Discussão durante a 83ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Referente ao PLC n. 132/2012 (n. 7.193/2010, na Casa de origem).

Autor
Pedro Taques (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MT)
Nome completo: José Pedro Gonçalves Taques
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
Outros:
  • Referente ao PLC n. 132/2012 (n. 7.193/2010, na Casa de origem).
Publicação
Publicação no DSF de 29/05/2013 - Página 30897

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT. Para discutir. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, não sou useiro e vezeiro em violar a lei, muito menos o Regimento Interno. Queria dizer isso a S. Exª o Senador Lobão.

            Muito bem, eu quero, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicialmente, cumprimentar os delegados de polícia, os servidores do sistema de polícia, que aqui se encontram, você agente, investigador, escrivão, membros do Ministério Público Federal e Estadual que aqui se encontram.

            Eu quero dizer, inicialmente, que eu devo minha vida à polícia. Devo minha vida à polícia. Passei quase 7 anos de minha vida com escolta de delegado de polícia, de investigador, de agente da Polícia Civil e da Polícia Federal. Quero expressar o meu respeito à polícia brasileira.

            Muito bem. Um segundo ponto, Sr. Presidente, é dizer a S. Exª, o Sr. Relator, que ele foi absolutamente honesto no seu relatório. Este projeto não tem relação com a PEC nº 37. Eu quero dizer isso com honestidade legislativa, com honestidade parlamentar. Eu analisei este projeto em todos os seus pontos e entendo que este projeto, de nenhuma maneira, tem relação com a Proposta de Emenda à Constituição nº 37, que se encontra em andamento na Câmara dos Deputados. Com certeza, se aqui chegar, vou fazer a defesa contrária à aprovação da PEC nº 37. Mas, por honestidade, temos que dizer isso.

            O projeto me traz algumas preocupações e eu gostaria de dividir estas preocupações com os Srs. Senadores e as Srªs Senadoras que aqui se encontram. A primeira delas: qual é a importância do inquérito policial? Em poucos países do mundo existe inquérito policial igual ao que existe no Brasil desde 1941. Alguns doutrinadores dizem o seguinte: “Se o inquérito é bem feito, ele precisa ser refeito durante a ação penal; se ele é malfeito, precisa ser novamente feito pela autoridade policial”. Mais do que discutir a atuação do delegado de Polícia Federal ou Polícia Civil, nós precisamos, no Brasil, debater a eficiência da chamada investigação preliminar; precisamos debater a eficiência da denúncia ofertada pelo Ministério Público; precisamos debater a eficiência dos processos judiciais que resultam em condenação ou absolvição.

            Eu apresentei quatro emendas. Uma delas eu retiro, porque já foi acatada pelo Senador Humberto, no tocante ao art. 3º, que trata da igualdade de tratamento entre o Ministério Público, a Defensoria Pública e os delegados de polícia. Entendo que, na democracia, requisitos como V. Exª, tratamentos como V. Exª têm o objetivo de afastar o cidadão daquele que exerce o poder. Melhor seria que Senadores, Deputados, Procuradores da República, membros do Ministério Público, delegados fossem chamados apenas de senhor, com todo o respeito. Agora, trazermos para a lei esse tratamento! Melhor seria se mudássemos a Lei Complementar nº 75, que fala que o membro do Ministério Público tem que ser tratado como excelência - isso é uma excrescência! -; mudássemos a Lei Complementar nº 35, de 1979, que diz que o juiz tem que ser tratado de excelência - isso também é um absurdo!

            Alguns pontos que apresentei: delegado de polícia preside inquérito policial - e é bom que assim seja feito -, e o delegado de polícia conduz o termo circunstanciado. O projeto trata de outros procedimentos legais. Quais seriam estes outros procedimentos legais? A dúvida aqui chegará ao Poder Judiciário, tenho absoluta compreensão disso.

            Nós, neste momento, não somos contra delegado de polícia presidir inquérito policial e conduzir o termo circunstanciado. Tem que fazer isso, sim, porque está no Código de Processo Penal, até que aprovemos a mudança do Código de Processo Penal, como se encontra na Câmara dos Deputados. Esse primeiro ponto trará sérias dificuldades ao Poder Judiciário no momento de decidir o que o delegado vai presidir.

            Segundo, o projeto está assim narrado, Sr. Presidente: “Ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a condução da investigação”. A Constituição da República não fala em condução. A Constituição da República, no art. 144, fala que o delegado vai apurar infrações penais. A diferença existe, e essa diferença precisa ser ressaltada. Quem conduz, dirige. E o inquérito policial no Brasil é uma peça absolutamente dispensável, de acordo com o art. 46 do Código de Processo Penal.

            O Ministério Público, como titular constitucional da ação, pode dispensar o inquérito policial. Está previsto, desde 1941. Está previsto isso no decreto-lei, que é o Código de Processo Penal, todos nós sabemos.

            O §1º diz: “Cabe a condução da investigação criminal, por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei”. Quais seriam esses outros procedimentos previstos em lei? Quais seriam? Por que não estabelecermos aqui os procedimentos previstos em lei? Porque, com isso, pode-se chegar à conclusão de que a autoridade policial poderia presidir, por exemplo, o inquérito civil público, que está estabelecido na Lei de Ação Civil Pública. Ah, não pode, porque este projeto trata da investigação policial. Nós todos sabemos que trata da investigação policial. No entanto, aqui, e disse isto na Comissão de Constituição e Justiça, nós teremos sérias dúvidas na aplicação deste dispositivo.

            No § 2º: “Durante a investigação criminal, cabe ao delegado de polícia a requisição de perícia, informações, documentos e dados”. Não vejo nenhum problema nisso. Aliás, hoje é assim. A autoridade policial pode fazer isso sim. Requisição aqui no sentido de determinação. A autoridade policial faz isso e pode fazer isso. Não vejo prejuízo algum a requisição prevista no art. 129 da Constituição. Por honestidade parlamentar, tenho que dizer isso, e honestidade acadêmica. Não vejo prejuízo algum.

            Continuo, Sr. Presidente. Estou relacionando os temas que trouxe através das três emendas que apresentei.

            O § 3º: “O delegado de polícia conduzirá a investigação criminal de acordo com o seu livre convencimento técnico jurídico”. Livre convencimento. Quem é dotado de livre convencimento pode se recusar a praticar determinados atos. Isso em Direito Administrativo, a ele existe a discricionariedade, a oportunidade e conveniência de praticar este ato. Livre convencimento isso significa.

            Outro ponto do §3º que se me apresenta como absolutamente inconstitucional - e eu vou dizer - é a segunda parte desse mesmo §3º: “delegado com isenção e imparcialidade”. Imparcialidade só existe em processos judiciais onde existem partes. Por isso, o juiz é imparcial. Ele é equidistante, ele não se compromete psicologicamente com a causa, ele possui capacidade subjetiva. Só existe imparcialidade em processo judicial. No inquérito policial, que não é processo judicial, pode ser processo “judicialiforme”, que é outra coisa, no inquérito policial, é um procedimento administrativo.

            O delegado de polícia não tem imparcialidade, ele tem impessoalidade, que são termos completamente diferentes, porque está prevista a impessoalidade no art. 37 da Constituição da República. Impessoalidade, aqui, do delegado de polícia significa não beneficiar os amigos, não prejudicar os inimigos. Isso significa a impessoalidade do caput do art. 37 da Constituição.

            Falar em imparcialidade do delegado é, com todo o respeito, nós reduzirmos a função do inquérito policial. O inquérito policial é uma defesa do Estado contra aquele que comete crime. Se nós permitirmos que o delegado tenha imparcialidade no inquérito policial nestes termos, nós permitiremos ao delegado de polícia juntar documentos do investigado que assim requerer. E os delegados aqui presentes sabem que o art. 14 do Código de Processo Penal diz que essa é uma faculdade do delegado de polícia, não é um poder, dever do delegado de polícia, porque, no inquérito policial, não existe contraditório, não existe ampla defesa. O inquérito policial é um procedimento administrativo que decorre do dever fundamental que o Estado tem de investigar a prática de crime. Trocando isso em miúdos, não existe parte em inquérito policial. Por isso, imparcialidade só pode ser dita lá na ação penal, não no inquérito policial, como procedimento que é administrativo.

            Eu tenho dúvidas, Senador Humberto Costa, a respeito disso. E a consequência jurídica de imparcialidade aqui é uma consequência jurídica prejudicial à luta contra a corrupção, à luta contra a criminalidade...

            (Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Sr. Presidente, muito obrigado.

            O SR. PRESIDENTE (Renan Calheiros. Bloco/PMDB - AL) - Com a palavra, V. Exª.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Eu quero acatar o conselho do Senador Lobão e não violar o Regimento Interno. Eu vou continuar a dizer, porque não me utilizo de chicanas para que possamos chegar até a hora da verificação da presença dos Senadores aqui. Então, eu vou continuar se V. Exª assim me permitir.

            Senador Humberto, aqui eu tenho esta dúvida a respeito da chamada imparcialidade.

            E continuo. No §6º: “O indiciamento é privativo do delegado de polícia”. Muito bem. O que é indiciamento, de acordo com o Código de Processo Penal nacional? Nada mais do que o momento em que o delegado de polícia, a autoridade policial - e é bom que assim seja dito - forma a sua convicção a respeito de que um dos investigados ou suspeitos, como se diz no coloquial, teria praticado a conduta que ele está a investigar. Qual é a consequência jurídica do indiciamento? A consequência jurídica do indiciamento: a partir daí, o seu nome passa a constar no Instituto Nacional...

(Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - ... de Identificação, e ele, aquele indiciado, pode, a partir daí - se não existir identidade civil, conforme determina o art. 5º da Constituição -, ter a obrigação de ser identificado criminalmente.

            O indiciamento no Brasil não tem a razão de ser de outros países, porque o indiciamento no Brasil não obriga o titular constitucional da ação a ajuizar a ação penal. O Ministério Público pode, e a Constituição, no art. 129, inciso I, a ele determina, deixar de denunciar aqueles que a autoridade policial pediu o seu indiciamento. Se a autoridade policial, e é um ato privativo fazer o indiciamento, o Ministério Público pode, lá na ação penal, se ele oferece a denúncia, com fundamento num procedimento administrativo que ele conduz, e o Supremo Tribunal Federal já disse que isso possível, o Ministério Público pode determinar...

(Interrupção do som.)

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - ... o indiciamento (Fora do microfone.) daquele cidadão, para que ele possa constar o seu nome no cadastro, no Instituto Nacional de Identificação.

            Eu, Senador Humberto Costa, quero ressaltar a honestidade de propósitos de V. Exª aqui e, mais uma vez, como ex-representante do Ministério Público Federal, porque eu não me licenciei, não me aposentei, eu me exonerei do cargo, e com a honestidade parlamentar, dizer, para encerrar, que eu não entendo que este projeto possa, de alguma forma, restringir o poder-dever que a Constituição da República oferta, ao meu juízo, ao Ministério Público, para que ele possa conduzir investigações.

            No entanto, os temas levantados, Sr. Presidente, nestas três emendas - para que peço o apoiamento dos Srs. Senadores -, trarão grandes dificuldades no sentido de que nós possamos ter uma investigação criminal que seja séria, que seja decente...

(Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - ... que seja honesta, no sentido da eficiência, que é isso que o cidadão brasileira deseja.

            Sr. Presidente, já encerro, dizendo o seguinte: mais do que discutir este projeto, nós temos sim que discutir a função do delegado, temos sim que regulamentar a investigação por parte do Ministério Público, através de uma lei, em sentido formal e material, para que nós tenhamos limites na investigação por parte do Ministério Público. Defendo isso. Agora, isso não faz com que eu possa concordar com projetos de lei que, a meu juízo, e de acordo com a vontade do povo de Mato Grosso, dos eleitores que me mandaram para cá, me dão este poder-dever de aqui falar a respeito disso.

            Esses três pontos causarão sérios transtornos na investigação, e eu gostaria do apoiamento dos colegas que aqui se encontram. E não adianta, senhores, nós debatermos o seguinte: “Ah, mas nós vamos debater o projeto aqui e este...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - ...projeto vai voltar à Câmara dos Deputados.” Aliás, se nós não tivermos o poder-dever de emendar projetos que da Câmara venham, nós temos que acabar com o Senado da República, porque ele não tem outra função a não ser a de ser uma Casa revisora dos projetos que se iniciam na Câmara dos Deputados.

            Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)

(Manifestação nas galerias.)

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 29/05/2013 - Página 30897