Pronunciamento de Cícero Lucena em 17/05/2013
Discurso durante a 74ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Alerta para as dificuldades financeiras por que está passando a Associação de Assistência à Criança Deficiente – AACD; e outro assunto.
- Autor
- Cícero Lucena (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PB)
- Nome completo: Cícero de Lucena Filho
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
CALAMIDADE PUBLICA.:
- Alerta para as dificuldades financeiras por que está passando a Associação de Assistência à Criança Deficiente – AACD; e outro assunto.
- Aparteantes
- Cristovam Buarque.
- Publicação
- Publicação no DSF de 18/05/2013 - Página 27113
- Assunto
- Outros > CALAMIDADE PUBLICA.
- Indexação
-
- REGISTRO, PEDIDO, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, RELAÇÃO, REDUÇÃO, DIVIDA, PEQUENO AGRICULTOR, REGIÃO NORDESTE, ESTADO DA PARAIBA (PB), MOTIVO, SITUAÇÃO, CALAMIDADE PUBLICA, SECA, REGIÃO.
O SR. CÍCERO LUCENA (Bloco/PSDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Presidente.
Sr. Presidente, antes de entrar no tema Nordeste, em que o senhor está se especializando também, de tanto participar das discussões, das preocupações, do Brasil, como um todo, mesmo, sendo um digno representante do Mato Grosso do Sul, eu gostaria de chamar a atenção a algo que considero muito importante.
Existe, neste País, uma entidade chamada AACD - Associação de Assistência à Criança Deficiente. Sr. Presidente, venho aqui, também, para alertar para o fato de que a referida instituição está enfrentando dificuldades financeiras de grande monta, que poderão, no limite, prejudicar irremediavelmente as nobres atividades por ela desenvolvidas.
A AACD, Srªs e Srs. Senadores, foi criada em 1950, quando a poliomielite vitimava uma parcela bastante expressiva da nossa população. É bem verdade que avançamos no combate a essa doença, mas existem outras ações que a AACD hoje desenvolve tão bem.
Naquela época, cumpre observar, praticamente não existia, em nosso País, um atendimento especializado às crianças e adolescentes com deficiências. Pessoas em tais condições não frequentavam escolas, não conseguiam emprego, viviam quase à margem da sociedade.
Foi nesse cenário, Sr. Presidente, que o trabalho da AACD se impôs com toda a força do pioneirismo e continuou a ser desenvolvido com extrema dedicação, por mais de 60 anos que seguiram a sua fundação.
Hoje, a pujança da instituição reflete-se em 14 unidades de atendimento em plena operação: Campo Grande, Ibirapuera, Lar Escola, Mooca, Osasco, Santana, Mogi das Cruzes e São José do Rio Preto, no Estado de São Paulo; Recife, em Pernambuco; Poços de Caldas e Uberlândia, em Minas Gerais; Nova Iguaçu, no Rio de Janeiro; Porto Alegre, no Rio Grande do Sul; e Joinville, em Santa Catarina.
Temos, ainda, duas unidades iniciando suas atividades, uma delas em Vitória, no Espírito Santo e a outra, Srªs e Srs. Senadores, no bairro de Bodocongó, na nossa querida Campina Grande, na Paraíba, fruto de uma luta intensa de todos que amam aquela terra, sabedores da importância de uma AACD para a Paraíba, para Campina Grande e todo o interior da Paraíba, bem como dos recursos para a sua construção, grande parte arrecadada através de um programa do SBT, que proporcionou base dos recursos para a construção daquela unidade.
Pois bem, Sr. Presidente, quando estiver em plena operação, a mesma evitará que, pelo menos, 450 crianças paraibanas precisem buscar assistência fora do Estado. Veja que ato humanístico: 450 crianças, pelo menos, anualmente, deixarão de ter - há aqueles que eventualmente têm condição - de buscar o tratamento fora do Estado da Paraíba.
Auxiliamos ao tratamento de patologias como lesão medular, acidente vascular cerebral, traumatismo cranioencefálico, amputações, doenças neuromusculares, paralisia cerebral, malformação congênita, esclerose lateral amiotrófica, mielomeningocele e sequelas de poliomielite.
Teremos médicos, terapeutas e técnicos da várias áreas da saúde dedicados a avaliar cada paciente, estimular e auxiliar na identificação de todo o seu potencial remanescente e, dessa forma, facilitar a sua inclusão social, superando as limitações impostas pela deficiência.
Entre as terapias que estarão disponíveis, podemos citar a fisioterapia, a fisioterapia aquática, a terapia ocupacional, a fonoaudiologia, a psicologia, a pedagogia, a musicoterapia, a reabilitação pela arte e a reabilitação desportiva, com profissionais devidamente treinados, qualificados, estabelecendo-se, consequentemente, sem dúvida nenhuma, uma rede de agentes multiplicadores juntamente com os demais profissionais em todo o Estado da Paraíba. Esse serviço não ficará restrito apenas àqueles que eventualmente terão a oportunidade e a felicidade de trabalhar na AACD. Acresce-se a isso a importância pedagógica que irá qualificar outros profissionais no nosso Estado.
Como se vê, Sr. Presidente, trata-se de um quadro de esperanças renovadas que se abriu para brasileiras e brasileiros em outras unidades da Federação e que se abrirá, nos próximos 60 dias possivelmente, também para o povo da Paraíba.
Ocorre, porém, que transformar esse sonho em realidade, além da dedicação dos que fazem a AACD, um sonho dos paraibanos, depende de recursos. Não muitos, Sr. Presidente. A bem da verdade, não estamos falando aqui de valores astronômicos que esta Casa está acostumada a ouvir, de bilhões, de milhões de perdão, de ajuda, de gasto, de renúncia. Nós estamos falando aqui de uma cifra bem modesta, principalmente se comparada ao que é feito no Brasil; mas uma cifra, no caso da AACD, é importante e representa uma enorme diferença.
Para V. Exª ter uma ideia, Sr. Presidente, minhas senhoras, meus senhores, Srªs e Srs. Senadores, no ano passado, repito, no ano passado, R$7,6 milhões destinados à AACD para o atendimento de crianças com deficiência foram simplesmente cortados do Orçamento.
Eu mesmo apresentei emenda de R$1 milhão, que seria aplicado no foco cirúrgico LED, mas que não foi empenhado pelo Ministério da Saúde, e, por isso, foi automaticamente cancelado.
Sr. Presidente, estou falando de R$7,6 milhões para todo o Brasil. Destaquei a minha emenda, em favor de Campina Grande, de R$1 milhão.
Eu faço este pronunciamento nesta tribuna e saio daqui com a certeza absoluta de que o Ministro Padilha, mesmo não sendo do nosso Partido, ao tomar conhecimento, tomará providências, porque é inadmissível que esses R$7,6 milhões não tenham sido empenhados numa entidade como a AACD e que a minha emenda, em particular, a emenda individual de um Senador com objetivo coletivo, também não tenha sido empenhada.
Ora, Sr. Presidente, por mais que os quatro mil colaboradores da Associação de Assistência à Criança Deficiente encarem suas atividades como um sacerdócio, doando-se ao extremo para proporcionar uma vida melhor às crianças e aos adolescentes com deficiência, é evidente que só podem desenvolver o seu trabalho se tiverem um mínimo de respaldo financeiro e político. Daí a minha disposição de colaborar, de cobrar e de ajudar.
Trata-se de um respaldo que somente será viabilizado se os diversos projetos da instituição forem aprovados na instância competente e se os respectivos recursos forem efetivamente liberados.
Por sinal, temos aqui um bom exemplo das vantagens do orçamento impositivo, que evitaria distorções e injustiças dessa natureza. Daí a necessidade urgente de o Congresso Nacional, que representa o povo, que sabe das dificuldades em todos os recantos deste País, dos Municípios, das sociedades beneficentes e das demandas da população, discuta e aprofunde, cada vez mais, a necessidade de um orçamento impositivo, para que o Governo não fique a empenhar apenas aquilo que lhe interessa e que lhe seja conveniente.
Sr. Presidente, apenas no ano de 2012, nas unidades espalhadas pelo Território nacional, a AACD realizou 1.503.427 atendimentos; repito, 1.503.427 atendimentos; 203.531 consultas médicas; e 7.747 cirurgias - pela patologia a que me referi anteriormente, todos nós temos consciência de que não foram pequenas cirurgias.
Há de se imaginar o quanto de alívio, conforto e esperança esses procedimentos representam para as pessoas atendidas e para os seus familiares e amigos.
Pois bem! Não podemos permitir, pois, que todo esse trabalho corra o risco de ser prejudicado pela falta de recursos que, volto a dizer, não representam quase nada quando confrontados com o total dos gastos públicos em nosso País.
Por isso, Sr. Presidente, eu renovo, desta tribuna, meu apelo ao Ministro Padilha, que eu tenho certeza absoluta de que não tem conhecimento desta informação que estou aqui apresentando, para que possa ajudar a AACD a continuar o seu trabalho, a exemplo do Sarah Kubitschek, outra entidade que presta um serviço que todos nós conhecemos, e para que esses recursos sejam liberado.
Em Campina Grande, uma unidade da instituição será inaugurada no começo do próximo semestre, ainda neste ano. E aqui eu faço questão de registrar a dedicação do coordenador desse trabalho que também foi entregue a um paraibano, Dr. José Nunes, que é responsável pela entidade em Pernambuco e que tem conduzido de forma brilhante esse trabalho tão importante para a Paraíba e para os paraibanos.
Sr. Presidente, eu quero agradecer pela oportunidade de ter feito esse pronunciamento, ao mesmo tempo em que peço a V. Exª para falar sobre o endividamento dos pequenos agricultores da Paraíba, porque, desta forma, eu estarei falando também do agricultor nordestino, do seu endividamento, das suas dificuldades, de tudo que ele tem sofrido.
V. Exª estava presente, ontem, quando realizamos um debate na Comissão de Agricultura, em que se aprovou uma ação para que possamos discutir, com um representante do Tesouro Nacional, com um representante do Banco do Nordeste e com o Presidente da Federação de Agricultura da Paraíba, Dr. Mário Borba, uma causa tão nobre como a do endividamento dos nossos agricultores, porque há todo um processo, todo um momento de questionamento, quando se vive a seca do Nordeste paraibano. E, de repente, há a possibilidade, por parte do Governo Federal, de o Banco do Nordeste executar pequenos e médios agricultores que, infelizmente, se encontram endividados, impossibilitados de pagar as suas dívidas, muitas delas contraídas antes de 2001 e mesmo depois de 2001, em razão da estiagem, da seca, e que não conseguem a remissão desse pagamento.
Pois bem, Sr. Presidente, venho à tribuna desta Casa, que já me ouviu falar várias vezes do assunto, para insistir na gravidade da seca que assola o Nordeste, uma das piores dos últimos cem anos. Isso não é exagero retórico, Sr. Presidente, mas constatação dos cientistas dedicados ao estudo do clima da região. É fato, pois. A situação, enfatizo, é gravíssima. E temos visto cenas de animais morrendo às dezenas, plantações se perdendo e, uma vez mais, o sertanejo sendo exposto a situações humilhantes e desumanas.
Além disso, nos últimos 30 anos, desde o início da década de 80, foram registradas cinco secas de grandes proporções, ou seja, em pouco mais de uma geração, o agricultor foi atingido pela seca repetidas vezes. O que acumula em um bom ano é perdido em outro ano de seca.
Assustadora também é a maneira despreocupada com que o Governo Federal tem tratado a questão.
É de se perguntar quais são exatamente as ações que têm sido levadas a cabo pelo Governo Federal no sentido de reduzir o sofrimento do povo nordestino. Nós sertanejos não queremos esmola; nós queremos ser tratados com o respeito, a dignidade e a atenção que merecemos por parte do Governo Federal. Por que há anistia de tantos débitos? Por que há desoneração de tantas causas? Por que há redução de tantos juros e hoje estão sendo cobrados juros extorsivos do pequeno e médio agricultor nordestino?
O Presidente da Comissão de Agricultura, o Senador Benedito de Lira, disse, ontem, no seu pronunciamento, que vai pedir que o Tribunal de Contas faça auditoria nos saldos devedores dessa dívida - o que terá todo o nosso apoio e a nossa solidariedade -, para ser verificado o crime financeiro que se está fazendo contra esses agricultores, até porque esses valores já foram colocados no balanço do Banco do Nordeste como prejuízo. Portanto, não há essa necessidade de estabilização financeira para o banco, porque esses valores já estão na conta prejuízo e parte desses recursos, se não a totalidade, é do Tesouro Nacional.
Hoje, quero destacar a premente necessidade de se resolver o problema do endividamento dos pequenos e médios produtores rurais nordestinos. Vitimados pela seca, precisam de ajuda urgente. Se continuar a política de ações contra esses agricultores, enquanto o Governo Federal fala em reforma agrária, o Banco do Nordeste irá se tornar o maior latifundiário deste País.
É importante acrescentar que, segundo os dados do IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 90% das propriedades nordestinas rurais estão abaixo de 4 módulos fiscais, ou seja, são classificadas como pequenas propriedades. Outra parte está entre 4 e 15 módulos fiscais, ou seja, são médias propriedades.
Muito bem, Sr. Presidente. Eu recebi uma carta do Presidente da Assembleia Legislativa da Paraíba, o Deputado Ricardo Marcelo, expressando um sentimento daquela casa de preocupação com a seca. Visitaram várias cidades do Estado, também com a coordenação e o valoroso trabalho do Deputado Estadual Quintans.
E eles, consequentemente, apresentaram esse mesmo documento que foi encaminhado a mim, ao Senador Vital do Rêgo, ao Senador Cássio Cunha Lima; foi encaminhado também ao Presidente desta Casa; foi encaminhado à Presidente Dilma, quando da reunião da Sudene, em Fortaleza. Nele, ele afirma que é preciso um novo modo de pensar, porque eles apontam que, além da seca, há uma falta de sensibilidade por parte das autoridades públicas.
Observa ele e os pares da Assembleia Legislativa, os nossos Deputados estaduais, que o produtor rural é uma pessoa humilde, simples, sem muitos recursos e frequentemente impossibilitado de contratar um advogado que possa defendê-lo na ação.
Senador, grande parte desses agricultores tem, na sua propriedade, o seu sustento; basicamente, o seu sustento alimentar. A roça que ele planta de feijão, quase na totalidade, é para ele comer com a família; a do milho é para ele compartilhar com os animais em um período mais crítico; a cabra que ele tomou emprestada ao Banco do Nordeste para criar é para que na sua casa tenha o leite para fazer um queijo; é para o alimento da sua família, para a sobrevivência da sua família.
Então, ao ser acionado pelo Banco do Nordeste, muitos desses processos são julgados à revelia, porque eles não têm informação, eles não têm como contratar advogado. Então, está sendo um crime financeiro e uma injustiça social muito grande o tratamento que está sendo dado a esses pequenos agricultores.
Continuo, Sr. Presidente, com a confiança e a certeza bem dita pelo Deputado Ricardo Marcelo - como eu disse, representando a Assembleia - que enfatiza que ainda é preciso um novo modo de pensar sobre a questão. Não é mais possível olhar para o pequeno produtor rural do Nordeste e imaginar que ele tem isso como negócio, pois há outras variáveis, e tratar isso sob um ângulo empresarial é errar o foco.
Como bem observa o produtor rural e estudioso do Semiárido nordestino, Manelito Dantas Vilar, que teve a capacidade, inclusive, de fazer estudo, pesquisa e desenvolvimento genético, para que possam ser desenvolvidas, no Nordeste, raças de caprinos e de bovinos que sejam produtoras de leite e também produtoras de carne, com rusticidade, com capacidade de enfrentar as adversidades climáticas da nossa região - e Manelito Vilar o Brasil conhece como referência, ele é de Taperoá, na Paraíba -, desde a grande seca de 1970, a irregularidade das chuvas levou à elaboração de 34 projetos.
Segundo ele, todos tecnicamente pobres e de duração efêmera. E, portanto, ineficaz para combater a seca. Ainda observa ele que entre as regiões do Semiárido o Nordeste do Brasil é a única para a qual não foi estabelecida uma adequada equação tecnológica de uso de suas terras. Ao se lidar com um produtor rural nordestino, é preciso também focar a questão social e a questão ambiental.
O Manelito tem uma frase, e quando eu fui vice-governador ao lado de Ronaldo, conversando com ele, discutindo já naquela oportunidade o problema da seca, ele dizia que o grande erro dos governos é querer combater a seca; que nós temos é que conviver com a seca, desenvolver projetos tecnológicos, desenvolver pesquisa que nos permita exatamente a convivência com a seca, quer seja na parte hídrica; quer seja na parte de raças resistentes, como eu fiz referência anteriormente; quer seja de plantações também resistentes às condições climáticas que nós temos, mas a presença do governo atuando na área social como precisa, na área ambiental e também ajudando as pessoas a ter a consciência de como proceder naquela região.
Por isso eu reforço a ideia de que o combate à seca precisa de novas abordagens que possam oferecer soluções definitivas, uma das quais passa obrigatoriamente pela resolução das dívidas do pequeno e do médio produtores rurais do Nordeste.
Isso é urgente. Eu tenho falado sobre isso toda semana. Outros Senadores têm também usado essa tribuna, têm tido reuniões. E vamos ter agora audiência pública, que foi, com o meu agradecimento a todos os Senadores presentes, aprovada na Comissão de Agricultura.
O Deputado Ricardo Marcelo, ainda representando os seus pares, em seu ofício apresenta também sugestões de como devem ser os princípios e as premissas para se lidar com o problema da dívida. A sugestão da Assembleia da Paraíba diz o seguinte: “Dentre os princípios sugeridos por ele, eu destaco, em primeiro lugar, a ideia de conferir tranquilidade ao produtor rural, por meio da suspensão do vencimento das dívidas de pelo menos 365 dias, bem como as execuções em curso”.
Se não bastasse a seca, a dificuldade financeira, o encarecimento do produto alimentar, tirar essa condição, como se diz lá, de “aperreio” que o pequeno agricultor nordestino está vivendo. Alguns inclusive com sacrifício de saúde.
É importante que o Governo… Isso é um ato; isso é um decreto de poucas linhas; isso é uma vontade política; é uma atitude de Justiça social: suspender as dívidas e as ações enquanto não se encontra uma solução definitiva. Pelo menos por um ano.
Em segundo lugar, simplificar os processos operacionais na apuração do saldo devedor.
Em terceiro lugar, definir percentual de rebates para a equalização das dívidas, como meio para eliminar as diferenças no saldo devedor decorrentes da aplicação de encargos diferenciados por fontes de recursos, eliminando, também, a aplicação de multa e juros com remuneração de capital. É inadmissível o Banco do Nordeste e o Governo quererem tratar um empréstimo desses com a demanda, com a necessidade da remuneração do capital.
Em quarto lugar, alterar a abrangência da renegociação das dívidas, de modo a permitir que operações contratadas até 30 de dezembro de 2006 possam ser inseridas no processo de negociação e que as parcelas com vencimento para 2012 e 2013 sejam automaticamente prorrogadas.
Em quinto lugar, consolidar o saldo devedor rebatido para evitar a figura do bônus sob condição de adimplência, o que, na Região Nordeste, torna a dívida, na prática, impagável.
Em sexto lugar, estabelecer um novo cronograma de reembolso.
Em sétimo, definir rebate para devedores que têm interesse em liquidar a sua dívida.
Em oitavo lugar, remissão de dívidas com saldo inferior a R$10 mil. Veja o que a Assembleia está pedindo, Senador Cristovam: a remissão das dívidas com saldo inferior a R$10 mil, quando se tratar de uma dívida contraída antes de 30 de dezembro de 2001. São R$10 mil. O que é isso para o Governo? E é tão importante para esses pequenos agricultores que hoje estão inadimplentes. O Governo anuncia, como ação de combate à seca do Nordeste, mais de R$2 bilhões em empréstimos. Para esse agricultor que devia R$10 mil, que está inadimplente, a porta do banco está gradeada, está fechada. Ele não tem acesso. Ele não vai poder salvar a sua cabra, que dá o leite ao seu filho. Ele não vai poder plantar. Ele não vai poder nem comprar alimento para sua família. Enfim, são propostas muito voltadas aqui para a questão da dívida, mas, nesse trabalho feito pela Assembleia Legislativa, existem também outras sugestões para a convivência com a seca.
O Governo Federal precisa entender que parte desse documento enviado para mim também já foi entregue à Presidente da República, como eu fiz referência aqui anteriormente. Eu espero que a Presidente tenha determinado aos Ministérios competentes que façam a sua ação e o seu procedimento. Por isso, eu estou cobrando desta tribuna, mais uma vez relatando a dificuldade, mais uma vez relatando o sofrimento, a angústia do povo do Nordeste, em particular da minha querida Paraíba, para que provoque a sensibilidade e a responsabilidade daqueles que estão à frente do Governo, que tem o dever e a obrigação de fazer o seu papel de atender às emergências deste País, que é um dos itens da responsabilidade do governante.
Ouço, com muito prazer, o aparte do Senador Cristovam Buarque que, embora seja símbolo da educação deste País, Senador pelo Distrito Federal, é nascido em Pernambuco, e tem grande sensibilidade humana.
O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Muito obrigado, Senador. Eu quero dizer que, mais uma vez, fico satisfeito de ver o senhor falando sobre essa crise que vive o Nordeste, sobre a emergência, e que lamento que tenha sido um tema apenas dos Senadores do Nordeste ou de um Senador que nasceu no Nordeste. Esse tem que ser um tema de todos os Senadores, tem que ser um tema do Brasil. Por isso, eu fico satisfeito quando o senhor propôs a audiência - está, inclusive, hoje no Jornal do Senado - para que nós discutamos esse assunto. O Presidente Renan está criando ou já criou uma comissão para pensar o futuro. Eu acho que é uma coisa muito interessante, em vez de ficar só agricultura, saúde, educação, a gente ter uma comissão para pensar o futuro. Eu, pensando, quando ouvi isso, disse que a gente devia começar por pensar o futuro do Nordeste. Mas, quando o senhor fala da necessidade de um enfoque novo, eu acho que até para o Nordeste a gente deve pensar num enfoque novo. Talvez o verdadeiro tema, Senador Figueiró, seria o futuro da relação do homem brasileiro com a natureza do Brasil, com ênfase na relação com a natureza do Nordeste, para conviver com o Semiárido, que vai precisar de água, sim, mas não é só de água. E aí está a importância do seu discurso sobre o novo enfoque. Isso é que é fundamental. Eu vinha escutando o seu discurso pelo rádio, antes de chegar aqui, e uma das coisas que me fez vir correndo foi isto: poder fazer esse aparte para lhe dizer que essa ideia de que precisamos de um novo enfoque é fundamental. Primeiro, pelo Nordeste. Descobre-se o problema nordestino com o enfoque da engenharia, lá em Dom Pedro; depois, com o Juscelino, com o Denocs. Com o Juscelino, existe uma mudança: sai da visão do Nordeste pela engenharia das obras para a economia que Celso Furtado trouxe; o desenvolvimento econômico; a Sudene; o 3418, que levava recursos. O senhor tocou, há pouco, que a gente precisa ter também uma ênfase no social agora, não é só o econômico. Já vínhamos, depois de quase 60 anos de política de desenvolvimento do Nordeste, com a Sudene, com incentivos fiscais, com a ideia da industrialização do Nordeste imitando São Paulo, porque não conseguíamos dar o salto. E aí, volto a insistir, um dos enfoques seria a educação no Nordeste. Se lá, há 60 anos, aquele dinheiro que a gente gastou para industrializar tivesse sido um pouco menos, se essa diferença tivesse sido para a educação, hoje o Brasil podia ser um Vale do Silício, como o da Califórnia; hoje o Nordeste poderia até conviver com a seca por estar produzindo alta tecnologia, e inclusive alta tecnologia a serviço de resolver o problema da seca. Sobre essa ideia de dar novo enfoque, eu acho que a gente precisaria insistir mais, e gostaria até de conversar com o senhor. Por exemplo: a segurança. Existe o enfoque da cadeia depois do crime cometido, ou o enfoque da escola, do emprego, da renda antes do crime cometido. A saúde. Existe o enfoque do hospital depois da doença, ou o enfoque da prevenção, como aqui no meu governo a gente fez com o Saúde em Casa. Então, temos enfoques diferentes. Quer ver outro? O engraçado é que a gente não pode ficar contra hospital, não pode ficar contra a cadeia, mas não é a saída. As bolsas - que tive um papel fundamental na criação. Ninguém pode ficar contra o Bolsa Família. Imaginem o Brasil sem o Bolsa Família? Mas o enfoque está errado. O enfoque é: como é que a gente vai fazer com que, no Brasil, nenhuma família precise de bolsa? O enfoque está na pergunta. Uma pergunta é: qual é o valor da bolsa para que uma família não passe fome? A outra pergunta é: como é que eu faço para que a família não precise da bolsa para sair da fome? Nós estamos prisioneiros de enfoques antigos. Para mim, esse é o ponto central do seu discurso. Quando eu ouvi, eu disse: vou estar lá, porque esse é um chamamento que o senhor está fazendo. Na verdade, está fazendo mais de um chamamento, está fazendo um chamamento ao problema emergencial - o senhor usou a expressão emergência -, e a gente não pode esquecer a emergência. Por isso que as bolsas são tão importantes, porque quem está com fome hoje não pode esperar medidas que lhe deem independência. Na verdade, falando com toda a tristeza, mas procurando ser lúcido, a solução para abolir a necessidade da bolsa não está no adulto de hoje, mas nos seus filhos. É através dos filhos que a gente vai abolir a necessidade de bolsa, no futuro, quando esses filhos crescerem. Então, a emergência tem que ser atendida. Por isso, precisamos de mais cadeia, sim, para os crimes que estão sendo cometidos hoje. Mas nós precisamos encontrar um caminho para que este País fique pacífico. E aí, outra vez, o enfoque: existe o enfoque da segurança e o enfoque da pacificação. Este é que deve ser o enfoque de quem pensa o futuro. E espero que, nessa comissão que o Presidente Renan está criando, a gente possa discutir os problemas do Brasil com um novo enfoque. Um desses novos enfoques - e continua a emergência da sua audiência - seria: como é que o povo brasileiro convive com a natureza do Brasil - com os Pampas do Rio Grande do Sul, com a realidade da Amazônia, com a realidade do Nordeste? E, aí, o senhor falou bem: existem experiências bem-sucedidas. Em Afogados da Ingazeira, um amigo meu, chamado José Artur Padilha, tem uma pequena unidade de produção agrícola que sobrevive à seca. Como digo a ele, nas obras que ele faz, ele conversa com o vale, ele pergunta aonde a água quer ir e quer ficar quando ela está por lá. E foi fazendo pequenas obras, pequenas soluções. E outra coisa: usando a agricultura compatível com pouca água, como faz Israel; usando os animais compatíveis. Como sabemos, alguns resistem: existem os cactos, que resistem, e existem as cabras também, que resistem; existe resistência no mundo vegetal e no mundo animal. Nós temos que falar com a natureza, conversar, e não querer, arrogantemente, dominá-la, para que ela se comporte como a gente quer, para fazer aquilo que a gente sabe que tem mais mercado no exterior. Temo que, qualquer dia desses, a saída defendida para o Nordeste seja plantar soja. E a gente vai voltar ao mesmo que com a cana-de-açúcar, só que, em vez do açúcar, que tinha pelo menos um grauzinho de indústria, é a soja, que é, basicamente, agrícola, apesar de haver um alto conteúdo tecnológico, na sua produção, em áreas como o próprio Cerrado. Agora mesmo ouvi que estão querendo plantar cana na Amazônia. É um contrassenso! Em vez de procurar explorar a própria madeira da Amazônia - vejam que não estou propondo conservar a floresta como ela é -, usar a madeira, replantando, convivendo, querem plantar soja. Todo o seu discurso foi bom, mas quero parabenizá-lo por esse chamamento à necessidade de um novo enfoque para observar, analisar e propor soluções para os nossos problemas.
O SR. CÍCERO LUCENA (Bloco/PSDB - PB) - Se há alguém a agradecer aqui, Senador Cristovam, certeza absoluta de que sou eu, pelo enriquecimento do aparte de V. Exª, em que aproveita a visão que o senhor tem de futuro e colabora para que possamos agir num item que é fundamental.
Já tivemos experiências administrativas, e sabemos, mais do que ninguém, que administrar é ter ações emergenciais, quando necessárias; é gerenciar o dia a dia das rotinas que a sua obrigação assim exige. Mas, mais do que esses dois que são também importantes, é planejar o futuro. Esse tripé é o dever e a obrigação de quem tem responsabilidade, para que este País seja mais justo, mais humano, mais solidário.
V. Exª falou no novo foco da visão da relação do Nordeste. Pouco antes, quem me antecedeu, o Presidente, Senador Figueiró, fazia exatamente a preocupação com o Pantanal no Mato Grosso, quer dizer, dentro desse contexto de o Brasil passar a se discutir, a se dimensionar, para que possamos projetar o Brasil de amanhã que nós queremos.
V. Exª falou em educação no Nordeste. Hoje, há várias experiências. Muitas vezes - e aqui, sem nenhum bairrismo, sem nada -, os nossos profissionais, na área de saúde, na área de engenharia, na área de eletroeletrônica, destacam-se para onde eles forem, para qualquer canto. Se for em São Paulo, boa parte dos médicos de alta qualidade são nordestinos. Na área de tecnologia, temos uma Campina Grande, hoje, que é comparável, em termos tecnológicos, a São Carlos, em São Paulo. A universidade foi desenvolvida porque teve oportunidade - e o senhor teve a oportunidade de conhecer seu Reitor, Lynaldo Cavalcanti - de dar essa contribuição do futuro. O Manelito Vilar, a que fiz referência, aqui, que dei testemunho sobre a sua vida, chegou a desenvolver raças no Nordeste, quando não havia, ainda, a ciência que temos hoje, em termos de melhoramento de raça, para desenvolver ovinos, caprinos e bovinos resistentes e que pudessem conviver com a diversidade climática da nossa região.
A educação é fundamental. Eu me recordo de que - infelizmente, eu só tive o prazer de ser prefeito da cidade de João Pessoa, quando o senhor era ministro, por um ano e meio, no início do governo Lula - o senhor assumiu querendo enfrentar, entre outros itens da educação, o analfabetismo.
Naquela oportunidade, João Pessoa era dimensionada com 40 mil analfabetos, uma cidade com 550 a 560 mil habitantes, uma capital de um Estado. Fizemos um programa, com o apoio e a solidariedade do Senador, então ministro da Educação, e o meu Secretário era o Prof. Neroaldo Pontes, que também tinha sido reitor da Universidade Federal da Paraíba, e conseguimos alfabetizar dez mil em um ano. Por quê? Porque nós sabíamos da importância, tínhamos a vontade política e tivemos o apoio financeiro para fazer.
A minha origem é na construção civil, e foi na Paraíba que nós criamos a Escola Peão. Eu era presidente do Sindicato da Construção Civil, e o dono da construtora cedia uma hora do trabalhador da construção civil, ele ficava mais uma hora e, no canteiro de obra, era alfabetizado. Essa experiência, quando prefeito, nesse programa de zerar o analfabetismo, nós fizemos. Eu fui a prédios, a condomínios, pedir, em uma reunião de condomínio, que eles cedessem o salão de festas para que virasse uma sala de aula, para que os empregados do condomínio que não fossem alfabetizados, ou da vizinhança, pudessem ser alfabetizados. Por isso conseguimos, em um ano, alfabetizar dez mil na cidade de João Pessoa.
Então, essa visão de futuro é que é fundamental. Concordo plenamente com a questão da Bolsa. Hoje a Bolsa Família não é patrimônio de governo nenhum, mas uma necessidade daqueles que precisam. Ninguém deve explorar isso politicamente, porque não está sendo correto, não está sendo justo, não está sendo humano achar que merece ter o reconhecimento político por conta de estar pagando, hoje, uma Bolsa Família. A ideia da Bolsa Família que saiu, da Bolsa Escola, em que V. Exª também teve participação, tinha a contrapartida. Não era contrapartida de juros, não era contrapartida de multa. Não! Era contrapartida para quem era beneficiado pela Bolsa Escola, porque ele tinha que dar o tempo presente na aula.
Em João Pessoa, também quando prefeito, havia o Lixão do Roger. Nesse lixão, havia trezentas e poucas famílias. Nós retiramos essas famílias que moravam lá. Havia crianças - no meu site tem, no Youtube tem o fim do Lixão do Roger - que passavam o dia catando lixo dentro do lixão.
A Bolsa Escola não era universalizada. Eu criei uma escola, creche para essas crianças e dei a Bolsa Escola, desde que elas permanecessem na escola e não voltassem mais a catar lixo. Essas crianças - os pais, coitados, muitos deles vitimados por drogas ou álcool, achavam que os filhos eram um problema - passaram a ser referência porque passaram a ser fonte de uma receita certa naquela família. Depois, graças a Deus, a Bolsa Escola, ainda no governo do Fernando Henrique Cardoso, foi ampliada e universalizada neste País, pelo menos a oferta, e, consequentemente, os governos seguintes vieram a ampliá-la.
Então, há necessidade da contrapartida, não para o Governo, embora, para quem tenha visão de futuro, será para o futuro, porque está beneficiando o cidadão, que é o objetivo maior do Governo, que tem o dever de cuidar dele.
Pois bem, Srs. e Srªs Senadores, quero dizer, Senador Cristovam, que ouvi o pronunciamento de V. Exª ontem ou anteontem. Eu já havia conversado sobre essa questão da seca com o Senador Inácio Arruda, antes de ele ir com a Presidenta Dilma para Fortaleza, da preocupação para que conversássemos sobre criar uma comissão no Senado que cuidasse dessa questão emergencial que temos e que tivesse um foco, também, no futuro, para o Nordeste, de propor algo, de fazer o diagnóstico, mas, mais do que o diagnóstico, propor o tratamento. Essa semana, retomando esse assunto, essa preocupação, o Senador Cristovam fez uma referência a uma fala da Senadora Lídice da Mata, convocando esta Casa para que criássemos essa comissão.
Quero dizer a V. Exª, dando-lhe o crédito, que apresentei a esta Casa exatamente o pedido de criação de uma comissão especial em que tenhamos a oportunidade - já que esta Casa tem comissões permanentes e temporárias, mas essa seria uma comissão, não uma subcomissão - de diagnosticar, fiscalizar, cuidar e propor ações para o Nordeste brasileiro, com essa visão de um futuro melhor.
Meu muito obrigado, Sr. Presidente.
Que Deus proteja todos.