Discurso durante a 53ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Cumprimento aos povos indígenas pelo transcurso do Dia do Índio; e outro assunto.

Autor
Jorge Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Jorge Ney Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO ESTADUAL, ATUAÇÃO. HOMENAGEM, POLITICA INDIGENISTA. :
  • Cumprimento aos povos indígenas pelo transcurso do Dia do Índio; e outro assunto.
Aparteantes
Flexa Ribeiro.
Publicação
Publicação no DSF de 19/04/2013 - Página 19923
Assunto
Outros > GOVERNO ESTADUAL, ATUAÇÃO. HOMENAGEM, POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • REGISTRO, VISITA, GOVERNADOR, MUNICIPIOS, ESTADO DO ACRE (AC), TIÃO VIANA, BRASILIA (DF).
  • SAUDAÇÃO, COMUNIDADE INDIGENA, MOTIVO, DIA NACIONAL, INDIO, DEFESA, NECESSIDADE, IMPLANTAÇÃO, POLITICA INDIGENISTA, OBJETIVO, PROTEÇÃO, RESERVA INDIGENA, IMPORTANCIA, PRESERVAÇÃO, VIDA, CULTURA, COMENTARIO, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, ORADOR, RELAÇÃO, ASSUNTO.

            O SR. JORGE VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, caro Presidente, caro colega, Senador Eduardo Suplicy, que preside a sessão. Pedi que V. Exª assumisse a Presidência dos trabalhos, na Mesa do Senado, para que eu pudesse vir aqui, mesmo que de maneira breve, vir à tribuna para poder cumprir uma das missões que tenho como Senador, que é a de procurar representar o generoso povo acreano, o meu querido Estado do Acre.

            Já terei uma reunião, como atribuição da Vice-Presidência, para tratar do plano de saúde da Casa. Por isso, estou fazendo uso da palavra de maneira muito breve.

            Nesta semana, Sr. Presidente, recebemos aqui em Brasília e no Senado - e quero fazer o registro agora da tribuna, como fiz do plenário - a presença do Governador do Acre Tião Viana, meu irmão e ex-Senador da República.

            Ele veio aqui e foi cortejado, cumprimentado pelos funcionários, desde o mais simples servidor desta Casa, dos ascensoristas de elevador, do pessoal que nos servem com carinho o cafezinho, a água, todos que dão suporte à Mesa. Os funcionários desta Casa receberam o Governador Tião Viana com amizade e carinho, porque ele construiu essa relação de amizade e carinho.

            Os colegas Senadores e Senadoras também o acolheram aqui neste plenário e vieram, um após o outro, cumprimentar e abraçar o Governador do Acre e, ao mesmo tempo, falar da relação respeitosa de amizade que foi construída quando ele ocupou com tanta honradez a tribuna do Senado Federal como membro da Bancada do Acre.

            Mas, Sr. Presidente, o Governador passou dois dias aqui. Eu acompanhei em uma parte da agenda, a outra não foi possível. O Senador Anibal Diniz esteve o tempo inteiro acompanhando o Governador.

            Eu, pelas atribuições que tenho como Vice-Presidente da Casa, de participar de reuniões, das comissões e dar conta do meu mandato, procuro me dividir, como V. Exª faz, assim como outros aqui nesta Casa, em muitos, contanto sempre com a assessoria, para poder dar conta do trabalho que se avoluma.

            Eu dobrei o trabalho, mas uma parte desse trabalho que não é visível. Quando estou presidindo é visível, mas, agora mesmo, vou sair para uma reunião para tratar de questões que são fundamentais para o bom funcionamento do Senado Federal, como atribuição que a Mesa Diretora me passa.

            Mas eu também queria dizer que o Governador Tião Viana fez uma agenda intensiva aqui. Aliás, como tem feito no Governo do Estado. Hoje, ele está indo para o Juruá. Ele vai fazer uma agenda anunciando investimentos, fiscalizando obras e desenvolvendo uma série de atividades da maior importância para a população de Cruzeiro do Sul, da Rodrigues Alves, de Mâncio Lima, de Thaumaturgo e de Porto Walter.

            E também, na semana, na véspera do Dia do Índio, o Governador Tião Viana estará assinando junto com o Secretário Edgard, com a coordenação indígena do Governo - que foi criada ainda na minha época de Governador, a Secretaria dos Povos Indígenas -, estará assinando uma série de medidas que levam benefícios diretamente às população indígena do Estado do Acre.

            E é nesse aspecto, Sr. Presidente, que eu queria - já que amanhã eu não poderei fazê-lo aqui, por conta de compromisso de agenda - cumprimentar todos os povos indígenas do Brasil. E, de alguma maneira, falo aqui, sem nenhum proselitismo, mas acho que nós ainda seguimos tendo que pedir desculpas aos povos indígenas pela maneira, não só do Brasil, mas do mundo inteiro... Talvez o maior exemplo de agressão aos povos indígenas seja os Estados Unidos. O nosso País, ao contrário, em muitos aspectos é até uma referência positiva. Mas nós ainda temos uma dívida enorme com esse povo.

            No Acre, a gente desenvolveu um trabalho ao longo desses anos que, de alguma maneira, resgatou a dignidade e o respeito à cultura, à história desses povos. Mas os conflitos ainda estão em um nível que não é bom, nem para os não índios e muito menos para os índios.

            E acho que o fundamental é que construamos todos um propósito de tratar com respeito, de estabelecer adequadamente aquilo que é de direito desses povos para conservar e manter sua cultura; mas, também, ao mesmo tempo, não tratar isso como um instrumento de enfrentamento ideológico ou político. Não. Tem que ser uma decisão de Nação brasileira.

            Eu tenho uma relação ótima com os povos indígenas. Quando estou nas aldeias me sinto em casa, com segurança, no meio de parentes - como eles mesmos gostam de nos chamar.

            E é nesse sentido que venho aqui hoje - já que não posso fazê-lo amanhã - para cumprimentar esses brasileiros como nós, brasileiros originais, que têm uma cultura diferenciada e especial, pela passagem do Dia do Índio, pela Semana do Índio. E dizer que, com serenidade, mas com compromisso, nós devemos, sim, sempre procurar corrigir as distorções, corrigir os erros e, ao mesmo tempo, apontar um caminho que busque trazer a tranquilidade necessária.

            Ouço com satisfação, apesar do pouco tempo, o aparte do meu colega e colega de Mesa também Flexa Ribeiro, que tão bem representa o Pará nesta Casa.

            O Sr. Flexa Ribeiro (Bloco/PSDB - PA) - Senador Jorge Viana, serei breve, apenas para me acostar ao pronunciamento de V. Exª, parabenizando-o pela lembrança de hoje, já que amanhã não estaremos aqui também para festejar o Dia do Índio. Acho que V. Exª tem toda razão. Todos nós temos que respeitar as nossas origens e dar a todos os povos indígenas o tratamento que eles merecem. Às vezes, não recebem o tratamento devido pela Funai, mas isso é outro questionamento. Concordo com V. Exª também com relação à questão das terras indígenas, que devem ser respeitadas, que devem ser mantidas dentro das necessidades assim definidas. Eu apresentei uma PEC, que tramita no Congresso, não especificamente para terras indígenas, mas para quaisquer outras reservas que venham a ser criadas. Que elas sejam, primeiro, apreciadas pelo Congresso Nacional, e não mais por decreto do Executivo, de tal forma que a gente possa, antes de homologá-las, definir qual o impacto que elas trarão para aquelas pessoas que estão ocupando essas terras e a devida indenização pelo trabalho ali desenvolvido ao longo de décadas. Mas quero parabenizá-lo e dizer que todos nós temos que festejar o dia de amanhã pelas origens do nosso País.

            O SR. JORGE VIANA (Bloco/PT - AC) - Muito obrigado, Senador Flexa, pelo aparte.

            Eu queria, então, para concluir, Sr. Presidente, só dizer que hoje aprovei, com a contribuição do Senador Anibal Diniz, um voto de louvor, de agradecimento, na Comissão de Constituição e Justiça, à CPI - Comissão Pró-Índio do Acre. A Comissão Pró-Índio do Acre fez um trabalho extraordinário ao longo desses anos. Começou lá atrás ainda, num trabalho de cooperação com Chico Mendes; com o antropólogo Terri Aquino, que é um marco e já tem seu nome inscrito na história do resgate do respeito ao povo indígena acriano e brasileiro; com o sertanista Meirelles, que me deu o privilégio de ter a mais ousada relação com os povos indígenas.

            Quando Governador, Senador Flexa, eu saí de Rio Branco, voei duas horas num pequeno avião, desci numa tentativa de pista numa fazenda que já tinha sido usada, numa época, pelos traficantes de drogas - descemos no que sobrou da pista que a Polícia Federal havia deixado - e peguei uma embarcação, um barco com motor de 15HP e um pequeno casco de alumínio, sem nenhum tipo de conforto. Foram 14 horas de viagem para chegar até a cabeceira do Rio Envira, onde vivem os índios isolados.

            O que são índios isolados, gente? Não sei quem está me ouvindo pela Rádio Senado, quem está me assistindo pela TV Senado, mas as pessoas não acreditam que ainda existem hoje índios não contactados - índios isolados são índios não contactados. E eles felizmente hoje estão sendo mantidos isolados.

            Então, o trabalho que a Funai faz hoje, que é um trabalho do País, é manter essas populações isoladas. No caso do Acre, o sertanista Meirelles morava lá, onde hoje há uma base da Funai com seus funcionários para tentar evitar que brancos e não índios possam chegar próximo daquela região e para que os índios também possam sair sem haver conflito.

            E alguém vai dizer: “Mas por que não contactar rapidamente e apresentar para eles o celular, a água gelada, essas coisas todas sem as quais achamos que não conseguimos viver?” Porque eles conseguem viver sem absolutamente nada disso que achamos que é tão imprescindível para a vida.

            Sobrevoei essa área várias vezes e vi esses índios. O problema todo está na seguinte equação: historicamente, 70% desses índios morreriam nos primeiros três anos se o contato fosse feito. Então, vou repetir: se nós brancos ou não índios fizermos contato com índios não contactados, a tendência é que 70% deles venham a morrer nos primeiros três anos. São dados, são números. Por que isso? Porque nós, ao longo do tempo, com a morte de milhões, adquirimos imunidade para algumas doenças com que eles não têm contato, mas, também, não têm a imunidade. Vão pegar gripe e vão morrer. O filme Xingu mostra claramente isso.

            Então, enquanto não formos puros o suficiente para fazer contato com quem vive numa relação absolutamente harmoniosa com a natureza, o que fazer?

            Senadores e Senadoras, quando eu era Governador, eu fui lá e fiquei três dias sem poder contactar com nada. O pessoal achava até que o Acre ia ficar sem governador, porque não tinha mais como voltar e os índios tinham me encontrado.

            Depois, eu voltei de avião, e estava havendo conflitos entre brancos, ou seja, não índios e índios vizinhos àquela área. E os índios iam lá, os índios isolados, pegavam algumas ferramentas, cordas e levavam para suas áreas. Era basicamente isso.

            Conversando com Meirelles, o sertanista, eu falei: “Vai haver morte dos nossos índios.” Eu estou falando, Senador, de cerca de 500 índios isolados, que vivem no Acre, não contactados. “E como vocês sabem disso, se eles não são contactados?” Passando de avião, nas coordenadas que são sigilosas, é possível sobrevoar, identificar, ver e saber, pelo número de aldeias, mais ou menos quantos índios vivem ali. Eles não têm contato com nada disso que conhecemos. Nada! Absolutamente nada! São um patrimônio da Humanidade.

            E estava havendo uma visitação deles, de madrugada, para pegar ferramentas, cordas nas casas dos não índios vizinhos a quilômetros de distância. E, para evitar conflito, eu, Governador - lembro-me bem e orgulho-me de ter feito isso -, e o Meirelles definimos juntos, pois queríamos tentar resolver a situação.

            Eu falei: “Meirelles, nós vamos comprar machados, terçados ou facões, como alguns falam, enxadas, facas, cordas, enfim, ferramentas. Vamos ensacar tudo isso e contratar um avião. O avião vai passar e vai fazer chover essas ferramentas para eles lá.” Eu acho que até hoje eles estão querendo entender o que aconteceu, pois aquilo que eles estavam procurando longe, a quilômetros de distância, de uma hora para outra, caiu na aldeia. Aí, eles pararam de visitar os vizinhos, e, com isso, evitamos os conflitos.

            Então, na semana do índio, na véspera do Dia do Índio, que está chegando, eu queria, do fundo do coração, dizer que nós temos de tomar muito cuidado no trato da questão indígena, respeitando esses povos. Está havendo um rearranjo nas organizações deles na Amazônia. Foram cometidos muitos erros, sempre por ingerência política, com partidos políticos querendo filiar índio, movimentos de branco querendo fazer a condução do movimento indígena. Isso é péssimo! Não ganhamos, e, muito menos, os povos indígenas e o movimento indígena. Eu sempre procurei respeitá-los e aprender com eles.

            Este ano, certamente, vou visitar o Festival dos Yawanawás, vou aos Ashaninka. Eu já combinei inclusive com o grande músico João Donato, que, no ano que vem, completa 80 anos e quer fazer, nesses 80 anos, a aproximação com a musicalidade indígena.

            Então, para não terminar de uma maneira lamentável, queixando dos problemas, que são gravíssimos, eu quero dizer que, no Acre, a harmonia dos não índios com os índios vai acontecer, e vai sair certamente um bom material, produzido por João Donato - V. Exª sempre nos estimula tanto -, que possa expor para o Brasil, para os acrianos e para o mundo a beleza da cultura indígena, acriana, brasileira, da Amazônia.

            Então, parabéns a todos os nossos irmãos!

            Muito obrigado, Presidente, pela tolerância do tempo.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/04/2013 - Página 19923