Pela Liderança durante a 33ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem ao juiz de direito Alexandre Martins de Castro Filho, assassinado há dez anos.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem ao juiz de direito Alexandre Martins de Castro Filho, assassinado há dez anos.
Publicação
Publicação no DSF de 21/03/2013 - Página 11622
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, JUIZ DE DIREITO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), MORTO, ESTADO DO ESPIRITO SANTO (ES), ELOGIO, ATUAÇÃO, TRIBUNAL DE JUSTIÇA, REGIÃO.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) - Exmo Sr. Presidente desta sessão, eminente Senador e amigo Paulo Paim; Srªs Senadoras; Srs. Senadores, ocupo a tribuna do Senado Federal para falar da trajetória de um homem, da trajetória de um Estado e da singularidade de um tempo. Venho até aqui para falar, acima de tudo, sobre uma história de superação, uma história de união, uma história escrita coletivamente à custa de muita luta e de muita dor.

            O homem desta história, Sr. Presidente, chamava-se Alexandre Martins de Castro Filho, Juiz de Direito brutalmente assassinado há exatos dez anos. O Estado era o meu Estado, o Estado do Espírito Santo. O tempo foi o de um passado que, tenho certeza, todos os capixabas de bem, os capixabas que trabalham e que devotam sua vida a uma construção positiva, desejariam esquecer.

            Srªs e Srs. Senadores, senhoras e senhores telespectadores que nos acompanham pela TV Senado, brasileiros e capixabas, inicio meu pronunciamento falando de um período muito triste e recente na construção da história do Espírito Santo, falando de um tempo em que nosso Estado ficou mergulhado por desvios de toda a ordem, estagnado e atolado na lama da corrupção e dominado pelo crime organizado.

            Falo de um tempo, Sr. Presidente, em que muitos capixabas tinham vergonha de dizer que eram do Espírito Santo. Falo de um tempo em que meu Estado ganhava destaque na mídia nacional não por suas potencialidades e vocações, não por suas virtudes e potenciais. Falo de um triste e amargo tempo em que ocupávamos as páginas policiais dos grandes jornais e revistas do nosso País. Éramos retratados, fielmente, naquele momento, como moradores de um Estado falido, desmoralizado, dominado e liberado pelo crime organizado, pois, durante quase uma década, até o início de 2003, nós, capixabas, vivemos um dos mais tristes períodos da nossa história. Os capixabas, impotentes, assistiam ao crime organizado estender todos os seus tentáculos sobre os Poderes constituídos no Espírito Santo. A desorganização político-administrativa era completa. Havia uma crise muito mais do que conjuntural, havia uma crise estrutural, em que as instituições públicas estavam lideradas, dominadas e contaminadas pelo crime organizado.

            Sr. Presidente, essa história e esse tempo levaram o nosso Estado e os capixabas a um momento de união e de unidade. Houve a necessidade de que nós nos juntássemos, com diferenças, com divergências, com respeito àqueles que pensam assim ou assado, mas sem abrir mão de nossas convicções, para empreender a necessária construção de um projeto Político, com “p” maiúsculo, de um projeto administrativo, de um projeto que pudesse, na prática, recriar toda a história do nosso Estado.

            Felizmente, essa triste página de nossa história começou a ser virada em 2002, quando os capixabas elegeram o então Senador Paulo Hartung como nosso Governador. Eu tenho muito orgulho, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de ter feito parte dessa construção, de ter dado uma modesta contribuição a esse movimento liderado pelo nosso ex-Governador Paulo Hartung, pois, no seu primeiro período, fui Secretário de Estado da Agricultura e, como Secretário, pude tratar de reorganizar o interior do nosso Estado, período em que a Secretaria evoluiu para muito além da agricultura, para ser a verdadeira Secretaria de articulação dos interesses e da integração das nossas regiões, das regiões do nosso Estado do Espírito Santo. Depois, no segundo mandato, como Vice-Governador, pude consolidar o nosso Estado, restaurá-lo, devolvendo aos capixabas a necessária autoestima.

            Mas essa foi, seguramente, acima de tudo, Srªs e Srs. Senadores, uma obra construída coletivamente, uma obra construída por muitas mãos, por muitos corações que se uniram nessa reconstrução. Certamente, essa travessia não teria obtido sucesso, sem que houvesse a união e a participação de muita gente destemida e ousada, que colocou o interesse do Estado e o interesse público acima de qualquer outro interesse. Poderes instituídos, partidos políticos, lideranças comunitárias, sociedade civil organizada, igrejas - no plural -, a Ordem dos Advogados do Brasil, enfim, homens e mulheres de bem do Espírito Santo se uniram no mais importante e verdadeiro mutirão pela reconstrução do Estado do Espírito Santo.

            Falei aqui de um tempo de tristes lembranças de um Estado que conseguiu se reerguer do atoleiro em que se encontrava, dando demonstração da sua capacidade de superação. Mas, agora, Sr. Presidente, passo a ressaltar o trabalho e a coragem de um jovem juiz de direito cuja atuação foi fundamental para libertar o Espírito Santo das amarras da criminalidade organizada.

            Eu me refiro, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a um carioca que adotou o meu Estado, o Juiz Alexandre Martins de Castro Filho. Com apenas 32 anos de idade, cinco dos quais vividos no Espírito Santo, foi, brutalmente e covardemente, assassinado com três tiros no momento em que entrava em uma academia de ginástica no Município de Vila Velha, na região da Grande Vitória, na manhã de 24 de março de 2003.

            O Juiz Alexandre era um dos mais atuantes membros da missão especial federal que, desde julho de 2002, investigava as ações do crime organizado no Espírito Santo. O trabalho destemido e obstinado desenvolvido e liderado pelo Juiz Alexandre representava um grande obstáculo aos representantes de todos os tipos de organizações criminosas que, há anos, dominavam as instituições capixabas: bancas de jogo do bicho, casas de bingo, grupos de extermínio, de tráfico de drogas, de lavagem de dinheiro, com corrupção de tudo quanto é tipo. Por conta desse trabalho, o magistrado vinha recebendo ameaças e estava sendo escoltado por seguranças. Infelizmente, Sr. Presidente, no dia do crime, ele havia dispensado a escolta.

            O assassinato do jovem juiz causou uma das maiores comoções populares já vistas no Estado Espírito Santo: carreatas, mobilizações de protesto e manifestações foram organizadas em várias das nossas cidades. Mais de seis mil pessoas compareceram ao seu velório, realizado no Tribunal de Justiça do Estado.

            Em vez de causar a intimidação daqueles que atuavam na linha de frente dessa guerra, a morte do sempre saudoso Dr. Alexandre Martins foi responsável por promover a reação de toda a sociedade capixaba contra o crime organizado ainda com uma intensidade muito mais elevada na direção do dever e do desafio de uma superação que nós precisávamos cumprir, de uma página que nós precisávamos virar.

            Dois dias antes de sua morte, o Dr. Alexandre Martins concedeu sua última entrevista, publicada no jornal A Tribuna, do meu Estado. O título da matéria era a resposta do magistrado às ameaças que vinha recebendo por causa de sua atuação: “Não vamos nos intimidar”.

            A coragem do Juiz Alexandre Martins rendeu frutos. Seu parceiro na 5ª Vara de Execuções Penais de Vitória, o Juiz Carlos Eduardo Lemos, fez questão de afirmar logo após o crime - abre aspas: “Espero que os juízes não se acovardem. Se tirar um, tem outro para colocar no lugar, e assim por diante!” Essa foi a manifestação de seu companheiro e estimado magistrado do meu Estado, o Juiz Carlos Eduardo Lemos.

            E foi sob o peso de toda a consternação provocada pela morte do Juiz Alexandre Martins de Castro Filho que os homens e mulheres de bem do Espírito Santo intensificaram e continuaram sua união na direção dessa que era uma tarefa, uma missão de todos nós.

            Por isso, a sociedade e o Poder Público precisam estar permanentemente atentos para evitar todo e qualquer tipo de retrocesso. É muito mais fácil destruir do que construir.

            Sr. Presidente, passados dez anos do assassinato do Dr. Alexandre, os sete executores e intermediários do crime já foram julgados e condenados pela Justiça. Faltam ir a júri popular ainda três pessoas como mandantes. A demora para que o julgamento aconteça se deve aos intermináveis recursos interpostos pelas defesas dos acusados, e, infelizmente, ainda não há data prevista para que eles sejam levados a júri popular.

            Assim como todos os capixabas, eu desejo que esse julgamento aconteça o mais rápido possível. A dor pela perda do Dr. Alexandre nunca será apagada de nossos corações, bem como seu exemplo, sua luta, sua jornada. Mas ela se torna ainda maior diante da possibilidade de que os responsáveis pelo planejamento desse crime bárbaro e covarde permaneçam impunes, alimentando a impunidade brasileira.

            Mas uma coisa é certa: a morte do Juiz Alexandre Martins jamais cairá no esquecimento. Todos os anos, no mês de março, os capixabas têm se reunido para homenagear esse grande magistrado, esse grande brasileiro, esse grande capixaba, que, com grande esforço, dedicou sua vida à construção de uma sociedade mais justa e mais humana.

            Pelos dez anos de sua morte nós não poderíamos passar de forma indiferente, Sr. Presidente. A Academia Brasileira de Direitos Humanos, a Faculdade de Direito de Vitória e a Secretaria de Estado da Justiça vão promover, no próximo dia 24, domingo, um ato público em homenagem ao Juiz Alexandre Martins. O ato público terá início às 10 horas, com uma caminhada silenciosa, que partirá do Quiosque nº 1 da praia de Camburi, em Vitória.

            Aqui, Sr. Presidente, desta tribuna, em nome dos organizadores dessa mobilização, faço o convite para que possamos estar juntos nesse evento em memória do saudoso Juiz Alexandre Martins. Será uma forma de mantermos viva a sua memória, a sua luta, a sua história, a sua missão. Será uma homenagem a um magistrado, a um brasileiro, a um capixaba que por nós foi acolhido e que, nas terras capixabas, fez do seu mandato, da sua missão, do seu ministério e da sua magistratura a expressão da mais alta e elevada dignidade.

            Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, presto minha homenagem ao Juiz Alexandre, que tanta saudade deixou, por seu exemplo pessoal, por sua fibra, por sua ousadia e pela forma destemida de sua atuação! Durante aqueles anos todos, ele insistia em transformar o meu Estado, um Estado que não se revelava ou um Estado que não estava compatível com nossa história.

            A minha homenagem, portanto, ao Juiz Alexandre!


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/03/2013 - Página 11622