Discurso durante a 42ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Apelo em favor da célere ratificação, pelo Brasil, do tratado que regulamenta o comércio internacional de armas.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA, COMERCIO EXTERIOR, SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Apelo em favor da célere ratificação, pelo Brasil, do tratado que regulamenta o comércio internacional de armas.
Publicação
Publicação no DSF de 05/04/2013 - Página 15813
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA, COMERCIO EXTERIOR, SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • REGISTRO, ELOGIO, DECISÃO, ASSEMBLEIA GERAL, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), APROVAÇÃO, TRATADO, REGULAMENTAÇÃO, COMERCIO EXTERIOR, ARMA, OBJETIVO, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, SETOR, ANALISE, VOTAÇÃO, PROPOSTA, COMENTARIO, IMPORTANCIA, PROJETO, COMBATE, VIOLENCIA, EXPECTATIVA, ORADOR, AGILIZAÇÃO, EXECUTIVO, LEGISLATIVO, RATIFICAÇÃO, ACORDO, AMBITO NACIONAL.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, meu caro Senador Paulo Paim, Presidente desta sessão.

            Fiquei muito tocado pela generosidade das suas palavras. Tenho tido a oportunidade de compartilhar com V. Exª muitas e muitas lutas relevantes e importantes para o povo trabalhador do nosso País.

            Sr. Presidente, tenho ocupado esta tribuna muitas vezes, entendendo que deve ser este o nosso primeiro compromisso, a nossa primeira obrigação: trabalhar pelos nossos Estados, para defender os nossos Municípios. Isso faz parte de um compromisso fundamental de todos nós que chegamos aqui. Tenho feito aqui, no Senado, permanentemente, a defesa do meu Estado, o Estado do Espírito Santo, na certeza de que existe o todo, mas que o todo é composto pelas partes, e as partes justificam a nossa presença aqui.

            Mas a minha presença hoje na tribuna, Sr. Presidente, não é para defender o meu querido e glorioso Espírito Santo, a minha terra e a minha gente, os capixabas. A minha presença hoje na tribuna do Senado da República se justifica não apenas pelo fato de ser Senador, mas também pelo fato de ser um cidadão que preside a Comissão de Relações Exteriores desta Casa: é para saudar uma luta civilizatória, uma luta na direção e no caminho da promoção da cultura da paz.

            Refiro-me, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, à decisão da Assembleia Geral das Nações Unidas, decisão tomada na última terça-feira, uma decisão histórica, aplaudida por organizações de direitos humanos e de controle de armas no mundo inteiro. Sr. Presidente, a ONU aprovou, por maioria esmagadora de votos, o primeiro tratado - pasmem, mas é o primeiro tratado - para regular o comércio internacional de armas convencionais. Isso inclui, evidentemente, desde armas leves, de pequeno porte, até mísseis, tanques, navios, e assim por diante. O objetivo é dar mais transparência ao mercado poderoso. Poderoso, Sr. Presidente, e perigoso, estimado em mais de US$70 bilhões por ano. Um mercado que não obedece hoje a qualquer tipo de regulação internacional.

            Para que possamos ter uma ideia do que isso significa, vale repetir aqui a expressão usada recentemente pelo Coordenador do Instituto Sou da Paz, Daniel Mack: “É mais fácil exportar mísseis do que vender mandioca no mercado internacional”.

            O documento aprovado, Sr. Presidente, na ONU, por 154 votos a favor, 3 contrários e 23 abstenções, coloca o dedo direto na ferida, ao proibir a venda de armas a países que possam usá-las em genocídios, crimes contra a humanidade, alvos civis, crime organizado e outras violações à Convenção de Genebra, a convenção que regula as leis de guerra desde 1949.

            Sr. Presidente, a aprovação do Tratado de Comércio de Armas põe fim a sete longos anos de negociação no âmbito das Nações Unidas. Também responde às pressões crescentes de entidades não governamentais e de parcela expressiva da opinião pública mundial, que, desde a primeira Guerra do Golfo, em 1991, vem cobrando, de forma insistente, dos governos a adoção de regime regulatório para o comércio de armas e munições.

            O Brasil, que desempenhou papel de reconhecido protagonismo durante as negociações, juntou-se à maioria que aprovou o tratado. Os Estados Unidos, maiores exportadores mundiais de armas, comemoraram a aprovação. Outros grandes exportadores, entretanto, como China, Índia e Rússia, abstiveram-se nessa votação.

            Os votos contrários - poucos, é verdade - vieram, por motivos óbvios, da Coreia do Norte, do Irã e da Síria, três países envolvidos em sérios conflitos internacionais. Os três haviam impedido a aprovação da medida por aclamação, na semana anterior. Foi por isso que a matéria acabou submetida a voto nessa terça-feira. E a diplomacia brasileira teve um papel importante, relevante, foi decisiva e protagonista na consolidação desse importante tratado, um tratado que tem a ver com a vida.

            Chega a ser assustador o fato de o comércio de armas letais convencionais não estar submetido a algum tipo de regulação internacional. Afinal, há muito tempo, a comunidade internacional vem procurando avançar na construção de uma ordem mundial pautada por regras e limites que nos afastem da barbárie, ampliando o processo civilizatório da humanidade, promovendo a paz e a segurança, os direitos humanos e o desenvolvimento.

            Apesar de ainda convivermos, em tantas regiões, com a força bruta das guerras, dos conflitos e do terrorismo, a realidade é que temos progredido nessa desafiadora obra de ordenamento jurídico-político internacional, passando pelo direito humanitário, pelo direito da guerra, pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, pela própria constituição de organismos internacionais como a ONU, até chegar aos regimes de não-proliferação de armas de destruição em massa - as armas nucleares, químicas e biológicas.

            O certo é que os armamentos convencionais são responsáveis por centenas de milhares de mortes todos os anos - em guerras civis e conflitos de todo gênero, em ações terroristas e na criminalidade comum que destrói vidas e propriedades em nosso País e mundo afora, armas que no dia a dia têm sido a razão de tanta tristeza, de uma criminalidade e uma violência nas nossas cidades brasileiras. No núcleo, no centro da escalada da violência em nosso País está exatamente o tráfico de drogas, o tráfico de armas, criando um barril de pólvora nas relações dos seres humanos.

            Mesmo assim, foi necessária, imaginem, uma longa negociação para que o tratado de comércio de armas fosse assim aprovado na ONU. E o texto final, Sr. Presidente, Senador Paulo Paim, embora considerado histórico, já é alvo de críticas, particularmente por não prever punições aos países que não cumprirem o esse acordo que foi firmado.

            Cabe ressaltar que é responsabilidade de cada país exportador identificar os riscos da utilização dos armamentos vendidos.

            É também generalizada a preocupação com as dificuldades que os EUA deverão enfrentar no processo de autorização do Congresso para ratificar o tratado que ajudaram a aprovar. Afinal, é notória a influência, é conhecida a influência do Iobby da arma naquele país, cuja Constituição assegura o direito ao porte de arma a seus cidadãos, o que é objeto de grandes debates que dividem a sociedade norte-americana e que tem sido alvo de preocupações, de manifestações e ações do Presidente, grande Presidente, Barack Obama. Será uma difícil batalha política a aprovação legislativa do Tratado de Comércio de Armas, portanto, no Congresso americano.

            Vale observar, Sr. Presidente, que o tratado precisa ser ratificado por pelo menos 50 membros da ONU. Uma vez em vigor, constituirá norma universal de Direito Internacional Público, a ser respeitada por todos os países.

            Embora se imponha o reconhecimento de que o Direito Internacional Público, por se aplicar a Estados soberanos, não raro enfrente dificuldades para se efetivar, a verdade, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, brasileiros que nos acompanham pela TV Senado, pela Voz do Brasil, é que, já a partir de sua aprovação na terça-feira, por margem tão expressiva, os padrões que o novo tratado introduz já servirão para que a sociedade e a opinião pública internacional passem a se engajar na militância, na cobrança de uma nova postura por parte dos governos nacionais.

            Na prática, alguns dos elementos mais significativos do novo tratado, particularmente a exigência de transparência e de responsabilização pelas implicações das vendas de armas e munições, poderão começar a ser cobrados imediatamente, antes mesmo da entrada em vigor formal do novo instrumento multilateral, a partir do controle social, cidadão, que nos Estados nacionais precisam cada vez mais ser intensificados e implementados.

            Entre os mecanismos inovadores, Sr. Presidente, que o tratado estabelece destaca-se a necessidade de que as exportações de armamentos e munições sejam objeto de relatórios circunstanciados que serão regularmente submetidos a instâncias próprias da ONU, que, por sua vez, divulgará o resultado de suas análises, a veracidade dos relatos, tornando públicas as listagens com os eventuais violadores, de modo que a opinião pública nacional e internacional possa não apenas acompanhar, mas cobrar, cobrar intensamente. Governos e empresas serão responsáveis pelas informações prestadas, que terão caráter público e que ensejarão responsabilização direta, caso se descumpra o mandamento de que produtores, vendedores possam determinar o destino exato e o uso final a ser dado aos produtos vendidos, assim, limitando a possibilidade de que armas e munições caiam em poder de criminosos, terroristas e, de uma forma geral, bandidos.

            Para o Brasil, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que é assolado por crescente onda de violência, que choca a sociedade, causando perdas, angústia, sofrimento em tantas famílias em nosso País, prejuízos e devastações, além de muito macular a nossa imagem mundo afora, o tratado aprovado pela ONU, esta semana, acho eu que deve ser saudado como um passo significativo. Evidentemente, um passo ainda que não tem a dimensão daquele de que nós necessitamos, um passo importante. Mas outros tantos passos terão que ser dados. Apesar de reconhecer isso como um fato importante, é verdade que também é uma decisão insuficiente.

            O tratado, enfim, Sr. Presidente, sobre o comércio de armas, que abrange desde mísseis, tanques, aviões de combate, até armamento leve, tudo isso é um instrumento de elevado conteúdo civilizatório. É isso que nós precisamos considerar e precisamos reverberar. Trata-se de uma oportunidade sem precedentes para afirmarmos nossa índole pacífica, nossas melhores tradições de País que prestigia o direito na construção de um mundo melhor.

Sr. Presidente, é nessa dimensão, é com essa convicção que, tendo a ONU aprovado esse tratado, tendo a missão diplomática e nosso País sido protagonistas dessa consolidação, o Congresso Nacional, o Senado e a Câmara, o Governo Federal, o Poder Executivo, o Brasil precisa ser um dos primeiros países a consolidar, a ratificar esse tratado. Por isso, o meu apelo; por isso faço aqui minha manifestação ao Poder Executivo, a Sua Excelência, Presidente Dilma, para que possa rapidamente enviar esse tratado ao Congresso brasileiro, e o Congresso brasileiro, a partir de suas Casas, da Câmara e do Senado, possa ratificar esse tratado e, com essa ratificação, firmar mais um decisivo e definitivo comprometimento na linha, na direção e no caminho da cultura da paz.

            É a manifestação, Sr. Presidente, que faço, saudando, de maneira efusiva, esse que considero um avanço importante, que foi consolidado essa semana pela Organização das Nações Unidas.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

            Muito obrigado, Srªs e Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/04/2013 - Página 15813