Discurso durante a 102ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações acerca das manifestações populares ocorridas no País nos últimos dias; e outros assuntos.

Autor
Ruben Figueiró (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/MS)
Nome completo: Ruben Figueiró de Oliveira
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA. ATUAÇÃO PARLAMENTAR. MANIFESTAÇÃO COLETIVA.:
  • Considerações acerca das manifestações populares ocorridas no País nos últimos dias; e outros assuntos.
Publicação
Publicação no DSF de 25/06/2013 - Página 39319
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA. ATUAÇÃO PARLAMENTAR. MANIFESTAÇÃO COLETIVA.
Indexação
  • REGISTRO, FATO, LIDER, GRUPO INDIGENA, PRODUTOR RURAL, REALIZAÇÃO, REUNIÃO, LOCAL, MUNICIPIO, CAMPO GRANDE (MS), ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), PARTICIPAÇÃO, GOVERNADOR, OBJETIVO, DEBATE, ASSUNTO, DEMARCAÇÃO, TERRAS, MOTIVO, OCORRENCIA, CONFLITO.
  • ELOGIO, ATUAÇÃO, SENADOR, PEDRO TAQUES, PAULO PAIM, CRISTOVAM BUARQUE, RODRIGO ROLLEMBERG, PEDRO SIMON, PERIODO, OCORRENCIA, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, POPULAÇÃO, REIVINDICAÇÃO, MELHORIA, SERVIÇO PUBLICO.
  • COMENTARIO, FATO, POPULAÇÃO, REALIZAÇÃO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, OBJETIVO, REIVINDICAÇÃO, MELHORIA, SERVIÇO PUBLICO, DEFESA, NECESSIDADE, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO, ENFASE, REDUÇÃO, QUANTIDADE, MINISTERIO, AUMENTO, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, RELAÇÃO, GASTOS PUBLICOS, REGISTRO, IMPORTANCIA, IMPLEMENTAÇÃO, REFORMA POLITICA.

            O SR. RUBEN FIGUEIRÓ (Bloco/PSDB - MS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, permitam-me, antes de adentrar o texto do meu discurso, do meu pronunciamento, ressaltar dois fatos que considero importantes. O primeiro ocorreu no meu Estado, Sr. Presidente.

            Na última quinta-feira, reuniram-se em Campo Grande lideranças indígenas e lideranças de produtores rurais, sob a Presidência do Sr. Governador André Puccinelli, com a presença ilustre de dois Ministros de Estado, o Ministro Gilberto de Carvalho, da Secretaria-Geral da Presidência da República, e o Ministro Adams, da Advocacia-Geral da União. A reunião que lá se realizou foi consequência de várias tratativas de Deputados Federais e dos três Senadores desta Casa representantes do Mato Grosso do Sul: Delcídio do Amaral, Waldemir Moka e eu. Tivemos a oportunidade de insistir com as autoridades da República em que havia a necessidade de se promover o entendimento entre índios e não índios para resolver em definitivo a questão das demarcações de terra, evitando, assim, os conflitos que enlutaram a sociedade sul mato-grossense.

            A reunião foi produtiva. Decidiu-se, afinal, que, dentro de 45 dias, ou seja, daquela data até o dia 5 de agosto, haveria uma proposta do Governo, com a plena concordância das duas partes - produtores rurais e silvícolas -, para resolver, em caráter definitivo, essa questão. É um marco importante para a confraternização em meu Estado de duas importantes figuras do processo produtivo do meu Estado.

            O outro fato que eu gostaria de ressaltar, Sr. Presidente, Srs. Senadores, é a presença do Senado nos acontecimentos da última quinta-feira. Nós estávamos presentes ali, nem todos nós, mas alguns dos nossos valorosos companheiros, como o Senador Pedro Taques, o Senador Paulo Paim, o Senador Cristovam Buarque, o Senador Rodrigo Rollemberg, o Senador Pedro Simon.

            Eu me recordo de que cheguei à minha residência, em Campo Grande, depois de ter participado da reunião a que aqui me referi há alguns instantes. Estavam os nossos Parlamentares no Senado, na quinta-feira, à noite, em uma sessão de vigília, demonstrando, de forma muito candente, a solidariedade que o Senado Federal prestava à população que estava nas ruas defendendo as nossas ideias. A população as defendia num volume tão grande, que eu diria que foi um tsunami de ideias sobre o que está provocando uma revolta muito grande na consciência de toda a sociedade brasileira.

            Registro, portanto, Sr. Presidente, esses dois acontecimentos, cumprimentando, efusivamente, os Parlamentares, os Senadores que estiveram presentes naquela sessão de vigília na noite da última quinta-feira.

            Sr. Presidente, permita-me, agora, fazer um pronunciamento sobre o que desejo registrar, nesta tarde, na sessão do Senado.

            Não há como negar que estamos vivendo um dos acontecimentos históricos mais importantes do País. Deus está nos concedendo a graça de participar deste momento fundamental de inflexão nos rumos de nossa Nação. Temos nas mãos a oportunidade de ajudar a criar as bases do Brasil do futuro, com o apoio inconteste das ruas, nas milhares de reivindicações que nos chegam e que podem ser condensadas numa agenda enxuta: não roubar e fazer mais. Repito, é uma agenda enxuta: não roubar e fazer mais.

            Não há como negar: as manifestações populares que tomaram conta do Brasil nas duas últimas semanas causaram perplexidade geral, estão assombrando o mundo. E ainda permanecem sobre nossas cabeças como um enigma a ser decifrado.

            Na verdade, Sr. Presidente, o Brasil real não mudou. Ainda somos o mesmo País, com os mesmos problemas, com os mesmos vícios, com os mesmos erros, Senador Ataídes, com as mesmas dúvidas. O que mudou foi a nossa percepção de Brasil. Pensávamos, até poucos dias atrás - opinião esta, inclusive, lastreada em pesquisas de opinião, nas declarações otimistas de investidores nacionais e estrangeiros, nos índices gerais da economia -, que estávamos vivendo senão o melhor dos mundos, pelo menos um mundo suportável.

            Acredito que estávamos inebriados com a nossa capacidade de resistência em não vivenciar aqui a crise internacional que solapou as economias americana e europeia. Estávamos comemorando o Brasil macro e negligenciando o Brasil micro, aquele Brasil do cotidiano, das mazelas recorrentes, dos escândalos em escala crescente, dos mensalões e obras superfaturadas, do desinteresse pelos problemas reais do povo, ou seja, daquelas pautas realmente relevantes para que a vida seja melhor e mais feliz.

            Como nas cavernas platônicas, o que estávamos vendo eram as sombras da realidade, aquilo que as nossas ilusões gostariam que fosse a verdade. Mas a realidade dura e concreta era outra, muito diferente.

            O processo histórico é sutil. A classe política, os governos, os especialistas e a imprensa não conseguiram detectar o acumulo de insatisfação das ruas e a iminência de um curto-circuito. Bastou que a faísca do aumento das tarifas de ônibus desencadeasse inicialmente uma pequena onda de protestos ocorridos em várias capitais do País para que o gigante acordasse. Em grandes, médias e pequenas cidades, levantou-se com rapidez assombrosa uma imensa fogueira de demandas reprimidas há anos de norte a sul de nossa Nação, como um tsunami de ideias.

            E, assim, com as manifestações inicialmente pacíficas e ordeiras vieram, infelizmente, as ações de vândalos e irresponsáveis que se aproveitam de momentos de crise para destruir o patrimônio público e privado, saquear lojas, agredir inocentes, transformando um evento cívico importante em espetáculo da celebração da barbárie.

            Mesmo dessa forma, podemos dizer com certeza que 99% daqueles que foram para as ruas levantar suas bandeiras e reivindicações fizeram com sentimentos de paz e grandeza, vislumbrando a construção de um País melhor para todos. Tenho absoluta clareza de que passado esse primeiro momento de maior tensão, o Governo saberá identificar os vândalos e puni-los exemplarmente.

            Srªs e Srs. Senadores, o momento é grave. A juventude brasileira está dando seu recado. Temos que fazer uma reflexão serena dos acontecimentos. Temos que analisar esse processo com humildade, fazendo mea-culpa, pontuando nossas ações pelo bom senso e pela autocrítica. Não podemos mais olhar de cima e ditar regras como se fôssemos os únicos detentores do saber.

            Temos que ouvir e ponderar. Temos que colocar nossas experiências no rumo do enriquecimento deste processo, e não recusar o clamor das ruas dizendo que elas não sabem o que querem e nem têm objetivos claros.

            É óbvio, Sr. Presidente, o que a Nação brasileira está pedindo: ela quer educação e saúde de qualidade, mais transparência, mais recato e sobriedade dos homens públicos, mais honradez, mais honestidade, menos desigualdade social, menos criminalidade nas ruas, ou seja, demandas naturais de toda e qualquer democracia que se pretende avançada deseja e sonha!

            Nada mais verdadeiro, neste aspecto, Senador Ataídes Oliveira, do que o clamor das ruas: o povo quer um serviço público com padrão FIFA. Ou seja: melhor qualidade e eficiência efetiva nos gastos com obras de infraestrutura, menos propaganda enganosa, mais respeito aos direitos, maior ligação efetiva e afetiva das instituições para com as pessoas - isso é, noutras palavras, os contribuintes, aqueles que sustentam a máquina municipal, estadual e federal, querem ser tratados como gente. E isso, convenhamos, não é pedir muito.

            Srªs e Srs. Senadores, vejo que a Presidenta Dilma está, como a maioria de nós, atônita. Ficou claro que ela não estava preparada nem informada devidamente para lidar com um evento dessa magnitude. Nesses momentos, ela devia buscar inspiração numa frase do nosso saudoso Presidente Eurico Gaspar Dutra, conterrâneo ilustre do Senador Pedro Taques, e perguntar, entre aspas: "Neste caso, o que diz o livrinho?".

            Infelizmente, a Presidente não o fez. Preferiu ouvir duas pessoas da sua amizade pessoal, o ex-Presidente e o seu marqueteiro. Deu no que deu. Se atendesse as lições de um grande antepassado o Presidente Eurico Gaspar Dutra procuraria "o livrinho" - ou seja, a nossa Constituição - e lá encontraria o caminho.

            A Presidente Dilma poderia buscar na Seção V, no Capítulo Do Conselho da República e do Conselho de Defesa Nacional a fonte para tomar suas decisões emergenciais. Lá está escrito no art. 89 que: O Conselho da República é órgão superior de consulta do Presidente da República, e dele participam 14 personalidades: o Vice-Presidente da República; os Presidentes da Câmara e do Senado; os líderes da maioria e da minoria do Senado e da Câmara; o Ministro da Justiça; e seis cidadãos prestantes à Nação. E o art. 90 diz que compete ao Conselho da República pronunciar-se sobre intervenção federal, estado de defesa e estado de sítio; e sobre as questões relevantes para a estabilidade das instituições democráticas, como é o caso que vivemos hoje.

            Mas, Senhor Presidente, creio que chegou o momento de nossa Presidente ouvir, ouvir e ouvir. Ele precisa concluir que não é autossuficiente. Depois disso, tomar decisões, agir, tirando do horizonte a questão eleitoral. Não é hora de ficar ouvindo marqueteiro. Não é hora de pensar em popularidade. Não é o momento de partidarizar questões sabidamente de fundo institucional. Em crises como esta que se revela o estadista.

            Pergunto, portanto, Srs. Senadores, não seria, pois, esse o momento de grande oportunidade para a Senhora Presidente assumir a condição de estadista e abrir a janela que mostraria o seu desejo de reencontrar, num halo de esperança, o clamor que vem das ruas?

            O clamor decantado por Castro Alves de que "a praça é do povo, como o céu é do condor". Venha às nossas praças, Senhora Presidente. Tome decisões que podem ser desagradáveis àqueles que querem o gozo do poder, diminuindo o número de Ministérios, pelo menos para 20; dê transparência aos gastos da Presidência da República, todos e todos, como passo inicial à sua caminhada para as praças do povo e verá, aí então, a renovação, confiança que das praças lhe fugiu.

            Sabemos que lidar com a realidade é difícil e complicado. Mas o momento exige desprendimento, prudência e cautela. Mais ainda, Srs. Senadores: grandeza de espírito moral, discernimento e separação clara dos interesses públicos dos privados.

            Aqui a oportunidade de se pensar seriamente em uma reforma estruturante de nossas instituições por meio da convocação de uma Assembléia Constituinte exclusiva em que nós Parlamentares dela não participaríamos, dando à Nação a demonstração de nosso espírito público, desambição e desejo de que o texto encontrasse os mais ardorosos anseios do povo. Esta Assembléia seria eleita e integrada por cidadãos que fariam apenas a elaboração do novo texto constitucional.

            Por fim, Srªs e Srs. Senadores, o Legislativo e os partidos políticos devem mergulhar na elaboração de propostas concretas que promovam uma ampla reforma das nossas instituições.

            Temos que começar pela reforma política, tão mencionada aqui nesta sessão, Sr. Presidente, passando pela reestruturação dos conceitos de gestão pública, buscando tomar medidas que possam garantir a estabilidade econômica, impedindo o descontrole da inflação, redefinindo com clareza as funções dos Poderes, impedindo a fragilização da política fiscal, enfim, temos que estabelecer um novo pacto político-econômico-social com a Nação e lançando, dessa maneira, as bases para a construção de um novo País.

            Os partidos devem priorizar o diálogo com a juventude. A democracia corre sério risco com a crescente despolitização que estamos vendo nas ruas. O repúdio dos jovens aos partidos revela sinais perigosos, trazendo à nossa memória o advento do fascismo e do nazismo. Temos que alertar a sociedade brasileira o quão perigosa pode ser essa aventura caso não sejam esclarecidos pontos fundamentais da importância do Estado democrático de direito.

            Para finalizar, Sr. Presidente, a sociedade está a nos dar lições valiosas neste momento. Temos que apreendê-las e dar-lhes corpo, alma e sentido. Toda a crise gera oportunidade. Não devemos sequer imaginar que essas manifestações sejam um clamor de desespero e sim um verdadeiro grito de esperança.

            Sr. Presidente, eu queria dar o último toque às minhas palavras e dizer que nesta Casa, no Senado da República, pelos meses que aqui estou - vou completar agora seis meses do meu período de mandato -, nesses seis meses, encontrei um ambiente de trabalho, de responsabilidade, de senso público, de brasilidade. Nós estamos aqui cumprindo o nosso dever.

            Qual é o argumento, qual é o instrumento de guerra que nós temos? É a nossa palavra, e isso temos feito. E não só isso, não só a nossa palavra, é a nossa caneta, a nossa imaginação, a nossa ideia. Quantos projetos foram apresentados aqui, sobretudo Propostas de Emenda à Constituição, que visavam e visam modernizar a Carta Magna de 1988?

            Há poucos momentos falou desta tribuna o Senador Rodrigo Rollemberg. Mencionou que pelo menos cinco propostas de alta relevância para a estruturação da nossa Carta Magna estão aqui ainda dormitando. Mas não por nossa responsabilidade.

            Eu até diria, Sr. Presidente, que seria de todo conveniente que a tramitação das Propostas de Emenda à Constituição tivesse um rito obrigatório no tempo. Talvez 90 dias no Senado; talvez 90 dias na Câmara, para apreciá-las, para demonstrar que as nossas propostas não podem ficar submetidas ao princípio da gaveta. Elas têm que vir a público, têm que ser debatidas, e nós temos que nos pronunciar sobre elas.

            Então fica aqui, Sr. Presidente, a minha manifestação nesta tarde, com profundo respeito aos oradores que usaram da palavra, inclusive àqueles que disseram que nós não estamos cumprindo o nosso dever. Estamos sim. Estamos, dentro das nossas possibilidades, dentro das nossas prerrogativas, nós estamos - e bem! - cumprindo o nosso dever.

            Muito obrigado, Excelência.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/06/2013 - Página 39319