Discurso durante a 32ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Tristeza pela danificação de parte dos documentos do Arquivo Nacional.

Autor
Cyro Miranda (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/GO)
Nome completo: Cyro Miranda Gifford Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • Tristeza pela danificação de parte dos documentos do Arquivo Nacional.
Publicação
Publicação no DSF de 20/03/2013 - Página 11265
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • CRITICA, FALTA, INVESTIMENTO, GOVERNO FEDERAL, RELAÇÃO, CULTURA, MOTIVO, INUNDAÇÃO, INSTALAÇÃO, ARQUIVO NACIONAL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), FATO GERADOR, DESTRUIÇÃO, DOCUMENTO HISTORICO.

            O SR. CYRO MIRANDA (Bloco/PSDB - GO. Pronuncia o seguinte discurso sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Senador Jorge Viana, que preside esta sessão.

            Srªs e Srs. Senadores, Rádio Senado, TV Senado, Agência Senado, senhoras e senhores, sem memória nacional, não há nação! Sem memória nacional não há povo, nem cidadania!

            A Nação, o povo e a cidadania consolidam-se em torno da história que determinado grupo humano, unido por valores comuns, constrói ao longo dos séculos.

            Por isso, Sr. Presidente, é extremamente grave o que se revela em matéria publicada no jornal O Estado de S. Paulo, sob o título "Memória em risco".

            É difícil aceitar que um temporal que atingiu a cidade do Rio de Janeiro tenha danificado parte dos documentos do Arquivo Nacional.

            O Arquivo Nacional, que deveria ser exemplo para as demais instituições dessa natureza, lamentavelmente, não o é. Ao que parece, conta com a sorte, mais que com o planejamento estratégico, para preservar o acervo.

            Foram atingidos documentos originais do Tribunal de Segurança Nacional do governo de Getúlio Vargas, de 1930 a 1945. Foram danificados, também, papéis do Serviço de Informação do Ministério da Justiça com registro do regime militar e documentos sobre os negócios da época do reinado de D. João VI, além de registros do Marquês de Barbacena. Os documentos da Lei Áurea só não foram atingidos porque estavam em exposição numa sala a salvo do alagamento.

            O patrimônio cultural de um povo, Senadora Grazziotin, e de uma nação não se reduz, é claro, aos fatos e acontecimentos de governo, tampouco aos feitos dos heróis nacionais.

            A historiografia contemporânea, baseada na etnologia e na etnografia, é muito mais abrangente. Ao historiador moderno importam os hábitos e os costumes comezinhos. Estes são capazes de retratar os pormenores da vida cotidiana de nosso povo e de nossa gente; dão um colorido e traçam um cenário mais próximo da realidade do passado.

            Mas a maior fonte desse passado, que nos faz povo, Nação e cidadãos, é, sem qualquer sombra de dúvida, a documentação: os registros guardados em arquivos e museus.

            Preservados na integridade, os documentos permitem um constante revisitar do passado para compreendê-lo nas minúcias dos acontecimentos.

            Quando se fala em documentação, não se pode ter um olhar restrito aos acordos e tratados, aos planos e projetos. A memória de um povo escreve-se e descreve-se, também, nas linhas e entrelinhas de certidões de nascimento, casamento e óbito, nos contratos de compra e venda e numa infinidade de fontes.

            Basta ver o quão importante se mostrou o trabalho de Alcântara Machado ao mergulhar no detido exame de documentos cartoriais, reveladores de hábitos, costumes e crenças da sociedade de São Paulo, do século XVI ao século XVIII.

            O fato lamentável, nesse episódio do Arquivo Nacional, é que não há uma política pública bem definida e eficaz no sentido de preservar o acervo documental existente nos arquivos públicos e museus.

            Parece-nos evidente que documentos da importância dos que foram atingidos no Arquivo Nacional devessem estar a salvo de toda e qualquer intempérie.

            Quando se perde uma peça do passado, perde-se também uma memória, uma passagem, um fato ou um feito, por mais restrito que seja.

            Um prédio que abriga a Memória Nacional precisa ser corretamente mantido para que não se coloque em risco um patrimônio de valor inestimável, que, quando perdido, causa um dano irreparável.

            De acordo com depoimentos de servidores, o que se viu no Arquivo Nacional, Srªs e Srs. Senadores, foi uma cachoeira descendo do teto. E isso tem ocorrido há muito tempo!

            Uma bela construção do século XIX, o Arquivo Nacional tem apresentado problemas estruturais importantes que requerem atenção constante e permanente. Mas a lógica aqui é a mesma de sempre: emenda aqui, emenda aqui, remenda acolá e vai-se rezando para São Pedro ajudar.

            As inundações do prédio têm se repetido ao longo dos anos e, a cada novo temporal, há um novo prejuízo. Ora, sabemos que, todos os anos, nós estamos sujeitos a essas intempéries.

            A direção do Arquivo Nacional, como outras autoridades de governo, já se acostumou a encontrar desculpas. Dizem que foi pedido um milhão e seiscentos mil reais ao Ministério da Justiça, que é responsável pelo Arquivo, para as obras emergenciais. Mas o pedido ainda não foi atendido.

            E aqui abro parênteses para dizer que estamos convidando o Ministro da Justiça para, na Comissão de Educação, prestar esses esclarecimentos.

            No ano passado, foi a vez da Biblioteca Nacional, que, em razão da ruptura de um duto de ar condicionado, teve atingidos exemplares de jornais e obras antigas.

            Esses lamentáveis episódios revelam que o Governo não tem o devido zelo na preservação da memória nacional. Há uma preponderante cultura de improviso e remendos. É como se tudo seguisse essa ótica reativa da equipe econômica, que, sem rumo e planejamento, tenta controlar a inflação com a retirada de um imposto aqui e um incentivo acolá.

            Esta forma caótica de gerir a economia do Brasil poderá ser corrigida por governos centrados na gestão por resultados. Mas o estrago feito pelo descaso na preservação da memória nacional é irreparável. Não tem volta!

            Srªs e Srs. Senadores, perder um documento de qualquer momento da história brasileira cria uma fissura na reconstrução do passado.

            Os historiadores, que se debruçam sobre a nossa memória, munidos da lente clínica voltada à observação dos detalhes de cada episódio, sabem como a perda de um documento pode colocar em risco todo um trabalho de entender a história da sociedade de cada período.

            Um documento perdido pode quebrar o elo de uma cadeia de acontecimentos que jamais poderá ser reconstituída.

            Por isso, queremos e devemos deixar aqui o nosso protesto contra a forma como a memória nacional tem sido preservada como legado às futuras gerações.

            O Brasil moderno e contemporâneo não pode prescindir de qualquer documento que lhe delineie a história, os fatos, os feitos e os costumes dos diversos momentos da historiografia nacional.

            Muito obrigado, Sr. Presidente!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/03/2013 - Página 11265