Discurso durante a 87ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Defesa do Programa Bolsa Família.

Autor
Humberto Costa (PT - Partido dos Trabalhadores/PE)
Nome completo: Humberto Sérgio Costa Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO, POLITICA SOCIAL.:
  • Defesa do Programa Bolsa Família.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 05/06/2013 - Página 33172
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO, POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • DEFESA, POLITICA SOCIAL, BOLSA FAMILIA, ANALISE, DADOS, REFERENCIA, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO, MOTIVO, IMPLANTAÇÃO, PROGRAMA, ENFASE, SETOR, EDUCAÇÃO, SAUDE.

            O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco/PT - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ouvintes da Rádio Senado, espectadores da TV Senado, hoje venho a esta tribuna para falar do maior programa de redução da pobreza da história deste País. Eu me refiro ao Bolsa Família, que, nos últimos dias, voltou a ser objeto de críticas e de questionamentos, inclusive por políticos do Nordeste, uma das regiões mais beneficiadas pelo programa.

            Falo aqui não somente para responder a esses críticos, mas também para me dirigir à população brasileira, inclusive aos cidadãos e cidadãs que conhecem de perto o programa, aqueles que puderam ser reintegrados à sociedade, e, com isso, tiveram ou estão tendo a oportunidade de lutar, com maior dignidade, por uma vida melhor, incomparavelmente com mais chances do que tinham quando eram marginalizados.

            É lamentável que, depois de tantos dados e exemplos de sucesso, um programa reconhecido nacionalmente e internacionalmente seja atacado; e, junto com ele, muitos beneficiários, vistos como pessoas acomodadas, que desejam passar toda a vida à custa das benesses públicas. Que argumentos são esses? Ao bom político e homem público são necessárias sensibilidade social e compreensão da importância de programas de inclusão social, num país que historicamente sempre teve percentuais elevados de pobreza e de desigualdade.

            Segundo o estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que trata do empreendedorismo, o auxílio financeiro do Bolsa Família não desestimula os favorecidos a buscar emprego ou a se tornar empreendedores. A publicação Radar, do Ipea, mostrou que 38% dos chefes de família elegíveis para o Bolsa Família trabalham por conta própria. Os empreendedores que pertencem ao cadastro do programa estão concentrados na Região Nordeste (41%); depois estão mais presentes no Sudeste (32%), seguidos do Norte (10%), Sul (10%) e Centro-Oeste (8%).

            Dados do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome mostram que 1,69 milhão de famílias beneficiadas pelo Bolsa Família deixaram espontaneamente o programa, declarando que a renda já tinha ultrapassado o limite de R$140,00 por pessoa. Isso representa 12% do total de 13,8 milhões de famílias atendidas. Esses dados abrangem o período entre outubro de 2003 e fevereiro de 2013, ou seja, todo o período do programa.

            Além dessas famílias que declararam espontaneamente terem ultrapassado o limite de renda para recebimento do benefício, a fiscalização excluiu 483 mil beneficiados flagrados com renda superior àquela permitida pelo programa.

            O Bolsa Família está inserido numa estratégia maior que inclui portas de saída para aqueles beneficiados que puderam prosperar, deixando a situação de miséria ou pobreza em que se encontravam.

            Parte do Plano Brasil Sem Miséria, voltado para os 16 milhões de brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$70,00 por mês, o Bolsa Família tem três eixos principais: transferência de renda, condicionalidades e ações e programas complementares.

            A transferência de renda resgata o cidadão marginalizado da extrema pobreza, dando um alívio imediato e maiores condições de inclusão social. As condicionalidades reforçam o acesso a direitos sociais básicos nas áreas de educação, saúde e assistência social. As ações e programas complementares, por sua vez, permitem que os beneficiários superem a atual situação em que se encontram e que possam prosperar.

            Trata-se, portanto, de um plano articulado, com repercussão em outras áreas importantes, como na saúde e na educação, com resultados que já podem ser colhidos. Por exemplo, os estudantes das famílias inscritas no Cadastro Único (CadÚnico) que recebem o Bolsa Família têm chances 11% menores de repetir o ano do que aqueles cadastrados não contemplados pelo programa. É o que demonstram pesquisadores do Ipea, que cruzaram dados de três bases administrativas: o CadÚnico, o Projeto Frequência e o Censo Escolar.

            Além dos melhores índices de aprovação, o Ministério da Educação observou que a exigência da frequência às aulas por parte do Bolsa Família faz diferença também na redução do abandono escolar, evitando a evasão dos estudantes da rede pública.

            Os indicadores de abandono escolar no ensino fundamental são de 3,6% entre os beneficiários do Bolsa Família contra 4,8% da média nacional. No ensino médio, 7,2% dos contemplados do programa deixam a escola, frente a 14,3% da média nacional.

            Os resultados positivos também foram verificados na saúde. Estudo publicado na conceituada revista inglesa The Lancet mostra que, entre 2004 e 2009, o Programa contribuiu para a queda de 17% na mortalidade infantil entre crianças menores de 5 anos.

            O estudo apontou impacto ainda maior da ação do Bolsa Família quando a causa da mortalidade está relacionada à segurança alimentar. Isso porque o programa foi responsável direto pela diminuição de 65% das mortes causadas por desnutrição e 53% dos óbitos causados por diarreia.

            Essa pesquisa, realizada em 2.853 Municípios brasileiros, coordenada pelo Sr. Maurício Lima Barreto, coordenador do Instituto Nacional de Ciência, Inovação e Tecnologia em Saúde da Bahia, e envolveu outros pesquisadores brasileiros.

            O impacto do Bolsa Família na economia também já foi verificado e amplamente divulgado, com a melhoria de renda e de consumo da população brasileira. Nesse período de estiagem do Nordeste, foi fundamental para garantir as necessidades mínimas de sobrevivência da população, reduzindo os saques assistidos em outros períodos de seca da história do Nordeste.

            A própria Organização Internacional do Trabalho declarou, em seu Informe Mundial sobre o Trabalho Infantil, a importância do Bolsa Família para a redução do trabalho infantil no nosso País. De acordo com o informe, o Bolsa Família reduziu em 8,7% a quantidade de crianças trabalhando no campo e em 2,5%, na área urbana, desde a sua criação. E não só a OIT, mas diversas outras entidades internacionais reconhecem a importância do programa. Cito aqui a Organização das Nações Unidas (ONU), o Banco Mundial e o Banco Monetário Internacional.

            A experiência brasileira também foi adotada no México, na Venezuela, na Bolívia, no Peru, no Equador e em outros países da América Latina. Recomendado pela ONU, o programa inspirou iniciativas na África do Sul, em Gana, no Egito, na Turquia, no Paquistão, em Bangladesh e na Indonésia.

            É, portanto, caros Senadores, caras Senadoras, de se estranhar ou, pelo menos, lamentar as críticas lançadas contra o Bolsa Família. Mas os brasileiros sabem dos avanços obtidos com o programa e da importância dele para mudarmos a situação de pobreza historicamente cultivada neste País.

            Por isso é que nos estranha que alguns dos próceres mais importantes da oposição ergam as suas vozes para criticar o programa e para dizerem que nós precisamos apontar saídas produtivas para os membros do Bolsa Família, quando isso já acontece. Ouvi alguns nordestinos, inclusive, dizerem que nós não queremos ter a geração, hoje, dos integrantes do Bolsa Família, dos pais do Bolsa Família e dos avós do Bolsa Família. É lógico que isso não vai acontecer. É um dado concreto da realidade que aqueles que conseguem emergir socialmente jamais vão dar um passo atrás.

            Na verdade, esse é um programa que contribuiu e contribui decisivamente para que milhões de pessoas possam sair da pobreza. Lógico que não foi apenas o Bolsa Família, mas o Bolsa Família, conjugado com a geração de empregos, com o aumento da renda, com o aumento de salários, com a recuperação do valor do salário mínimo, produziu uma profunda mudança social em nosso Brasil. Por isso é que não temos e pedir desculpas a ninguém. A Presidenta Dilma não tem de pedir desculpas a ninguém e por nada relativo ao Bolsa Família, a não ser que vá pedir desculpas por ter o Bolsa Família contribuído para tirar milhões de pessoas da condição de miséria absoluta, a não ser que vá pedir desculpas por ter dado a esses pobres do País, juntamente com o Presidente Lula, a oportunidade de acesso à educação, a políticas de assistência social, à habitação, a políticas de saúde.

            Portanto, queremos aqui fazer a defesa enfática desse programa. E, de forma enfática, também, condenar aqueles que pretendem, com as suas críticas, não somente enfraquecer o programa, mas atacar o Governo. Se, de fato, são tão preocupados com o problema da pobreza, da miséria, por que é que não o implantaram nos governos em que estiveram à frente da Nação? Por que é que não consolidaram esses programas para atingir uma parcela tão importante de brasileiros e de brasileiras como o Bolsa Família atingiu e continua atingindo?

            Portanto, Sr. Presidente, a melhor resposta que podemos dar àqueles que pretendem descaracterizar, desmoralizar o Bolsa Família é deixar que o povo dê essa resposta. Quem vive de forma nababesca não sabe o que significa a importância do Bolsa Família. Mas as pessoas pobres, que antigamente não tinham sequer a certeza de, no dia seguinte, poderem fazer e dar aos seus filhos três refeições, esses sabem o que o Bolsa Família representou e representa para o nosso País.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª permite um aparte, Senador Humberto Costa?

            O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco/PT - PE) - Pois não, Senador Eduardo Suplicy.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª faz aqui uma análise, um registro muito importante a respeito do principal programa de transferência de renda hoje em execução no Brasil e que tem repercussão internacional. Tanto é que, em diálogos da própria Presidenta Dilma Rousseff ou do ex-Presidente Lula com chefes de Estado, ministros de inúmeros países em desenvolvimento, seja da África, seja da própria América Latina - como nesses últimos dias o Presidente Lula tem estado na Colômbia, no Peru, no Equador, onde ele está nesta semana, como há duas semanas aconteceu aqui em Brasília com inúmeros ministros de Moçambique e de outros países da África -, todos quiseram saber mais a respeito dos programas de transferência de renda, dentre os quais, o Programa Bolsa Família. Cabe assinalar - V. Exª aqui conhece que Senadores da oposição às vezes fazem essas críticas - que houve diversos aspectos de cooperação com esses programas. Primeiro, em 1956, indo um pouco para trás, quando Josué de Castro, lá de Pernambuco, era Deputado Federal, durante o governo Juscelino Kubitschek, num pronunciamento sobre os desníveis de renda no Brasil, ressaltando a extraordinária desigualdade socioeconômica, a certa altura desse discurso, falou, com muita clareza: “Eu defendo que toda pessoa precisa ter o necessário para a sua sobrevivência como um direito de ser brasileiro”. A frase foi aproximadamente essa. Então, ele pode ser considerado, com Celso Furtado, com Milton Santos e outros, como um dos precursores daquilo que vem a ser a garantia de uma renda. Aqui, no início de 1991, todos os partidos aprovaram um primeiro projeto de garantia de renda mínima, por meio de um Imposto de Renda negativo. Foi por consenso, em 16 de dezembro de 1991. Naquele mesmo ano, José Márcio Camargo, professor da PUC, numa reunião de economistas do governo paralelo de Lula, em Belo Horizonte, ponderou que a garantia de uma renda é uma coisa positiva, mas seria bom começar relacionando as oportunidades de educação. Escreveu um artigo com essa proposta. E Cristovam Buarque, então governador do PT, em 1995, concomitante a José Roberto Magalhães Teixeira, em Campinas, este do PSDB, o primeiro do PT, instituíram os primeiros programas que foram se espalhando por todo o Brasil, até que o Bolsa Escola, o Bolsa Alimentação, o Auxílio Gás, e daí o Cartão Alimentação, em 2003, foram existindo, quando a equipe interministerial de Lula resolver racionalizar e promover a unificação de todos os programas naquilo que é o Bolsa Família, que, de 3,5 milhões de famílias em dezembro de 2003, passou hoje para 13,9 milhões de famílias, aproximadamente, fazendo com que o Coeficiente de Gini de desigualdade, que estava próximo de 0,59 em 2001/2002, viesse para 0,519, e em todos os anos decrescendo, quer dizer, ao longo dos últimos 10 anos. Então, é formidável esse avanço, ainda que estejamos, Senador Humberto Costa, não mais entre os três países mais desiguais do mundo, mas ainda somos o décimo sexto mais desigual do mundo. Portanto, a Presidenta Dilma Rousseff diz bem que é um começo, mas que ainda precisamos avançar bastante.

(Soa a campainha.)

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Portanto, quero cumprimentá-lo por ter trazido hoje o diagnóstico de como o Programa Bolsa Família tem, efetivamente, diminuído a mortalidade infantil pelas mais diversas causas, inclusive a diarreia, nesse estudo tão bem feito, que V. Exª assinalou, pelos pesquisadores da Bahia e de toda a região do Nordeste, em mais de dois mil Municípios brasileiros. Meus cumprimentos a V. Exª.

            O SR. HUMBERTO COSTA (Bloco/PT - PE) - Senador Suplicy, agradeço o aparte de V. Exª.

            Digo, inclusive, que, quem sabe, o sucedâneo do Bolsa Família venha a ser o Programa de Renda Mínima, que, sem dúvida, é parte de uma discussão muito importante que todos nós devemos travar no sentido de reduzir as desigualdades e garantir a todos o mínimo, não somente para sua sobrevivência, mas para uma vida feliz.

            Sr. Presidente, agradeço a tolerância de V. Exª. E obrigado a todos os Senadores e Senadoras.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/06/2013 - Página 33172