Discurso durante a 18ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à política econômica de curto prazo adotada pelo Governo Federal.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Críticas à política econômica de curto prazo adotada pelo Governo Federal.
Publicação
Publicação no DSF de 01/03/2013 - Página 6563
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, RELAÇÃO, ECONOMIA NACIONAL, MOTIVO, AUSENCIA, DESENVOLVIMENTO, PROGRAMA DE GOVERNO, LONGO PRAZO, RESULTADO, AFASTAMENTO, INVESTIMENTO, ORIGEM, PAIS ESTRANGEIRO.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srs. Senadores, Srªs Senadoras; Srª Presidente, Senadora Ana Amélia, quero manifestar, inicialmente, minha satisfação de falar sob a sua presidência, porque falo de um tema que lhe interessa muito, que é como anda a economia brasileira.

            Nós estamos acompanhando pelos jornais que o Presidente do Banco Central, o Ministro da Fazenda, o Presidente do BNDES ou os enviados por eles estão rodando o mundo em busca de investimentos estrangeiros no País.

            Só podemos apoiar, parabenizar, ainda que lamentando um pouco que tenham demorado a fazer isso. Mas a satisfação de vê-los fazendo isso não é maior de que a preocupação dos resultados que terão.

            Quando lemos, Senadora Ana Amélia, a mídia internacional financeira e econômica - revistas, jornais - ou quando conversamos, pois, afinal de contas, nós Senadores temos contatos internacionais - eu, particularmente, pelos seis anos em que trabalhei em um banco internacional -, sentimos uma desconfiança muito grande em relação à economia brasileira nos tempos de hoje.

            Há quase dois anos, falei aqui e publiquei um documento, que está à disposição de todos no site que tenho no Senado: A economia está bem, mas não vai bem. E aí listava 15 pontos que ameaçavam a economia em algum momento do futuro. E poderiam ser dois, cinco, dez, mas aconteceriam. Como aconteceu na Espanha, que, não faz muito, vivia comprando terras e praias inteiras no Brasil. Como aconteceu com Portugal, que investia no Brasil. Como aconteceu com a Grécia, que era uma economia dinâmica. Como aconteceu com a Argentina há algum tempo. Aliás, por coincidência, vou citando esses países e vou vendo: Grécia, Argentina, Espanha, países em que houve olimpíadas. Deve ser uma coincidência. O fato é que esses países tiveram a sua ascensão e a sua queda certamente por falta de os governos levarem em conta os alertas e as críticas que eram feitas no sentido de que estavam caminhando sobre um solo frágil.

            Um dia, Senadora Ana Amélia, acho que a Presidenta Dilma vai ter que lamentar muito não ter escutado críticas, não ter escutado alertas. Porque nada destrói mais um governo do que a combinação da arrogância com a bajulação e a autobajulação, ou seja, quando você passa a acreditar que as coisas estão tão bem que não procura corrigir o andamento. Isso é um sinal claro de desastre mais adiante.

            Lamento que a Presidenta não chame para conversar os economistas que são críticos, até para ela mostrar que está tudo muito bem. Lamento que ela não ouça a oposição. Lamento que ela não ouça pessoas da Base de Apoio que têm feito críticas - eu sou um deles - como alertas. Não se ouve.

            Aquele documento que eu fiz, estou reescrevendo. E o título não vai ser mais “A economia está bem, mas não vai bem”. O título vai ser “A economia já não está bem e poderá ir pior”.

            Quando observamos que o Governo não pensa a longo prazo e o mercado internacional pensa a longo prazo, essa é uma diferença fundamental. O investidor estrangeiro não olha o imediato de que a venda de automóvel aumentou. Ele olha o longo prazo, como estão as estradas, se aumentou por causa da eficiência ou por causa da isenção fiscal. Ele olha como estão os portos, como estão os aeroportos, como está todo o conjunto da infraestrutura. Ele olha, sobretudo, como está a solidez da política econômica. E quando uma política econômica está sólida, não precisa de pacotes. E temos tido um pacote a cada dois ou três meses. Prova de que não há uma solidez na política econômica. É isso que lá fora eles olham, quando decidem investir em um lugar ou outro. Precisamos continuar alertando a Presidenta.

            Hoje, quando ouço, converso e leio, sinto que México, Colômbia, Peru e Chile atraem mais capital do que o Brasil, talvez não na quantidade, porque são países menores, sobretudo Chile e Peru, porque passam mais confiança. Eles passam mais confiança, porque a política fiscal foi resolvida, porque a política cambial não precisa de intervenções diárias, não trabalha com um câmbio que é quase fixo. Falamos que o câmbio brasileiro é flexível, mas não é. Ele é quase fixo, pela intervenção diária do Banco Central, não permitindo que passe de uma certa banda.

            Eles olham como está a situação monetária, e a inflação no Brasil é coisa séria. Não se quer ouvir isso, mas é coisa séria. Chega a um ponto tal que, quando a gente descobre, a inflação estoura. Inflação não vai subindo aos pouquinhos por toda a vida; ela vai subindo aos pouquinhos, até que um dia ela dá um salto. Aí fica difícil de corrigir.

            Não estamos trabalhando as bases de sustentação da economia com a seriedade do longo prazo necessária. E uma das provas disso é esta antecipação da campanha eleitoral presidencial. Ao antecipar a campanha presidencial, o Brasil passou um recado ao mundo: nossa economia vai ficar subordinada à campanha eleitoral que ocorrerá daqui a um ano e meio.

            Lá fora eles estão vendo isso. Eles não conseguem entender por que houve essa antecipação, mas eles começam a casar essa antecipação com a isenção fiscal, Senador Capiberibe, com a redução da tarifa de energia elétrica, com medidas de curtíssimo prazo para satisfazer o imediato, mas que vão trazer um preço altíssimo no futuro.

            A redução das tarifas elétricas: claro que temos que comemorá-la, nós de hoje, mas as gerações futuras talvez tenham que pagar um alto preço, porque nós, em vez de investirmos em fontes alternativas de energia, como o seu Rio Grande do Sul tenta fazer, estamos insistindo na velha forma de produzir energia elétrica. Em vez de uma grande campanha de redução do consumo, nós estamos incentivando o aumento do consumo. E não me digam - recebi acusação nesse sentido - que nós queremos que os pobres não usem energia elétrica. Não! Que fizessem duas tarifas, uma bem alta para os ricos e outra, até zero, para os pobres, mas a média cair 20% é uma temeridade! Tudo isso é para beneficiar o imediato, mas sacrificando o longo prazo.

            Eu lamento que nós não vejamos, da parte do Governo Federal atual, desde o Presidente Lula, o desejo de ouvir críticas, de ouvir alertas. Ao contrário, começam a dizer que quem critica não é brasileiro - a velha ideia do “ame-o ou deixe-o”, que eu recebo no meu Twitter todos os dias quando faço algum alerta sobre algum ponto que me parece preocupante, que eu quero que seja corrigido, que eu não quero que vá para o desastre. Mas poderemos estar caminhando para isso, como outros países já fizeram, por falta de percepção dos governos da época e por falta de ouvirem os críticos, de ouvirem os que alertam, mesmo estando dentro da Base do Governo.

            Eu venho aqui manifestar essa preocupação muito grande com esse road show, como dizem em inglês. Esse show de rodada dos dirigentes da economia brasileira em busca de capital financeiro não está entusiasmando o mercado, e o fato de não entusiasmar o mercado é um sinal de que nós precisamos tomar algumas medidas.

            Talvez uma boa medida seja não buscar mais capital estrangeiro, mas fazer com que não precisemos dele. O problema é que nós não estamos fazendo o que é necessário para não precisar dele e nem estamos fazendo o que é necessário para recebê-lo; estamos no pior dos mundos a médio e a longo prazo.

            Fica aqui, mais uma vez, este alerta, Senadora, dizendo que o título do que eu sempre falo vai mudar. Já não vai ser mais “A economia está bem, mas não vai bem”. Vai ser “A economia já não está bem e pode ir pior”, se o Governo não despertar, fazendo esse ouvido de que não quer ouvir críticas, fazendo essa autobajulação, que é a maior tragédia em um governante: achar que tudo vai bem e que todos que levantam dúvidas, críticas e alertas são loucos, débeis mentais ou não brasileiros. Nem mesmo de oposição são, porque os de oposição são brasileiros também. Mas são interessados em que as coisas funcionem e deem certo. E não estamos caminhando para dar certo. Nós estamos caminhando para dar errado. Talvez demorando dois, cinco, talvez mais anos ainda, não vou dar prazo. Mas o Brasil merece ser pensado no longo prazo, e não no prazo da próxima eleição.

            É isso, Sra Presidenta, que eu tinha para colocar. Vamos colocar o Brasil pensando em longo prazo, e vamos agir preocupados com o longo prazo, embora afinando no curto prazo o que for preciso.

            É isso, Sra Presidenta.

            A SRa PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco/PP - RS) - Caro Senador Cristovam Buarque, mais ajuda o Governo quem é capaz de ter essa visão crítica séria, responsável, madura, do que a bajulação. E seria muito benéfico para o País se essas críticas fossem observadas.

            Agora há pouco, nós tivemos um debate muito rico, sob a Presidência do Senador Jorge Viana, na reforma do Código Penal. Eu não faço parte dela, mas dois especialistas na área penal foram lá apresentar pontos divergentes, num clima de tanta veemência que, no início, pareceu, digamos, uma verdadeira guerra, não só verbal, mas uma guerra de antagonismos sobre uma matéria tão complexa quanto a questão penal. E, ao final, depois de os autores e os criticados ouvirem as críticas de maneira extremamente civilizada, chegou-se a um termo extremamente maduro e extremamente colaborativo e construtivo, para que o Brasil tenha nas mãos de um competente Senador - o Senador Pedro Taques, que é o Relator do Código Penal - um caminho extremamente real de construir um Código adaptado ao século XXI, às mudanças que a sociedade brasileira teve.

            Então, o que V. Sa faz é um pouco do que aconteceu hoje pela manhã, mas que o Governo deveria prestar atenção, porque o seu objetivo, como o de todos nós aqui, é de ajudar, não é de destruir.

            Cumprimento-o, Senador.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Agradeço muito. E quero lembrar - aproveitando, aqui, a presença do Senador Jorge - que, durante o Governo do Presidente Fernando Henrique, ele fez o possível para ter conversa com as oposições. Eu fui intermediário dele para conversar com Lula e acredito que o Senador Jorge...

(Interrupção de som.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - ...Não tenho certeza, Senador Jorge Viana, mas é bem possível que também tenha sido.

            O Sr. Jorge Viana (Bloco/PT - AC. Fora do microfone.) - Várias vezes.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Várias vezes.

            Hoje, a gente vê uma agressão contra o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso, que merece crítica, sim - não somos da sua base de apoio -, mas não descaracterizar, não ignorar o que foi feito, não passar a ideia de que tudo está começando agora e que tudo vai às mil maravilhas.

            O Brasil vive um grave risco que é interessante: quando as economias estão em crise, o otimismo é fundamental para subir, mas, quando as economias estão no auge, o otimismo é uma tragédia que leva a cair. Temos que ser otimistas quando está por baixo para tentar subir. Quando está por cima, temos que ser pessimista, cuidadoso, para evitar cair.

            A SRa PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco/PP - RS) - Prudentes.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - E não estamos sendo; estamos no otimismo muito perigoso.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/03/2013 - Página 6563