Discurso durante a 15ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Alerta para a crise financeira por que passam as Santas Casas de Misericórdia e os hospitais filantrópicos em todo o País.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Alerta para a crise financeira por que passam as Santas Casas de Misericórdia e os hospitais filantrópicos em todo o País.
Aparteantes
Vital do Rêgo.
Publicação
Publicação no DSF de 26/02/2013 - Página 5658
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, ZERO HORA, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ASSUNTO, DIVIDA, SANTA CASA DE MISERICORDIA, MOTIVO, VALOR, PAGAMENTO, SISTEMA UNICO DE SAUDE (SUS), NECESSIDADE, VOTAÇÃO, EMENDA CONSTITUCIONAL, REFERENCIA, LIBERAÇÃO, RECURSOS.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Caro Presidente desta sessão, Senador Paulo Paim, Srªs e Srs. Senadores, nossos telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, tenho a convicção, Senador Paulo Paim, de que, como eu, todos os Senadores aqui presentes endossam as preocupações de milhares de brasileiros e brasileiras que aguardam, às vezes de madrugada, nas filas de hospitais para serem atendidos, enfrentando as dificuldades que nós conhecemos muito bem, porque a televisão, o rádio e os jornais mostram diariamente esse drama.

            Por outro lado, nós também precisamos olhar a situação em que se encontram os hospitais, especialmente as Santas Casas de Misericórdia e os hospitais filantrópicos, que exercem um papel extremamente relevante na preservação da saúde, no atendimento médico-hospitalar de milhões de brasileiros. Essas instituições estão encolhendo, ou até fechando as portas, por falta de recursos e, sobretudo, lentidão nos repasses do Governo Federal - recursos da sociedade repassados para uma área essencial, eu diria, prioritária.

            O descaso com essas importantes instituições de saúde está causando longas filas de espera para atendimento, serviços de emergência lotados e desassistência à população.

            Falo isso em relação ao País, mas, agora, como Senadora do Rio Grande, falo do meu Estado, o Rio Grande do Sul, e de outros Estados onde as Santas Casas estão presentes.

            Aliás, aproveito para saudar os visitantes, que também devem ter conhecimento de que, como me refiro agora, nos seus respectivos Municípios, nas suas cidades, as Santas Casas e os hospitais filantrópicos merecem um apoio maior para melhorar o atendimento à população.

            Na última sexta-feira, inclusive, Senador Paulo Paim, o Líder do PSDB, Senador Aloysio Nunes Ferreira, de São Paulo, mencionou a defasagem no valor dos procedimentos pagos pelo Sistema Único de Saúde como um dos principais fatores da crise financeira por que passam os hospitais filantrópicos de todo o País e, em particular, as Santas Casas.

            Essas instituições calculam que a dívida das Santas Casas esteja próxima de R$12 bilhões. Esse descontrole das contas, prejudicial ao bom atendimento do serviço de saúde, ocorre porque 57% da assistência ao Sistema Único de Saúde no País é feita pelos hospitais filantrópicos.

            Só no meu Estado, o Rio Grande do Sul, os nossos 245 hospitais filantrópicos são responsáveis por 72% da assistência ao Sistema Único de Saúde (SUS). A dívida, lá no Rio Grande, é superior a R$1,2 bilhão.

            Este assunto preocupa não apenas os Estados da Região Sul, mas de todas as regiões do País. Hoje, as contas das Santas Casas são tema de um relevante debate na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo. Mais de 300 representantes de hospitais filantrópicos promovem um encontro nacional, na capital paulista, para buscar soluções junto ao Poder Público que minimizem as perdas financeiras e o custeio do sistema de saúde.

            Aliás, o Presidente da Federação das Santas Casas do nosso Estado, Senador Paim, Dr. Julio Dornelles de Matos, que o senhor bem conhece, será um dos presentes nesse encontro de São Paulo; e, amanhã, ele estará aqui, em Brasília, participando, às 17h, no Plenário 10 do Anexo II da Câmara Federal, do debate, com representantes de outras entidades e o Deputado Antonio Brito, do PTB da Bahia, Presidente da Frente Parlamentar das Santas Casas, sobre a crise financeira das instituições de saúde.

            Outros parlamentares estão vinculados a esse tema, especialmente o Deputado Darcísio Perondi, do PMDB do Rio Grande do Sul. Nós aqui, no Senado, nos associamos e estaremos juntos nesse debate para encontrar uma solução adequada e rápida para resolver essa grave crise financeira das Santas Casas e das instituições filantrópicas.

            Entre as propostas em estudo estão o refinanciamento de parte das dívidas das Santas Casas pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Aliás, eu já falei sobre esse tema com o próprio Presidente Luciano Coutinho. quando em depoimento perante a Comissão de Assuntos Econômicos, no ano passado, oportunidade em que ele me disse que o BNDES estava avaliando os processos relacionados às Santas Casas, especialmente a do Rio Grande do Sul. Só que esse problema não foi resolvido até agora.

            O setor também quer um reajuste de 100% na tabela do Sistema Único de Saúde para a assistência de média e baixa complexidade, consideradas as mais importantes e urgentes para as populações que, infelizmente, não podem ter acesso ao sistema privado de saúde.

            É preciso, portanto, pensar soluções e agir com rapidez, sob pena de estabelecer uma verdadeira situação caótica no sistema.

            O Ministério da Saúde e a Casa Civil precisam se envolver com esse problema para evitar, Senador Vital do Rêgo, um colapso no Sistema Único de Saúde, muito dependente do trabalho dessas entidades filantrópicas.

            Dirijo-me ao Senador Vital do Rêgo pela importância que S. Exª terá na posição de comando da Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania e por ser médico e conhecedor do assunto a que me refiro.

            Os atendimentos de média e baixa complexidade são os maiores prejudicados pela falta de repasse federal do Orçamento da União para esses hospitais. Na Paraíba não deve ser diferente do Rio Grande do Sul.

            Com muita alegria, concedo um aparte ao Senador Vital do Rêgo.

            O Sr. Vital do Rêgo (Bloco/PMDB - PB) - Senadora Ana Amélia, gostaria de me incorporar ao pronunciamento de V. Exª pela firmeza de suas convicções ao tratar de um assunto da mais alta relevância para a saúde pública brasileira, principalmente quando versa sobre as Santas Casas, que têm uma história de inestimáveis serviços prestado ao País. V. Exª sabe muito bem o quanto a Santa Casa do seu Estado ou os hospitais filantrópicos do meu Estado representaram ao longo da implantação do SUS: a consolidação desse projeto de universalização da saúde. Foi por intermédio da ação dos hospitais públicos e dos hospitais filantrópicos que nós conseguimos hoje ter um sistema que funciona no papel e aos olhos da lei, mas com problemas seriíssimos de manutenção e de sobrevivência. Estes são alguns: a manutenção das Santas Casas, o custo da tabela SUS e a reciprocidade do Governo. E aí nós temos de remontar ainda o entulho, no Congresso Nacional, da Emenda nº 29. Tudo isso faz com que o exemplo do Rio Grande seja o que se está vivendo na Paraíba. Recebi, na semana passada, companheiros da Fundação Assistencial da Paraíba (FAP), que é quase uma Santa Casa na minha cidade Campina Grande, e falei, agora há pouco, com membros do Hospital Napoleão Laureano. Esses dois hospitais, que representam o coração do sistema de tratamento oncológico na Paraíba, estão em regime semifalimentar por força da falta de condições de sobrevivência. Eu queria me incorporar vivamente ao pronunciamento e à preocupação de V. Exª. Eu tenho absoluta convicção de que o Ministro Padilha é um homem de profunda sensibilidade nessa área. Ele vem tocando, com todas as dificuldades, o Ministério da Saúde, com sua grandeza e complexidade. E, nessa área, nós precisamos aqui, no Congresso Nacional, avançar com o sistema de custeio para que ele possa ter receitas para aplicar em situações como essas das Santas Casas.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Muito obrigada, Senador Vital do Rêgo. O senhor mencionou dois importantes hospitais de sua Campina Grande, lá na Paraíba. E isso deve apenas ser o reflexo de uma realidade que nos preocupa enormemente, porque temos de ajudar, politicamente, a sensibilizar o Governo. Eu concordo com V. Exª quando diz que o Ministro Alexandre Padilha terá sensibilidade para a correção dessa tabela.

            Além do mais, temos de lembrar também que o endividamento dos Municípios, intensificado, principalmente no ano passado, com a queda dos repasses do FPM - Fundo de Participação dos Municípios e dos chamados Restos a Pagar, aumentou a crise financeira dessas instituições, uma vez que o Município compra esses atendimentos ou essas consultas dos hospitais. Como eles não têm receita, cortaram esse repasse, o que agravou ainda mais a situação financeira dessas instituições, as Santas Casas e também os hospitais filantrópicos.

            Muitos Municípios são fonte de renda importante para a manutenção do sistema de saúde das Santas Casas e das instituições filantrópicas. Com recursos reduzidos, muitos pacientes que dependem dos hospitais filantrópicos para atendimentos básicos de saúde poderão ter limitações nesses serviços de clínica geral, cirurgia geral, pediatria e ginecologia e obstetrícia.

            Aliás, Paulo Brossard, ex-Ministro, aposentado, do Supremo Tribunal Federal e ex-Ministro da Justiça, do seu partido, o PMDB, ex-Senador, brilhante aqui nesta Casa, aborda, num artigo publicado hoje, no jornal Zero Hora, as causas do endividamento das Santas Casas.

            Escreveu o ex-Senador Paulo Brossard que, em 2004, os hospitais públicos respondiam por pouco mais de 41% das internações pelo SUS, enquanto os hospitais privados sem fins lucrativos, instituições filantrópicas e Santas Casas respondiam por quase 40% de tais atendimentos. As entidades privadas com fins lucrativos ficavam com 18,7%. Em 2011, essas instituições particulares diminuíram sua participação para 10,2% do total das internações. Hoje, as Santas Casas e os hospitais filantrópicos cobrem 44% das internações, enquanto os hospitais públicos, 45%.

            Como bem apontou o ex-Ministro Paulo Brossard, os progressos da Medicina, a partir de metade do século passado, foram extraordinários. O número de especialidades profissionais médicas se multiplicou, mas o instrumental correspondente aos progressos científicos precisa acompanhá-los e deve envolver constantes investimentos. Aí é que está o problema.

            A previsão dos especialistas é de que o endividamento das Santas Casas poderá passar de R$17 bilhões, neste ano, enquanto a remuneração dos hospitais não passa de 65% das despesas. É, portanto, uma conta que nunca fecha e que, no médio prazo, tem impactos catastróficos no atendimento de saúde. Significa que as chances de sobrevivência dos hospitais beneficentes e das Santas Casas estão, a cada ano, menores.

            É preciso foco da Administração Pública, nessa questão, para que as atividades de saúde das Santas Casas não sejam paralisadas. A liberação de recursos das emendas parlamentares também precisa ocorrer rapidamente.

            No ano passado, o Gabinete Civil da Presidência da República não autorizou o Ministério da Saúde a abrir o Sistema de Convênios, o Siconv, para o recebimento de propostas de Bancada federal do meu Estado e dos outros Estados, certamente.

            Por isso, mais de R$18,5 milhões da Bancada gaúcha não puderam chegar à Santa Casa e aos hospitais filantrópicos. Sem cadastro de projeto, não há como receber recursos. Os hospitais ficam sem condições de oferecer atendimento à demanda cada vez mais crescente.

            O reajuste da tabela do Sistema Único de Saúde precisa ser uma prioridade do Ministério. Apresentei requerimento para que essa questão seja tratada na Comissão de Assuntos Sociais (CAS). Isso já foi aprovado no ano passado, no caso, não só para avaliar o impacto da falta de reajuste da tabela do SUS nos hospitais filantrópicos, mas também, e especialmente, a situação crítica dos laboratórios de análises clínicas, que, como os hospitais filantrópicos, estão sem o reajuste da tabela do SUS.

            Desde 1994 - vou repetir: 1994 -, os preços dos serviços de análises clínicas não são reajustados, com exceção dos procedimentos hormonais. Só esses. Significa dizer que a defasagem na tabela do SUS gera dificuldades aos hospitais que oferecem atendimento pelo Sistema Único de Saúde.

            Biomédicos, bioquímicos e médicos patologistas pagam para realizar exames com as exigências impostas ao padrão de qualidade dos serviços. Isso também é, sob o ponto de vista econômico, um grave risco de desnacionalização desses serviços, já que, descapitalizados, atraem grupos multinacionais para a compra do seu controle.

            Lamento que governos e ministros da saúde das últimas duas décadas não tenham tomado providências para evitar a persistência dessa defasagem.

            Os hospitais que atendem ao SUS, em especial, os filantrópicos, vivem na penúria e miséria, vilipendiados pelas diárias irrisórias que recebem nas internações e pelos valores pagos pelos procedimentos e cirurgias. Também, em relação a isso, as consultas médicas.

            Por isso, precisamos avançar. Serão convidados para participar da audiência pública os presidentes da Confederação Nacional de Saúde, José Carlos de Souza Abrahão; da Sociedade Brasileira de Análises Clínicas, Irineu Keiserman Grinberg; do Conselho Federal de Farmácia, Walter da Silva Jorge João; da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica, Paulo Azevedo; da Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas, José Reinaldo Nogueira de Oliveira; e também o representante do Conselho Federal de Biomedicina, Marcelo Abissamra. A data da reunião ainda será definida.

            Espero que o nosso Presidente, que vai assumir o comando da Comissão de Assuntos Econômicos, Senador Lindbergh Farias, do PT do Rio de Janeiro, amanhã, na instalação dos trabalhos da CAE, ajude no agendamento dessa audiência pública.

            Estou indo para a conclusão, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores.

            No dia 18 de fevereiro, o editorial do jornal O Estado de S. Paulo mostrou como é grave a situação das contas envolvendo o Sistema Único de Saúde em nosso País. Trata-se de um problema antigo, de causas perfeitamente diagnosticadas, que se agrava a cada dia, mas para o qual as autoridades responsáveis - em boa parte, por comodismo - não deram e continuam a não dar a atenção que merece. O preço que o País terá de pagar, caso os problemas se agravem, certamente será maior que o custo de uma solução racional, que ainda é possível adotar, como o reajuste das tabelas do SUS.

            No dia 10 de fevereiro, outro jornal, O Globo, mostrou que, por causa da falta de recursos e do Poder Público, os hospitais têm adiado cirurgias, enfrentando ameaças de greve e falta de materiais.

            É importante lembrar que as Santas Casas são essenciais para o bom funcionamento do SUS em muitas comunidades - elas e os hospitais filantrópicos, em sua maoria. De mais de 2 mil estabelecimentos hospitalares sem fins lucrativos, 56% estão em cidades com até 30 mil habitantes e são o único hospital em quase mil cidades.

            No caso da Santa Casa do Rio Grande do Sul, temos áreas de excelência na área médica, como o transplante de pulmão no Hospital São Francisco, que integra a Rede da Santa Casa comandado pelo Dr. José Camargo; e a área da cardiologia, com o Dr. Fernando Lucchese. Homenageio esses dois médicos homenageando todos os médicos que atendem na Santa Casa, os servidores, a direção da Santa Casa, dizendo aqui que os Senadores, não só os Senadores do Rio Grande do Sul - Senador Pedro Simon, Senador Paulo Paim e eu - estaremos unidos para ajudar a convencer o Ministro Alexandre Padilha e o Governo do reajuste das tabelas do SUS e da liberação dos recursos aprovados no Orçamento.

            Portanto, o reajuste imediato da tabela de pagamento do SUS para cerca de cem procedimentos é o caminho mais acertado para evitar um quadro crítico da saúde pública brasileira. Acho que a população vai agradecer.

            Muito obrigada, Sr. Presidente.

 

DOCUMENTO A QUE SE REFERE A SRª SENADORA ANA AMÉLIA EM SEU PRONUNCIAMENTO

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e §2º, do Regimento Interno.)

Matéria referida:

- Artigo do ex-Ministro Paulo Brossard: “O endividamento das Santas Casas”


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/02/2013 - Página 5658