Discurso durante a 52ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro do transcurso de dezessete anos do massacre ocorrido em Eldorado dos Carajás-PA; e outros assuntos.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM, POLITICA FUNDIARIA.:
  • Registro do transcurso de dezessete anos do massacre ocorrido em Eldorado dos Carajás-PA; e outros assuntos.
Publicação
Publicação no DSF de 18/04/2013 - Página 19504
Assunto
Outros > HOMENAGEM, POLITICA FUNDIARIA.
Indexação
  • REGISTRO, OCORRENCIA, ANIVERSARIO DE MORTE, PARTICIPANTE, CONFLITO, REFORMA AGRARIA, MUNICIPIO, ESTADO DO PARA (PA).
  • REGISTRO, LANÇAMENTO, PUBLICAÇÃO, CONFLITO, CAMPO, REFERENCIA, DADOS, LUTA, TERRAS, AGUA, PAIS, ENFASE, AUMENTO, QUANTIDADE, HOMICIDIO, REFORMA AGRARIA.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Senadora Ana Amélia, Srªs e Srs. Senadores, quero, em primeiro lugar, aqui dar as boas-vindas ao Presidente do Tribunal Regional Federal, da 3ª Região, Newton De Lucca, que se faz acompanhado da Desembargadora Federal Regina Helena Costa, também do mesmo Tribunal Regional Federal, da 3ª Região, ele que é de São Paulo. Seja muito bem-vindo aqui. Eu terei o prazer de dar apoio à indicação que pleiteia hoje.

            Eu gostaria, Srª Presidenta, assinalar algo, uma tragédia que ocorreu há 17 anos, em 17 de abril de 1996, quando houve uma ordem para evacuar, a todo custo, a estrada PA-150, epicentro de agitação pela reforma agrária.

            Fabíola Ortiz, da Inter Press Service, em reportagem hoje elaborada e publicada de forma muito benfeita, recorda o que se passou:

Por volta das cinco horas da tarde do dia 17 de abril de 1996 (...) a ordem para evacuar, a todo custo, a estrada PA-150, epicentro de agitação pela reforma agrária. Nessa estrada que une a cidade de Marabá e Parauapebas, no sudeste do Estado, se concentravam os maiores projetos de mineração e pecuária. Nesse dia, em uma área conhecida como Curva do S, perto do Município de Eldorado dos Carajás, a 800 quilômetros da capital do Pará, Belém, 150 policiais abriram fogo contra cerca de mil manifestantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST) que bloqueavam a passagem.

Dezenove pessoas morreram e 70 ficaram feridas. Os manifestantes se dirigiam a Belém para cobrar a expropriação da Fazenda Macaxeira, que já era ocupada por 1.500 famílias de Curionópolis, perto de Eldorado, e a distribuição de suas terras na reforma agrária. A tragédia colocou o problema agrário na agenda política do País, e o dia 17 de abril se converteu em Dia Mundial de Luta pela Terra.

             

            Não é à toa, portanto, que, hoje, centenas de trabalhadores rurais sem terra, do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra - quando, por exemplo, eu estava a caminho do Senado, pude observar que havia ali uma grande passeata -, estavam esses trabalhadores do MST se dirigindo à Esplanada, diante do Palácio do Planalto. Percorreram as vias que dão junto ao Congresso Nacional e, depois, se concentraram perante o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal, na Praça dos Três Poderes.

            Ainda hoje de manhã, por requerimento do Senador Randolfe Rodrigues, na Comissão de Direitos Humanos, presidida pela Senadora Ana Rita, ali estiveram falando os representantes da Comissão Pastoral da Terra, do MST, da Contag, de diversas organizações de trabalhadores rurais, e o representante do Incra, que justamente relembraram esse episódio e a luta pela reforma agrária.

            E continua a reportagem:

Este ano, se completam 17 anos do massacre e 15 da criação do Assentamento 17 de Abril, que fez justiça ao que era reclamado. O Assentamento foi fundado quase dois anos depois do massacre, quando o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) declarou improdutiva a fazenda, condição necessária para a sua expropriação. Cerca de 700 famílias sobreviventes moram hoje no acampamento de 27 mil hectares da fazenda Macaxeira e lutam para sobreviver sem empregos nem apoio para tornarem suas áreas produtivas.

Ivagno Brito, filho de camponeses, tinha 13 anos quando testemunhou os fatos. Hoje, com 30, dedica-se à causa do MST. “Foi um desespero e uma loucura. Imagine muita gente e fogo cruzado. A cena que mais me marcou foi ver mulheres e crianças se escondendo em uma pequena capela que hoje não existe mais”, contou Brito à Inter Press, apontando para o lugar exato do massacre na Curva do S. “Não posso esquecer. Desmaiei, não encontrava meu pai e comecei a correr. Logo me vi no meio do mato”, acrescentou.

Maria Zelzuita, de 48 anos, também foi parte da tragédia: “Queriam que desocupássemos a estrada, mas estávamos a pé. A forma que a polícia encontrou foi atirar contra nós. O que não esqueço são os gritos das pessoas e das crianças, chamando por suas mães”, contou. “Já havia gente morta sobre o asfalto, peguei a mão de quatro crianças para salvá-las. Saí da estrada, correndo para os arbustos. Carregamos inclusive uma criança baleada”, afirmou.

Zelzuita tem um lote de 25 hectares onde cultiva arroz, mandioca, milho e abóbora. Mas os anos mostraram que não basta repartir terras, se não forem fornecidos instrumentos e conhecimentos para desenvolver uma agricultura sustentável. Ela trabalha em associação com a aldeia dos assentados, ganha a vida como ajudante de cozinha na escola local, estuda e é mãe sozinha de três filhos. Em sua casa tem água encanada e eletricidade.

"Me sinto feliz como assentada; tenho onde viver e criar meus filhos. Antes não tinha, e não me vejo na cidade. Mas aqui não há trabalho e muitos precisam partir para as cidades em busca de sustento", explicou Zelzuita à IPS. Diante destas dificuldades, muitos assentados pelo Incra venderam seus lotes e foram embora. A comercialização dos assentamentos é um fenômeno frequente no Pará.

Aos 49 anos, “dona” Rosa Costa Miranda não pensa em deixar o campo, mas, superada pelo esforço de cultivar uma horta em um solo tão pobre, decidiu arrendar a área para criação de gado.  “Hoje tenho um lote e uma casa.  Não produzo quase nada porque sou sozinha, mas alugo a terra.  A vida no assentamento é difícil porque não há trabalho.  Tem gente endividada com o banco sem ter como pagar”, contou à Inter Press Service.

Dona Rosa nasceu no Maranhão, no extremo nordeste.  Aos 16 anos se mudou para o Pará com o marido agricultor.  Ela estava presente na ocupação da fazenda, e no dia do massacre foi uma das mulheres que se esconderam na pequena igreja. Há pouco tempo conseguiu dinheiro para plantar cupuaçu. Mas o fogo que seus vizinhos colocaram em uma área adjacente - prática frequente para limpar e fertilizar o terreno - fugiu ao controle e queimou as plantas.

Apesar das dificuldades, “é melhor viver na periferia do que nas cidades ou favelas.  Quem tem um pedaço de terra hoje está seguro.  Não penso em mudar.  A rua é muito perigosa”, afirmou dona Rosa. As expropriações de fazendas são lentas e podem demorar até uma década.  Para o assentamento 17 de Abril, a expropriação foi obtida “dois anos depois (do massacre) em razão do derramamento de sangue.  Há acampamentos que estão esperando há 12 anos e para eles a reforma agrária nunca chega”, pontuou.

A Amazônia já não é o que era quando ela veio do Nordeste.  Para chegar ao 17 de Abril, é preciso cruzar pequenas aldeias e zonas urbanas que crescem ao lado da estrada, como Sororó, Eldorado dos Carajás e Curionópolis, centros de grande circulação de caminhões carregados de minérios.

Pela antiga estrada PA-150, hoje a estrada federal asfaltada BR-155, se passa perto do distrito industrial de Marabá, que conta com 12 siderúrgicas e grandes propriedades pecuárias, tudo em plena Amazônia. Dali se divisa uma paisagem sem uma única árvore, apenas pastagens. “Está mudando muito, por isso estamos morrendo de seca. Daqui a alguns anos não haverá nem chuva, porque não há árvores”, lamentou dona Rosa.

            Quero registrar que a Comissão Pastoral da Terra lançará, no dia 22 de abril, segunda-feira próxima, a publicação Conflitos no Campo Brasil 2012, onde narra que o número de casos de mortes cresceu de 29, em 2011, para 36 mortes, em conflitos no campo, no ano passado.

            A Região Amazônica concentra casos de assassinatos por conflitos agrários. Os números de violência no campo, em 2012, superaram os índices do ano anterior. Um balanço preliminar da CPT mostrou que 36 pessoas morreram no ano passado em razão de conflitos agrários...

(Interrupção do som.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - ... o que representa o aumento de 24% em relação a 2011, quando houve 29 casos.

            Ressalta a CPT que a impunidade tem sido um dos fatores que mais contribui para o aumento dos números.

(Soa a campainha.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - “De 1985 até hoje, tivemos 1.566 mortes no campo. Desses casos, apenas 72 foram a julgamento.”

            Eu gostaria aqui, Srª Presidenta, de registrar o balanço efetuado pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário, de 1994 a 2012, de assentamentos de trabalhadores rurais, que passaram de 2.226, em 1994; 2.410, em 2002; 3.271, em 2012; num total geral de 132.119.

            Então, peço a gentileza de transcrever aqui esses dados sobre propriedade e posse...

(Interrupção do som.)

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - ...dados do próprio Ministério do Desenvolvimento Agrário e Reforma Agrária, bem como esta reportagem da CPT, na íntegra, cujos dados eu mencionei.

            Muito obrigado, Senadora Ana Amélia.

 

DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inseridos nos termos do art. 210, inciso I e §2º, do Regimento Interno.)

Matérias referidas:

- CPT: Violência no campo cresce 24% em 2012, aponta Pastoral da Terra;

- Inter Press Service: Sobreviventes de Eldorado dos Carajás enfrentam outra extinção.

- Assentamentos de Trabalhadores Rurais - Números Oficiais.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/04/2013 - Página 19504