Discurso durante a 61ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Saudação aos trabalhadores do País pelo transcurso, amanhã, dos 70 anos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT); e outro assunto.

Autor
Anibal Diniz (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Anibal Diniz
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. JUDICIARIO, LEGISLAÇÃO ELEITORAL.:
  • Saudação aos trabalhadores do País pelo transcurso, amanhã, dos 70 anos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT); e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 01/05/2013 - Página 22851
Assunto
Outros > HOMENAGEM. JUDICIARIO, LEGISLAÇÃO ELEITORAL.
Indexação
  • HOMENAGEM, DIA INTERNACIONAL, TRABALHO, DEFESA, CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT).
  • CRITICA, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), IMPEDIMENTO, TRAMITAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, PROJETO DE LEI, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, LEI ORGANICA DOS PARTIDOS POLITICOS.

            O SR. ANIBAL DINIZ (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Romero Jucá, Srs. Senadores, telespectadores da TV, ouvintes da Rádio Senado, faço hoje, nesta tribuna, uma saudação respeitosa a todos os trabalhadores do País e às centrais sindicais, nesta véspera do dia 1º de maio, que neste ano será marcado pela comemoração e reafirmação da defesa da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que está completando 70 anos desde sua promulgação e do estabelecimento de normas para regulação das relações individuais e coletivas de trabalho, entre patrões e empregados.

            Com a CLT, os trabalhadores brasileiros passaram a ter direito a grandes conquistas, entre elas a jornada diária de oito horas, férias de um mês por ano, repouso semanal remunerado, salário-mínimo, aposentadoria, previdência e direito à greve. A Consolidação das Leis do Trabalho constituiu um grande avanço nas relações entre empregado e empregador neste País e uma grande transformação do cenário trabalhista nacional.

            Para os especialistas, sem a CLT, o Brasil não teria visto o crescimento robusto da formalização do mercado de trabalho. Em dez anos, por exemplo, de 2001 a 2011, o número de empregados com carteira assinada cresceu no Brasil a uma taxa de 6,1% ao ano.

            Esse crescimento foi significativo. A modalidade de trabalhador por conta própria e contribuinte da Previdência, por exemplo, cresceu 5,8%, e a opção de funcionário público cresceu 3,6%, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

            Entre 2006 e 2011, o trabalho com carteira assinada continuou a crescer cerca de 6,2% e o trabalho por conta própria, com contribuição para a Previdência, avançou, em média, 11% ao ano.

            Neste ano de 2013, é importante destacar que os 70 anos da CLT ocorrem quando o mercado de trabalho nacional passa por um de seus melhores momentos.

            A taxa de desemprego está baixa e os salários mantêm o poder de compra. Nos últimos meses, de acordo com o IBGE, entre os meses de março de 2012 e março de 2013, foram criados no Brasil 309 mil postos de trabalho com carteira assinada, o que mostra uma situação positiva do País em relação ao emprego.

            Eu também quero fazer uma ressalva importante: essa taxa de desemprego de 5,7%, medida pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio, teve um impacto importante. No ano passado, essa mesma pesquisa apontava 6,7% e, em março de 2013, aponta 5,7%. E o Estado do Acre, na sua última amostragem, também teve uma redução importante, com 4,3% de índice de desemprego, sendo a terceira melhor performance do País medida pelo Pnad de 2011.

            Nos últimos anos, o mercado de trabalho se tornou mais formal. Isso aconteceu, de acordo com especialistas, pelo aumento da demanda por trabalhadores formais, diante do crescimento da economia, e pela implementação da Lei do Simples Nacional, que estimulou a regularização entre os pequenos e médios empreendedores, entre outros motivos.

            Segundo os dados da Pesquisa Mensal de Emprego, do IBGE, 80% dos empregados no setor privado no Brasil têm carteira de trabalho assinada, o que é explicado justamente pelo atual cenário de baixo desemprego.

            A CLT, portanto, deu uma contribuição sólida e consistente para a base econômica de desenvolvimento do Brasil. E agora deve abranger novos desafios.

            Avaliamos que a Consolidação das Leis do Trabalho chega neste próximo dia 1º de maio com o desafio de aumentar a formalização do trabalho.

            Hoje, cerca de 20% da mão de obra nacional ainda não conta com carteira assinada. Isso significa praticamente 18 milhões de trabalhadores admitidos ilegalmente e que, portanto, não possuem os direitos da lei.

            E há outros 15 milhões de trabalhadores por conta própria que não contribuem para a Previdência Social. Precisamos avançar na modernização dessa legislação para estar em consonância com as atuais realidades econômicas e sociais. É preciso fazer ajustes, sim, mas mantendo os direitos assegurados para a proteção dos trabalhadores e sem a supressão de conquistas já consolidadas.

            Especialistas apontam que a CLT já recebeu cerca de 900 alterações desde a sua promulgação em 1932. No entanto, creio que novas alterações devam ocorrer. Uma delas, que considero necessária, é o fim do fator previdenciário, um instrumento punitivo para o trabalhador, que dedicou a maior parte da sua vida para contribuir não apenas para a Previdência Social, mas, fundamentalmente, para a construção do Brasil.

            A política de terceirização das atividades-fim também é perniciosa e prejudicial aos interesses dos trabalhadores brasileiros. Tem a polêmica do imposto sindical, que é defendida, inclusive, como um imposto injusto para o trabalhador, uma vez que é um imposto obrigatório. Há quem reflita sobre a possibilidade de contribuição voluntária, de maneira a fazer com que os sindicatos só tenham o tamanho exato do convencimento da consciência dos trabalhadores a ele associados, que pagam voluntariamente. Seria o fim do imposto sindical. É uma proposta polêmica, mas é importante ser refletida.

            Em outra frente de reflexão, temos o plano coletivo do direito do trabalho como um dos pontos mais vulneráveis da Consolidação das Leis do Trabalho. Poderíamos pensar, por exemplo, em atualizar a legislação trabalhista para permitir o surgimento de novas formas de contrato e fortalecer as negociações coletivas entre sindicatos patronais e de empregados. Isso demarcaria uma alteração na Constituição, mas não a revogação da CLT.

            Vale ressaltar que, neste início de ano de 2013, nós aprovamos aqui, no plenário do Senado, a PEC das Domésticas, que se transformou na Emenda Constitucional nº 72, e que significa um importante aperfeiçoamento porque foi a extensão de direitos que estavam na Consolidação das Leis do Trabalho, mas não eram acessíveis aos trabalhadores domésticos. E essa nova lei, a Emenda Constitucional nº 72, a chamada Lei das Domésticas, terá que ser regulamentada e é, também, um processo de aperfeiçoamento da Consolidação das Leis do Trabalho.

            Mas, para esse 1º de maio, as centrais sindicais já definiram as bandeiras de luta que vão defender. As reivindicações incluem o fim do fator previdenciário, a redução da jornada de trabalho, a regulamentação do direito de greve no serviço público e a aprovação da resolução da Organização Internacional do Trabalho que inibe a demissão sem motivo, a demissão imotivada.

            Temos, sim, trabalho pela frente e também a consciência de que, sem vislumbrar a perfeição, muito foi conquistado até aqui, ao lado dos trabalhadores, na questão do emprego e da distribuição de renda. Hoje, faço uma saudação a essas conquistas dos trabalhadores, às centrais sindicais e a uma lei trabalhista que teve e tem a preocupação de proteção aos empregados, que contribuiu para a pacificação social e que, com o necessário esforço, pode se tornar, cada vez mais, inclusiva e trazer para a formalidade os muitos trabalhadores que não são alcançados pela legislação.

            Então, fica aqui a minha saudação a todos os trabalhadores brasileiros, nessa véspera de 1º de maio, que celebra, amanhã, não só os 70 anos da Consolidação das Leis do Trabalho, mas também esse momento muito importante e alvissareiro que vivemos no Brasil, com um cenário de pleno emprego, com apenas 5,7% de desemprego no Brasil, um cenário que tem sido melhorado a cada ano desde que nós tivemos essa presença do Presidente Lula e da Presidenta Dilma, com o Partido dos Trabalhadores e partidos aliados, tentando fazer o melhor para o trabalhador brasileiro em todas as dimensões. Então, fica o meu cumprimento a todos os trabalhadores do Brasil, que têm ajudado imensamente ao progresso do nosso País.

            Mas, Sr. Presidente, eu gostaria, nesta segunda etapa deste pronunciamento, de voltar ao tema de que tratei na sessão de ontem.

            O Presidente desta Casa, Senador Renan Calheiros, e o Presidente da Câmara dos Deputados, Deputado Henrique Alves, reuniram-se ontem com o Ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal.

            Segundo as notícias, a reunião foi proveitosa, no sentido de distensionar a relação entre o Congresso e o Judiciário.

            Na última quarta-feira, dia 24, em resposta ao mandado de segurança impetrado pelo Senador Rodrigo Rollemberg, o Ministro Gilmar Mendes concedeu liminar que interrompeu a tramitação do Projeto de Lei da Câmara nº 14, de 2013. O texto impede que Deputados que trocarem de partido levem o tempo de rádio e de TV e o Fundo Partidário para o novo partido.

            A liminar impede que o Senado aprecie o projeto até que o mérito do mandado de segurança impetrado seja examinado pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal. Independentemente da discussão sobre o mérito do Projeto de Lei da Câmara nº 14, de 2013, o que penso que deve ser debatido à exaustão nesta Casa, neste momento, é a relação entre os três Poderes da República, sua independência e as tentativas de usurpação de competências, que têm sido frequentes ultimamente.

            Houve um tempo em que se acreditava, no jargão popular, que decisão liminar não se discute, apenas se cumpre. Decisão jurídica se cumpre em respeito, como já dito, às competências constitucionais de cada Poder. Mas decisão jurídica também se discute e devemos, aqui, no Parlamento, discutir muito cada decisão jurídica que afete a legitimidade dos debates do Poder Legislativo.

            Louvo a grande iniciativa dos Presidentes das duas Casas Legislativas na sempre salutar busca do diálogo. Acredito que não há crise entre os Poderes, como é hábito aventar, mas penso que o melhor distensionamento que pode haver é o respeito entre os três Poderes legalmente constituídos, cada um exercendo suas funções dentro dos limites constitucionais.

            É nesse ponto que não podemos ter inibição de afirmar que a liminar deferida pelo Ministro Gilmar Mendes incorreu em grave intromissão do Poder Judiciário no Poder Legislativo, ferindo o princípio da separação e harmonia entre os Poderes, bem como o Estado democrático de direito e a própria democracia.

            Em sua decisão, o Ministro Gilmar Mendes não demonstrou qualquer falha formal ou material no processo legislativo que pudesse caracterizar um perigo da demora ou fumaça do bom direito, ingredientes processuais que autorizam à concessão de medida liminar em mandado de segurança.

            O processo legislativo no debate do projeto atacado foi feito dentro de todos os parâmetros constitucionais e atendendo aos ditames dos Regimentos da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

            O Senado ainda não tinha sequer entrado na fase de apreciação do mérito do projeto. Estava votando o requerimento de urgência no momento da suspensão decorrente da ordem liminar. Teve o Poder Legislativo, por ordem de outro Poder, suas funções paralisadas.

            O que fez o Ministro Gilmar Mendes pode ser considerado um verdadeiro exercício de futurologia. Imaginou que a lei, caso aprovada, poderia prejudicar novos partidos que podem vir a ser criados. Criou uma tese de possibilidade futura de tratamento não isonômico com outros partidos criados nesta mesma legislatura.

            Tal dissertação, dentro do debate político, é perfeitamente válida. Em uma decisão jurídica, é, no mínimo, despropositada. Afinal, que dispositivo fundamental da Constituição Federal de 1988 estava sendo atacado para justificar a concessão de liminar para paralisar o processo legislativo?

            Ora, sabemos todos que o Supremo Tribunal Federal possui um dos mais significantes exemplos de controle do Poder Judiciário exercido em relação ao Poder Legislativo, que é aquele da constitucionalidade das leis produzidas. O art. 102 da Constituição Federal de 1988 prevê, inclusive, o poder do Supremo Tribunal Federal de determinar a suspensão da execução de lei inconstitucional.

            O controle de constitucionalidade prévio dos atos legislativos, admitido pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, só pode e deve ser feito a bem da democracia, de forma excepcional, quando há flagrante desrespeito ao devido processo legislativo e aos direitos e garantias fundamentais da Constituição, ou seja, quando estão em risco as cláusulas pétreas atacadas por emendas constitucionais. Não é nem de longe o caso do PLC nº 14, de 2013.

            A Constituição Federal de 1988 não prevê qualquer legitimidade democrática em decisões jurídicas que tenham por escopo fazer parar, invalidar ou retroceder o processo legislativo legalmente instituído, como ocorreu na decisão do Ministro Gilmar Mendes.

            Não há uma só linha na decisão liminar deferida que possa demonstrar onde houve, no legítimo processo legislativo, tanto na Câmara dos Deputados quanto aqui no Senado Federal, qualquer erro formal de procedimento ou tentativa de violação aos princípios democráticos do pluripartidarismo e da liberdade e criação de legendas. Houve, sim, uma decisão liminar que diz com a posição do Ministro sobre o tema de mérito do PLC nº 14, de 2013. O problema é que não cabe ao Judiciário, que não tem função legislativa, debater o mérito dos projetos que ainda estão sob a esfera do Poder Legislativo.

            A limitação do poder político, o chamado sistema de freios e contrapesos é fundamental para o bom funcionamento de uma democracia.

            A nossa atual Constituição Federal divide o poder e individualiza seus órgãos, superando qualquer ideia de prevalência de um sobre o outro, através da compreensão da necessidade de equilíbrio, independência e harmonia entre o Legislativo, o Executivo e o Judiciário, admitindo-se a interferência como mecanismo de controle e vigilância recíprocos de um Poder sobre o outro relativamente ao cumprimento dos deveres constitucionais de cada um.

            A materialidade da competência de cada Poder não é elemento de deliberação de qualquer outro, o que significa dizer que, mesmo que o Legislativo discorde do resultado de uma decisão judicial, uma vez tomada dentro dos parâmetros legais e constitucionais, não tem poder para modificá-la.

            O sistema constitucional de controle dos atos normativos estabelece que o Legislativo é responsável pela verificação prévia da constitucionalidade dos projetos de lei, por meio de suas Comissões e do Plenário. Cabe às respectivas Comissões de Constituição, Justiça e Cidadania dizer da constitucionalidade e juridicidade dos projetos que tramitam nas duas Casas.

            Portanto, não poderia o Ministro Gilmar Mendes ou qualquer outro juiz analisar o conteúdo material de um projeto em tramitação e debate no Congresso Nacional que não tenha incorrido em erro formal na tramitação ou atentado contra princípios fundamentais constitucionais e deferir uma liminar de acordo com suas convicções políticas.

            Em determinado trecho da decisão liminar, afirma o Ministro Gilmar Mendes que leis casuísticas são altamente questionáveis.

            Nesse sentido, repito o que foi dito ontem pelo eminente Senador Humberto Costa: decisões casuísticas, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, telespectadores da TV Senado, têm sido aquelas tomadas pelas resoluções do Tribunal Superior Eleitoral. Muitas resoluções são feitas às vésperas das eleições, causando verdadeiro tumulto ao processo eleitoral. Faça-se uma pesquisa naquele órgão que não encontraremos uma só justificativa na elaboração da Resolução n° 22.610, de 2007, que fundamente como justa causa de exceção à regra da fidelidade partidária a criação de novas legendas.

            O fato é que não está na competência do Poder Judiciário corrigir o que entende de equivocado nas decisões do Legislativo. Como representantes legitimamente eleitos pelo povo, não podemos nos calar diante de um decisionismo que se traveste do politicamente correto e judicialmente justo, com o uso de jargões jurídicos e retórica supostamente republicana.

            Essa prática é profundamente danosa a valores extremamente caros ao Estado democrático de direito e à democracia, porque permite que juízes imponham suas preferências e valores sobre o mérito das matérias legislativas, passando por cima de deliberações do legislador.

            Mais uma vez, faço minhas as palavras do Senador Humberto Costa ao se referir à PEC nº 33, de 2011, que tramita na Câmara dos Deputados, que afeta os poderes do Supremo Tribunal Federal. O Presidente do Supremo Tribunal Federal fez divulgar nota oficial onde sustenta que a separação de poderes não é uma noção abstrata.

            Assim como o Senador Humberto, estou de total acordo com o Presidente do Supremo Tribunal Federal neste ponto. A separação de poderes não é abstrata. Tal premissa deve estar sempre presente na consciência dos magistrados quando proferirem suas decisões sobre o processo legislativo, sob pena de adentrarem em esferas de competências que não são as suas.

            Assim, Sr. Presidente, termino este meu pronunciamento deixando a minha posição diante desse debate de que, quando ocorre aprovação de uma matéria que tem vício de constitucionalidade, se, por acaso, vier acontecer, aí, sim, o Supremo Tribunal Federal terá o seu momento para apreciação, mas impedir a tramitação de uma matéria me parece ser algo aviltante para o Parlamento brasileiro, e nós não podemos aceitar esse tipo de intromissão.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/05/2013 - Página 22851