Pronunciamento de Eduardo Suplicy em 27/02/2013
Discurso durante a 17ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Comentários sobre o transcurso do Dia Mundial das Doenças Raras.
- Autor
- Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
- Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
SAUDE.
ELEIÇÕES.
HOMENAGEM.:
- Comentários sobre o transcurso do Dia Mundial das Doenças Raras.
- Publicação
- Publicação no DSF de 28/02/2013 - Página 6347
- Assunto
- Outros > SAUDE. ELEIÇÕES. HOMENAGEM.
- Indexação
-
- COMENTARIO, REALIZAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, SEMINARIO, HOMENAGEM, DIA INTERNACIONAL, DOENÇA, BAIXA, INCIDENCIA, REFERENCIA, ATUAÇÃO, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), MELHORIA, ASSISTENCIA, DIFICULDADE, DIAGNOSTICO, TRATAMENTO, DEFESA, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, CRIAÇÃO, FUNDO DE SAUDE, INVESTIMENTO, SETOR.
- EXPECTATIVA, CANDIDATURA, DELCIDIO DO AMARAL, SENADOR, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS).
- HOMENAGEM POSTUMA, VITIMA, SUICIDIO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), RELAÇÃO, DOENÇA MENTAL, MOTIVO, TORTURA, DITADURA, REGIME MILITAR, DURAÇÃO, INFANCIA, VOTO DE PESAR, FAMILIA.
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Prezado Presidente, Senador Delcídio do Amaral, quero agradecer suas palavras e as da Senadora Ana Amélia, que comigo compartilhou a comemoração do Dia Mundial das Doenças Raras, justamente o tema de que irei falar agora, conforme havia me comprometido diante do Deputado Romário.
Felizmente, Senadora Ana Amélia, se no ano passado o auditório Nereu Ramos estava cheio quando foi comemorado o Dia das Doenças Raras, hoje estava superlotado. Hoje houve um aumento tão significativo de interesse pela causa!
Quero também cumprimentar o Deputado Romário, nosso grande campeão de futebol, um dos maiores jogadores da história do futebol brasileiro, que tem dignificado o seu mandato pela circunstância de ter uma filha com síndrome de Down. Ele abraçou essa causa com um entusiasmo tal que é de tirar o chapéu.
Quero assinalar a presença de uma das pessoas que estiveram lá e testemunharam esse fato, a Professora Nana Machado, que é uma cuidadora, professora de pessoas com algumas limitações, como deficiência. Ela me relatava há pouco que toma conta de dois nenês com doenças raras ou deficiência que têm dois meses de idade. Ela deu duas aulas, uma para cada nenê hoje, só pode chegar lá às quatro horas, mas, mesmo assim, assistiu agora ao seu pronunciamento.
Quero também agradecer a atenção do Senador Flexa Ribeiro. De fato terei um compromisso daqui a instantes e agradeço muito a sua atenção no sentido de eu poder falar antecipadamente, Senador Presidente Delcídio Amaral.
Quero lhe transmitir que o Prefeito de Campo Grande, Alcides Bernal, fez uma previsão. Não sei se posso relatar. Senador Flexa Ribeiro, V. Exª me autoriza? Ele disse que é praticamente certo, na visão dele, que o Senador Delcídio do Amaral será governador em 2014. É uma previsão dele, que sabe das coisas de Mato Grosso do Sul.
O SR. PRESIDENTE (Delcídio do Amaral. Bloco/PT - MS) - E com o apoio primordial do Prefeito de Campo Grande, Alcides Bernal.
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Bom, é o povo que quer dizer.
O SR. PRESIDENTE (Delcídio do Amaral. Bloco/PT - MS) - Se Deus quiser. E Deus quer, não é, meu querido Prefeito Alcides?
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - O Senador Delcídio do Amaral sabe que, se o Prefeito Alcides Bernal quiser fazer de Campo Grande um exemplo da Renda Básica de Cidadania, poderá contar comigo, começando por Campo Grande e, a partir de 2014, em todo o Mato Grosso do Sul. Exemplo da renda básica, V. Exª sabe que pode contar comigo. O Senador Flexa Ribeiro, também, lá no Pará.
O SR. PRESIDENTE (Delcídio do Amaral. Bloco/PT - MS) - Com certeza, o Prefeito Alcides Bernal o convidará, Senador Suplicy, para que V. Exª apresente a Renda Básica da Cidadania, fundamental para a nossa cidade de Campo Grande, para o nosso Estado e para o Brasil.
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Que bom!
Mas eu justamente quero falar hoje do Dia Mundial das Doenças Raras, pois tenho me aproximado muito da discussão de políticas públicas, de conscientização social necessária para a temática relativa às pessoas com essas doenças, por influência direta do Instituto Baresi, de São Paulo, coordenado pela Adriana de Abreu Magalhães Dias e por Marcelo Higa. Em Brasília, tenho dialogado com frequência sobre essas questões que envolvem as doenças raras, por exemplo, com Rogério Lima Barbosa, Presidente da Associação Maria Vitória.
Fruto da sensibilização recebida do Instituto Baresi, apresentei três matérias legislativas sobre as doenças raras. A primeira é o Projeto de Lei do Senado nº 159, de abril de 2011, que institui o último dia do mês de fevereiro como Dia Nacional de Doenças Raras. A proposição encontra-se na Comissão de Educação do Senado, aguardando que o seu Presidente marque uma audiência pública para a instrução do projeto.
A segunda proposta, que apresentei em novembro de 2011, é o Projeto de Lei nº 711, que institui a Política Nacional de Proteção aos Direitos da Pessoa com Doença Rara, matéria distribuída para análise da Comissão de Assuntos Sociais e de Direitos Humanos e Legislação Participativa, sendo terminativa nesta última. Não terá, portanto, que necessariamente passar pelo Plenário do Senado para ser enviada à análise da Câmara. O PLS nº 711 encontra-se com o Relator designado pela CAS, Senador Paulo Bauer, desde 29 de março de 2012.
A terceira matéria é o Projeto de Lei do Senado nº 231, de agosto de 2011, que cria o Fundo Nacional de Pesquisa para Doenças Raras e Negligenciadas. O projeto foi distribuído para a instrução de três comissões: Ciência e Tecnologia, Assuntos Sociais e Assuntos Econômicos, sendo terminativa nesta última. No momento, a propositura, que já teve parecer pela aprovação, na forma de emenda substitutiva, da Comissão de Ciência e Tecnologia, encontra-se na Comissão de Assuntos Sociais, aguardando designação de Relator.
É interessante destacar que uma doença rara é uma patologia que ocorre com pouca frequência no geral da população. Para ser considerada rara, cada doença específica não pode afetar mais do que um número limitado de pessoas de toda a população. Na Europa, a definição para doenças raras abarca as que atingem um em cada dois mil cidadãos (Regulamento da Comunidade Europeia sobre Medicamentos Órfãos). Nos EUA, são consideradas raras as doenças que atingem menos de 200 mil indivíduos. No Japão, a definição jurídica de uma doença rara é a que afeta menos de 50 mil pacientes no país ou cerca de uma em 2.500 pessoas.
Individualmente, cada uma das patologias tidas como raras compromete menos de uma em cada duas pessoas, mas é preciso salientar: há mais de cinco mil doenças raras identificadas. A etiologia das doenças raras é diversificada: a grande maioria delas é de origem genética (80%), mas doenças degenerativas, autoimunes, infecciosas e oncológicas também podem originá-las.
Apesar das dificuldades causadas pelas doenças raras, inúmeras pessoas com essas doenças prestaram e prestam grandes contribuições para a humanidade. Como exemplo, cito o Presidente John Fitzgerald Kennedy, com a doença de Crohn; o físico Stephen Hawking, com esclerose lateral amiotrófica; o músico Seal, com lúpus infantil; o ator Michael J. Fox, com a doença de Huntington; o medalhista olímpico Doug Herland, com osteogênese imperfeita; e a aviadora Jessica Cox, que, por uma doença congênita, nasceu sem os braços.
As sequelas causadas pelas doenças raras são responsáveis pelo surgimento de cerca de 30% das deficiências, que podem ser físicas, auditivas, visuais, cognitivas, comportamentais ou múltiplas, a depender de cada patologia. A dificuldade no tratamento médico começa com a falta de um mapeamento nacional dessas pessoas. A baixa incidência das doenças raras no Brasil, quando comparada com outros países, leva à suspeita de que muitos casos simplesmente não são diagnosticados, em especial em regiões historicamente não incluídas, como a Norte e a Nordeste.
Dados internacionais apontam que a mortalidade infantil entre pessoas com doenças raras chega a 30% em países desenvolvidos. Este percentual pode ser ainda mais alto no Brasil, uma vez que essas crianças não recebem o tratamento adequado. Dados concretos embasariam o desenvolvimento de uma abordagem coerente das necessidades dessa parcela da população.
Estudos recentes efetuados pela Eurordis, organização que auxilia pessoas com doenças raras na União Europeia, comparou dados de oito doenças raras em 17 países europeus, num universo de 6.000 doentes e familiares, mostrando que 25% dos doentes inquiridos esperaram de cinco a 30 anos entre o aparecimento dos sintomas iniciais e o diagnóstico definitivo.
Estima-se que, no Brasil, a dificuldade de diagnóstico e tratamento seja ainda maior. Contribui para isso um fenômeno denominado "desequilíbrio 10/90" (The 10/90 Gap, em inglês), pelo qual, conforme o Global Fórum for Health Research, menos de dez por cento dos gastos mundiais com pesquisa em saúde são dedicados a doenças e condições mórbidas que representam noventa por cento da carga global de doenças.
Essa "falha de mercado" caracteriza-se por uma situação em que o setor privado investe quase exclusivamente em remédios para o mundo rico e desenvolvido, onde serão vendáveis e lucrativos. Como resultado dessa exiguidade de recursos destinados à pesquisa em saúde relacionada com as doenças da pobreza, proliferam as assim denominadas "doenças negligenciadas", virtualmente ignoradas em termos do desenvolvimento de medicamentos.
As doenças negligenciadas, tais como dengue, doença de Chagas, esquistossomose, hanseníase, leishmaniose, filariose, oncocercose, malária, tuberculose e tracoma, entre outras, estão associadas a situações de pobreza, a precárias condições de vida e às iniquidades em saúde, ou seja, às desigualdades injustas, desnecessárias e evitáveis. E a Presidente Dilma quer acabar com elas.
Apesar de serem responsáveis por quase metade da carga de doença nos países em desenvolvimento, os investimentos em pesquisa e desenvolvimento tradicionalmente não priorizaram essa área. O Brasil, felizmente, é uma exceção a essa regra, em face de já ser considerado um líder mundial em pesquisas sobre doenças negligenciadas.
As ações iniciais do Ministério da Saúde com relação às doenças negligenciadas foram lançadas em 2003, com o primeiro edital temático em tuberculose, seguido pelos editais de dengue, em 2004, e de hanseníase, em 2005. Em 2006, implantou o Programa de Pesquisa e Desenvolvimento em Doenças Negligenciadas e financiou 82 pesquisas com um investimento total de R$22,3 milhões.
Em 2008, financiou 58 projetos, mediante investimento conjunto com o Ministério da Ciência e Tecnologia e apoio administrativo do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) de R$17 milhões, perfazendo um total de R$39,3 milhões.
Em 2012, o Ministério da Saúde anunciou a criação de uma Rede de Pesquisa em Doenças Negligenciadas, com financiamento de R$20 milhões.
Esses são apenas alguns exemplos de iniciativas governamentais nessa área. E foi muito importante, hoje, o anúncio feito pelo representante do Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, conforme a Senadora Ana Amélia ressaltou, de que ainda neste semestre será feita uma audiência pública sobre as doenças raras e as doenças negligenciadas.
No caso das doenças raras, acontece situação parecida com a das doenças negligenciadas, pois a decisão das indústrias farmacêuticas de investir na pesquisa e na comercialização de produtos é largamente influenciada pela demanda e, principalmente, pelo mercado potencial. Com base nesse raciocínio, a indústria concentra a sua produção em determinadas linhas de produtos, retirando do mercado drogas de pouco consumo, utilizadas em doenças raras, de baixo retorno financeiro ou de preço controlado pelo Governo - por ser o maior comprador -, tal como acontece com determinadas doenças endêmicas.
Drogas órfãs são medicamentos usados para o diagnóstico, prevenção e tratamento das doenças raras. Para que um medicamento seja considerado órfão, são utilizados critérios epidemiológicos (baixa prevalência ou incidência da doença em uma determinada população) e econômicos (presunção de não rentabilidade do medicamento).
Tanto o diagnóstico quanto o tratamento são dificultados pela falta de conhecimento sobre essas doenças e de protocolos de atendimento específicos. Faltam, ainda, profissionais especializados, capazes de entender as implicações dos tratamentos em um corpo com características especiais. Isto leva ao agravamento de sintomas e sequelas. Muitas vezes, as pessoas com doenças raras ou as associações que as congregam é que são responsáveis por localizar e traduzir as pesquisas mais recentes sobre sua patologia, encaminhando-as para seus médicos.
As pessoas com doenças raras enfrentam gigantescas dificuldades sociais, cujas barreiras são muitas vezes intransponíveis. O preconceito contra os sintomas físicos pouco comuns dessas patologias é frequente, assim como a visão assistencialista, que considera estes indivíduos um peso para a sociedade e não uma parte integrante dela. Muitos acabam isolados socialmente, devido à falta de estrutura adequada a suas necessidades específicas em escolas, universidades, locais de trabalho e centros de lazer. A grande maioria das pessoas com doenças raras não têm acesso às condições necessárias para atingir seu pleno potencial.
Neste sentido, é muito importante ressaltar a importância dos cuidadores, que poderão ser em muito maior número quando for instituída a Renda Básica de Cidadania para valer em nossa Nação, porque as pessoas poderão até optar por cuidar de pessoas queridas, seus familiares que porventura tenham problemas dessa natureza.
Para aprofundar o estudo dessas questões e estabelecer melhores condições à cidadania das pessoas com doenças raras, é preciso contemplá-las em todas as discussões a respeito de suas necessidades. Foi com este grande objetivo em mente que apresentei o projeto de lei que estabelece o Dia Nacional - e não apenas mundial - de Doenças Raras, a ser comemorado, como em todo o mundo, no último dia do mês de fevereiro.
Apesar dos recentes avanços científicos e tecnológicos, as doenças infecciosas continuam a afetar desproporcionalmente as populações pobres e marginalizadas.
O incremento de investimentos em doenças negligenciadas no Brasil, em face dos sucessos já obtidos, exige, agora, a instituição de mecanismos de financiamento mais perenes, que também contemplem as doenças raras. Nesse sentido, a criação do Fundo Nacional de Pesquisa para Doenças Raras e Negligenciadas, proposto pelo Projeto de Lei do Senado 231, de 2012, pode significar um importante avanço com vistas a ampliar o financiamento e, consequentemente, o escopo das ações de pesquisa nessa área.
O Fundo proposto funcionará sob as formas de apoio a fundo perdido ou de empréstimos reembolsáveis. As fontes de recursos incluem doações, sendo permitidas doações para pesquisa de doença específica; subvenções e auxílios de entidades de qualquer natureza, inclusive de organismos internacionais; e reembolso das operações de empréstimo realizadas por meio do Fundo, a título de financiamento reembolsável. Ademais, contará com recursos orçamentários anuais de R$50 milhões, conforme proponho no projeto de lei.
Com essas ideias, aqui, quero finalizar a minha contribuição sobre o tema, cumprimentando a Câmara dos Deputados, e, principalmente, o Deputado Romário, pela realização do seminário tão bem-sucedido, na tarde de hoje, em comemoração ao Dia Mundial das Doenças Raras, e a Associação Maria Vitória, pelo apoio ao evento. Avalio que devemos todos nós prosseguir nessa luta, para fazer valer para as pessoas com doenças raras o princípio constitucional que assegura o direito à saúde para todos.
Mas gostaria, também, de assinalar algo que foi extremamente doloroso, uma espécie de doença rara que aconteceu em função de episódio triste da ditadura militar no Brasil.
Infelizmente, conforme registra Rodrigo Cardoso, na revista IstoÉ, torturado por agentes do regime militar ainda bebê, Carlos Alexandre passou a sofrer de fobia social e nunca se recuperou do trauma. Na semana passada, aos 39 anos, ele se suicidou.
Pouco antes de atentar contra a própria vida ao ingerir medicamentos em excesso, Carlos Eduardo Alexandre escreveu um e-mail para um amigo à 1h30m do sábado 16. Nele, justificava o ato, assumindo não enxergar mais perspectivas na vida.
(Soa a campainha.)
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Queixava-se do pouco dinheiro que ganhava com o trabalho e listava os bens que deixaria: um computador, um HD externo, uma coleção de histórias em quadrinhos e outra de CDs. Na sequência, consumou a ação fatal.
Cacá, como carinhosamente era chamado pelos seus familiares, suicidou-se aos 39 anos, no apartamento em que morava com a mãe e a irmã, em São Paulo.
Sua vida lhe foi tirada pelos excessos do regime ditatorial que mancharam de sangue a história do País entre 1964 e 1985. "Ele foi suicidado, na verdade, uma vez que a morte dele foi a consequência de todo o processo de angústia que ele viveu nesses anos todos após ser torturado", afirma seu pai, o jornalista e cientista político Dermi Azevedo, que mora em Belém, no Pará, e foi meu colega na Folha de S.Paulo, a quem eu transmito o mais afetuoso abraço.
A cena é kafkiana, mas aconteceu com Carlos Alexandre.
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Para concluir, Sr. Presidente. Serei breve.
Em 14 de janeiro de 1974, Carlos Alexandre, com apenas 1 ano e 8 meses, recebeu choques elétricos e foi vítima de outras sevícias nos porões do Deops. Ali, ele, a mãe, a pedagoga aposentada Darcy Angozia, e o pai foram torturados pelos agentes da ditadura. "Cacá apanhou porque estava chorando de fome. Os policiais falavam que ele era doutrinado e perigoso", revelou Darcy, em 2010, em entrevista exclusiva à IstoÉ. A vida de Carlos Alexandre jamais voltaria a entrar nos eixos depois desse episódio. Em meio à pressão por crescer em um ambiente em que seus pais eram tachados de bandidos e terroristas pela vizinhança e vigiados pelos militares, ele desenvolveu um transtorno conhecido como fobia social, uma forma de doença rara. Ao sofrer dessa perturbação, a pessoa, temendo ser rejeitada e humilhada, torna-se reclusa. Na infância, o garoto fazia birra para não ir à escola, porque não queria interagir com outras crianças.
(Interrupção do som.)
(Soa a campainha.)
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Estou concluindo, Sr. Presidente.
Foi na adolescência, porém, entre os 13 e os 20 anos, que a situação piorou. Passou esse período, praticamente, dentro de casa. Acessos de fúria o faziam quebrar o que via pela frente. Na época, também tentou o suicídio.
Cacá começou a descobrir o seu passado por volta dos 10 anos. As histórias eram reveladas aos poucos pelos pais. Desde então, frequentou sessões de psicoterapia. "Os efeitos da ditadura não passam para quem saiu da tortura", diz Ivan Seixas, da Comissão Nacional da Verdade. Na fase adulta, Carlos Alexandre prestou serviços de informática como autônomo. Em 2010, foi anistiado. Recebeu uma indenização de R$100 mil, gastou R$40 mil em cirurgia para corrigir o maxilar, que fora tirado do lugar por um militar que o levou de casa.
Enfim, esse filho sofreu muito. Disse o pai: “Só Deus pode copiosamente banhar-te com a água purificadora da vida eterna", diz um trecho.