Discurso durante a 25ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Apelo à AGU para que mantenha o entendimento inicial de inconstitucionalidade sobre o projeto de redistribuição dos royalties do petróleo.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EXECUTIVO.:
  • Apelo à AGU para que mantenha o entendimento inicial de inconstitucionalidade sobre o projeto de redistribuição dos royalties do petróleo.
Publicação
Publicação no DSF de 12/03/2013 - Página 9083
Assunto
Outros > EXECUTIVO.
Indexação
  • COBRANÇA, ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO (AGU), DEFESA, INCONSTITUCIONALIDADE, PROJETO DE LEI, REDISTRIBUIÇÃO, ROYALTIES, PETROLEO, VETO (VET), DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Exmº Sr. Presidente desta sessão, Senador Casildo Maldaner, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, brasileiros e capixabas que nos acompanham pela TV Senado, há muitos séculos atrás, Thomas Moore enfatizou como é importante mostrarmos, com os nossos atos, aquilo que nós profetizamos com nossas palavras: criando uma linha necessária de coerência entre aquilo que fazemos, falamos e aquilo que nós praticamos.

            A coerência, a conexão entre as palavras e as atitudes, a coerência na defesa de princípios e valores é uma virtude inquestionável, uma virtude indissociável no exercício não apenas da atividade pública, mas uma atitude e uma virtude fundamental nas relações humanas. Uma virtude indissociável da conduta ética, do caráter e da integridade moral, sobretudo daqueles que exercem a vida pública.

            É necessário o mínimo, o mínimo de coerência, Srªs e Srs. Senadores, para que possamos ser dignos da confiança, dignos do respeito, dignos da credibilidade e dignos da reputação. Isso vale, particularmente, não apenas para a vida pública, quando temos a obrigação de prestar contas, não apenas aos nossos familiares, aos nossos vizinhos, amigos e colegas. Quem está na vida pública deve satisfação, permanentemente, aos contribuintes, deve satisfação à sociedade de uma forma geral, até porque os nossos mandatos nós o exercemos por delegação. O mandato não é propriedade particular de quem o exerce, muito menos quem está na atividade pública e que tem elevada responsabilidade com questões estratégicas. Quando nossa postura política e nossas decisões têm consequências práticas, sobretudo nos rumos do País e da sociedade, aí a coerência, aí a conexão entre aquilo que falamos e aquilo que praticamos é fundamental.

            É exatamente essa coerência, Sr. Presidente, essa coerência que queremos cobrar, na tribuna do Senado, da Advocacia-Geral da União, do Sr. Luís Adams, homem competente, preparado, de excepcional e notório valor na arte do Direito. Mas a Advocacia-Geral da União e o Dr. Luís Adams, no exercício das suas atribuições constitucionais, de consultoria e assessoramento jurídico do Poder Executivo, alertou, em boa hora, a Excelentíssima Senhora Presidente da República, a Presidente Dilma, sobre as graves inconstitucionalidades do projeto aprovado, na semana passada, pelo Congresso Nacional, que pretende redistribuir os royalties do petróleo.

            Digo que pretende, porque essa luta é uma luta que não se encerra com a manifestação do Congresso Nacional. O Congresso Nacional não está acima da Constituição Federal. Temos mandados de segurança impetrados no Supremo Tribunal Federal para corrigir as violações de que nós fomos vítimas por parte da condução daquela fatídica sessão do Congresso, onde a nossa voz, onde a liberdade e a democracia não foram garantidas à minoria, que teve a sua voz suprimida por um comando absolutamente autoritário. Digo isso porque essa luta não se encerra no Congresso Nacional. Os nossos Estados, o meu Estado, o Espírito Santo e o Rio de Janeiro, e quero crer também que o Estado de São Paulo, pela manifestação do Governador Geraldo Alckmin, estarão ajuizando, nos próximos dias, ações diretas no Supremo Tribunal Federal para que o Supremo Tribunal Federal possa garantir os nossos direitos.

            Foi a partir, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, das fundamentações, das orientações, do Dr. Luís Adams que a Presidente Dilma houve por bem vetar os absurdos previstos na lei aprovada pela maioria do Congresso Nacional, sem qualquer respeito assegurado aos nossos direitos, aos direitos dos nossos Estados, assim como dos nossos Municípios.

            Como pôde, então, o Advogado-Geral da União afirmar na semana passada e retrasada, orientando a Presidente Dilma, técnica e juridicamente, a vetar tais aberrações?

            Como pode, numa semana, ter uma posição e na semana seguinte, lamentavelmente, assistirmos a uma espécie de metamorfose, como na música cantada pelo grande poeta brasileiro Raul Seixas?

            Como pode ele declarar que a missão da Advocacia-Geral da União, a partir de agora, é defender a legitimidade de uma decisão que, referindo-se a uma lei apontada como ilegítima pela própria Advocacia? Foi a própria Advocacia-Geral da União que sustentou os fundamentos robustos que levou a Presidente Dilma a vetar o projeto de redistribuição dos royalties.

            Como pode, de um dia para o outro, a Advocacia-Geral da União, como pode o Dr. Luís Adams passar por cima de suas próprias convicções? Ou não foi ele mesmo que ajudou a alinhar os fundamentos da mensagem do veto, da lei dos royalties, assinalando, ponto por ponto, os princípios constitucionais que ela ofende: o princípio da isonomia, o princípio federativo, o da segurança jurídica e o necessário equilíbrio orçamentário?

            Vale repetir, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, brasileiros que nos acompanham pela TV Senado e capixabas, vale repetir que, na Mensagem Presidencial do veto, a Presidente explica que os royalties são uma compensação financeira dada aos Estados e Municípios produtores e confrontantes em razão da exploração de óleo.

            Leio aqui, Sr. Presidente, ipsis litteris, um trecho da Mensagem da nossa Presidente Dilma vetando essa proposta, naturalmente orientada e fundamentada pela Advocacia-Geral da União:

Devido à sua natureza indenizatória, os royalties incorporam-se às receitas originárias desses mesmos entes, inclusive para efeitos de disponibilidade futura. Trata-se, portanto, de uma receita certa, que, em vários casos, foi objeto de securitização e operações de antecipação de recebíveis. A alteração dessa realidade jurídica afronta, segundo a Advocacia-Geral da União, o inciso XXXVI, do art. 5º, e o princípio do equilíbrio orçamentário previsto no art. 167, ambos da nossa Constituição Federal.

            Em outro trecho da Mensagem, a Presidente da República explica que o texto do Congresso é inconstitucional porque “conflita diretamente com as disposições previstas no art. 5º e no §1 do art. 20 da Constituição Federal, ao obrigar os Estados e Municípios a renunciarem a direito constitucional originário para participar da distribuição do fundo especial destinado aos entes federados”.

            São manifestações que constam do veto da Presidente Dilma e que foram fundamentadas pela Advocacia-Geral da União. Até porque a sessão de votação dos vetos, como nós afirmamos aqui, não violou apenas a Constituição Federal. Também violou o direito e a prerrogativa de manifestação de questões de ordem que nós, minoria, não pudemos manifestar.

            Ao se recusar enxergar essas irregularidades, ao ignorar a ilegitimidade das decisões inconstitucionais, a Advocacia-Geral da União, Sr. Presidente, dá uma de avestruz, sobe em cima do muro, enfia a cabeça no buraco e faz de conta que não falou, faz de conta que não escreveu, faz de conta não orientou a Presidente Dilma - e não apenas a Presidente Dilma, mas também o ex-Presidente Lula, porque ambos vetaram essa medida inconstitucional de força, que violenta o direito, que violenta os nossos Estados e os nossos Municípios.

            No que se refere à Advocacia-Geral da União, no entanto, Sr. Presidente, há uma incoerência injustificável. A Advocacia-Geral da União precisa ter uma postura de ordem técnica, de ordem constitucional, e não uma postura de conveniência política. O compromisso primeiro da Advocacia-Geral da União deve ser com a legalidade. Esse é o pressuposto básico da Advocacia-Geral da União. A ilegalidade, nesse caso, é questionar.

            Não há outro caminho, Sr. Presidente. Não há outro caminho para a Advocacia-Geral da União que não manter a sua coerência, que não questionar, no Supremo Tribunal Federal, a derrubada do veto. O que, aliás, me chamou a atenção, porque um veto presidencial que foi votado no Congresso Nacional, que sequer teve a defesa dos Líderes partidários que dão sustentação à base da Presidente da República, aqui no Congresso Nacional, aqui no Senado e lá na Câmara. É defender a obediência à Lei Maior do País e refutar a ofensa a princípios constitucionais básicos.

            Em outras palavras, o que esperamos da Advocacia Geral da União, neste momento, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é que ela proponha uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra as mudanças impostas, arbitrariamente, pela maioria que se formou à margem daquilo que fez o constituinte.

            O que esperamos, Sr. Presidente? O que quero acreditar é que a Advocacia-Geral da União manterá a sua coerência. Os nossos Estados estarão, naturalmente, ajuizando no Supremo Tribunal Federal. Mas não há outro caminho, Sr. Presidente, em nome da coerência. Não há outro caminho em nome da dignidade. Não há outro caminho em nome da necessidade de nós termos uma conexão entre nossas palavras, ações, gestos e atitudes.

            Por isso mesmo, nós estamos aqui concluindo o nosso pronunciamento, afirmando a nossa convicção de que a Advocacia-Geral da União vá refletir, na pessoa do seu Presidente, do Advogado-Geral da União, Dr. Luís Adams, não estar submetida a qualquer tipo de orientação política. É essa mesma coerência que nós estamos aqui cobrando da Advocacia-Geral da União.

            Não pode, na semana anterior, fundamentar o veto e, na semana posterior, achar ou concluir que o Congresso Nacional é legítimo. Não! O Congresso Nacional não é legítimo para agir ao arrepio da Lei e da Constituição Federal. Nenhum de nós pode estar acima da Constituição Federal. Nenhum de nós pode estar acima das leis, até porque somos nós que fazemos as leis e nós precisamos ter a obrigação de, em primeiro lugar, darmos exemplo e respeitarmos as leis.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/03/2013 - Página 9083