19,3 mortes por 100 mil habitantes. Ou seja, me parece claro que estamos diante de realidades diferentes de violência e mesmo de número de vítimas de armas de fogo e que a situação dos EUA é muito mais tranquila.

            Aliás, me parece evidente que os números da violência no Brasil decorrem de armas não registradas e/ou contrabandeadas.

            Mas, ainda assim, mantenho a dúvida, para qualquer povo no Planeta, se para o conjunto da sociedade o melhor não seria retirar definitivamente as armas de fogo do nosso convívio.

(Interrupção do som.)

            O SR. PRESIDENTE (Anibal Diniz. Bloco/PT - AC) - Para concluir, Senador Sérgio Souza..

            O SR. SÉRGIO SOUZA (Bloco/PMDB - PR) - Sei que, de qualquer maneira, uma decisão como esta requer um debate mais aprofundado e ainda uma transição para o modelo ideal.

            Entretanto, diante de fatos tão lamentáveis como as tragédias, sem motivo, que temos presenciado, aqui no Brasil e em outros países, indago se não é hora de iniciarmos esta discussão, a discussão do desarmamento no Brasil e no mundo dos cidadãos.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigado pela tolerância do tempo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/12/2012 - Página 74925