Discurso durante a 80ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com a desproporcionalidade na distribuição de médicos no Brasil.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PTB - Partido Trabalhista Brasileiro/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Preocupação com a desproporcionalidade na distribuição de médicos no Brasil.
Aparteantes
Wellington Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 25/05/2013 - Página 30234
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • COMENTARIO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, DISTRIBUIÇÃO, MEDICO, PAIS, ANALISE, JUSTIFICAÇÃO, AUSENCIA, ESPECIALISTA, SETOR, MUNICIPIOS, REFERENCIA, ESFORÇO, CONSELHO NACIONAL, SAUDE, PROMOÇÃO, MELHORIA, ENFASE, CRIAÇÃO, CURSOS, MEDICINA, ESTADO, ESTADO DE RORAIMA (RR), NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, DEBATE, ASSUNTO, REGISTRO, PROPOSTA, ORADOR, DISCUSSÃO, COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS (CAS), PARTICIPAÇÃO, MINISTERIO DA SAUDE (MS).

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Paulo Paim, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, hoje estamos tendo uma sessão em que os temas são sobretudo humanísticos.

            A Senadora Vanessa falou sobre o câncer nas mulheres, o Senador Paim tratou de vários temas, todos eles voltados a propiciar melhores condições de vida às pessoas, seja quanto à questão da adoção, seja quanto à da discriminação, e eu quero abordar um tema que eu diria que tenho até obrigação de abordar. Vou tratar da questão da distribuição dos médicos no Brasil.

            Sendo médico, sendo um médico que exerceu a profissão num Estado pequeno, tendo trabalhado inclusive indo ao interior, às comunidades indígenas, para atender praticamente todo fim de semana, tendo sido Secretário de Saúde do meu Estado por duas vezes, eu conheço bem... Também fui Presidente do Conselho Regional de Medicina, participei de várias reuniões do Conselho Federal de Medicina e procuro sempre estar atualizado com a questão, que considero dramática para muita gente, da distribuição dos médicos por este País, que é desproporcional.

            Vamos dar números aqui. No Brasil, há 373.176 médicos em atividade e a nossa população é de 190 milhões de brasileiros. Isso dá, segundo o Conselho Federal de Medicina, dois médicos por mil habitantes, sendo que, segundo a Organização Mundial de Saúde, o mínimo ideal é de um para mil.

            Portanto, em tese, o Brasil tem mais do que o dobro exigido pela Organização Mundial de Saúde. Já no SUS, há 1,11 médico por mil habitantes.

            Se fôssemos ver só esses números, diríamos que o Brasil está bem atendido na questão dos médicos. É verdade que esse é o mínimo recomendado, mas, se olharmos o que acontece nas regiões, Senador Paim, vamos ver que, no Norte, há 1,01 médico por mil habitantes; no Nordeste, 1,18; no Sudeste, 2,61; no Sul, 2,03. Então, só daqui, já se depreende que as Regiões Sul e Sudeste têm uma média bem superior, quase o dobro, o dobro mesmo, à verificada nas Regiões Norte e Nordeste.

            Na verdade, precisamos ver o que vamos fazer, já que ninguém é obrigado a se formar e ir, por exemplo, para o interior de Roraima, para o interior do Amazonas, compulsivamente, porque isso é inconstitucional. O direito de ir e vir e do livre exercício da profissão não permitiria a adoção dessa medida coercitiva.

            No entanto, já há bastante tempo, logo que iniciei meu primeiro mandato, apresentei um projeto com base em uma experiência que aconteceu na Austrália, Senador Paim. A Austrália adotou o seguinte critério: o médico formado nas escolas públicas era obrigado a ir para uma cidade ou um local do interior onde não houvesse médico ou onde a proporção fosse inferior a um para mil. O que acontecia? O médico formado, mesmo após a residência, teria de passar dois anos nessas regiões carentes e seria remunerado. Durante dois anos, ele teria um registro provisório do Conselho Regional de Medicina e, depois desses dois anos, estaria livre para ir para onde quisesse.

            Infelizmente, esse projeto não prosperou no Parlamento brasileiro. Depois, essa ideia foi adotada, eu diria, e até aprimorada pelo Ministério da Saúde na questão do Programa Saúde da Família: quanto mais distante estivesse o médico da Capital Federal, mais ele receberia. Isso beneficiaria, sobremodo, a Amazônia toda, que abrange não só todos os Estados do Norte, mas também o Mato Grosso e parte do Maranhão. Essas regiões são, realmente, as mais carentes. Se eu fosse aqui ler os dados por Estado, V. Exªs veriam a discrepância existente, mas prefiro fazê-lo por região.

            A pergunta é a seguinte: por que, então, há Município no Brasil que não tem nenhum médico ou que tem um médico para dez mil habitantes ou para cinco mil habitantes? Porque, realmente, existem várias condicionantes.

            Quero analisar esse caso, Senador Paim, de maneira desapaixonada. Aliás, quero fazer essa análise do ponto de vista da Medicina. Deve haver um remédio na dose certa e adaptada para cada região. Não se pode pensar em uma solução única para esse problema, como, por exemplo, a de importar seis mil médicos de Cuba. Por quê? Não tenho lá minhas simpatias pelo regime cubano - regime de governo -, mas tenho de aqui dar um testemunho de como, no meu Estado, foi importante o convênio feito com o governo de Cuba para levar médicos para os Municípios do interior. Eles revalidaram seus diplomas.

            Como foi também importante para nossa Universidade Federal de Roraima - e tenho a honra de ter sido autor da lei que propiciou a criação da Universidade - a implantação do curso de Medicina! Essa foi uma ousadia, poderíamos dizer assim, tanto que houve uma batalha árdua no Conselho Nacional de Saúde, porque, por exemplo, a Federação dos Médicos achava que não tinha sentido criar um curso de Medicina em um Estado tão pequeno quanto Roraima. Eu estava, nesse período, sem mandato. Eu era do Conselho Universitário da Universidade e convenci um a um disso. Na primeira reunião, só a Drª Zilda Arns, da Pastoral da Criança, já falecida, encampou a ideia, porque conhecia o problema devido ao trabalho com as crianças na questão da saúde. Depois, fui convencendo, mostrando que era possível, sim, que não havia nenhum dispositivo legal dizendo que um Estado tinha de ter tantos mil habitantes para criar um curso de Medicina. O problema era como fazê-lo.

            Aí passei a ter o apoio do representante do Conselho Nacional dos Secretários Municipais de Saúde, que disse, a propósito, que havia se formado na Unicamp e que, na época em que ele estudou lá, todas as vias dentro da universidade estavam sem asfalto, sem calçamento, e que, portanto, havia ali poeira permanentemente. Disse que as carteiras ficavam cheias de poeira, o que era problemático. Mas ele disse: “Nem por isso deixamos de ter um bom curso de Medicina”. E quem é que discute hoje a qualidade da Unicamp? Ao contrário, é uma referência nacional de bom curso de Medicina.

            Pois bem, como foi que nós conseguimos, depois de aprovado no Conselho Nacional de Saúde, implantar o curso em Roraima? Fazendo um convênio com a Universidade de Matanzas, em Cuba, que enviou professores de matérias básicas do primeiro ano de Medicina. E enviaram doutores ou, no mínimo, mestres, que deram aulas de Anatomia, de Citologia, de Histologia, matérias básicas do primeiro ano de Medicina. A partir daí, e até mesmo no segundo ano, nós contamos com a presença desses médicos cubanos. Abrimos concurso depois, conseguimos fazer com que vários médicos, quase todos de outras regiões, fizessem concurso. E, hoje, o nosso curso já formou mais ou menos dez turmas de profissionais, e todos os que saíram de lá para fazer uma residência foram aprovados com boas colocações. Hoje, a avaliação do curso de Medicina de Roraima pelo MEC é muito boa; o curso está entre os melhores do Brasil. Por quê? Porque tivemos a coragem de ousar, contratando, registro mais uma vez, médicos cubanos, professores cubanos.

            Então, não é um problema contra os médicos cubanos. O que quero dizer é que a questão tem de ser analisada. A população precisa de mais médicos? Isso é verdade. Porém, repito: é preciso discutir essa questão com bastante clareza. Já dei aqui o exemplo do meu Estado, e Tocantins também fez convênios com Cuba para levar médicos cubanos para o interior. Então, quero dizer que não tenho uma opinião formada contra trazer médicos estrangeiros. Aliás, há médicos brasileiros na Inglaterra, nos Estados Unidos, e todos eles que foram para lá fizeram a prova de revalidação do seu curso e estão exercendo a profissão.

            Então, não é possível nivelar por baixo a questão do médico que venha de qualquer lugar, seja de Cuba, da Espanha, de Portugal. Entendo que o Brasil tem que ter uma norma clara, não excludente, porque, se colocar também empecilhos terríveis, aí realmente não vai sanar a questão.

            Mas por que também não há um incentivo ao médico que se forma no Brasil a ir para esses Municípios onde não há médicos ou onde há poucos médicos? Aliás, esse meu projeto falava só da obrigatoriedade de o médico formado em escolas públicas de Medicina ficar pelo menos dois anos em Municípios onde havia carência de médicos. Mas o Ministério da Saúde - e eu já disse isto aqui - colocou em prática, pelo menos com relação ao Programa Saúde da Família, uma coisa muito importante: quanto mais distante de Brasília o médico estiver, mais ele recebe, inclusive contando pontos para a prova dele de residência, se ele sair da faculdade e for para o interior.

            É muito importante que nós façamos aqui um debate bem claro, que busquemos um consenso, a dosagem certa, para que, de fato, toda a população brasileira... De um lado, concentra-se no Sul e no Sudeste a maioria dos médicos. Mesmo no Norte e no Nordeste, onde há essa carência, a maioria deles está nas capitais ou nas cidades de porte médio, porque, realmente, eles não vão para Municípios onde não há um hospital ou onde há um hospital em que não haja condições de eles exercerem adequadamente a profissão.

            Então, é preciso que haja um debate claro e que procuremos sentar à mesa com os representantes da categoria, com representantes do Sindicato dos Médicos, da Federação dos Médicos, da Associação Médica Brasileira e do Conselho Federal de Medicina e com outros atores envolvidos, para que encontremos, de fato, uma medida adequada. Eu diria que isso não é emergencial, que isso não pode ser tratado emergencialmente. Isso é urgente, mas não é emergencial.

            Portanto, acho que tem de se buscar, repito, a dose certa para esse problema, de maneira que, inclusive, possa haver estímulo para que o médico que se forma... Por exemplo, eu me formei em Belém. Quando fui Secretário de Saúde pela primeira vez no meu Estado, liguei para os meus colegas, porque lá não havia anestesista, não havia pediatra, não havia traumatologista, e consegui levar para lá um médico de cada especialidade. Insisti para levar para lá outros. E o que eles diziam? Colegas que se formaram em Belém, na Região Norte, diziam assim: “Quanto é que se paga aí?” Eu dizia: “Quanto é que você está recebendo em Belém?” Eles diziam que estavam recebem x. E eu dizia: “Pois é, aqui pagamos duas vezes x, e ainda o Governo dá casa mobiliada para você morar. Você não vai pagar aluguel, nada.” Sabe o que me respondiam, Senador Wellington? Alguns deles me responderam: “Prefiro ganhar metade aqui no asfalto a ganhar o dobro no mato”.

            Então, realmente, vamos forçar esse médico a trabalhar onde ele não quer? Agora, é preciso encontrar incentivos que, de fato, permitam que o médico que sai de uma faculdade vá para lá. E me refiro mesmo aos médicos do Norte. Até os médicos que estão se formando em Roraima, pelo menos a maioria deles está saindo para outros Estados. Eles fazem residência em São Paulo ou em Brasília e terminam ficando por aqui, não voltam para lá. Mas a existência do curso de Medicina lá, por exemplo, já propiciou uma média muito boa na relação médicos/população.

            Senador Wellington, ouço V. Exª com muito prazer.

            O Sr. Wellington Dias (Bloco/PT - PI) - Senador Mozarildo...

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Senador Wellington, antes de V. Exª falar, permita-me cumprimentar os meus amigos e amigas do meu querido Rio Grande aqui presentes. São estudantes do curso de Direito da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, a nossa querida Unisinos. Muitas vezes fui recebido por eles lá.

            Vocês estão assistindo, na tribuna, ao Senador Mozarildo Cavalcanti, Líder do PTB, médico, que está, neste momento, discorrendo sobre um tema de que o ex-Governador do Piauí, Líder do meu Partido, Wellington Dias, vai falar, em um aparte, que é a questão da saúde, da falta de médicos no Brasil e da possibilidade de médicos do exterior trabalharem aqui e também de estudantes nossos que vão para o exterior exercerem sua atividade aqui como médicos.

            Está aqui no plenário alguém de quem vocês gostam muito, tenho certeza, o Senador Pedro Simon. S. Exª será o próximo orador.

            Senador Pedro Simon, estou dizendo à gauchada que está na plenária - permitam-me falar assim -, às gaúchas e aos gaúchos de todas as querências, que o senhor será o próximo orador a falar, em seguida, no plenário do nosso Senado.

            Enfim, sejam todos bem-vindos!

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR) - Quero também cumprimentá-los. São estudantes de Direito, e a nossa Constituição diz que é dever do Estado e direito do cidadão o acesso à saúde. Portanto, o Governo brasileiro está descumprindo isso há muito tempo ao não colocar em prática esse dispositivo constitucional. O importante é conseguir motivar os médicos brasileiros, em primeiro lugar, a irem para o interior e até para as periferias das capitais, mas sem excluir a hipótese de trazer médicos de outros países, para que todo Município, por mais longínquo e pequeno que seja, tenha um médico para atender a população.

            Senador Wellington, com muito prazer ouço V. Exª.

            O Sr. Wellington Dias (Bloco/PT - PI) - Com o maior prazer. Eu também quero saudar aqui todos os visitantes do Rio Grande do Sul. É um prazer muito grande recebê-los. Saibam do orgulho que também temos da representação gaúcha nesta Casa, com o Senador Paulo Paim, que é um orgulho do povo brasileiro e do nosso Partido; o Senador Pedro Simon, que é uma legenda viva, um homem que todo o Brasil admira; e a Senadora Ana Amélia, que não está aqui, mas por quem temos a mesma admiração. Sejam bem-vindos. Mas, Senador Mozarildo, veja, é importante este debate - e hoje, para que todos saibam, é uma sessão apenas de debate, não é deliberativa, por isso fica, normalmente, mais vazia -, e eu quero falar, primeiro, da atitude tomada pela Presidenta da República. Esses dias, tive a oportunidade de dialogar com ela, que tem consciência de que, na percepção do povo, esse é um dos problemas mais graves, e é real. Ela, como Presidenta, tem bem mais informações e bem mais dados do que qualquer um de nós, individualmente. Por isso é importante o depoimento de V. Exª, pela experiência de, como médico, estar nas entranhas do Brasil, em tribos indígenas e em cidades maiores, como Belém, e agora no Estado que representa, Roraima. Quero que V. Exª saiba que as medidas que a Presidenta está tomando vão em várias direções porque ela quer resolver problemas. E sempre diz: “Estou disposta a colocar recursos, mas quero que esses recursos vão exatamente para onde é necessário, exatamente para onde o povo percebe que existe o problema”. Então, o povo percebe que é o problema do médico. O que ela está fazendo? Descentralizando formação. No meu Estado, por exemplo, o Piauí, só tinha em Parnaíba. Aliás, só em Teresina, melhor dizendo. Ampliou em Teresina, que agora tem ensino superior pela federal, e há também uma faculdade em Parnaíba, que deve estar fazendo o primeiro vestibular agora, e a outra, no início do próximo ano. E vai ter em Picos, no sul do Piauí. Então, a ideia é descentralizar, em cada Estado, essa formação. Junto com isso, residência médica. Ou seja, precisamos de especialistas, de pediatra... Ontem, eu vi aqui, em um debate, algo para o que eu mesmo não havia atentado: o pediatra, por exemplo, por que falta? Porque é uma profissão que, muitas vezes, é a consulta, é o retorno... E as tabelas do SUS? É uma vergonha o que pagam por consulta, para dar o exemplo. Por essa razão, o pediatra termina indo por outros caminhos. Então, há a necessidade de resolver situações como essa. De outro lado, abrir com prioridade para o médico brasileiro. Há dois caminhos para isso. Primeiro, criando condições, inclusive de apoio financeiro durante o estudo, com uma contrapartida após a formação, para onde Brasil precisa. Segundo, que as vagas ofertadas sejam, primeiro, para brasileiros e brasileiras. Se há vagas para 5 mil médicos no Brasil, primeiro os brasileiros. Caso não sejam preenchidas essas vagas, Municípios ficaram descobertos, aí vem a necessidade. E não podemos ter preconceito contra isso. Ora, se existe uma cidade brasileira... O meu Estado, Senador, tem 224 Municípios, e 120 Municípios ainda não têm um médico residente. Há Municípios com 10 mil habitantes e um médico, dois. Então, há necessidade real de dar soluções a problemas concretos como esse. Agora, o médico estrangeiro que vier, ele vem direcionado, como disse aqui outro dia o Senador Eduardo Braga, para perceber um CRM para aquele Município. Se for designado para trabalhar no Município de Morro Cabeça no Tempo, no Piauí, que está precisando, após o contrato não pode ir para Teresina, a capital, que é até bem servida de profissionais. E ampliar nas especialidades, porque o problema maior é na área da média complexidade, especialmente. É dessa parte que vamos precisar cuidar. Então, eu quero aqui louvar V. Exª por essa fala lúcida, que é importante, pela sua experiência. E nós temos de preservar, primeiro, médicos e médicas brasileiros, está certo? De outro lado, não deixarmos de ter e de nos somar à coragem da Presidente. Há necessidade de contratar, inclusive complementando com médicos de outros países? Sim! E para tirar da frente uma mentira que muitas vezes se espalha: não se trata só de médicos cubanos - é preciso não ter preconceito contra eles -, mas também de espanhóis, chilenos, argentinos, enfim, de qualquer lugar, de preferência de língua portuguesa e espanhola, porque é mais fácil de lidar, no dia a dia, com o nosso povo. Quero parabenizar V. Exª e me somar à defesa que faz. Muito obrigado.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR) - Antes de responder o aparte de V. Exª, quero registrar que se encontra, na tribuna de honra, o ex-Deputado e ex- Vice-Governador do meu Estado de Roraima, Salomão Cruz, que nos honra muito nesta sessão.

            Senador Wellington, no início do meu pronunciamento, citei o exemplo de Roraima, tanto por trazer médicos para o Governo e serem distribuídos no interior - por sinal, um deles, já naturalizado brasileiro, hoje é prefeito de um Município...

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Senador Mozarildo, me desculpe, mas se o Senador Simon não olhar para lá e não abanar, eles não vão embora. Agora, sim.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR) - Então, como eu estava dizendo, Roraima tem essa experiência, tanto na questão de o médico ir para o interior quanto do professor que colaborou com a instalação do nosso curso de Medicina e até em outros cursos e áreas da faculdade.

            Mas, realmente, como disse V. Exª, alguns problemas são um entrave para o exercício da Medicina, não motivam o jovem médico a ir para o interior. Primeiro, a inexistência de hospitais ou a existência de hospitais mal equipados. Às vezes, como disse V. Exª, em um Município com 10 mil habitantes, há um ou dois médicos, e esse médico tem que ser o faz-tudo. Às vezes, ele vai ter de fazer uma cirurgia e não ter sequer um colega para ajudá-lo. Não há anestesista.

            Nós temos um diagnóstico. E o que falta fazer? É a terapêutica, o tratamento adequado. É isso que estou defendendo. Portanto, com relação a essa questão de dizer que vão contratar seis mil médicos cubanos, não tenho preconceito contra os médicos cubanos. Ao contrário, conheço vários em meu Estado, muito competentes, em várias áreas complexas, por sinal. Mas também, V. Exª abordou um ponto fundamental, a tabela do SUS é aviltante, assim como a dos planos de saúde.

            Então, é muito incompreensível que alguém, por exemplo, faça um parto cesariano e receba algo em torno de R$300,00, ou R$350,00 por um parto normal.

            O Sr. Wellington Dias (Bloco/PT - PI) - Muitas vezes, para trocar o pneu de um carro estão cobrando isso.

            O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (Bloco/PTB - RR) - Pois é.

            Eu sempre digo que está aviltada ou ultrapassada essa tabela. Tem que ser corrigida, assim como tem de haver uma fiscalização maior dos planos de saúde e do atendimento de modo geral.

            Porém, também há outro problema, Senador Wellington, muito sério na área de saúde. Eu até apresentei um projeto dobrando a pena para caso de corrupção na saúde e na educação. E o Senador Paulo Davim foi mais longe, apresentou outro projeto considerando crime hediondo a corrupção na área de saúde. Pois alguém que rouba na área de saúde está roubando o quê? Muitas vezes, a vida de uma pessoa. Muitas, a saúde daquela pessoa.

            E essa situação é estarrecedora. Dados da Controladoria-Geral da União (CGU), se não me engano publicados no ano passado, mostram que, nos últimos quatro anos, foram desviados, só da Funasa (Fundação Nacional da Saúde), que, inclusive, tem sob sua responsabilidade o atendimento à saúde da população indígena, por corrupção, R$500 milhões.

            Então, isso é inaceitável. E acontece na maioria dos hospitais públicos. No meu Estado, que é pequeno, em uma operação recente da Polícia Federal, constatou-se um mecanismo de corrupção na compra de remédios e assessórios hospitalares. O que acontecia? Um grupo de empresários, lógico que mancomunado com funcionários de hospitais, pedia um, dois, três remédios em caráter de emergência porque estavam faltando na rede ou estavam, no estoque, se extinguindo. Esse grupo, então, contatava empresas distribuidoras de outros Estados, comprava medicamentos com prazo de vencimento de um ou dois meses, portanto, comprava lá embaixo, pela metade do preço normal, e chegava o remédio com o prazo já expirando. Um mês, dois meses depois, tudo era descartado e, de novo, outra compra dispensando licitação porque era emergência. Nessa brincadeira, só o que foi possível detectar foram R$30 milhões. Assim, a saúde já tem um problema sério, que é o do financiamento adequado do setor.

            Eu aqui defendi e votei a favor da regulamentação da PEC 29, que estabelece um percentual que o Governo Federal deve gastar com a saúde. Porque hoje está estipulado quanto o Município tem que gastar, que é 15%; o Estado, 12%; e para o Governo Federal não há nada estipulado. Não é possível que o Governo, que cuida do Brasil todo, não tenha a obrigação formal de ter um percentual para investir em algo que, depois da vida, é o mais importante, que é a saúde, porque é ela que garante a vida da pessoa, a qualidade de vida. Não cuidando da saúde, a pessoa perde a vida. Então é fundamental.

            E vou propor à Comissão de Assuntos Sociais, da qual sou membro e é onde tratamos desses assuntos, que façamos uma audiência com instituições médicas e com instituições populares, de forma a haver uma discussão, junto com representantes do Ministério da Saúde, e se chegar, de maneira rápida, a um tratamento adequado para essa questão.

            O que me preocupa - V. Exª disse muito bem - não é a questão de nacionalismo burro, não. Evidentemente, temos que dar prioridade aos médicos brasileiros, temos que dar incentivos para os médicos brasileiros irem para as regiões carentes desses profissionais. Ao se constatar que não há esses profissionais, eu não vejo outra solução, como foi feito no meu Estado, senão trazer médicos de outro lugar. Em Municípios do meu Estado - tirando a capital, são apenas 14 -, na maioria deles, não havia médicos. Então, é preciso realmente enfrentar esse problema. Não podemos deixar, digamos, a coisa passando, pois a população é quem paga o pato, o doente é quem paga o pato.

            A gente vê, em reportagens e mais reportagens, pessoas que estão há não sei quantos dias tentando marcar uma consulta e não conseguem. Ou quando conseguem, o médico não está, porque adoeceu, enfim, e faltou ao serviço. Se for caso para cirurgia, é outro drama para marcá-la. Isso tudo acontece a ponto de o projeto nosso - que, aliás, já foi até sancionado pela Presidente Dilma - estabelecer um prazo, por exemplo, para uma doença. Ou seja, quando os portadores de câncer têm o diagnóstico, o SUS tem que atendê-lo, no máximo, em 60 dias.

            Ora, vejam bem, quando a pessoa tem diagnóstico de câncer, nem sempre é no início. E quanto tempo ela leva para ter esse diagnóstico no SUS, no serviço público? E aí, quando ela tem o diagnóstico, o tratamento às vezes demora. Nós colocamos aí 60 dias, que já é um prazo prolongado para quem tem câncer, sabendo que tem câncer, esperar dois meses para poder ter o tratamento adequado.

            É preciso, sim, fazer uma reforma sanitária neste País, uma reforma da saúde pública no País.

            Eu confio que o Ministro Padilha, que é um homem que não só é médico, mas é político e conhece, portanto, o Brasil, e é da Região Norte também, seja o homem que possa, de fato, mudar esta realidade.

            Repito, não é só a Região Norte que tem problemas. Todas as regiões têm, até São Paulo tem. Há Municípios em São Paulo - eu tenho notícias - que não têm médicos também, como a periferia da capital também tem carência. E, mesmo na capital, mesmo na cidade de São Paulo, alguns serviços públicos são uma pena, fora - vou usar aqui esta palavra - algumas maracutaias que são feitas para que, de alguma forma, não exista médico presente para atender as pessoas.

            Eu lamento muito isso e quero dizer que realmente, Senador Wellington, nós temos que agir rapidamente, porque a saúde pública - e mesmo a saúde de planos de saúde - no Brasil já está na UTI.

            Então, nós temos que, urgentemente, tratá-la e corrigir isso, que é, como eu disse aqui, um dever constitucional do Governo. Está na Constituição, de cuja elaboração eu tive a honra de, como Constituinte, participar, que a saúde é um dever do Estado e um direito do cidadão.

            Portanto, até diria que os governos brasileiros todos têm agido de maneira inconstitucional nesta questão.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/05/2013 - Página 30234