Discurso durante a 25ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão sobre relatório recentemente divulgado pelo movimento Todos pela Educação; e outro assunto.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • Reflexão sobre relatório recentemente divulgado pelo movimento Todos pela Educação; e outro assunto.
Aparteantes
Aloysio Nunes Ferreira, Vanessa Grazziotin.
Publicação
Publicação no DSF de 12/03/2013 - Página 9043
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, EDITORIAL, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ASSUNTO, RELATORIO, AVALIAÇÃO, SITUAÇÃO, PRECARIEDADE, SISTEMA DE ENSINO, MANIFESTAÇÃO, GRUPO, EMPRESARIO, PROFESSOR, INTELECTUAL, ASSISTENCIA EDUCACIONAL, CRITICA, ESTABELECIMENTO, OBJETIVO, DEFESA, FEDERALIZAÇÃO, EDUCAÇÃO.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Boa tarde, Senadoras e Senadores, Sr. Presidente. Nós acabamos de ouvir o discurso do Senador Vital do Rêgo, e vimos, com a emoção que caracteriza sua fala aqui, um debate sobre um dos problemas mais fundamentais da história do Brasil. Mas eu digo “mais fundamentais”, ao longo dos 500 anos.

            Essa periodicidade com que o nosso Nordeste enfrenta estiagem, seca, falta d’água, morte de animais, pessoas sofrendo, agricultura perdida... A cada tempo nós temos isso. E já houve intenção de cuidar disso, desde Dom Pedro II, quando, na seca de 1870,, ele disse que se fosse preciso ele venderia as jóias da Coroa para enfrentar o Nordeste. E nós iniciamos um movimento naquela época, o Brasil, preocupados com a água. O problema era como se fosse apenas de água. Criou-se o DNOCS, que não foi capaz de resolver.

            Houve uma geração seguinte. Criou-se uma saída pela economia, que foi liderada por Juscelino com o auxílio de Celso Furtado.

     O problema é criar no Nordeste um desenvolvimento econômico que diminua a desigualdade com São Paulo e o Sul. Em nenhum momento se pensou, se trabalhou, a idéia de que, talvez, o problema fosse falta de educação. Talvez o problema fosse o Nordeste não ter uma massa crítica de ciência e tecnologia que permitisse elevar o nível de vida e, inclusive, enfrentar o problema da estiagem. Ou porque com a ciência a gente consegue reduzir a estiagem ou porque com a ciência a gente não precisa ter uma dependência tão grande em relação às chuvas. Não se pensou!

     Já imaginaram se todo o dinheiro gasto no Nordeste, a partir do projeto de Celso Furtado, tivesse sido investido em educação, no desenvolvimento de grandes universidades, na formação de grandes institutos de ciência e tecnologia, como fizeram na Califórnia, como é feito em Israel? Por que não pensamos nisso? Por que nós, brasileiros, não damos a importância devida ao maior de todos os recursos que um povo tem: os cérebros dos seus habitantes? A terra é importante? É, mas não é mais o fundamental no mundo moderno. É o cérebro. Nós não demos importância. Mas o mais grave é que não demos importância no Nordeste nem no Brasil.

            O que quero falar hoje, Senador? Quero ler aqui um editorial do jornal O Estado de S. Paulo, de sábado passado. É um editorial que repercute um documento da máxima importância. Esse documento, que foi publicado pelo movimento Todos pela Educação, é um raio X do futuro do Brasil, um raio X do futuro. Se você quiser ver como vai ser o futuro de um país olhe como é a sua escola pública no presente. Um corpo passa pelo raios X e ele diz a doença que há, mas uma avaliação da situação da educação de um país mostra o país que a gente vai ter no futuro. Esse documento é de pessoas sérias, lideradas por Arthur Gerdau, um grande empresário que é auxiliar da Presidenta Dilma, e mostra a tragédia que estamos vivendo depois de quase 30 anos de democracia, depois de 20 anos de governos social-democratas de Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma, depois de 10 anos do governo do Partido dos Trabalhadores. É um editorial que transcreve, apenas resumidamente, o que aqui está. Começa dizendo:

Criado por educadores, pesquisadores, empresários e gestores públicos com o objetivo de elevar a qualidade do sistema de ensino do País, o movimento Todos pela Educação desenvolveu vários mecanismos de avaliação para saber se as políticas educacionais estão surtindo efeito.

Além de identificar escolas com bom desempenho para verificar se os métodos pedagógicos por elas adotados podem ser disseminados para toda a rede ensino, o movimento estabeleceu metas de produtividade para 2022, ano do bicentenário da Independência, e periodicamente divulga relatórios sobre a situação de cada uma delas.

            E veja a tragédia que nós temos, Senador Aloysio. Uma das metas prevê que todas as crianças estejam na escola até 2022. Veja como estamos atrasados: a meta é de que tenhamos todas as crianças na escola até 2022! A maior parte dos países do mundo, com potencial razoável como o nosso, já tem todos na universidade, Senador Aloysio. Eles já têm todos na universidade, Senadora Vanessa. A meta deles hoje já não é toda criança na escola, porque já a cumpriram. A deles é grandes centros de ciência e tecnologia, na área da neurobiologia, da informática, da nanotecnologia, da pesquisa espacial.

            Eles estão na área da pesquisa espacial, da nanotecnologia, da biotecnologia, e nós querendo colocar todas as crianças na escola! Será que não nos damos conta do atraso que isso representa?

            Mas é mais grave, Senador: essa meta ridícula - de tão modesta de ter todas as crianças na escola em 2022 - não está caminhando bem. Não estamos caminhando na direção de cumprirmos a meta, como vou mostrar daqui a pouco.

            Uma segunda meta estabelece que toda criança esteja alfabetizada até os 8 anos. Vocês já pensaram que meta modesta, ridícula de tão pequena, já entrando no final do primeiro quarto do Século XXI, que será em 2022, a gente ter toda criança aprendendo a ler aos 8 anos? Isso quer dizer que muitas crianças que ainda vão nascer não vão ter atendidas as suas demandas educacionais, porque 2022, aos 8 anos de idade vai estar a criança que nasceu em 2014.

            Oito anos!

            O Sr. Aloysio Nunes Ferreira (Bloco/PSDB - SP) - V. Exª me permite um aparte, Senador?

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Apenas um minuto, com todo prazer.

            Para ver como isso é um atraso, quantas crianças das classes média e alta brasileiras esperam para aprender a ler aos 8 anos? Elas prendem muito antes, e nós temos como meta 2022.

            Isso é uma vergonha! É uma meta vergonhosa! Mas o mais grave é que não estamos caminhando para cumpri-la. Quando analisamos a meta - como esse documento aqui, imparcial e com gente séria -, pegando o que nós queremos em 2022, analisemos onde deveríamos estar em 2011, e eles vão mostrar que estamos aquém da meta. Ou seja, em 2022, não vamos cumprir esta meta. E é fácil dizer o porquê entre outras razões. Agora mesmo um documento que eu vi em que o Ministro diz que está discutindo com os secretários para que essa meta possa vir a ser alcançada. Caramba! Discutindo com os secretários? Isso mostra falta de interesse, mostra falta de seriedade, mostra o descompromisso do Governo Federal, porque nos outros assuntos eles não ficam debatendo com os secretários, eles tomam a decisão e fazem. Na hora de salvar a indústria automobilística não houve reunião com os secretários da Fazenda do Brasil. O Presidente da República ou a Presidenta decidiu fazer uma desoneração para vender mais carro. Mas para colocar as crianças aprender a ler aos oito anos o Ministro diz: “Nós estamos conversando com os secretários.” E enquanto conversamos há menina e menino nascendo, menina e menina chegando na idade da escola, ficando fora da escola ou entrando na escola e saindo antes do tempo, ou ficando na escola um pouco mais de tempo e sem aprender o que precisam. Como eu vou mostra daqui há pouco.

            Senador Aloysio com todo o prazer.

            O Sr. Aloysio Nunes Ferreira (Bloco/PSDB - SP) - Senador Cristovam Buarque, V. Exª ocupa a tribuna e faz um alerta e esse seu alerta não podia ser mais oportuno em relação a esta abdicação da exigência de uma sociedade que aspira a ser uma sociedade que propicie desenvolvimento integral às pessoas. A abdicação dessa exigência está prestes a se consumar, porque nós temos na nossa Ordem do Dia uma medida provisória tratando da educação à qual foi apresentada uma emenda, a emenda do Senador Alvaro Dia, propondo exatamente aquilo que V. Exª propõe: que a alfabetização comece aos seis anos de idade. Essa emenda foi proposta à medida que está na Ordem do Dia e foi rejeitada na Câmara. Faz V. Exª um pronunciamento, quando nós nos preparamos para votar essa medida provisória no Senado. Se V. Exª, com a autoridade que tem, levar ao Presidente Renan a sugestão, e creio que estará falando em nome de todos nós, para que essa medida provisória seja deliberada pelo Senado com a maior urgência, haverá tempo para que ela retorne à Câmara e para que a Câmara aprecie a modificação que o Senado vier a introduzir, porque o prazo para perda de eficácia dessa medida provisória só expira em abril, de modo que nós teremos tempo de fazer essa correção, de aprovar a emenda - que é uma exigência nacional -, sem prejuízo da validade da medida provisória, pois teríamos tempo para que a Câmara voltasse a examiná-la quando saísse daqui. Então, o pronunciamento de V. Exª é um alerta, um alerta oportuno. E V. Exª, repito, tem autoridade moral, intelectual e política para diligenciar junto ao Senador Renan Calheiros, Presidente do Senado, para que essa votação possa ocorrer em tempo. Muito obrigado.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Eu que agradeço, Senador, e eu aceito essa sua tarefa. Hoje mesmo vou pedir uma audiência. E gostaria que a Senadora Vanessa e que o Sr. Presidente aqui da Mesa fôssemos juntos. Mas pedirei hoje mesmo a audiência.

            Senador, eu não vou ler todo o relatório, apenas dizer: a terceira meta estabelece que todas as crianças e jovens de 14 a 17 anos se matriculem na série mais educada, porque um dos problemas trágicos do Brasil é a quantidade de crianças em séries defasadas.

            A outra meta é que os alunos concluam as três primeiras séries do ensino médio até 19 anos. Deveria ser até os 17, no máximo 18.

            A quinta está relacionada aos investimentos.

            Pois bem, vamos às análises. Aqui há um documento que mostra com clareza que esse relatório apresenta mais um retrato desolador da educação brasileira, especialmente do ensino médio. Eu quero chamar atenção para duas coisas: a palavra “desolador”, “retrato desolador”, e “apresenta mais um”. Mais um. Não é o primeiro, não é o segundo, não é o terceiro. É mais um retrato desolador da situação da educação brasileira. E vou mais longe: um retrato desolador da educação brasileira de hoje é um retrato desolador do Brasil no futuro. Eu repito: se quiser ver o futuro de um país, olhe como está a sua escola no presente. O futuro de um país tem a cara da escola no presente. Nosso retrato do futuro é desolador. Não adianta dizer que o Brasil é um país emergente, que o Brasil é a sexta potência ou a sétima economia do mundo, que nossos turistas esbanjam dinheiro nos Estados Unidos, que nossa moeda é forte. Nosso futuro é fraco, porque nós não temos a base fundamental do desenvolvimento de um povo.

            Isso significa - aí continua o relatório: segundo o estudo, 92% das crianças e jovens de quatro a sete anos estavam estudando em 2011. Vejam bem: 92% estudam; 8% em idade escolar estão fora da escola. Isto é muito grave. É como se a gente tivesse descobrindo cem poços de petróleo e tapando oito, ignorando-os. Nós não estamos usando os cérebros. Tem coisa mais importante? Nós temos 8%, e a meta, modesta, era de 94%. Nós não estamos chegando nem a essa meta ridícula. Estamos com 92%. Isto significa que 3,8 milhões de crianças se encontram fora da escola. Como diz o documento, um Uruguai brasileiro está fora da escola no Brasil. Um Uruguai inteiro!

            O relatório informa que - vejam isto aqui, vejam este dado: tem futuro um país em que um em cada dez, um em cada dez alunos da terceira série do ensino médio teve desempenho adequado em matemática? Vou repetir: Senadora Vanessa, um em cada dez teve desempenho adequado em matemática. Não é que um em cada dez é um gênio em matemática, não é que um em cada dez é um possível matemático, mas que um em cada dez teve um desempenho adequado em matemática. Adequado significa saber o que é regra de três, significa saber o que é percentual, não significa saber o que é equação múltipla, não significa saber o que é integral, não significa saber o que é derivada, não significa saber o que é a teoria dos limites, que é a base para o mínimo de boa matemática. Apenas um em cada dez, no terceiro ano. E está falando dos alunos que estão no terceiro ano. Se nós colocarmos todos que estão em idade, incluindo os que estão fora, aí cai, vai ser meio, meia gente, ou menos de meia gente. Essa é uma tragédia. Mas eu vou continuar lendo a tragédia.

            Antes disso, passo a palavra à Senadora Vanessa.

            A Srª Vanessa Grazziotin (Bloco/PCdoB - AM) - Muito obrigada, Senador Cristovam. Primeiro, quero cumprimentar V. Exª não só pelo pronunciamento, mas pela prioridade que tem dado à educação, e assim tem sido sua vida. V. Exª, que já foi reitor de uma das mais importantes universidades públicas brasileiras, que é a UnB, tem dedicado toda uma vida à educação. Entretanto, Senador Cristovam, eu, que concordo com a necessidade, quando V. Exª fala da necessidade de avançarmos não só na garantia, na universalização da educação brasileira, mas avançarmos na melhoria da qualidade da educação em nosso País, sou obrigada também a destacar alguns avanços importantes que houve nos últimos anos, como a criação de novas universidades públicas brasileiras, sobretudo no interior deste País. O meu Estado do Amazonas, que tem o interior mais vasto deste Brasil, passou, há pouco tempo, a ter direito a universidades, graças ao programa do Governo Federal. As escolas técnicas federais, que estavam à beira de serem todas elas fechadas, não só foram reabilitadas como também expandidas pelo Brasil inteiro. Agora, é óbvio que meta é importante, Senador, mas, junto com a meta, tem de vir o recurso. Essa é a sua luta principal, é a nossa luta principal. V. Exª e eu participamos do movimento por recursos para a educação brasileira. Eu acho que a nossa luta para que seja aplicada a integralidade dos recursos do fundo do pré-sal em educação e até mesmo de grande parte dos royalties é fundamental. Nós precisamos fazer essa campanha. Acabamos de aprovar uma proposta importante de dividir melhor a riqueza daquele petróleo que é produzido a mais de 200 km da costa brasileira, que seja dividida de forma mais igual no Brasil inteiro, mas que o Brasil tem de saber utilizar esse recurso. E utilizar onde? Na educação, para que, daqui a poucos anos, não muitos anos, o senhor possa, quem sabe, ocupar esta tribuna e falar de resultados muito mais positivos com relação à matemática. E não é diferente com a língua portuguesa, não é diferente com a física, não é diferente com outras disciplinas, não é diferente. Durante algum tempo na minha vida, eu fui professora e professora militante do movimento sindical. Hoje, há um piso, que é importante, não é o ideal, mas é um piso para o magistério. O que vimos foram alguns Estados brasileiros entrando na Justiça contra a possibilidade de o professor ter horário extraclasse. Isso é o que não podemos admitir. E quem entra na Justiça, Senador Cristovam, são exatamente os Estados mais ricos, aqueles que deveriam dar o exemplo para outros Estados brasileiros, mas esses entram na Justiça contra a lei que aprovamos. Melhorar a situação do professor é melhorar a qualidade da educação. Então, cumprimento V. Exª pelo pronunciamento. Seguindo nessa luta, seguindo nesse rumo, não tenho dúvida nenhuma de que já conquistamos melhorias, mas de que melhorias muito maiores deverão vir, com certa urgência. Não é à toa que a Presidenta Dilma tomou para si a luta por recursos do petróleo exclusivos para a educação. Muito obrigada e parabéns pelo pronunciamento.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Agradeço, Senadora, porque me permite aqui algumas considerações, para as quais eu gostaria de ter um pouquinho mais de tempo.

            Primeiro, não há dúvida de que estamos melhorando, mas numa velocidade insuficiente. Agora, vejam bem: imagine a Senadora que o Ministro Aldo Rebelo comemorasse que os Estados estão avançando, sem pensar na data exata da Copa do Mundo. Por que na hora da Copa, de construir estádio, a gente não tem meta de avançar, a gente tem meta de concluir? Em educação, a gente comemora o avanço; um avanço que é mais devagar do que as exigências novas de educação. Essa é a tragédia. A tragédia não é que está piorando; é que avança assim, e as exigências são assim.

            Veja bem, criamos muitas faculdades federais por aí afora. Nós não vamos ter alunos, Senadora Vanessa. Hoje, já existe mais menino terminando o ensino médio - e olhe que são poucos -, temos mais vagas em curso superior do que gente terminando o ensino médio. Significa que estão entrando na universidade pessoas despreparadas. Um em cada dez tem desconhecimento adequado de matemática. Desses nove que não têm, alguns vão entrar em escolas de engenharia. É uma tragédia.

            Agora, o mais importante da sua fala, Senadora Vanessa: tudo isso de bom das faculdades, tudo é federal. Por que a gente se nega a fazer a federalização da educação de base no Brasil? Não tem outro jeito. Os Municípios são pobres e desiguais. Não tem jeito de ter educação de qualidade igual no Brasil inteiro, se não for assumindo para a União a responsabilidade da educação de base, como nós já fizemos com as universidades, como já fizemos com a escola técnica, com o Banco do Brasil, com a Caixa Econômica, com o Ministério Público, com a Justiça, com tudo que deu certo, inclusive com educação de base. O pouco que dá certo é federal: a merenda, o livro didático, o Fundeb, o Fundef, e por aí vai.

            Não há como ter uma boa educação em todo o País nas mãos dos pobres coitados Prefeitos do Brasil. Não adianta a gente querer dizer: criança que nasce tem um futuro X ou Y conforme a cidade onde ela nasce. A criança, ao nascer neste País, ela é primeiro brasileira; depois é que é paranaense; depois é que é amazonense; depois é que pernambucana ou brasiliense. No Brasil, não. No Brasil, o que vale é a naturalidade, não a nacionalidade do ponto de vista da educação.

            E continuando, Senador, o Relatório informa:

O resultado ficou muito abaixo da meta prevista para este ano. No caso dos estudantes da rede Escolar pública, o quadro é ainda pior: apenas 5,2% sabem o que deveriam de matemática no Ensino médio.[Aqui chegou àquele meio gente de que eu falava;5%, nem um em dez, é menos de uma]. Em português, o índice foi de 29,2%.

            Mas, vejam bem, nós já deveríamos estar com um índice de 50% falando inglês, francês ou espanhol! A gente está com 29% em português. Vocês já imaginaram a tragédia? Esse é um tempo de bilinguismo, trilinguismo. Aqui 29% têm conhecimento suficiente da língua portuguesa. Imaginem quantos têm de inglês, de francês! A meta era 31%, que é uma meta muito baixa.

Na 9ª série do ensino fundamental, a situação não é muito diferente. Só 16,9% apresentaram nível de aprendizagem adequado em matemática, bem menos do que os 25% da meta: a ridícula meta de 25% - ficou quase na metade dela.

O levantamento também aponta grande variação no desempenho dos alunos do Estado para Estado.

            Aí vem outra tragédia brasileira, que justifica a federalização, Senadora Vanessa, porque a desigualdade de um Estado para outro é terrível. Em alguns indicadores aqui, o Norte tem metade do nível de aprendizado do Centro-Sul, que já é baixo. Essa desigualdade não vai ser resolvida na mão dos prefeitos, como não foi resolvido na mão dos prefeitos o Banco do Brasil, que é nacional, a Caixa Econômica, os Correios. Imaginem se os Correios fossem municipalizados. Acho carta muito importante, mas não me digam que criança não é mais importante do que carta, até porque a criança é que vai um dia escrever as cartas.

            Por que a Copa do Mundo foi federalizada...

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - ... e as escolas não são federais? Outra coisa, há um mito de que a escola particular é melhor do que a pública. No que se refere à média, a média das escolas federais públicas é maior do que a média das escolas particulares no Brasil. As 451 escolas federais, institutos de aplicação, Colégio Pedro II, escolas técnicas, colégios militares têm uma média melhor do que as particulares. Não do que a melhor das melhores particulares, que valem aqui duas vezes quase um curso na Suíça.

            Vou chegando ao final, ao último parágrafo,

O relatório do [...] Todos Pela Educação evidencia as dificuldades que o Brasil enfrenta para se manter entre as maiores e mais prósperas economias, diante de competidores empenhados em investir e ampliar os investimentos em educação, ciência e tecnologia.

(Interrupção do som.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Aqui o editorial (Fora do microfone.) pega o fundamental. E vou repetir:

O relatório [...] evidencia as dificuldades que o Brasil enfrenta para se manter entre as maiores e mais prósperas economias diante de competidores empenhados em investir e ampliar os investimentos em educação, ciência e tecnologia.

            Não tem futuro a economia se for baseada só em exportar ferro, soja e carne. Ela precisa exportar chips, equipamentos médicos, remédios, porque é isso que dinamiza uma economia.

Mostra, também, [o relatório] que um ensino de má qualidade continua limitando o acesso dos jovens a empregos de qualidade na economia formal, condenando [...] gerações à ignorância. [Aí vêm as aspas]: “Isso é uma tristeza. Quer exclusão maior do que o aluno não saber o que deveria ter aprendido?” [...]

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Veja que coisa interessante. Quer tragédia maior do que o aluno não saber o que deveria ter aprendido? Porque um aluno de classe média alta, quando é reprovado, sabe que o que deveria ter aprendido e não aprendeu. No Brasil, eles não sabem, Senador, porque a gente passa automaticamente, porque a gente cancela disciplinas. Eles nem sabem o que deveriam ter aprendido e não conseguiram. Estão felizes com o que não aprenderam, e os governos, fechando os olhos.

            Eu vou concluir, Senador, dizendo que o relatório do Todos Pela Educação cita - veja bem: mais uma vez, não sou eu que falo, o maníaco da federalização - que “falta um currículo nacional. Esse é um dos fatores que têm impedido o ensino médio de melhorar”.

            O que é um currículo nacional? É uma maneira de federalizar a educação.

            O que é o piso salarial? Agradeço à Senadora Vanessa por ter falado sobre isso, até porque, se um dia...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - ... houver uma lei com o meu nome, será “Lei do Piso” (Fora do microfone.) É a única lei que talvez venha a ter o meu nome.

            Pois bem. O piso é o caminho da federalização, só que, Senadora Vanessa, a gente tem que transformar o piso na carreira inteira do professor federal. Esse é o caminho de que a gente precisa.

            Enquanto isso - eu já falei, mas é a parte final -, “o MEC alega que está discutindo com as secretarias estaduais medidas para reestruturar esse ciclo de ensino”.

            Gente, no século XXI, a gente está discutindo com as secretarias medidas para reestruturar? A gente estaria era definindo como executar as medidas de federalização da educação de uma carreira nacional do magistério, com professor ganhando R$9,5 mil por mês, porque, se for menos do que isso, a gente não atrai os melhores quadros. Não é aumentar todos de uma vez, porque não há dinheiro, é uma carreira nova a ser construída. Esse é o recado que deixa o Todos Pela Educação, não pelo que eles colocaram...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (Bloco/PDT - DF) - Não pelo que eles colocaram, defendendo isso, porque isso sou eu quem está defendendo. Eles eu não sei se gostariam de ver esse caminho ou acreditam em outros caminhos, mas o que o relatório mostra é um raio X do futuro do Brasil. Está visto aí. É uma radiografia do futuro do Brasil. E, se quisermos que a radiografia não corresponda à realidade, temos um dever de casa sério neste Senado a fazer. E eu não vejo outra maneira. E tentemos outra, mas não vejo outra, a não ser o início de um processo de 20 anos de federalização da educação de base no Brasil, para acabar com essa vergonha e esse suicídio nacional.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/03/2013 - Página 9043