Discurso durante a 94ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Destaque para a necessidade de o Mercosul se reinventar, atualizando-se às exigências do novo milênio.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).:
  • Destaque para a necessidade de o Mercosul se reinventar, atualizando-se às exigências do novo milênio.
Publicação
Publicação no DSF de 14/06/2013 - Página 36839
Assunto
Outros > MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).
Indexação
  • COMENTARIO, NECESSIDADE, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), RENOVAÇÃO, POLITICA, COMERCIO EXTERIOR, FATO, ALTERAÇÃO, POLITICA EXTERNA, RELAÇÃO, COMERCIO, MUNDO.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Sr. Presidente, Senador Jorge Viana, Presidente desta sessão, com quem eu me congratulo. Quero, Sr. Presidente, rapidamente, me congratular com o Presidente do Senado, Senador Renan Calheiros, do Senado e do Congresso Nacional, por ter adotado a iniciativa de enviar à Câmara Federal um novo projeto que estabelece uma nova distribuição, um novo compartilhamento dos recursos do Fundo de Participação dos Estados. É inacreditável, é surreal que a Câmara Federal tenha procedido da forma que procedeu ontem, simplesmente rejeitando uma proposta que foi discutida, que foi deliberada pelo Senado Federal, e, ao rejeitar, está, na prática, contribuindo para a judicialização de uma deliberação que nós Congressistas precisamos fazer.

            É sabido que o Supremo Tribunal Federal já declarou a inconstitucionalidade da lei em vigor, abrindo prazo excepcional para que o Congresso se posicionasse. O Senado, em tempo tempestivo, se posicionou, mas a Câmara depois entendeu rejeitar a manifestação e, portanto, mais uma iniciativa, mais uma tentativa para que a Câmara Federal possa entender a urgência e a importância do Fundo de Participação dos Estados como fonte de financiamento para as nossas políticas públicas em nossos Estados.

            Está correta a iniciativa do Presidente Renan Calheiros e nós estaremos associados a esse esforço para que o Senado, mais uma vez, possa dar mais essa contribuição.

            Mas, Sr. Presidente, está em discussão pelo Brasil - e não apenas no Brasil, também no exterior - a atual política comercial internacional adotada pelo nosso País. Na qualidade de Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado, venho mantendo intenso diálogo, frequente, com setores da sociedade brasileira, entre os quais entidades acadêmicas, entidades empreendedoras, sobre a atual quadra da nossa política externa, com especial interesse em procurar compreender como nossas opções se refletem, no curto e no médio prazos, nos interesses comerciais do País e, ainda mais, como os brasileiros serão afetados pelas escolhas feitas pelo Governo Federal nessa quadra.

            São decisões que repercutem igualmente em declarações dadas sobre o Mercosul, em entrevistas concedidas por entidades acadêmicas, por lideranças políticas - como, por exemplo, o eminente Senador Pedro Simon, valendo-se, recentemente, da sua autoridade, não apenas como Senador, mas como ex-Ministro, como ex-Governador, por toda uma jornada e uma trajetória que tem de envolvimento com o tema do Mercosul, seu impacto e a sua importância para o nosso País - mas também por entidades de classe, como a Confederação Nacional da Indústria, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, e por especialistas, economistas, empresários, acadêmicos, enfim, por um conjunto muito amplo da sociedade brasileira que entende e que tem preocupação com os rumos e com essas escolhas.

            Tudo isso - acho eu - é muito natural e deve ser saudado pelo que tem de positivo: por ser o nosso País uma das maiores economias do mundo, por ser tido como um país líder entre os emergentes, membro dos BRICS, do G20. É natural que a posição que adotarmos nessa temática de relações exteriores mereça a atenção dos observadores e influencie outros atores da cena mundial. Mais ainda, é natural porque, diante do acelerado redesenho do mapa-múndi das relações econômico-comerciais - que, aliás, acompanha mudanças estruturais também sem precedentes na nova arquitetura das relações internacionais - os caminhos e estratégias, enfim, escolhidos pelo Brasil serão interpretados como sinal a ser levado em consideração nos cálculos sobre que futuro nos espera a todos. Mira-se o Brasil na certeza de que aqui se tem feito uma reflexão madura - não apenas madura, mas profunda - sobre o que se passa no mundo atual, sobre tendências e processos ora em curso que, em sua complexidade e ineditismo, nos impactam e serão determinantes para o nosso futuro.

            Hoje, portanto, permito-me aqui indagar algumas questões: será mesmo que o Governo brasileiro está prestando a devida atenção às mudanças em curso no comércio internacional, principalmente no que se refere ao denominado giro para o Pacífico, tal como definido na inflexão proposta pelo Presidente Obama para o seu país, de que também é exemplo a recém-formada Aliança do Pacífico, composta por vizinhos do Brasil?

           Estaria nosso Poder Executivo, que detém primazia, hegemonia em assuntos de natureza político-comercial externa do Estado brasileiro, preparado para reagir de forma mais pragmática e menos ideológica aos novos tempos e às novas configurações da economia mundial?

           A necessidade da intensificação do debate sobre os rumos das relações comerciais externas do Brasil reside na consciência das imensas transformações que se operam na economia internacional com o momento econômico preocupante que o Brasil parece ter voltado a atravessar. Com efeito, há muitos anos o Brasil não temia, como agora, a volta do fantasma da inflação, ou a deterioração de nossos fundamentos macroeconômicos, notadamente no balanço de pagamentos e na balança comercial, tudo isso em conjuntura de baixo crescimento do Produto Interno Bruto.

           A verdade é que as expectativas, que são balizadoras da confiança dos agentes econômicos, obviamente estão toldadas por um sentimento de crescente incerteza, não apenas em nosso País, mas há uma incerteza no mundo!

           Boa parte do impulso que nosso comércio exterior experimentou recentemente decorreu de fatores sobre os quais não tínhamos qualquer controle, particularmente a contínua expansão da demanda agregada chinesa, que apreciou os preços internacionais de diversos produtos primários brasileiros durante anos seguidos. Por outro lado, nesse último decênio, talvez até mesmo em função daquelas circunstâncias favoráveis, o Brasil sofreu o preocupante fenômeno da desindustrialização, de maneira mais aguda em sua pauta de exportações.

           De global trader em fase de afirmação, exportador de bens e serviços de ampla gama, desde os primários até os mais sofisticados, o Brasil se tornou grande fornecedor de matérias-primas minerais, agrícolas e alimentares, estas, em certa medida, parcialmente processadas. Sem desmerecer esses setores dinâmicos em que o Brasil tem excelência e competitividade de padrão global, por tudo que temos de tecnologia embarcada em nossa produção agrícola, e cuja performance tem impedido que o resultado do PIB fosse ainda mais baixo, o fato é que involuímos quando examinamos as características do valor agregado em nossa pauta de exportações.

            Hoje, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, pretendo me ater a aspectos de nosso comércio internacional e de como o Brasil pode estar correndo o grave risco de perder oportunidades tão valiosas quanto passageiras, justamente quando precisamos da alavanca externa...

(Soa a campainha.)

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - ... para contra-arrestar alguns inquietantes sinais em nossa performance econômica. Uma ampla agenda de competitividade, que urge ao Brasil enfrentar, está em aberto, gerando prejuízos que todos haveremos de lamentar no curto e médio prazo.

            De novo, Sr. Presidente, quero meu foco mais estreito: a inserção internacional do Brasil e as alternativas que se nos apresentam em termos de política comercial, à luz de compromissos em vigor e dos dinâmicos processos que estão sendo negociados por alguns de nossos mais importantes e estratégicos parceiros. No debate que ora se trava sobre o tema, por várias razões o Mercosul aparece como o vilão preferencial, o que não me parece justo com o nosso bloco.

            O Mercosul teve o mérito de disseminar confiança entre vizinhos que antes se hostilizavam, transformando-os em sócios de uma empreitada que alcançou êxito inegável, com a multiplicação de nosso comércio intrabloco, De fato, não fazia sentido nem econômico muito menos político a continuidade de uma situação em que o Brasil, até a fundação do Mercosul, importasse milhões de dólares anuais de trigo procedente, por exemplo, dos EUA, do Canadá e até mesmo da Europa, e nada adquirisse dos nossos vizinhos, irmãos, Argentina e Uruguai, grandes produtores e exportadores de trigo. O mesmo se poderia mencionar com relação ao petróleo, já que antes nada importávamos da Argentina. Portanto, não há que se discutir: a meu juízo, e por convicção e com convicção, o Mercosul é uma instituição que veio para ficar, que faz sentido até mesmo para além dos resultados estritamente econômicos que certamente produziu e produz, Sr. Presidente.

(Soa a campainha.)

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - Por outro lado, o fascinante mosaico - já vou concluir, Sr. Presidente, - de novas parcerias e entendimentos que vinculam parceiros antigos e também os não tradicionais, que aproximam regiões antes distantes, tem que nos fazer refletir se, depois de um quarto de século, não é também chegada a hora de o Mercosul se reinventar, se refundar, deixando de ser concepção datada da década, enfim, de 1980, no século passado, e atualizando-se às exigências do novo milênio, mediante um possível redesenho institucional capaz de torná-lo mais dinâmico e propositivo, em nome de um pragmatismo que no momento parece faltar ao bloco, preso que está às preferências ideológicas momentâneas de alguns de seus membros, e naturalmente incluindo o Brasil.

            Contudo, para tratar do Mercosul - do Mercosul de hoje e de seus possíveis caminhos futuros - convém, antes, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, contextualizá-lo. Quando o Acordo de Assunção estabeleceu o Mercosul, em 1991, se coroava de êxito importante o processo de superação de desconfiança que havia marcado o relacionamento, sobretudo entre o Brasil e a Argentina. Com o fim das ditaduras militares no Cone Sul, os Presidentes Sarney e Alfonsín ensaiam, a partir de 1986, os primeiros passos naquela aproximação, para o que precisaram desmilitarizar as fronteiras e jogar luz sobre os respectivos programas nucleares, para só então avançar na negociação de instrumentos de coordenação bilateral que conduzissem à paulatina integração econômica.

            Os vizinhos Uruguai e Paraguai, que igualmente...

(Soa a campainha.)

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - ... saíam de regimes autoritários, se vincularam àquelas negociações e se tornaram, também, sócios-fundadores do Mercosul, que nasceu para ser instrumento de um regionalismo aberto, não excludente, que servisse de plataforma não só para fomentar o comércio intrazona, mas também para estimular trocas com terceiros países. Vale notar que são Estados Associados do Mercosul a Bolívia, o Chile, o Peru, a Colômbia e o Equador. Ainda que não sejam Estados Associados, em 2012, a Guiana e o Suriname passaram a contar com formas de participação nas reuniões do Mercosul. Também em 2012, como sabemos, a Venezuela foi incorporada ao Mercosul, após a suspensão do Paraguai, em reação ao processo que resultou no afastamento do Presidente Fernando Lugo pelo Parlamento paraguaio.

            Agora, sim, Sr. Presidente, vou caminhar para o encerramento.

            Cabe lembrar, por sua vez, que o Mercosul convive com a Aladi, Associação Latino-Americana de Integração, criada pelo Tratado de Montevidéu. A Aladi, que inclui o México e todos os países sul-americanos, à exceção da Guiana e do Suriname, nunca ambicionou evoluir para uma união aduaneira que impusesse a seus membros uma política comercial única e uma tarifa externa comum, no que talvez tenha sido mais pragmática, se comparada àquela que o Mercosul adotou.

            A diversidade de objetivos estratégicos e de condições de desenvolvimento relativo entre os componentes nunca recomendou que a Aladi ousasse engessar seus membros, subordinando-os a objetivos de integração mais ambiciosos, que jamais sairiam do plano declaratório ou mesmo retórico.

            Isso é verdade, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tanto que, por exemplo, o México, sem abdicar de sua qualidade de membro fundador da Aladi, pôde associar-se aos EUA e ao Canadá no Nafta, em 1994. Depois ele logrou negociar parceiros...

(Soa a campainha.)

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - ... e agora está em processo de constituição da Aliança do Pacífico.

            Sr. Presidente, o inimigo tempo não permite que eu vá adiante na minha manifestação.

            O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco/PT - AC) - V. Exª tem tempo para concluir.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - Eu vou concluir...

            O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco/PT - AC) - Siga com o tempo.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - Vou concluir.

            O SR. PRESIDENTE (Jorge Viana. Bloco/PT - AC) - Asseguro o tempo.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - Retornarei à tribuna em outra oportunidade, porque estou manifestando muitas preocupações com os números do Mercosul.

            Parece-me que nós precisamos participar, ativamente, como protagonistas, deste debate: o futuro do Mercosul, seus cenários vis-à-vis o que está acontecendo mundo afora.

            Então, retornarei à tribuna, para, numa segunda parte de meu pronunciamento, em outro dia, não apenas contextualizar, diagnosticar, mas até mesmo sinalizar propostas e alternativas, para que, à luz das evidências dessa conjuntura que estamos vivendo, o Governo Federal, que é hegemônico e que tem protagonismo nessa questão, possa de fato permitir o compartilhamento com o Congresso Nacional, com o Senado Federal, na definição das diretrizes que melhor possam contemplar os interesses nacionais. Eu retornarei à tribuna para concluir o meu pronunciamento, em outra oportunidade, até por respeito aos meus colegas Senadores, que também estão ávidos por fazer uso da tribuna.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/06/2013 - Página 36839