Discurso durante a 27ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem à Srª Margarida Genevois pelo transcurso dos seus noventa anos.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem à Srª Margarida Genevois pelo transcurso dos seus noventa anos.
Publicação
Publicação no DSF de 14/03/2013 - Página 9541
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • REGISTRO, PRESENÇA, PLENARIO, SENADO, MINISTRO DE ESTADO, AGRICULTURA, EMBAIXADOR, ORIGEM, PAIS ESTRANGEIRO, SUDÃO.
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE NASCIMENTO, MULHER, IMPORTANCIA, CONTRIBUIÇÃO, DESENVOLVIMENTO, DIREITOS HUMANOS, BRASIL, ENFASE, PERIODO, DITADURA, SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), REFERENCIA, REALIZAÇÃO, CELEBRAÇÃO, MANIFESTAÇÃO, PESAMES, FAMILIA.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Senadora Vanessa Grazziotin, quero agradecer a sua atenção e dar as boas-vindas ao Ministro da Agricultura e da Irrigação do Sudão, Dr. Abd Elhalim Elmotafi, que está acompanhado do Embaixador do Sudão no Brasil, Abd Elghani Elnaim Awad Elkarim, e de uma delegação tanto de membros do governo como de empresários.

            Já é a segunda vez que ele vem ao Brasil. Eles estão muito interessados no aprofundamento das relações do Brasil com o Sudão. A Casa Civil está examinando o acordo que está por ser realizado entre o Brasil e o Sudão e que promoverá o desenvolvimento das relações, especialmente na área da agricultura, mas também nas áreas da indústria, do comércio, da educação e outras. Eles estão muito interessados nos programas de combate à fome, de segurança alimentar, de combate à pobreza.

            No período em que o Sudão fez a divisão entre o Sudão e o Sudão do Sul, houve algumas dificuldades de entendimento. O Ministro e o Embaixador me transmitiram as notícias de que começou a haver um melhor entendimento entre o Sudão do Sul e o Sudão. Eu até estava dizendo a eles que, quem sabe, como os sudaneses gostam muito do futebol, eles possam convidar a Seleção Brasileira para fazer um jogo com a Seleção Mista de Sudão do Sul e do Sudão, para pacificar melhor ainda o país.

            Thank you very much - muito obrigado por sua visita.

            Eu agora passo à oração que iria fazer aqui.

            Hoje, Srª Presidenta, eu quero falar de uma mulher de excepcional qualidade, a Srª Margarida Genevois.

            No último domingo, 10 de março, uma das pessoas que mais contribuíram para com o devido respeito aos direitos humanos e para a realização de justiça na história do Brasil, Margarida Genovois, foi homenageada em São Paulo por todos os seus amigos e admiradores, por ocasião de seu aniversário de 90 anos. Primeiro, na missa tão bonita celebrada por Frei Betto, Frei João Xerri e Padre Júlio Lancelotti na Igreja do Convento dos Dominicanos; depois, no jantar que reuniu as pessoas de sua família e todos nós que com ela tanto interagimos ao longo das últimas décadas; também por bonita reportagem, na Folha de S.Paulo, feita por Eleonora de Lucena, cuja íntegra peço transcrição nos Anais do Senado.

            Em especial, lá estavam seus companheiros da Comissão Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo ao longo dos últimos 40 anos: Dalmo de Abreu Dallari, representado por sua família, pois enviou mensagem de cumprimentos de Paris; Fábio Konder Comparato; Hélio Bicudo; Mário Simas; Luiz Antônio Alves de Souza; Waldemar Rossi; Antônio Cândido de Melo e Souza; José Gregori; Maria Victoria Benevides; Plínio de Arruda Sampaio; Marco Antônio Rodrigues Barbosa; Antônio Carlos Malheiros; Belisário dos Santos Júnior; Antônio Funari Filho; Josefina Bacariça; Juliana Santoro, entre outros.

            Como diz a sua amiga Rose Marie Muraro, Margarida era naturalmente uma lady. Quem a visse pensava que era de classe alta, mas por baixo de toda essa elegância estava uma mulher fortíssima, que Dom Paulo Evaristo Arns, então Arcebispo de São Paulo, convidou para fazer parte da Comissão Justiça e Paz, composta somente por homens, mas que pelo estatuto precisava de pelo menos uma mulher.

            Margarida era membro da Ação Católica; fundou a instituição Veritas para mulheres de classe média, mas, acima de tudo, salvou a vida de milhares de pessoas, trabalhando junto com Dalmo Dallari, que era o Presidente da Comissão Justiça e Paz. Logo foi aceita por todos, e seu trabalho ia mudando na medida em que mudavam os tempos. No começo era dar fuga aos que seriam torturados; depois ela se dedicou, à medida que o número dessas pessoas ia crescendo, a conseguir fugas em massa, sempre com seu jeito de lady. Contava ela que, com esse jeito de ir, bem vestida, conseguia muitas coisas que outros não conseguiam.

            Anualmente viajava para França, a princípio para visitar a família do marido, mas sua missão era levar documentos secretos entre outras pessoas. Foram essas pessoas que conseguiram as fontes para, logo que acabou a ditadura, ser publicado o livro Brasil: Nunca Mais, editado naquela época pela Editora Vozes quando esta ainda era progressista, e que fez um estrondoso sucesso, pois o povo brasileiro não tinha a menor ideia do que estava acontecendo naqueles anos de chumbo.

            No seu casamento, viveu primeiramente na fazenda da Rhodia, dirigida por seu marido, Lucien Genevois. Ali ela tomou noção do que era realmente a pobreza. Fundou creches, grupos de estudo e tudo aquilo que se devia fazer para mães que colocavam estrume nas feridas dos recém-nascidos porque não sabiam o que fazer, e o tétano não demorava a chegar. Pouco a pouco, foi aprofundando este trabalho tanto na fazenda, onde conseguia salvar centenas de crianças entre os 2.500 servidores, como na Comissão Justiça e Paz, onde conseguia salvar milhares de crianças e adultos.

            À medida que esse trabalho ia se espalhando, apareciam milhares de pessoas para serem ajudadas a fugir. Suas idas anuais à Europa, que todos pensavam que era por motivos frívolos, na verdade, eram viagens principalmente para França, Alemanha e Holanda, onde conseguia dinheiro e lugares para "exportar" - entre aspas - os mais necessitados. E nunca deixou de fazer esse trabalho.

            Cremos que ela deixaria de existir se não estivesse trabalhando na área de Direitos Humanos, que começara numa casinha modestíssima onde morava Dom Paulo Arns, e depois obteve várias salas na Cúria, tal era a quantidade de pessoas que vinham inclusive da América Latina, fugindo de outras ditaduras militares, como a da Argentina, do Uruguai, do Chile. Era preciso que se escrevesse a saga que foi e é a vida dessa mulher fantástica, que não encontrou outras iguais ou que a sobrepujassem.

            As mulheres devem se orgulhar dela que, antes que as feministas surgissem, já era uma militante de primeira ordem. Ao mesmo tempo, era cheia de ternura pelos necessitados e cheia de força contra os que os oprimiam. Tudo isso silenciosamente e que está aparecendo somente agora.

            Na missa que Frei Betto, Frei João Xerri e o Padre Júlio Lancelotti celebraram foram colocadas citações tão belas que resolvi reproduzi-las, sobretudo porque ela própria escolheu poemas de Carlos Drummond de Andrade.

(Soa a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Permita-me, Srª Presidenta; peço um pouco mais de tolerância.

            Disseram os sacerdotes:

Irmãos e irmãs, estamos reunidos para celebrar o dom da vida de nossa querida parente e amiga Margarida Genevois.

Devemos agradecer a Deus tudo que ela significa para cada um de nós. Todos aqui reunidos sabemos o quanto a vida dela tem sido frutífera na esfera eclesial e social, mas também graças ao seu especial carisma para fazer amizades, cultivar a fé, dedicar-se aos pobres e excluídos.

Bom estar aqui e participar da alegria de Margarida e de seus familiares.

‘Que pode uma criatura senão, entre criaturas, amar?

amar e esquecer, amar e malamar,

amar, desamar, amar?

sempre, e até de olhos vidrados, amar?

Que pode, pergunto, o ser amoroso,

sozinho, em rotação universal, senão rodar também, e amar?

amar o que o mar traz à praia,

o que ele sepulta,

e o que, na brisa marinha,

é sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?

Amar solenemente as palmas do deserto,

o que é entrega ou adoração expectante,

e amar o inóspito, o áspero, um vaso sem flor, um chão de ferro,

e o peito inerte, e a rua vista em sonho, e uma ave de rapina.

Este o nosso destino: o amor sem conta,

Distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas,

doação ilimitada a uma completa ingratidão,

e na concha vazia do amor a procura medrosa, paciente, de mais e mais amor.

Amar a nossa falta mesma de amor,

e na secura nossa

amar a água implícita,

e o beijo tácito,

e a sede infinita’.

            Padre Júlio Lancelotti terminou sua fala dizendo de Margarida Genevois: “Flor que para ser flor tem que ser margarida, e Margarida tem que ser Genevois”.

            O poema final por todos dito foi o de Cora Coralina:

Não sei se a vida é curta

ou longa demais para nós,

mas sei que nada do que vivemos tem sentido,

se não tocamos o coração das pessoas.

Muitas vezes basta ser colo que acolhe,

braço que envolve,

palavra que conforta,

silêncio que respeita,

alegria que contagia,

lágrima que corre,

olhar que acaricia,

desejo que sacia,

amor que promove.

E isso não é coisa de outro mundo,

é o que dá sentido à vida.

É o que faz com que ela não seja nem curta,

nem longa demais,

mas que seja intensa,

verdadeira e pura ...

Enquanto durar.

            Aqui desejo a Malu, Rose, Anny, Bernard, Verônica, Paulo, Sofia, aos seus parentes mais próximos, as minhas homenagens e de todos os amigos da exemplar Margarida.

 

DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e §2º, do Regimento Interno.)

Matéria referida:

- ‘Pobres ainda são esmagados pela injustiça’, diz ex-assessora de Arns, (Eleonora de Lucena, Folha de S.Paulo;


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/03/2013 - Página 9541