Discurso durante a Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações acerca da tragédia ocorrida na Boate Kiss, em 27 de janeiro último, na cidade de Santa Maria–RS.

Autor
Jorge Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Jorge Ney Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Considerações acerca da tragédia ocorrida na Boate Kiss, em 27 de janeiro último, na cidade de Santa Maria–RS.
Publicação
Publicação no DSF de 07/02/2013 - Página 1737
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, FATO, INCENDIO, LOCAL, CASA NOTURNA, MUNICIPIO, SANTA MARIA (RS), ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), MANIFESTAÇÃO, PESAMES, FAMILIA, ADOLESCENTE, VITIMA, MORTE, ELOGIO, ATUAÇÃO, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, MOTIVO, DETERMINAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, AUXILIO, RESOLUÇÃO, CALAMIDADE PUBLICA, APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, AUTORIA, ORADOR, DESTINATARIO, MESA DIRETORA, SENADO, OBJETIVO, SOLICITAÇÃO, ORGÃO PUBLICO, ADOÇÃO, PROVIDENCIA, AUMENTO, SEGURANÇA, COMBATE, ACIDENTES.

            O SR. JORGE VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Srªs e Srs. Senadores, eu, como tinha falado ontem -- por uma coincidência, V. Exª preside a sessão e eu tive o privilégio de passar a direção desta sessão para uma Senadora que é do Rio Grande do Sul, que já fez um pronunciamento aqui sobre o tema que trago aqui para a Casa --, penso que nós seguimos sofrendo com a tragédia porque praticamente todos os dias uma nova vítima fatal se soma às centenas de mortos no lamentável episódio do incêndio na boate Kiss, em Santa Maria.

            Eu trago alguns números. Essa tragédia que abalou as famílias de Santa Maria, do Rio Grande do Sul e do Brasil inteiro, que repercutiu da maneira como repercutiu no mundo, ela se segue a outras tragédias que aconteceram no Brasil e mundo afora. Vou citar algumas: um incêndio no circo em Niterói, em 61, com 500 mortos; o incêndio do edifício Joelma, com 180 mortos, em 1974; em 84, em Cubatão, na favela, 93 mortos; em Porto Alegre, lojas Renner, 41 mortos em 76; no edifício Grande Avenida em São Paulo, em 81, 17 mortos; o edifício Andraus -- logo no começo dos anos 70. Em 72, 16 mortos; e também uma casa de shows em Belo Horizonte, Canecão, 7 mortos e 300 feridos.

            Quando a gente busca mundo afora tragédias em casas de show, nós temos: na Argentina, em 2004, 194 mortos em um incêndio em uma discoteca; na Venezuela, em 2002, 50 mortos em uma casa de show, em um incêndio; no Peru, mais 50 mortos em uma discoteca chamada Utopia; no México, 20 mortos; na China, em 2000, 300 mortos em uma casa de espetáculos; nos Estados Unidos, em 2003, 96 mortos.

            E agora, em Santa Maria, 238 mortos, jovens, cheios de vida; famílias perderam os únicos filhos que tinham. Um foi para cuidar do outro, e ambos perderam a vida. O incêndio de Santa Maria, que ocorreu no último dia 27 na boate Kiss, é uma soma de lamentáveis erros e equívocos. O vocalista segurou um artefato pirotécnico e iniciou o incêndio. Era comum a utilização -- e é comum --, nas casas de espetáculos, o uso de fogos de artifício, de fumaça, de fogo. A banda comprou um sinalizador proibido. O extintor de incêndio não funcionou. Havia mais público do que a capacidade do estabelecimento. A boate tinha apenas um acesso à rua. O alvará fornecido, que passa pelos bombeiros, estava vencido. Cento e oitenta mortos foram encontrados próximos aos banheiros; 90% das vítimas foram envenenadas por gases tóxicos, não foram queimadas. Equipamentos de gravação estavam no conserto.

            Essa tragédia mexeu com todos nós e cada país desses que eu citei, que viveu uma tragédia, tomou algumas atitudes, Senadora e Presidenta Ana Amélia. Eu vi V. Exa ontem propondo uma comissão especial. Nós não temos regramento nem legislação nacional sobre esse tipo de evento. A defesa civil -- eu trabalhei na Comissão de Defesa Civil -- não trata especificamente desse tipo de evento. Ele é caracteristicamente levado para os Municípios, para as prefeituras, que obviamente, amparadas em parecer do Corpo de Bombeiros, dão ou não a licença.

            O pronunciamento que eu quero fazer aqui na Casa traz alguns encaminhamentos, porque nós temos que tomar uma atitude. É óbvio que nós precisamos seguir sendo, como todos foram, solidários. O abraço, o carinho, o apoio às famílias, inclusive psicológico, são fundamentais -- e me parece que as autoridades do Rio Grande do Sul, inclusive o próprio Ministério da Saúde, estão fazendo --, mas que atitude nós vamos tomar diante de um episódio como esse? O que vamos fazer para que outro evento como esse não aconteça?

            Quando também lamentavelmente ocorre um desastre aéreo, não há como se fazer o reparo do dano, mas, nessa atividade em que ninguém pode garantir a segurança do voo, pode-se garantir cuidados com a segurança apesar de o voo depender de outras variáveis. Quando acontece um acidente, não se sai partindo só para ver quem é o culpado, mas como se pode fazer para que outro evento como esse não se repita. E foi assim que a aviação evolui, deu-se mais segurança, mudou-se o material dentro dos aviões, estabeleceu-se mais segurança de voo. Evitar outros desastres não evita, mas certamente pode diminuir o seu número.

            Eu queria aqui fazer um reparo e sei que as famílias que foram acolhidas têm, inclusive nos jornais, reconhecido o empenho da Presidenta Dilma. Ela largou uma reunião no Chile imediatamente e falou: “Não tenho nada para fazer nessa reunião, é lá junto com as famílias do Rio Grande, de Santa Maria, que eu tenho que estar”. V. Exª também esteve lá. O apoio pessoal da Presidenta Dilma merece constar nos Anais do Senado, porque foi uma atitude de mãe, de avó, de mulher, que tem a sensibilidade e sabe o que é a dor de uma mãe que certamente, quando o filho sai para um show, para uma casa de espetáculo, para uma boate -- eu tenho duas filhas --, fica ligando a noite inteira, marcando horário para ligar para saber o horário que vai chegar e ver como o filho chegou em casa. Duzentas e trinta e oito mães, naquela noite, não puderam receber de volta seus filhos.

            A Presidenta Dilma foi lá e tomou atitude, pôs todo o aparato do Governo Federal para ajudar: o Brigadeiro Saito, Comandante da Aeronáutica; o Ministro da Defesa, Celso Amorim, merece os elogios; todo o corpo técnico de funcionários transportando pacientes nos aviões;

            O Ministro Padilha deu um recado fundamental, pela falta de conhecimento que nós temos, sobre como fazer na hora de um incêndio. Correr para o banheiro, onde não queima. Pior lugar! Nunca a sociedade foi orientada, os jovens não são orientados. Como fazer na hora de um incêndio num cinema, em algum lugar? Correr para o banheiro é o pior lugar porque o que mata é o gás, a fumaça. O Ministro Padilha disse: não fiquem em casa, quem estava lá e já foi para casa; vá para o hospital. E salvou muitas vidas com isso. Nosso Ministro Padilha.

            Queria então dizer que a Presidenta Dilma tomou atitudes e medidas, que não podem trazer vidas de volta, mas certamente salvaram muitas quando criou um aparato de transporte para os centros mais especializados.

            Hoje, o Prefeito de Rio Branco recebeu um ofício do Corpo de Bombeiros, amparado, este ofício, numa deliberação, numa provocação do Ministério Público do Estado pedindo o fechamento de 10 casas de espetáculo em Rio Branco. O Prefeito certamente vai adotar as medidas.

            Mas estou vindo aqui, Srª Presidenta -- e agradeço --, trazendo quatro ofícios, um deles para o Procon. Estou fazendo um requerimento à Mesa que encaminha ofício ao Procon, para que adote uma medida imediata. Em boa parte das casas de shows, dos clubes noturnos, das boates no Brasil, há uma coisa chamada comanda. Essa palavrinha mágica, às vezes, ajuda a matar também. Estou encaminhando à Mesa um requerimento pedindo que se providenciem junto ao Procon medidas imediatas para que a gente não tenha mais a juventude refém dessa história da cobrança das comandas. É um papelzinho que se recebe que põe todo mundo em confinamento. Você vai consumindo e paga ao final, numa fila, mostrando sua carteira de identidade. Isso aconteceu lá na boate. A primeira atitude dos seguranças foi “tranca a porta porque ninguém pagou”. O Procon pode ajudar a resolver.

            Por que não fazer como em qualquer parte do mundo? Consumiu, paga na hora; consumiu, paga na hora. Se acontece algum evento, todos podem sair. Essa é uma atitude que o Procon pode tomar agora.

            Estou encaminhando para a Mesa outro requerimento, pedindo aos ministérios públicos, todos eles, dos Estados, Srª Presidenta -- vou encaminhar --, que tomem uma providência. A grande maioria, a quase totalidade das ações tomadas pelos ministérios públicos Brasil afora -- elogiáveis -- não é de ações pela parte da segurança contra incêndio, é de ações contra ruídos. O som nas boates perturba o vizinho, o vizinho recorre ao Ministério Público, e sabe qual é a atitude do dono da boate? Aumentar a largura da parede, forrar a parede com materiais combustíveis. O cuidado é com aquilo que está prejudicando o vizinho, e não com a segurança.

            E nós temos que mudar. Os procedimentos têm que ser de segurança. Não pode haver uma casa noturna com uma única porta de entrada e saída.

            São atitudes que podem ser tomadas já.

            Mais de 90% dos processos que estão tramitando por alvarás -- falo como ex-prefeito e como ex-governador -- estão vinculados à perturbação por ruído, que não tem nada a ver com segurança. E nós temos que mudar isso.

            Estou encaminhando outro requerimento à Defesa Civil nacional. Que ela, imediatamente, peça uma revisão, nos 5.500 Municípios, dos alvarás de funcionamento das casas de espetáculo que tenham grande aglomeração de público. Isso dá para fazer. É reunir técnicos.

            E, por último, Srª Presidenta, para concluir, também estou encaminhando ao Confea/CREA -- eu sou engenheiro, filiado ao Confea/CREA -- pedido aos colegas desse sistema para que se reúnam nesse momento e deem uma contribuição. O Confea/CREA está instalado em todos os Estados; pode elaborar técnicas de procedimentos a serem adotados, de amparo aos alvarás das prefeituras, que não têm, às vezes, nenhum engenheiro. E é uma atitude concreta que o Sistema Confea/CREA pode adotar.

            Então eu agradeço o tempo, Srª Presidenta, mas queria aqui trazer a solidariedade para as famílias, trazer aqui o reconhecimento do papel do Governo da Presidenta Dilma, e tomar algumas atitudes como ex-prefeito, como engenheiro, como Senador e também como pai de família, para que possamos fazer o possível e o impossível para evitar que tragédias como essa se repitam.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/02/2013 - Página 1737