Discurso durante a 34ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à Funai pelas novas demarcações de reservas indígenas no Mato Grosso do Sul.

Autor
Ruben Figueiró (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MS)
Nome completo: Ruben Figueiró de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • Críticas à Funai pelas novas demarcações de reservas indígenas no Mato Grosso do Sul.
Aparteantes
Sergio Souza, Valdir Raupp, Waldemir Moka.
Publicação
Publicação no DSF de 22/03/2013 - Página 11855
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • COMENTARIO, SITUAÇÃO, CONFLITO, PRODUTOR RURAL, COMUNIDADE INDIGENA, DISPUTA, TERRAS INDIGENAS, CRITICA, INFLUENCIA, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), NECESSIDADE, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, ATUALIZAÇÃO, POLITICA AGRARIA, SOLUÇÃO, PROBLEMA.

            O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco/PSDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, recentemente estive nesta tribuna para falar de um tema difícil, que precisa ser encarado com seriedade e intenção real de chegar a soluções, sem medidas protelatórias.

            Tenho visto aqui parlamentares de vários Estados do País retratando suas preocupações com o problema fundiário e a relação entre produtores rurais e indígenas.

            Sabemos da nossa dívida histórica para com essa população, mas não podemos deixar que essa - entre aspas - “culpa” prejudique aqueles que ocupam a terra há décadas e que têm o direito de propriedade sobre ela. Estou falando dos produtores rurais do meu Estado, mas sei que meus colegas de Norte a Sul têm inúmeros exemplos de como é urgente uma ação efetiva do Executivo Federal a respeito dos conflitos agrários. Estamos em permanente estado de tensão, prestes a ver ainda mais derramamento de sangue de ambos os lados.

            No meu último discurso, Sr. Presidente, alertei para a influência da Funai de Mato Grosso do Sul, que está insuflando conflitos.

            Em decorrência desse pronunciamento, várias lideranças das comunidades indígenas do meu Estado solicitaram audiência em meu escritório parlamentar em Campo Grande, no último dia 15, para discutir o quadro dos conflitos e prestar esclarecimentos sobre o tema.

            Tivemos uma conversa franca por mais de duas horas. Pude constatar que os líderes indígenas são formados por pessoas preparadas e esclarecidas. Suas manifestações são formuladas com grande preparo intelectual.

            Tive a oportunidade de ouvi-los de maneira direta, sem interferências estranhas. Posso assegurar aos senhores que todos desejam a paz, a resolução dos problemas sem violência, respeitando a lei e a ordem. Muitos se sentem incomodados com a imagem de que são - entre aspas - “fantoches da Funai”; outros reclamam das excessivas interferências das ONGs em torno de suas comunidades.

            Enfim, as lideranças também estão preocupadas e desejam trilhar o caminho pacífico e ordeiro para encontrar soluções efetivas para os problemas.

            Srªs e Srs. Senadores, dessa reunião pude, então, reforçar meus pontos de vista. Vejo hoje que existem três aspectos para se observar de perto a questão do conflito existente em meu Estado entre comunidades indígenas e os proprietários rurais. O primeiro é o da legalidade; o segundo é o aspecto econômico, e o terceiro é o do ponto de vista humano e social.

            Esses três elementos formam o cerne das disputas. E com eles, infelizmente, confluem pelos desvãos os atos de violência.

            A cada tempo a imprensa noticia, com grande parcialidade, diga-se de passagem, o assassinato de cidadãos brasileiros, índios e não índios. Todos estão emocionalmente envolvidos numa disputa desesperada.

            Lembrando uma frase de Nelson Rodrigues, fica a impressão de que não há inocentes nem culpados: todos são vítimas.

            O ambiente nos Municípios de Antônio João, Amambai, Aquidauana, Caarapó, Coronel Sapucaia, Corumbá, Douradina, Dourados, Itaporã, Iguatemi, Miranda, Paranhos, Porto Murtinho, Sidrolândia e Tacuru é de tensão permanente, senhores.

            Toda a região fronteiriça entre Brasil, Paraguai e Bolívia vive uma situação anômala, nervosa, desesperada.

            Há informações de que, atraídos pela notícia de que reservas imensas serão demarcadas nessa faixa geográfica de nosso País - vejam bem, senhores -, comunidades étnicas vivendo em terras paraguaias, bolivianas e até colombianas, lá no extremo norte da América do Sul, aportam na região com a esperança de criar um grande território das comunidades indígenas latino-americanas.

            Não é preciso dizer o quanto isso tem causado apreensão entre quem vive há mais de um século na região ou quem adquiriu ali propriedades tendo plenos direitos e segurança jurídica de propriedade da terra.

            Os proprietários adquiriram suas terras com a formalização de atos jurídicos perfeitos.

            Por isso, a ação da Funai de publicar atos demarcatórios de surpresa, como fez recentemente em ato do dia 19, publicado ontem no Diário Oficial, desconsiderando a realidade específica de nosso Estado, insufla e tensiona o ambiente. Digo mais: o quanto isso tem retraído os investimentos, o quanto isso tem conflagrado os Municípios e o quanto essa situação é desgastante para todos.

            Estamos vivendo uma guerra permanente. Uma guerra suja de informações e contrainformações. Uma guerra jurídica sem trégua, com decisões e contradecisões que tornam a situação mais e mais indefinida.

            Analisando a história e as legislações consagradas, percebe-se um contrassenso.

            Recentemente, tive a oportunidade ler um parecer do grande mestre do Direito Constitucional Brasileiro da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, reconhecido internacionalmente, o Dr. Manoel Gonçalves Ferreira Filho, que detalha, numa exposição direta e brilhante, que, desde a Constituição de 1891, depois passando pelas Cartas de 1934, 1937, 1967 e 1969, a União reconheceu o direito dos Estados-membros às suas próprias competências, resguardando sua autonomia no que tange à utilização de suas terras devolutas.

            Com a Constituição de 1988, houve uma mudança de perspectiva. Se antes, ao longo de quase todo o século XX, a ideia vigente era de que o Brasil devia - entre aspas - “integrar seu território para não entregar” aos estrangeiros, na famosa frase do Marechal Cândido Rondon, com a nova Carta Constitucional passou a vigorar o conceito de - entre aspas - “ocupar para preservar”.

            Mas ressalte-se aqui o parecer do Dr. Manoel Gonçalves de que uma nova norma constitucional, mesmo quando editada pelo poder originário, tem incidência imediata, não caráter retroativo.

            Nesse sentido, desde a Constituição de 1934, foi reconhecido às comunidades indígenas o direito de posse da terra, mas não da propriedade. Só em 1946, no artigo 216, essa posse foi reconhecida quando havia ocupação em caráter permanente.

            Mais tarde, a Constituição de 1988, a que nos rege, confisca aos Estados as terras sobre as quais tinham domínio há um século, pois elas passam de terras do domínio estadual para terras do domínio da União, como ocorre hoje.

            Mesmo que pelo artigo 231 da atual Carta Constitucional tenha havido mudança de paradigma, é certo que as normas constitucionais não têm retroeficácia, mas eficácia imediata, conforme o parecer do graduado jurista a que me referi. Ou seja, o que antes existia está amparado pelo princípio do direito adquirido, não havendo possibilidade de qualquer alteração na base do direito, a não ser pela figura estranha e antidemocrática da quebra do Pacto Federativo.

            Assim, Srs. Senadores, o que se tem colocado cada vez mais é que a Funai, com essas novas demarcações de terra que vêm ocorrendo hoje em Mato Grosso do Sul, vem colocando em prática o confisco puro e simples. E o esbulho nunca foi um ato legalmente aceitável.

            Isso não tem amparo nas normas vigentes no Estado democrático de direito. No mínimo, o correto seria o pagamento pela União das terras consideradas indígenas pelo preço justo, conforme proposta de emenda constitucional ofertada pelos eminentes Senadores Waldemir Moka e Delcídio, nesta Casa.

            E a razão para que esse procedimento seja o menos injusto se baseia em dados históricos.

            Quero lembrar, Excelências, que, no final do século XIX, quase no fim do período Imperial, o Barão de Antonina recebeu de Dom Pedro II as terras limítrofes com o Paraguai. Eram milhões de hectares, perdidos num vazio territorial imenso, lugar onde qualquer presença humana era rara e episódica.

            Mais tarde, essas terras foram entregues à Companhia Mate Laranjeira, que explorava a erva brasileira, o famoso mate lá do Rio Grande do Sul, dando início ao processo de ocupação gradual da região sul de Mato Grosso.

            A colonização instaurou-se pela vontade do governo e interesse da União, principalmente depois da Guerra do Paraguai, que via a necessidade premente de delimitar, com a presença de cidadãos brasileiros, uma vasta área de fronteira, onde hoje se situa grande parte do território sul-mato-grossense.

            Quero aqui finalizar este pronunciamento.

            O Sr. Waldemir Moka (Bloco/PMDB - MS) - V. Exª me concede um aparte, Senador Ruben Figueiró?

            O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco/PSDB - MS) - Com muita honra, Senador Waldemir. V. Exª conhece muito melhor do que eu esta questão que estou analisando, neste instante, desta tribuna.

            O Sr. Waldemir Moka (Bloco/PMDB - MS) - Certamente não conheço, e V. Exª tem a experiência parlamentar de muitos anos. Mas, Senador Ruben Figueiró, no final do ano passado, com ajuda de vários Senadores aqui, fizemos uma emenda de comissão. E, na Comissão de Constituição e Justiça, conseguimos aprovar R$100 milhões. Sobre essa questão da luta pelos índios, eu fiz chegar ao Senador Paulo Paim, que hoje preside esta sessão e que, na época, era Presidente da Comissão de Direitos Humanos, que, em Mato Grosso do Sul, nós não temos essa figura de terras invadidas ou griladas. Lá, os produtores rurais têm legitimidade, têm títulos. Há uma cadeia dominial que mostra o título e a posse. Já há algum tempo esse era o meu discurso, solitário no início. Agora, conseguimos unanimidade, dizendo que isso não existe no Mato Grosso do Sul e que, portanto, não caberia a expropriação - esse é o termo exato. Caso se chegasse à conclusão de que lá era terra indígena, teria que haver uma desapropriação. O Ministério Público Federal do nosso Estado reconhece isso; a Funai, numa audiência, na Assembleia Legislativa, reconheceu isso; as lideranças das várias etnias reconhecem isso; e também os produtores, mesmo contrariados, porque eles acham que a terra é propriedade deles. Mas é sempre assim. Ao se chegar à conclusão de que é terra indígena não cabe a expropriação, e, sim, a desapropriação. Então, o caminho é esse, se querem, realmente, aumentar as reservas da população indígena, se querem reconhecer uma injustiça com a população indígena. E sou um daqueles que reconhece que há uma dívida a ser paga com os povos indígenas. Mas essa dívida é da sociedade como um todo, não pode ser debitada nas costas de um único segmento. Então, para se corrigir uma injustiça, vai-se praticar outra, desapropriando? Como essas famílias, há 100 anos, 70 anos, 50 anos nas terras, vão sair de lá, com uma mão na frente e outra atrás, como aconteceu no Mato Grosso recentemente? Então, diante disso, chegamos a essa conclusão. Dos R$100 milhões que conseguimos aprovar na Comissão de Constituição e Justiça, só foi possível, mesmo com a ajuda do Relator, colocar no Orçamento R$50 milhões. Mas eu ficava imaginando: R$50 milhões vão começar esse processo. Vamos desapropriar algumas propriedades e vamos fazer disso a referência de como será esse processo de demarcação. E a expectativa toda é essa. É muito difícil. É necessário, de um lado, segurar produtores rurais e, do outro, também os índios, que estão lá há 20 anos, 30 anos. E há gente que fica insuflando, dizendo: “Vocês têm que invadir, a terra é de vocês!” É claro que isso cria uma expectativa para os índios. E o produtor rural diz: “Daqui, eu não saio. Eu não roubei, não invadi; eu comprei essas terras.” Tenho alertado quanto a isso aqui. Recentemente, um jovem índio de 15 anos foi morto numa situação como essa. O enfrentamento entre índios e produtores rurais é uma coisa quase iminente. Muito bem. Fomos ao Ministro da Justiça, fomos à Presidente da Funai e, recentemente, à Ministra Gleisi.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Waldemir Moka (Bloco/PMDB - MS) - Penso que o mínimo que a Presidência da Funai tem que ter é bom senso e parar com o processo de demarcação. Ora, se não há dinheiro para demarcar nem aquilo que está lá, por que ela tem que assinar outro, Senador Valdir Raupp? A informação que eu tenho é que esse grupo de trabalho que está indo para lá tem a pretensão de demarcar mais 70 mil hectares. Onde vamos parar com isso? O que pretende esse pessoal? Eu chego a dizer que esse é um ato de irresponsabilidade. Mas nós convidamos o Ministro da Justiça na Comissão de Agricultura - ele tem que vir - e também a Presidente da Funai. Esta Casa não pode se omitir. Temos de colocar um basta nisso, porque chega às raias da irresponsabilidade estimular conflitos desnecessários entre produtores e população indígena. Esse é o meu aparte. Agradeço a V. Exª.

            O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco/PSDB - MS) - V. Exª, Senador Moka, o aparte não só enriquece o meu pronunciamento, mas também reitera muitas das coisas que eu já afirmara. Reconheço em V. Exª a maior autoridade neste Parlamento sobre a questão indígena em nosso Estado.

            V. Exª tem toda razão. Não retiro uma letra das afirmações que V. Exª fez. Estou perfeitamente solidário e agradeço, sinceramente, o esclarecedor aparte de V. Exª.

            Ouço o eminente Senador Valdir Raupp.

            O Sr. Valdir Raupp (Bloco/PMDB - RO) - Nobre Senador Ruben Figueiró, V. Exª aborda um tema explosivo - podemos chamar assim - em nosso País, e o aparte do Senador Moka veio contribuir com esses esclarecimentos. O meu Estado tem muitas reservas indígenas, em torno de 17 etnias, 17 reservas indígenas, algumas até com cinco milhões de hectares. São três milhões de hectares na reserva dos Cinta Larga; cinco milhões na dos Uru-Eu-Wau-Wau e há muitas outras quase desse tamanho. Não temos tido grandes conflitos. No passado, criaram mais uma reserva para um único índio isolado! Até aí, tudo bem! Pegaram fundiários de fazendas no sul do Estado, conseguiram diárias de preservação e criaram uma reserva de 50 mil hectares para um único índio. Até aí, tudo bem! Agora, estão querendo demarcar mais uma área na região de São Francisco, Seringueira, São Miguel, em torno de 60 mil hectares, e não há nenhum índio! Estão tentando buscar descendentes de uma tal etnia Puruborá, cadastrando pessoas para ir para essa reserva e desalojando 1,5 mil produtores rurais assentados pelo Incra. Agora, são pequenas propriedades de 21 alqueires de 50 hectares. Então, como se pode conceber isso, se o Incra distribuiu a terra, titulou a terra para 1,5 mil famílias? Agora querem criar uma reserva indígena, porque dizem que por ali passou a etnia Puruborá. Estão cadastrando gente da cidade de Guajará-Mirim, de Porto Velho, porque dizem que são descendentes dessa etnia. Aonde nós chegamos! Acho que esse assunto tem que ser trazido para o Congresso. E a Funai, a exemplo do Incra... Com todo respeito, o Incra foi um dos órgãos mais importantes do Brasil, mas ele envelheceu, ele desaparelhou, e o Presidente Lula teve que criar outro instituto, chamado Terra Legal, para poder regularizar terras no Brasil, porque o Incra não estava dando mais conta. O Incra agora está se renovando, está melhorando internamente. Mas eu digo que a Funai envelheceu, não está mais cumprindo a sua função. Ou se repensa, ou se renova a Funai, ou se trazem essas questões fundiárias de reservas indígenas para o Congresso Nacional. Acho que era isso que nós deveríamos ter feito para que essas discussões fossem feitas aqui. Se tiver que desapropriar uma área, tiver que ampliar uma área, atingindo famílias que estão lá há 30, 40, 50 anos, não é admissível essa questão. Meus parabéns a V. Exª pelo pronunciamento.

            O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco/PSDB - MS) - Muito obrigado a V. Exª, que reforça, sem dúvida alguma, com a experiência que V. Exª tem no Estado de Rondônia, aquilo que estamos afirmando aqui.

            E V. Exª ressaltou um assunto muito importante. Essas questões, a que inclusive vou-me referir no meu pronunciamento, têm que passar pelo alvedrio do Congresso Nacional. O Congresso Nacional, sobretudo o Senado, não pode ficar indiferente às decisões do Poder Executivo com relação às desapropriações.

            Muito grato a V. Exª pelo seu esclarecedor aparte.

            Senador Sérgio.

            O Sr. Sérgio Souza (Bloco/PMDB - PR) - Senador Ruben Figueiró, serei bem rápido, sabendo que o seu tempo já está se encurtando.

            O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco/PSDB - MS) - Mas nós contamos com a tolerância do nosso Presidente.

            O Sr. Sérgio Souza (Bloco/PMDB - PR) - E sempre benevolente, nós sabemos, ainda mais para temas como esse, que é nacional. Não é um tema do Mato Grosso do Sul, do Paraná, do Rio Grande do Sul, de Rondônia, do Mato Grosso; é um tema brasileiro. Eu tenho para mim que tudo isso foi terra de índio um dia, antes de nós chegarmos aqui, mas veio a colonização. Hoje nós já somos quase 200 milhões de habitantes e temos o maior respeito pelas etnias. Nós sabemos que precisam ser demarcadas as reservas, mas a demarcação não pode ser feita da forma como está sendo feita no Brasil hoje. Nós não podemos, inclusive, ficar reféns do Poder Judiciário para fazer aquilo que é de competência do Governo e, às vezes, do próprio Legislativo. Hoje, o Judiciário, depois de demarcar aquela área toda, lá em Roraima, da comunidade Raposa Serra do Sol, ainda não julgou os embargos de declaração. Se os embargos de declaração vão ter os efeitos modulares para as demarcações futuras, nós precisamos inclusive ir até lá. Mas queria, rapidamente, dizer a V. Exª que este assunto tem que envolver todos os Poderes. O Poder Judiciário, no âmbito da sua competência. O Poder Executivo mostrou vontade naquela reunião em que, juntamente com V. Exª, estavam mais alguns Senadores, onde estavam presentes a Ministra Izabella Teixeira, a Ministra Gleisi Hoffmann - a audiência foi na Casa Civil -, o Ministro da Justiça Eduardo Cardozo, a Ministra Miriam Belchior, do Planejamento. Então, quatro Ministros numa mesma reunião para tratar desse tema. O Governo tem a sensibilidade, eu percebi isso. Agora, precisamos dar um encaminhamento rápido. No meu Estado, o Estado do Paraná, estão vindo cidadãos paraguaios...

(Soa a campainha.)

            O Sr. Sérgio Souza (Bloco/PMDB - PR) - ... porque falam guarani, dizendo que são índios; e no rio não interessa a divisa, eles são índios da América Latina como um todo e estão invadindo. Porque, a partir do momento em que um antropólogo publica um relatório há uma sinalização de que aquela região pode ser terra indígena, há uma movimentação de milhares e milhares de índios e não índios que estão indo lá com essa expectativa de adquirir terras, terras de alto valor. A terra no Paraná é, em média, R$100 mil o alqueire naquela região - olha que isso é muito dinheiro. Qualquer mil alqueires e estamos falando em R$100 milhões. Qualquer reserva tem isso - nós sabemos - ou daí para mais. Então, é até mesmo um movimento mais econômico do que às vezes social. Nós temos que tomar cuidado e é isso que o senhor está trazendo aqui: temos que chamar a responsabilidade dos três Poderes para resolver isso o mais rápido possível. Parabéns. Obrigado. 

            O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco/PSDB - MS) - Muito obrigado, Senador Sérgio Souza.

            Realmente, Sr. Presidente, as contribuições que acabamos de ouvir através dos apartes dos nossos ilustres pares demonstram a preocupação que existe aqui no Senado Federal com relação a esta questão.

            Agradeço a todos os Srs. Senadores aparteantes pela oportuna opinião que ofereceram, com a qual enriqueceram meu pronunciamento.

            Sr. Presidente, sei que o meu tempo está se esgotando, mas permita-me V. Exª que eu faça os esclarecimentos finais. Uma das saídas para solucionar a questão será a votação da PEC 215, proposta no ano 2000. A proposta contida no âmago dessa nova regra pode ser um ponto importante de se estabelecer uma ordem no caos reinante: o decreto presidencial que fosse homologar terras indígenas teria que ser confirmado pelo Congresso Nacional - como afirmou V. Exª.

(Soa a campainha.)

            O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco/PSDB - MS) - Reconheço que não é fácil a solução, mas nada justifica sermos inertes enquanto a violência campeia em nosso território sob a influência de tantos interesses estranhos que nos domina e nos manipula. O único caminho possível para a paz é o da legalidade. A obediência às leis será sempre o estuário da superação dos conflitos.

            Por laços familiares antigos, Sr. Presidente. tenho sangue guarani correndo em minhas veias.

            Sei do drama que vivem meus irmãos índios e sei do medo que tomou conta da classe produtora de meu Estado.

            Peço à Presidência da República e ao Ministério da Justiça que ajam com clarividência nesse processo. Não haverá paz enquanto o Governo não encontrar o justo equilíbrio entre as partes. Quando eu digo Governo, refiro-me aos três Poderes. Sem isso, tudo será em vão, tudo será inócuo, não se fará justiça.

            Srªs e Srs. Senadores, quero reiterar, mais uma vez, a reunião que mantive na semana passada com uma comissão de indígenas de várias etnias lá em Campo Grande, meu Estado. Pediram-me o encontro porque alguém, naturalmente mal-intencionado, teria dito que eu havia pregado, desta tribuna, a extinção da Funai.

            Respondi-lhes enfática e categoricamente, e reafirmo aqui, com o respeito que tenho a V. Exªs, que, lembrando o Marechal Cândido Rondon, símbolo eterno da proteção aos seus irmãos índios, jamais pensei na extinção da Funai.

            Gostaria, sim, que a Funai fosse um órgão como sonhou Rondon. Depois do que ouvi na reunião com os índios, do abandono em que eles se encontram, relegados pela Funai, que, por sinal, vive à míngua de recursos lá no meu Estado, o melhor seria que a autarquia tivesse os olhos mais atentos do Palácio do Planalto.

(Soa a campainha.)

            O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco/PSDB - MS) - Penso que a Funai deveria estar diretamente ligada à Presidência da República, como, aliás, são os vários órgãos que atendem às minorias sociais, ou seja: a Secretaria de Direitos Humanos, a Secretaria de Políticas para as Mulheres e a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial.

            Está provado, nobres colegas, que, sob o âmbito do Ministério da Justiça, a Funai - repito: sob o âmbito do Ministério da Justiça - não passará do que é hoje: um instrumento de ação político-ideológica. Fica, pois, aqui esta sugestão, a título de advertência.

            Agradeço, Sr. Presidente, a boa vontade de V. Exª de permitir que o meu pronunciamento se alongasse tanto e sou profundamente grato aos ilustres Senadores aparteantes.

            Obrigado a V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/03/2013 - Página 11855