Discurso durante a 28ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Destaque à humildade do novo Papa da Igreja Católica.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IGREJA CATOLICA.:
  • Destaque à humildade do novo Papa da Igreja Católica.
Publicação
Publicação no DSF de 15/03/2013 - Página 10195
Assunto
Outros > IGREJA CATOLICA.
Indexação
  • COMENTARIO, ELOGIO, COMPORTAMENTO, PAPA, COMUNIDADE, IGREJA CATOLICA, REFERENCIA, BUSCA, EXTINÇÃO, POBREZA, MUNDO.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Prezado Presidente Jorge Viana, queridas Senadoras e Senadores, falar sobre o Papa não é fácil. Há 2.000 anos, os Papas decidem, de certa maneira, o destino da humanidade. Inclusive, muitas guerras foram feitas entre católicos e não católicos de outras denominações religiosas, haja vista, no século XVII, a guerra entre católicos e protestantes, que mudou a face do mundo.

            Era nisso que eu queria chegar. De acordo com o perfil do Papa, pelo menos 1,2 bilhão de pessoas assumiram outro perfil, um perfil mais humilde, mais pobre, menos arrogante. Falava-se que Pio XII havia ajudado os nazistas, mas não era verdade. Ele havia feito fugir mais de 5 mil nazistas da Alemanha.

            O Papa tem um poder diferente, um poder sobre a profundidade das pessoas, haja vista a proibição sobre a camisinha, o aborto, o tratamento da Aids e várias outras coisas em outros campos.

            São Francisco, a meu ver, foi o maior santo que a Igreja já teve. Protegeu não só os pobres, mas a natureza inteira. Pode-se dizer que ele carregou a natureza nas costas. Assim, parece que deve ser esse Papa Francisco. Desde já, ele mostra como é diferente dos outros Papas, que manipulavam direito e poder.

            O caso da sexualidade, da pedofilia, que agora tem conhecimento universal, sempre existiu na Igreja por causa do celibato. Creio que, com o assento desse novo Papa, que foi tão humilde, espontaneamente, desde o primeiro momento em que se viu na frente do povo, se possa ter um novo São Francisco, que dê uma face humana e transparente àquilo que corroía a Igreja no sécuio XIII e que é a mesma coisa que a corrói hoje: a corrupção, as lutas internas, a pesada carga do dinheiro do Vaticano. E que parece que este Papa, inconscientemente, rejeita.

            Temos certeza que, em seu pontificado, as finanças serão transparentes, a pedofilia será desnudada. E este é apenas o começo da mudança da Igreja, que tem uma responsabilidade moral sobre o que há de mais profundo no ser humano. E, se o Papa for como São Francisco, humilde e desligado do poder, poderá transformar o mundo. É interessante como a personalidade de uma única pessoa pode mudar a história. Do outro lado, lembra-nos a monstruosa personalidade de Hitler que matou milhões de pessoas.

            Temos a certeza absoluta que este Papa fará viver milhões de pessoas, principalmente os pobres, porque, desde o momento que ele apareceu em público, mostrou que era um pobre. Não tinha insígnias douradas nem bolsa de arminho, e, sim, trazia uma simples bata branca que pode simbolizar a sua personalidade.

            O inconsciente do Papa se revelou em toda a sua vida, durante a qual nunca usou transporte de luxo, restaurantes de luxo, e todos esses signos do poder, mas estava sempre, silenciosamente, ao lado dos despossuídos.

            Temos a certeza absoluta, aqui vamos de inconsciente para inconsciente, de que o seu inconsciente transparente fará a humanidade ganhar outra transparência.

            Durante 1.700 anos a Igreja de Cristo, pobre, foi aliada dos ricos. Creio que este Papa a fará ser a protetora dos pobres. E, com isso, voltar ao seu destino, iluminado de conduta da humanidade para a sua salvação e não para o que estamos vivendo hoje: guerras, violência e amor ao dinheiro, acima de tudo.

            O Espirito Santo, a nosso ver, agiu realmente sobre o Conclave.

            Caso contrário, teríamos uma igreja voltada sobre as cúrias e sobre as proibições e não sobre o amor.

            Eu gostaria, Sr. Presidente, de aqui ler o magnífico, o belo artigo que Leonardo Boff me enviou ontem, intitulado “O Papa Francisco chamado a restaurar a Igreja”:

Nas redes sociais havia anunciado que o futuro Papa iria se chamar Francisco. E não me enganei. Por que Francisco? Porque São Francisco começou sua conversão ao ouvir o Crucifixo da capelinha de São Damião lhe dizer: "Francisco, vai e restaura a minha casa; olhe que ela está em ruínas" (S. Boaventura, Legenda Maior 11,1).

Francisco tomou ao pé da letra estas palavras e reconstruiu a igrejinha da Porciúncula que existe ainda em Assis dentro de uma imensa catedral. Depois entendeu que se tratava de algo espiritual: restaurar a "Igreja que Cristo resgatara com seu sangue" (op.cit). Foi então que começou seu movimento de renovação da Igreja que era presidida pelo Papa mais poderoso da história, Inocêncio III, Começou morando com os hansenianos e, de braço com um deles, ia pelos caminhos pregando o evangelho em língua popular e não em latim.

É bom que se saiba que Francisco nunca foi padre, mas apenas leigo. Só nó final da vida, quando os Papas proibiram que os leigos pregassem, aceitou ser diácono à condição de não receber nenhuma remuneração pelo cargo.

Por que o Cardeal Jorge Mário Bergoglío escolheu o nome de Francisco? A meu ver, foi exatamente porque se deu conta de que a Igreja está em minas pela desmoralização dos vários escândalos que atingiram o que ela tinha de mais precioso: a moralidade e a credibilidade.

Francisco não é um nome. É um projeto de Igreja, pobre, simples, evangélica e destituída de todo o poder. É uma Igreja que anda pelos caminhos, junto com os últimos; que cria as primeiras comunidades de irmãos que rezam o breviário debaixo de árvores junto com os passarinhos. É uma Igreja ecológica que chama a todos os seres com a doce palavra de "irmãos e irmãs". Francisco se mostrou obediente à Igreja dos Papas e, ao mesmo tempo, seguiu seu próprio caminho com o evangelho da pobreza na mão. Escreveu o então teólogo Joseph Ratzinger [que depois veio a se tornar Bento XVI e que foi crítico e que levou Leonardo Boff a sair da Igreja]: "O não de Francisco àquele tipo imperial de Igreja não poderia ser mais radical, é o que chamaríamos de protesto profético" (em Zeit Jesu, Herder 1970, 269).

Ele não fala, simplesmente inaugura o novo. [assim prossegue Leonardo Boff].

Creio que o Papa Francisco tem em mente uma Igreja assim, fora dos palácios e dos símbolos do poder. Mostrou-o ao aparecer em público. Normalmente os Papas e Ratizinger principalmente punham sobre os ombros a mozeta, aquela capinha cheia de brocados e ouro que só os imperadores podiam usar. O Papa Francisco veio simplesmente vestido de branco. Três pontos são de ressaltar em sua fala inaugural e são de grande significação simbólica.

A primeira: disse que quer ‘presidir na caridade’. Isso desde a Reforma e nos melhores teólogos do ecumenismo era pedido. O Papa não deve presidir como urn monarca absoluto, revestido de poder sagrado como o prevê o direito canónico. Segundo Jesus, deve presidir no amor e fortalecer a fé dos irmãos e irmãs.

A segunda: deu centralidade ao Povo de Deus, tão realçada pelo Vaticano II e posta de lado pelos dois Papas anteriores em favor da Hierarquia. O Papa Francisco, humildemente, pede que o Povo de Deus reze por ele e o abençoe. Somente depois, ele abençoará o Povo de Deus. Isto significa: ele está aí para servir e não para ser servido. Pede que o ajudem a construir um caminho juntos e clama por fraternidade para toda a humanidade onde os seres humanos não se reconhecem como irmãos e irmãs mas atados às forças da economia.

Por fim, evitou toda a espetacularização da figura do Papa. Não estendeu os braços para saudar o povo. Ficou parado, imóvel, sério e sóbrio, diria, quase assustado. Apenas se via a figura branca que olhava com carinho para a multidão. Mas irradiava paz e confiança. Usou de humor falando sem uma retórica oficialista, como um pastor fala aos seus fiéis.

Cabe, por último, ressaltar que é um Papa que vem do Grande Sul, onde estão os pobres da Humanidade e onde vivem 60% dos católicos.

(Soa a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) -

Com sua experiência de pastor, com uma nova visão das coisas, a partir de baixo, poderá reformar a Cúria, descentralizar a administração e conferir um rosto novo e crível à Igreja.

            Assim, Leonardo Boff, autor de São Francisco de Assis: Ternura e Vigor, Vozes 1999, conclui o seu belo artigo sobre o Papa Francisco I, Papa que levou os italianos a se alegrarem tanto, exatamente por ter escolhido o nome de São Francisco de Assis, o nome Francisco I, que representa o santo mais querido da Itália mas de todos nós católicos, exatamente pela solidariedade com que Francisco sempre viveu dentre os mais pobres, os mais humildes.

(Soa a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Mas também é importante cumprimentar os argentinos que, representando toda a América do Sul, a América Latina, acabam tendo, dentre eles próprios, a escolha do Cardeal Jorge Mario Bergoglio, que foi eleito Papa de maneira a fazer todos os argentinos transbordarem de alegria. Inclusive a própria Presidenta Cristina Kirchner, que, por vezes recebeu críticas do Cardeal Jorge Mario Bergoglio, agora o Papa Francisco I, também o cumprimentou, desejando-lhe, assim como a Presidenta Dilma Rousseff, que ele tenha todo o sucesso na hora de contribuir para que...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - ...instituições que realmente signifiquem a realização da justiça possam fazer o mundo viver sem tantas guerras, sem tanta violência, porque as pessoas e os povos passarão a viver com maior justiça na relação entre todos nós.

            Meus cumprimentos, portanto, e todo o sucesso ao Papa Francisco I na sua difícil missão, agora, perante a humanidade.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/03/2013 - Página 10195