Discurso durante a 100ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise das demandas da sociedade que motivaram a deflagração das manifestações populares que têm ocorrido no País.

Autor
Pedro Taques (PDT - Partido Democrático Trabalhista/MT)
Nome completo: José Pedro Gonçalves Taques
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL, MANIFESTAÇÃO COLETIVA.:
  • Análise das demandas da sociedade que motivaram a deflagração das manifestações populares que têm ocorrido no País.
Aparteantes
Ana Amélia, Cristovam Buarque, Eduardo Braga, Rodrigo Rollemberg.
Publicação
Publicação no DSF de 21/06/2013 - Página 38779
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL, MANIFESTAÇÃO COLETIVA.
Indexação
  • COMENTARIO, RELATORIO, AUTORIA, GOVERNO FEDERAL, ASSUNTO, RESULTADO, POLITICA SOCIAL, AUMENTO, RENDA, PESSOA CARENTE, INTEGRAÇÃO, CLASSE MEDIA, REGISTRO, FATO, POPULAÇÃO, REALIZAÇÃO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, REIVINDICAÇÃO, MELHORIA, QUALIDADE, SERVIÇO PUBLICO, REPUDIO, VIOLENCIA, DESTRUIÇÃO, PATRIMONIO PUBLICO.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, amigos que nos assistem e nos ouvem pela Rádio, TV Senado, Agência Senado, amigos das redes sociais, nós estamos, às 18h54, do dia 20 de junho de 2013, num momento em que o Brasil, Deputado Domingos Dutra, para, porque o Brasil está parado neste momento. Ele está parado, mas ele está no movimento, no movimento para que possamos reconhecer o real significado do termo “democracia”.

            Ontem, eu vim a esta tribuna para defender que nós, políticos, temos que ouvir a voz das ruas, a voz do povo e dos jovens que querem manifestar que nada anda tão bem como tem sido propalado. Nada anda tão bem como tem sido propalado. Nós não vivemos em um mar azul, em um mar de rosas, não vivemos em um céu de brigadeiro hoje.

            Mas ouvir é tentar entender, Senador Magno Malta, é fazer o esforço de nos colocarmos no lugar da nossa gente que luta diariamente pelo pão e pela dignidade. A maior agressão, o maior desrespeito que se pode fazer a esses brasileiros que vão corajosamente às ruas é dizer que essa atitude é "romântica". Isso é uma agressão a eles que ali estão. Alguns estão dizendo que é "sonhadora", que é "emocional". Isso é uma agressão a esses brasileiros que aí estão.

            Esses brasileiros que estão nas ruas têm motivos, motivos reais para estar lá. Estão defendendo o País com a sua energia, com a mesma coragem e grandeza que mostrou o povo brasileiro ao lutar pelo fim da ditadura, ao exigir a democracia e o Estado de direito democrático.

            Naqueles tempos difíceis, Senador Paulo Paim, diante de movimentos parecidos, o nosso querido poeta Gonzaguinha já lembrava que o nosso povo sabe o que faz e dizia: “A gente quer viver uma nação.”

            O que isso quer dizer? Vamos arregaçar as mangas e começar a descobrir!

            Tenho falado e agido muito sobre as ações de Governo, tenho combatido a captura das agências reguladoras pelos que deveriam fiscalizá-las, as fraudes que se sucedem na gestão fiscal e nos números da execução orçamentária e da dívida pública, da inconsistência global da política econômica atual.

            Mas eu quero, hoje, tentar chegar mais próximo do ponto de vista dos homens e das mulheres do Estado de Mato Grosso, o Estado que tenho a honra de aqui representar, homens e mulheres do Brasil.

            Todos nós temos ouvido um discurso insistente de que “hoje somos todos classe média.” Isso é vendido como a solução de todos os problemas da sociedade. Será que isso é verdade? Será que isso é verdade?

            Vamos ver. Nos últimos dez anos, o Brasil viveu, sim, um aumento importante da renda familiar da população mais pobre. As famílias mais pobres levam mais dinheiro para casa hoje; isso é fato. De 2001 a 2009, pelos dados oficiais, a renda familiar de toda a população cresceu 2,8% a cada ano, enquanto a dos 10% mais pobres cresceu 7%. Muito mais pessoas, hoje, têm dinheiro para atender às necessidades básicas de subsistência nesses últimos dez anos. Isso é fato, temos que reconhecer, Senador Eduardo Braga.

            Mas isso significa o que exatamente? Podemos parar de dizer que está bom? O que é esse tal avanço para a “classe média”, que é tão festejado como a mágica solução de todos os problemas, como a panaceia para tudo?

            Eu vou usar os dados do próprio Governo Federal, que fez um relatório para tentar definir o que é essa “nova classe média” do País.

            A conclusão a que chegou esse grupo - e que é a base para esse discurso que ouvimos a todo momento de que “somos todos classe média” - é de que compõem essa chamada “classe média” famílias que têm uma renda entre R$291,00 a R$1.019,00 por integrante. Assim, um casal com dois filhos seria de classe média se tivesse uma renda entre R$1.164,00 e R$4.076,00, por mês, em 2012. Essa é a definição mais precisa que vem sendo utilizada quase como um refrão, como um mantra.

            É verdade que muitas pessoas, milhões de pessoas conseguiram sair da pobreza econômica e chegar a esse nível de renda nos últimos dez anos. Mas vamos pensar o que isso significa.

            O que isso significa? Vou usar os critérios que o próprio relatório, já falado, utiliza para caracterizar esse grupo chamado “classe média”.

Primeiro, são famílias que conquistam uma mudança nos padrões de sua despesa mensal. Sai da pobreza aquele que já não precisa dedicar uma parcela muito grande de seus recursos à compra de bens de subsistência como alimentos, roupas, artigos de limpeza, transporte urbano, gás, aluguel, luz. São aqueles que podem trazer para sua casa coisas importantes como serviços de saúde privada, educação, livros, viagens ou um carro.

            E aí a casa já começa a cair. Quem disser que uma família que vive com R$1 mil, R$1,5 mil ou R$ 3 mil mensais hoje no Brasil pode arcar com gastos particulares de saúde, educação, veículo próprio está fazendo uma brincadeira de mal gosto.

            Essas pessoas, por mais que tenham uma renda crescente, dependem do serviço público, dependem do Sistema Único de Saúde, dependem da escola pública, dependem do transporte público. Serviços públicos, aliás, que estão na Constituição.

            O mesmo poeta Gonzaguinha já nos alertava: “A gente quer caminho e atenção; a gente quer é ter muita saúde”. E é aí que “a porca torce do rabo!”, como se diz no Estado de Mato Grosso. O avanço da renda, que beneficiou a todos, inclusive os mais ricos, não correspondeu ao avanço nos direitos sociais de verdade.

            Garantir direitos sociais significa enfrentar interesses, significa escolher, na hora de gastar o dinheiro público, o benefício silencioso dos milhões na fila do SUS ou das crianças na escola. O que significa também deixar de bancar os projetos clientelistas com os quais se compra muitas vezes uma base de apoio no Legislativo.

            E a ação do mensalão revela bem isso. Significa também deixar de emprestar escondidos bilhões de reais dos bancos públicos para subsidiar grandes empresas privadas, Senador Cristovam Buarque.

            Significa construir transporte de massa de verdade: metrôs, trens urbanos, o que significa também enfrentar em cada grande cidade os cartéis privados que dominam o atual sistema de transporte e dominam as decisões do poder público e financiam as grandes campanhas eleitorais.

            Não existe almoço de graça!

            Garantir o direito à moradia não é despejar dinheiro para os incorporadores privados erguerem prédios populares. Isso só levou a um aumento brutal dos preços dos terrenos urbanos, fazendo com que os limites de preço do Minha Casa Minha Vida, aqueles que essa nova classe média pode pagar só caibam em terrenos cada vez mais afastados, levando o povo cada vez mais para longe do local de trabalho e para cada vez mais horas enlatado em transporte urbano precário, gerando lucro para o cartel dos ônibus e para o especulador imobiliário.

            Para o Governo, na prática, a nova classe média só precisa de geladeira e televisão, mas o Gonzaguinha já avisava que não é só isso: “A gente quer viver pleno direito”, mas não é só o padrão de consumo que identifica uma classe média.

            No relatório do Governo, aqui citado, também se fala que uma classe média seria aquele grupo de famílias cuja renda vem em sua maior parte do trabalho, e não da assistência governamental nem de rendas de propriedade, e mais do que isso: esse grupo seria também menos vulnerável, ou seja, famílias que possam planejar e construir um futuro sem um alto risco de se tornarem pobres num futuro próximo, ou seja, Senador Cristovam, estaria na classe média aquele trabalhador que hoje está firmemente inserido na economia produtiva e que não sofre o risco de ser varrido dessa posição de hoje para amanhã, como descreve o mesmo Gonzaguinha: “A gente quer valer nosso suor”.

            Para minha honra, concedo um aparte a S. Exª, o Senador Cristovam Buarque.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Senador Taques, o senhor traz aqui algo que transcende - e muito - todo este momento que a gente vive: é o que define progresso, qual o tipo de futuro que nós queremos para o País. Podem achar que não é isso, mas, no fundo, a insatisfação que nós vemos na rua é o fato do esgotamento de um tipo de concepção de progresso. Esgotou-se. A ideia, por exemplo, de progresso de um país é produzir 3,5 milhões de automóveis, em vez de ter um sistema de transporte eficiente - e isso a gente sabe que é muito mais possível com o transporte público. Esse modelo de progresso se esgotou, não cabem mais os carros. O que se fala por carro, fala-se para quase tudo. Esgotou-se o modelo que exige tanta energia, não tem como continuar. Esgotou-se o modelo que exige destruir florestas para produzir soja. O conceito de riqueza mudou. Quando o senhor cita o poeta Gonzaguinha é porque, na sensibilidade dele que vai muito além de qualquer análise, ele percebeu que ser rico não é ter um carro, ser rico não é ter conta bancaria; ser rico é, se for o caso, ter essas coisas para melhorar a condição de vida, mas, se ao ter isso, piora, não é bom. E hoje a gente sabe que carregar dinheiro na carteira leva é a assalto. Então, não leva ao bem-estar. Termina levando é à morte. A gente sabe que ter carro hoje, num país que, para optar pelo automóvel privado, teve que tirar dinheiro da educação, da saúde, para fazer viadutos, para fazer estacionamento até, esse país não cria um sistema de progresso que traga felicidade. O que está levando a meninada para a rua é a percepção de que a felicidade está se evadindo, que a felicidade está ficando longe deles na medida em que eles crescem. É isso que os leva para a rua. E essa palavra “felicidade” não entra na discussão dos governos, porque se preocupam com o PIB, não se preocupam com o bem-estar. Então, a sua fala vai muito além de tudo isso que está acontecendo nesses dias. E se nós não entendermos que o que está acontecendo nesses dias tem uma transcendência da dimensão da sua fala, nós não entendemos nada do que está acontecendo lá fora.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Sim.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Não confundam o que está acontecendo lá fora com a redução de passagem de ônibus. Por favor, confundir isso é não entender nada, nada, da insatisfação, das causas da insatisfação e dos caminhos para superar essa insatisfação. Por isso, eu espero que essa sua fala a gente continue debatendo nesta Casa, mesmo depois que as coisas se acalmem e essas manifestações saiam das ruas para a Internet - porque há uma diferença das manifestações de hoje para as de antes: as manifestações de antes, quando a gente ia para casa, acabavam; hoje, quando a gente vai para casa, elas recomeçam por meio das redes sociais. Este debate a gente deveria levar para as redes sociais: que progresso nós queremos para o Brasil.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Muito obrigado, Senador Cristovam Buarque. “A gente quer valer nosso suor”. Assistencialismo, comemorar esse número de pessoas, de brasileiros que entram em programas assistencialistas, sem que nós possamos comemorar quantos brasileiros saem de programas assistencialistas, é um equívoco histórico. Porque o povo não quer apenas, Senador Cristovam, apenas, receber uma bolsa de todas as qualidades na sua casa, na sua conta, no seu cartão, não interessando a cor. O cidadão quer mais que isso. O cidadão quer dignidade.

            Antes de conceder um aparte a S. Exª, o Senador Eduardo Braga, e logo depois à Senadora, mas antes à Senadora Ana Amélia, que levantou primeiro, Senador Eduardo Braga, é interessante dizer que este movimento, que, neste momento, está aí fora, a classe média a que aqui, inicialmente, eu fiz referência, Senador Cristovam, já financiou seu carro em 82 pagamentos. Já está endividada. Já tem todos os celulares, smartphones, isso é bom. Agora, mais que isso, ela deseja a concretização de direitos sociais, previstos no art. 6° da Constituição. Ela deseja saúde de qualidade. Ela deseja transporte que não possa ser enlatado. Ela demora três horas para ir e três horas para voltar do seu trabalho. Ela deseja educação que possa ser esse instrumento de transformação. Por isso, movimentos como esses que estão aqui. Má qualidade dos serviços públicos. E nós ainda vamos falar a respeito da Copa.

            Concedo um aparte à Senadora Ana Amélia. 

            A Srª Ana Amélia (Bloco/PP - RS) - Senador Pedro Taques, eu assino embaixo de suas palavras e do aparte do Senador Cristovam Buarque, lembrando que acompanhei recentemente um pronunciamento que V. Exª fez dessa mesma tribuna, baseado numa consulta que o senhor fez pelo Twitter aos moradores do seu Estado, Mato Grosso, perguntando a eles o que eles tinham como prioridades. E eles relatavam exatamente... O senhor dizia o nome de cada um que tinha respondido, e que era tudo focado, exatamente, nessa questão de qualidade de serviço, que é o que o Estado, que tanto recolhe de nós por meio dos impostos, não nos devolve em bons serviços. É o transporte de má qualidade, é a questão da segurança, é a questão da saúde, de não haver UTI para a criança, que morre aqui em Brasília, como referi há pouco, e o Senador Cristovam também lembrou. A Raquel é uma manicure aqui da barbearia do Senado. Não é de longe, é daqui do Senado. Hoje a Raquel me disse que faz um curso de Libras, que é a linguagem dos sinais, para ter melhor qualificação. Ela é, ao mesmo tempo, manicure aqui. Ela sai de casa, Senador Cristovam, às 4 da madrugada para pegar dois ou três ônibus em Brasília. Então, vejam, não é problema só de São Paulo, ou Rio de Janeiro, ou de Porto Alegre, mas também da Capital da República, nas - eu diria - barbas do Poder, que uma jovem que quer se qualificar tem que levantar às 4 da manhã para poder chegar às 8 a sua aula de Libras, linguagem de sinais. Esse é um caso que mostra claramente... Lamentavelmente, neste momento, Senador Pedro Taques, há um clima de muita tensão ali fora. Começaram a jogar os rojões, e aquilo que a gente estava defendendo aqui, Senador Paulo Paim, que era uma manifestação pacífica... Estava tudo lindo, muito bonito. Tomara que esse enfrentamento não resulte em violência. A manifestação pacífica, nós todos festejamos e queremos que ela seja cada vez maior. Então, eu queria repetir: assino embaixo do que V. Exª está dizendo, Senador Pedro Taques.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Muito obrigado, Senadora Ana Amélia.

            As manifestações devem ser pacíficas, democráticas. Não é possível violência. O Estado - digo Estado no sentido técnico-jurídico do termo, o Estado nacional, o Estado regional - não pode compactuar com a violência.

            Nós temos que, sim, bater palmas para estas manifestações, agora os radicais, aqueles que se utilizam da psicologia de grupo, do emocional, para a prática de crimes, depredar patrimônios públicos, ofender a integridade de policiais, como disse o Senador Eduardo Braga, estes devem merecer o que determina a lei, pois, senão, nós teríamos a baderna, nós teríamos o não Estado. O Estado é aquele que pode, em determinados momentos, se valer da violência legítima, e esta violência legítima pode ser usada, sim, na defesa do próprio Estado.

            Por isso, eu quero, mais uma vez, me declarar favoravelmente às manifestações sem violência, para que todos nós brasileiros possamos dar um exemplo ao mundo de que aqui nós temos uma Nação, uma Nação de homens e mulheres de bem, homens e mulheres que cumprem a lei, homens e mulheres que respeitam o direito de o outro se manifestar. Por isso, eu quero também repudiar qualquer forma de violência nesse tipo de manifestação.

            Concedo um aparte a S. Exª o Senador Eduardo Braga, honrado Líder do Governo nesta Casa.

            O Sr. Eduardo Braga (Bloco/PMDB - AM) - Senador Pedro Taques, mais uma vez, V. Exª vem à tribuna com absoluta pertinência e com um tema que é hoje o tema que todos nós estamos debatendo não apenas no plenário do Senado mas em todos os lugares. Quero, mais uma vez, dizer que estamos de acordo. As manifestações são legítimas e, além de legítimas, são um marco de um novo tempo, sociologicamente falando, no nosso País. No entanto, Senador Pedro Taques, este é um País de dimensões continentais, e o desenvolvimento no nosso País não chegou de forma igual em todas as regiões. Eu imagino que o Estado de Mato Grosso, com tanta soja sendo produzida, com tanto agronegócio sendo produzido, com...

(Soa a campainha.)

            O Sr. Eduardo Braga (Bloco/PMDB - AM) - ... tantos momentos de desenvolvimento importantes da nossa economia, efetivamente talvez o Bolsa Família não seja tão prioritário no Estado de V. Exª, mas me deixe falar do meu Estado. Um Estado que é proibido de quase tudo. O povo do meu Estado não pode desmatar, porque, se desmatar, está cometendo crime contra o meio ambiente; o povo do meu Estado vive no interior da floresta, com dificuldades de toda a natureza de infraestrutura, de acesso à comunicação, para colocarmos satélite para levar Internet de banda larga para o meu Estado, Sr. Senador. Hoje, 90% dos Municípios do Amazonas ainda não têm sequer um megabyte de Internet, a grande maioria tem 258Kbytes. Nós estamos falando de outra realidade de Brasil. No meu Estado, 300 mil famílias dependem do Bolsa Família. E digo a V. Exª: eu, que tive a honra de governar o Amazonas durante oito anos, fui prefeito de Manaus, construí, Senador Pedro Taques, 30 mil casas para o povo que não tinha onde morar. Meu pai era filho de uma família de 16 irmãos, ficou órfão aos cinco anos e ficou muito pobre. Durante muitos momentos de sua vida, foi obrigado a comer resto de feira, não tinha casa própria. Eu ouvi, durante toda a minha vida, o testemunho do meu pai do quanto era difícil. Depois, quando Deus e o povo me deram a oportunidade de entrar na vida pública e conhecer o desespero das famílias que moravam nos alagados, dentro dos igarapés... Entrava governo e saia governo e não havia política pública que pudesse mudar o destino daquele povo. Eu, sinceramente, Senador Pedro Taques, fiz e ajudo a fazer o máximo para a transformação. A educação é algo que transforma a sociedade e transforma a população de uma vez por todas, mas nós temos que ter tempo para que essas pessoas possam se transformar, para que haja migração econômica e migração social. Esses milhares de brasileiros que estão hoje nas ruas são de um Brasil novo, de um Brasil diferente, de um Brasil que está se transformando, sim, e que quer mais políticas públicas. Mas, se o Brasil conseguiu criar microeconomias importantes em regiões isoladas, em grotões, mesmo em Estados ricos, é porque houve políticas públicas sociais de transferência de renda. Essas políticas não são erradas, essas políticas precisam ser aprimoradas. Sei que V. Exª haverá de concordar comigo. Sei que V. Exª, no afã de compreender toda essa demanda que nós estamos vivendo neste momento, gostaria que as respostas viessem de ontem. Senador, eu fui o governador que, pela primeira vez, implantou escolas de tempo integral em meu Estado, e isso há dez anos, quando o Brasil ainda não falava de tempo integral. Nossas crianças - e muita gente discute, como ainda há pouco assistimos neste plenário, à discussão sobre a menoridade penal, a maioridade penal - até pouco tempo não tinham direito à creche. Foi o Brasil Carinhoso que abriu as políticas públicas que pudessem novamente voltar a construir creches. Fui Prefeito de Manaus e construí nove creches. O meu sucessor teve de fechar as minhas creches, as creches da cidade de Manaus, e transformá-las em escolas infantis. Foi o Fundeb que passou a financiar o ensino médio neste País, não faz muito tempo, no Governo Lula. O Fundef foi no Governo Fernando Henrique, não faz tanto tempo assim. Mais ainda, o Pronatec acabou de ser criado no governo Dilma. Nossas escolas com bolsa, através do ProUni, não faz muito tempo assim. O nosso nível de escolaridade está mudando. Portanto, o que eu quero dizer a V. Exª é que eu vejo um País que está em transformação. Há desigualdades? Claro que há. Há muito que se fazer? Há muito que fazer. Essas manifestações são porque ninguém aguenta mais pagar por celular que não funciona, Senador!

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - E as agências reguladoras?

            O Sr. Eduardo Braga (Bloco/PMDB - AM) - E as agências reguladoras?

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - E o aparelhamento delas?

            O Sr. Eduardo Braga (Bloco/PMDB - AM) - Não é só o aparelhamento. V. Exª aqui, como Senador, participa das nossas comissões e tem o direito e o dever constitucional e regimental de participar do debate que elege, através deste Senado, os representantes dela. V. Exª é testemunha do esforço da Presidenta Dilma em transformar as nossas agências pela questão meritória e técnica em agências eficientes. Há um embate político, neste momento, sobre isso. Mas não é apenas isso. Ainda há pouco, ouvíamos o Senador Rodrigo Rollemberg, que já não está mais no plenário, falar sobre a TV Brasil. E eu ficava me perguntando: o que está transmitindo, neste momento, a TV Cultura de Pernambuco? O que está transmitindo, neste momento, a TV Cultura do meu Estado? Cem mil pessoas, neste momento, já estão nas ruas em Manaus. Ainda há pouco, eram 50 mil. O que está transmitindo a TV Cultura de São Paulo? Portanto, vamos ser corretos, como V. Exª sempre o é, nesta Casa. Por isso eu me encorajo em fazer um aparte com esta filosofia de que estamos fazendo muito, mas ainda há muito que fazer. Mas não achar que nada funciona no País, que nada mudou neste País. Claro que mudou. E há muitas demandas que ainda precisam acontecer. É com esse espírito de mudança e de transformação que eu me alimento de esperança na vida pública. Estou aqui porque acredito que é através da política e da democracia que haveremos de construir este País em que, hoje, as ruas pedem urgência, mais velocidade e mais respostas.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Senador, me permite, porque eu quero comentar...

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Senador, eu vou lhe conceder um aparte imediatamente.

            Eu quero cumprimentar o Senador Eduardo Braga pelo aparte, que prova que ele é um competente Líder do Governo. Esse é o primeiro ponto. Segundo ponto: eu seria um canalha, um idiota se não reconhecesse a importância de programas como o Bolsa Família. Eu seria um canalha, um idiota, um Senador abilolado se eu isso não reconhecesse. No entanto, Senador Eduardo Braga, nós não podemos dourar a pílula, nós não podemos fazer coisas para inglês ver. Isso nós não podemos fazer. Nós não podemos ter uma economia baseada em desonerações. Nós não podemos estabelecer R$18 bilhões para a compra de geladeiras, computadores. Concordo. Mato Grosso é hoje um Estado que produz 43 milhões de toneladas de grãos, 29 milhões de cabeças de gado bovino. Mato Grosso é um Estado rico, mas um pobre Estado rico, um pobre Estado rico.

            Muito bem. Eu quero dizer a V. Exª que eu não sei o que está passando na TV Cultura de Pernambuco, porque o meu discurso não e eleitoreiro. Não sei o que está passando na TV Cultura lá do Estado de São Paulo, mas, na TV Brasil, que é uma tevê pública, não poderia estar a passar desenho animado neste momento.

            Eu concedo um aparte a S. Exª, o Senador Rodrigo Rollemberg.

            O Sr. Rodrigo Rollemberg (Bloco/PSB - DF) - Senador Pedro Taques, agradeço a V. Exª a gentileza de conceder este aparte. Estou acompanhando a sessão e me retirei para receber, com muita alegria, no plenário desta Casa, neste momento, o cacique Aritana, Anuía Yawalapiti, Timáiu Kalapalu e o João Carlos Almeida. Eu tive uma das maiores emoções da minha vida, no ano passado, quando tive oportunidade de participar da celebração do kuarup. Além de toda a generosidade, o acolhimento, o carinho dos povos do Alto Xingu, dos povos do Xingu, os yawalapiti, os kamaiurás, os kalapalus, os kuicuros, todos eles, e hoje, com muita alegria, recebo esses representantes das populações indígenas, que também passam por momentos de grande dificuldade. Neste País, neste momento, há uma luta pela demarcação das terras indígenas. Também é pauta do conjunto de reivindicações a demarcação dessas terras indígenas. Mas terei oportunidade de falar sobre esse tema em outra ocasião. Agora, com muita alegria, neste momento de grandes manifestações da população brasileira, o Plenário do Senado recebe o Cacique Aritana, Anuía Yawalapiti, Timáiu Kalapalu e João Carlos Almeida.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Muito obrigado, Senador.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Senador Pedro Taques.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Quero, antes de passar a palavra ao Senador Cristovam, cumprimentá-los e dizer que é uma honra recebê-los aqui. Mato Grosso os tem em boa conta. Mato Grosso tem quase 30 mil índios. O Parque Nacional do Xingu é o mais antigo demarcado. São 57 as reservas demarcadas. Sejam bem-vindos, brasileiros e brasileiras, índios. Eu os tenho em conta e com respeito.

            Passo a palavra, como um aparte, ao Senador Cristovam Buarque.

            O SR. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Senador, quero fazer um comentário sobre a fala do Senador Eduardo Braga, dizendo que tenho autoridade para defender a sua posição sobre o Bolsa Família, porque eu inventei isso. Eu inventei, intelectualmente, o Bolsa Escola como professor da UnB, em um livro. Eu inventei, ao implantar, pela primeira vez, aqui, e ao dar assessoria à Prefeitura de Campinas para que começasse. É com essa autoridade, com esse entusiasmo com a Bolsa que quero dizer que, de fato, Senador, ela é necessária. É isso o que o Senador Taques quis dizer. Mas o que a gente precisa comemorar é quando ela não for mais necessária. É isso o que ele quis dizer. Enquanto um brasileiro precisar de Bolsa Família, nós temos de dar Bolsas Famílias, mas, enquanto um brasileiro precisar de Bolsa Família, o Brasil não é um País desenvolvido, o Brasil não é um País justo. O Brasil só começará a ser justo quando ninguém precisar de Bolsa Família. Lamentavelmente, o dever de casa da redução do número de necessitados da Bolsa Família não está sendo feito. Seria o que o senhor começou no seu Estado do Amazonas: uma escola de qualidade para todos. A Bolsa, sem a escola, é como atender aqueles que estão na seca do meu Nordeste, agora. A gente não pode comemorar o aumento do número dos retirantes que temos de proteger. Nós temos de comemorar quando começar a diminuir o número de retirantes, até o dia em que não tenhamos mais ninguém precisando de ajuda. É como quando há uma inundação, o contrário da seca. Não adianta a gente comemorar porque aumentou o número dos desabrigados. E a Bolsa Família...

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Dos alagados.

            O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - A Bolsa Família é para os desabrigados. Então, ela é uma obrigação - obrigação, eu repito -, e fazer obrigação a gente não comemora. A gente só comemora quando a gente faz a revolução de fazer com que essa obrigação deixe de ser necessária. Por isso eu quero me solidarizar com sua fala. Entendi perfeitamente o que o senhor quer dizer. E o senhor tem razão. É lamentável que se comemore o aumento do número dos necessitados de Bolsa Família. E, finalmente, para concluir, é absurdo se comemorar, como se está comemorando, sem dizer que faz isso, a inclusão, no Bolsa Família, de famílias que, quando crianças, tinham Bolsa Família. Nós estamos na segunda geração de Bolsa Família. Isso é prova de fracasso. Mesmo que seja necessário. Mas, se é necessário, é um fracasso. Como a seca do Nordeste. Talvez, se tivéssemos feito o dever de casa nos últimos 50 anos, não houvesse mais seca. Como há, vamos dar apoio aos retirantes. Quando há cheia, vamos dar apoio aos desabrigados. Mas não comemoremos o número de desabrigados, nem o número de retirantes. Comemoremos a não mais necessidade de apoiar retirantes ou apoiar desabrigados.

            O SR. PEDRO TAQUES (Bloco/PDT - MT) - Sim. Senador Cristovam, mais uma vez, citando Gonzaguinha: “A gente não tem cara de panaca.” Não tem cara de panaca para acreditar que isso resolve tudo.

            E o cidadão está aí fora. E por que ele está aí fora, Senador Cristovam? Má qualidade do serviço público, políticos que não exercem suas atribuições constitucionais, partidos políticos que não mais representam o cidadão, a Copa do Mundo, a PEC nº 37, a PEC nº 33, as relações entre os Poderes. São vários os temas, vários os motivos.

            Mas eu penso - e já caminho para encerrar, Sr. Presidente - que o principal deles seja a descrença com o sistema político. Por isso precisamos, sim, pensar, Senador Eduardo Braga, como Líder do Governo, que esse sistema político está falido. Ele não mais existe, no sentido de concretizar as necessidades do cidadão. Precisamos pensar num novo caminho. Quem sabe, uma Constituinte exclusiva para nós modificarmos o sistema político. Nada contra a política, nada contra político. Nós não podemos criminalizar a política, não podemos generalizar os malfeitos da política. Agora, o sistema político atual não mais atende às necessidades do cidadão.

            Sr. Presidente, muito obrigado pela oportunidade de falar.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/06/2013 - Página 38779