Discurso durante a 89ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro da visita do Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a Sidrolândia, no Estado do Mato Grosso do Sul, em busca de uma solução para o conflito entre índios e produtores rurais na região.

Autor
Ruben Figueiró (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MS)
Nome completo: Ruben Figueiró de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • Registro da visita do Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a Sidrolândia, no Estado do Mato Grosso do Sul, em busca de uma solução para o conflito entre índios e produtores rurais na região.
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 07/06/2013 - Página 34012
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • REGISTRO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), VISITA, LOCAL, ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), OBJETIVO, BUSCA, SOLUÇÃO, CONFLITO, GRUPO INDIGENA, PRODUTOR RURAL, SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, TRECHO, EDITORIAL, PUBLICAÇÃO, JORNAL, O ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), REFERENCIA, POLITICA INDIGENISTA, GOVERNO FEDERAL.

            O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco/PSDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, eminente Senador pelo Paraná, Requião, Sras e Srs. Senadores, meu Estado, Mato Grosso do Sul, recebeu na manhã de ontem uma notícia auspiciosa: a ida do Sr. Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a Sidrolândia, fazendo-se acompanhar de um contingente de 110 militares da Força Nacional de Segurança, para encontrar uma saída para o gravíssimo conflito entre índios e produtores rurais de meu Estado. O Sr. Ministro, ciceroneado pelo Governador André Puccinelli, foi ao Estado para verificar in loco a zona de conflito onde se localizam 35 fazendas de pequenos e médios produtores que se acham ameaçados por índios da chamada Aldeia Buriti, que consideram aquelas terras de seu uso e posse.

            As dúvidas sobre o direito de domínio e posse estão claramente demonstradas por reiteradas decisões judiciais, embora algumas constem de processos protelatórios impetrados pela Funai e mesmo pelo Ministério Público Federal. Os dados objetivos demonstram com clareza que na região não há terra indígena e, pior, que os laudos antropológicos da Funai são peças fraudadas por especialistas contratados por ONGs internacionais claramente indicadas pelo Cimi.

            Entendo, Sr. Presidente, que a visita do Ministro, aliás provocada quando da audiência que S. Exa concedeu à Bancada Federal de meu Estado, na última terça-feira, foi saudada, no primeiro momento, como alvissareira. Realmente pensei que o Governo Federal iria verificar, no cenário dos conflitos, a gravidade da situação.

            Ainda naquela audiência, entre muitas afirmações feitas pelos Parlamentares sul-mato-grossenses, num ambiente acalorado, embora muito respeitoso, tive oportunidade de declarar a S. Exª, o Ministro, que, aliás, tergiversava nas suas respostas, que ali estávamos, nós, Parlamentares, clamando pela vida de brancos e índios, e não pelo direito de posse das terras naquele momento, uma vez que posse e domínio jamais poderão se sobrepor ao direito à vida.

            A imprensa, Sr. Presidente, já noticiou fortemente sobre o resultado daquele encontro, e uma solução preliminar ocorreu com a decisão do Governador André Puccinelli de solicitar, por intermédio do Ministério da Justiça, a presença da Força Nacional, o que de fato ocorreu.

            Sr. Presidente, a expectativa era de que deveria ser cumprida a ordem da Justiça Federal de reintegração de posse da fazenda Buriti, cuja decisão anterior foi atropelada por um grupo de indígenas, em desrespeito a um acordo de trégua estabelecido no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, entre as partes e, assim, chancelado pelo representante do Conselho Nacional de Justiça, ali presente, que lá foi por determinação por determinação do próprio e ilustre Presidente daquele Conselho.

            A nova ordem de reintegração seria cumprida na data de ontem, ao meio-dia. No entanto, a comunidade sul-mato-grossense foi surpreendida com a decisão da mesma Justiça, pelo Juiz Federal Jânio dos Santos, que atua na 1ª Vara Federal. Ele considerou que a reintegração de posse da área deveria ser suspensa até o julgamento pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em São Paulo, devido a um recurso da Advocacia-Geral da União que solicitava apenas a suspensão da multa de R$1 milhão por dia.

            Vejam, Srs. Parlamentares, que estranho: a AGU não solicitou a suspensão da reintegração de posse, e, repito, apenas a suspensão da multa. Mas, mesmo assim, o juiz extrapolou o pedido da AGU e concedeu, de maneira injustificada, a suspensão da reintegração de posse. Horas depois, o próprio, mais estranhamente ainda, TRF referendou tal resolução, criando um imbróglio jurídico preocupante.

            Ora, quando a própria Justiça se mostra refém do medo, a quem o cidadão poderá recorrer? A falta de compreensão da importância do cumprimento da lei não pode ser tolerada. O Brasil inteiro assistiu, escandalizado, os índios rasgarem e pisotearem uma ordem judicial. Esse fato abre um precedente gravíssimo, pois leva os cidadãos a crer que é factível, em última instância, fazer justiça com as próprias mãos.

            Resultado, Sr. Presidente, Srs. Senadores: volta-se perigosamente ao status quo anterior, criando um tremendo desassossego dos produtores de alimentos e da população do meu Estado.

            A comunidade está se mobilizando contra essa posição dúbia e volúvel das autoridades que devem zelar pela justiça plena, de um lado, e, de outro, pela segurança dos brasileiros que procuram a preservação de seus direitos constitucionais.

            Tive a informação, Srs. Senadores, de que, agora pela manhã, produtores estão entrando com um pedido de habeas corpus na Justiça para impedir que os proprietários de terras que sofreram invasão possam ser presos por força policial. Trata-se de uma decisão de resistência dramática, Sr. Presidente, que poderá provocar a perda de vidas caso a conflagração atinja níveis insuportáveis. Essa é uma denúncia que faço mais uma vez à Nação.

            Estou, Sr. Presidente, triste, muito triste, porque, sinceramente, esperava que, a partir da tarde e noite de terça-feira, surgisse uma luz a brilhar no território do meu Estado, luz partida do farol da República, a esperança de que a ordem pública e a segurança de índios e não índios voltariam a ser o apanágio de uma convivência fraterna entre irmãos, embora de etnias diferentes.

            Com muito prazer, eminente Senador Paulo Paim.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senador Ruben Figueiró, primeiro, cumprimentar V. Ex ª, que vem mais uma vez à tribuna, e com justa razão, para tratar desse tema que, com certeza, preocupa o seu Estado e preocupa o País. Hoje pela manhã, esse assunto foi o tema principal, eu diria, da Comissão de Direitos Humanos, em que debatemos requerimento apresentado pelo Senador Randolfe Rodrigues no sentido de que uma comissão vá conversar com o nosso Ministro da Justiça, e que, depois dessa conversa, se crie até o que chamamos de comissão especial para que, se for o caso, vá ao seu Estado. Além disso, até mesmo convidar o Ministro para dialogar sobre o tema aqui no Senado da República. O assunto tomou conta da principal imprensa, eu diria, do País e do exterior. A mídia, no exterior e no Brasil, está a comentar a situação de confronto entre agricultores e índios. É preciso, como diz muito bem V. Exª, ao estampar no pronunciamento a sua tristeza, que esse clima de guerra seja retirado, que seja colocado de lado, e que prevaleça o diálogo, a paz, o entendimento. E que cada um seja senhor de seus atos, responsável por seus atos, e que se dê a quem de direito o que cada um merece. Por isso é fundamental, como V. Exª lembra, a participação do Executivo. O Governo Federal tem que atuar firmemente nessa questão. Por isso a Comissão de Direitos Humanos está se colocando à disposição do seu Estado para tentar colaborar na busca de um entendimento para esse conflito que preocupa a todos. Parabéns, mais uma vez, pelo pronunciamento de V. Exª, um pronunciamento, eu diria, indignado, mas, percebo, cheio de amor, cheio de carinho, cheio de fraternidade e de tristeza, porque se trata de uma guerra fratricida, entre irmãos, principalmente no seu Estado, do nosso povo. Parabéns a V. Exª.

            O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco/PSDB - MS) - Muito obrigado Senador Paulo Paim. Não é a primeira vez que V. Exª se manifesta prestigiando os pronunciamentos que faço aqui.

            Realmente, a nossa luta, como disse o Ministro da Justiça, não é pelo domínio ou a posse da terra, é pela vida de nossos irmãos, que está correndo perigo. Ainda hoje, Sr. Senador Paulo Paim, na Comissão de Agricultura, o Senador Acir Gurgacz, de Rondônia, manifestou a sua apreensão, assim como o Senador Sérgio Souza. O Senador Acir Gurgacz até sugeriu a ida de uma comissão, como fez a Comissão de Direitos Humanos da nossa Casa, e eu afirmei a ele que gostaria, primeiro, que as autoridades da República se sensibilizassem com o nosso clamor, e que se não tomassem uma providência definitiva, então, nós, Poder Legislativo, teríamos de tomá-la, em nome das instituições nacionais.

            Agradeço profundamente, mais uma vez, a manifestação de solidariedade de V. Exª. É uma manifestação que representa o pensamento do Senado da República. Não podemos absolutamente permitir que haja conflito entre irmãos, índios e não índios; afinal de contas, todos somos brasileiros.

            Muito grato a V. Exª.

            E prossigo, Sr. Presidente.

            Ainda não sei dos desdobramentos factuais dessa contradição das autoridades federais, com decisões dúbias, uma entendendo que deva haver conciliação entre as partes com cumprimento da lei; e outra estimulando a discórdia, promovendo a negação absoluta do Estado democrático de direito.

            Sr. Presidente, é com muito pesar, repito, que ocupo esta tribuna para relatar esses fatos, mas não desesperançado de que o Governo há de perceber que, agindo com dubiedade como está, não atenderá os objetivos constitucionais a que é obrigado e, assim, terá que responsabilizar-se perante a Nação - repito - , ora pela omissão, o que é ruim para a sua imagem, ora por ação errônea frente aos fatos, o que será péssimo, dado o abalo ao seu conceito e prestígio futuro.

            Diante da minha decepção com a visita do Ministro da Justiça - isto com os dados que tenho em mãos -, não sei se a presença da Força Federal lá na área conflagrada será suficiente para garantir o gesto extremamente agressivo das comunidades indígenas, violentando frontalmente os conceitos de propriedade, de ordem e de segurança.

            Desejo também esclarecer a V. Exªs que a Força Nacional foi para lá para ficar na área conflagrada e está a 10 quilômetros do local. Ora, ela precisava estar onde estão índios prevenidos e proprietários rurais precavidos. Lá é o lugar em que ela deve exercer sua força coercitiva, a fim de evitar um mal maior.

            Mas prossigo, Sr. Presidente.

            Em conversa ontem com o Presidente da Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), Eduardo Riedel, ouvi a seguinte pergunta em tom de extrema frustração - aspas -:

A Força Nacional está em Mato Grosso do Sul para garantir a invasão? Ou a presença da Força Nacional será para restaurar o domínio que o Estado assegurou ao produtor, além da segurança ao direito inalienável de vida daqueles que, certos ou errados, estão em situação de penúria?

            Em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, o Presidente da Associação dos Criadores de Mato Grosso do Sul (Acrissul), Chico Maia, com a ênfase necessária de quem não tem papas na língua, recriminou a situação conflituosa no Estado, e teve, no final de sua entrevista, uma afirmação que aqui com pesar registro - aspas -:

Vai deixar só o produtor que já produz com sacrifício, que a sua produção não é valorizada nem reconhecida, que vende comida barata para o país inteiro, leva o país nas costas nesta fase da economia? Além de tudo isso é ele quem tem que resolver o problema indígena, se ele é vítima assim como os índios?

A sociedade tinha que ver essa questão dos dois lados. Quando a mídia mostra um indiozinho nu, chorando, numa fotografia que sensibiliza, ele pode ver que do outro lado tem um pequeno produtor com o "filhozinho" nu, chorando e que tem tanto sofrimento quanto ele [o índio].

            Sr. Presidente, Srs. Senadores, o que dizer mais diante disso?

            Antes de concluir, eu desejo ler, Sr. Presidente, para que conste nos Anais, trechos de um editorial publicado ontem no prestigioso e opinativo jornal O Estado de S. Paulo sobre a questão indígena, também um alerta à Nação, ipsis litteris - aspas -:

Os lamentáveis episódios de agora, portanto, são fruto do populismo irresponsável que há mais de 12 anos desmoraliza as instituições democráticas, disseminando a crença de que a lei - ora, a lei - só deve ser respeitada quando convém a um difuso ‘interesse social’ habilmente manipulado pelos poderosos de turno.

A triste realidade ilustrada pela disputa por uma terra que uma hesitante Justiça não consegue decidir a quem pertence é o resultado da incapacidade ou falta de coragem do Executivo de conduzir politicamente o conflito, de modo a criar as bases técnicas e legais de um entendimento que possibilite a acomodação dos interesses em choque - de um lado, os da população indígena, e de outro, o dos produtores rurais.

            E mais:

No centro do conflito, a Fundação Nacional do Índio (Funai) perdida entre a antropologia e a ideologia, tem seu trabalho contestado pelos produtores rurais e as associações que os representam, e defendida pelos “progressistas”, pela CNBB e pela Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo. Percebendo a vulnerabilidade do órgão responsável pela coordenação da política indigenista, o governo defende agora a ampliação do elenco dos responsáveis pela formulação dessa política - e recebe críticas de quem não quer que as coisas mudem.

            Vozes autorizadas partem desta Casa, Sr. Presidente, e tenho a obrigação de aqui relatar - aspas -:

“As soluções existem, falta decisão política”, é a opinião insuspeita do eminente senador petista Delcídio do Amaral [vou repeti-las: “As soluções existem, falta decisão política”, é a opinião insuspeita do eminente senador petista Delcídio do Amaral], que tem participado de reuniões sobre o assunto no Palácio do Planalto e garante que “não foi por falta de aviso” [Ora, não foi por falta de aviso!] que se criou o atual impasse a partir da ocupação da Fazenda Buriti.

            E para finalizar, diz o editorial:

A evidenciar a incapacidade do governo de tratar competentemente a questão indígena está o fato de que o conflito de Sidrolândia se arrasta há 13 anos, ao longo dos quais, pela ausência de referências sólidas do ponto de vista histórico, antropológico e legal, se alteram decisões judiciais contraditórias. E é nesse vácuo que a radicalização prospera.

            Sr. Presidente, com a leitura de parte do editorial do O Estado de S. Paulo, que bem retrata o meu pensamento, encerro meu pronunciamento, reiterando a minha confiança no despertar da consciência do Governo Federal para restabelecer a concórdia entre índios e não índios, hoje em conflito por culpa da omissão do próprio Governo.

            Sr. Presidente, sei que extrapolei o meu tempo regimental e mereci a tolerância de V. Exª pelo seu espírito democrático e pela consciência de um problema que também é do seu Estado, o Paraná.

            Muito obrigado a V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/06/2013 - Página 34012