Comunicação inadiável durante a 26ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Relato da retirada pacífica de posseiros que ocuparam a terra indígena xavante marãiwatsédé.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Comunicação inadiável
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA, DIVISÃO TERRITORIAL.:
  • Relato da retirada pacífica de posseiros que ocuparam a terra indígena xavante marãiwatsédé.
Publicação
Publicação no DCN2 de 13/03/2013 - Página 9321
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA, DIVISÃO TERRITORIAL.
Indexação
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, ORGÃOS, GOVERNO FEDERAL, GOVERNO ESTADUAL, GOVERNO MUNICIPAL, MOTIVO, EFICIENCIA, RETIRADA, POSSEIRO, LOCALIDADE, TERRAS, GRUPO INDIGENA, XAVANTES, LOCAL, ESTADO DE MATO GROSSO (MT), LEITURA, TEXTO, AUTORIA, SECRETARIO NACIONAL, ARTICULAÇÃO, SECRETARIA GERAL, PRESIDENCIA DA REPUBLICA, REFERENCIA, HISTORIA, OCUPAÇÃO, TERRAS INDIGENAS.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Paulo Paim, hoje, o tema que me traz à tribuna do Senado é a articulação exitosa de vários órgãos do Governo Federal, estadual e municipal que culminou com a retirada pacífica dos posseiros que ocupavam a terra indígena xavante Marãiwatsédé.

            O texto que aqui leio foi apresentado pelo Secretário Nacional de Articulação Social da Secretaria-Geral da Presidência da República, Paulo Roberto Martins Maldos, na Câmara Municipal de São Paulo, em 7 de fevereiro de 2013, num ato muito bonito de homenagem a Dom Pedro Casaldáliga e aos índios xavantes.

            Eis o testemunho de Paulo Maldos:

A comunidade indígena xavante foi retirada de sua terra tradicional Marãiwatsédé em 1966, em aviões da Força Aérea Brasileira (FAB), e colocada numa região distante, com a finalidade de se formar ali o maior latifúndio do Brasil à época, a fazenda Suiá Missú, com os conhecidos incentivos por parte do então governo militar. A ideia era ocupar a região amazôníca por intermédio de grandes projetos com o apoio governamental.

Este ano de 1966 coincide com a chegada do então padre Pedro Casaldáliga, missionário católico vindo da Espanha que, por testemunhar os inúmeros crimes cometidos pelos gerentes da Suiá Missú, contra posseiros, contra indígenas e contra o meio-ambiente, encaminhou denúncias à imprensa da época e, desde então, é ameaçado de morte pelos criminosos.

Durante a ECO-92, o latifúndio estava em mãos da Agip Brasil, empresa italiana que, pressionada pelas inúmeras denúncias de ambientalistas, entidades de direitos humanos, estudiosos e movimentos sociais, resolve publicamente devolver aquele território ao Estado brasileiro e à comunidade xavante.

A demarcação da terra indígena Marãiwatsédé teve início em 1992, e o governo Fernando Henrique Cardoso a levou até o final, com sua respectiva homologação e, finalmente, registro como terra da União em 1999. Ocorreu que, inconformados com a devolução da terra aos indígenas, políticos e fazendeiros do Mato Grosso, já em 1992, resolveram planejar uma invasão organizada da terra, levando para lá grandes, médios e pequenos posseiros, sem nenhuma titulação ou com titulação falsa.

Ao mesmo tempo que invadiram, os políticos e posseiros judicializaram a questão na busca de impedir o retorno da comunidade indígena, levando a disputa a todas as instâncias do Poder Judiciário. Ocorreu que, depois de sucessivas decisões favoráveis aos indígenas nos tribunais, o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Carlos Ayres Britto, em 17 de outubro de 2003, decidiu pela retirada imediata dos invasores, todos reconhecidos como de má-fé, e pela devolução do território à comunidade xavante.

Foram designados oficiais de Justiça para fazerem as notificações aos posseiros e a sua imediata desintrusão do território, e o Governo Federal foi convocado pelo Poder Judiciário a colaborar com estes, garantindo-lhes apoio logístico a infraestrutura.

O Governo Federai, atendendo à ordem judicial, montou uma base de apoio no município de Alto Boa Vista (MT), com o trabalho específico para esta finalidade logística realizado pelo Exército, e criou uma coordenação do apoio aos oficiais de Justiça, com representantes de diversos ministérios e órgãos públicos como Funai, Sesai, Ibama, Incra, Censipam, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e Força Nacional.

[...]

A orientação geral era para que todo o processo fosse conduzido de maneira transparente, pacífica, ordeira, e para que os pequenos posseiros fossem realocados em condições dignas.

A fase de notificação dos posseiros foi realizada sem conflitos, sendo que apenas no final, em Posto da Mata, um grupo de políticos tentou colocar a população contra os oficiais de Justiça e as forças de segurança, chegando a virar um carro da Força Nacional.

            (Soa a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) -

No início do processo de notificação foi detectado, pela inteligência do Estado do Mato Grosso, um plano que incluía o assassinato do Bispo Emérito de São Félix do Araguaia, Dom Pedro Casaldáliga, e do Cacique Damião da Aldeia Marãiwatsédé.O Governo Federal prestou assistência a ambos para garantir a sua proteção. Um grupo da Força Nacional acampou ao lado da Aldeia Marãiwatsédé, e Dom Pedro Casaidáliga teve que ser retirado por alguns dias de sua residência, no mês de dezembro de 2012, pois chegaram informes de que o seu assassinato estava em vias de ser concretizado.

[...]

Apesar desse clima de hostilidade, a operação de desintrusão continuou, sempre de maneira pacífica e respeitosa, evitando as provocações feitas por parte dos posseiros.

            (Soa a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) -

No início de dezembro de 2012, a operação foi reforçada, em homens e equipamentos, justamente para se demonstrar que a decisão era definitiva, mas que deveria ser feita sem violência.

No entanto, no final de dezembro de 2012, um grupo de posseiros e motoqueiros ocupou o Posto da Mata e de lá impediam a continuidade da desintrusão, ora ameaçando moradores do vilarejo que desmontavam suas posses, ora ameaçando agricultores que desejavam retirar suas mudanças. Trancavam as estradas e criavam transtornos permanentes a motoristas, caminhoneiros e demais pessoas e famílias que circulavam na região.

No dia 28 de dezembro, esse grupo atacou um caminhão das Sesai que transportava cestas de alimentos para uma comunidade indígena do Mato Grosso, levou motorista e acompanhante a um local onde foram ameaçados e torturados, roubou as sete toneladas de alimentos e ateou fogo ao caminhão.

Neste momento, o Governo Federal decidiu retomar o Posto da Mata, para poder restabelecer a ordem na região e dar prosseguimento à desintrusão da terra indígena.

            (Soa a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) -

Isto foi feito pelas forças de segurança, de maneira pacífica, na madrugada do dia 30 de dezembro e, a partir daí, a desintrusão passou a fluir num ritmo acelerado, pois todos os posseiros já estavam dispostos a deixar a área, mas estavam impedidos pela minoria que ocupava o Posto da Mata e os ameaçava de forma permanente.

A desintrusão da Terra Indígena Marãiwatsédé foi finalizada oficialmente no dia 28 de janeiro de 2013, tendo sido repassadas, pelos oficiais de Justiça para a Funai, todas as 619 posses ilegalmente existentes em seu interior, em Posto da Mata e no interior do território.

Dom Pedro Casaldáliga está de volta a sua residência, que segue monitorada pela Polícia Federal. Os inquéritos relativos aos conflitos nas fases de notificação e desintrusão e às ameaças feitas ao Bispo e ao cacique Damião seguem seu curso.

Assentamentos rurais foram oferecidos aos posseiros da terra indígena com perfil para a reforma agrária, e um assentamento urbano foi oferecido em Alto Boa Vista para os moradores de Posto da Mata. Cerca de 200 famílias foram cadastradas para esse assentamento urbano.

Trata-se agora de apoiar a comunidade indígena de Marãiwatsédé na sua retomada do território tradicional, para que nele possa se organizar para viver e produzir de maneira coerente com seus padrões culturais.

A experiência de desintrusão da Terra Indígena Marãiwatsédé mostrou que, neste processo, foi fundamental o protagonismo da comunidade indígena xavante, pois esta nunca desistiu de voltar à sua terra tradicional, de onde foi violentamente expulsa há quase 47 anos.

Esta experiência mostrou também que, quando o Estado brasileiro se articula de forma coerente e colaborativa, os direitos constitucionais de todos podem ser preservados, principalmente das comunidades mais frágeis e vulneráveis, como povos indígenas, quilombolas e populações tradicionais.

            (Soa a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP)

Provou o Governo Dilma Rousseff que esse processo pode ser realizado de maneira ordeira e pacífica.

Numa visão mais ampla, toda esta experiência, vivida pelos distintos poderes da República e acompanhada de perto pela sociedade brasileira, revelou que um amplo projeto de desenvolvimento pode ser realizado em nosso País, preservando-se os direitos culturais e territoriais das diversas comunidades tradicionais inscritos em nossa Constituição Federal.

            Sr. Presidente, agradeço muito por sua tolerância e quero aqui cumprimentar o Secretário-Geral Gilberto Carvalho e Paulo Maldos, Secretário de Articulação, que, inclusive, estão indo àquela região para assegurar que tudo caminhe muito bem - irão acompanhados da Funai e de outros segmentos do Governo.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DCN2 de 13/03/2013 - Página 9321