Discurso durante a 99ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários sobre os movimentos populares que vêm acontecendo no País.

Autor
Randolfe Rodrigues (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/AP)
Nome completo: Randolph Frederich Rodrigues Alves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MANIFESTAÇÃO COLETIVA.:
  • Comentários sobre os movimentos populares que vêm acontecendo no País.
Aparteantes
Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 20/06/2013 - Página 38450
Assunto
Outros > MANIFESTAÇÃO COLETIVA.
Indexação
  • COMENTARIO, ASSUNTO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, OCORRENCIA, PAIS, PARTICIPAÇÃO, JUVENTUDE, OBJETIVO, REIVINDICAÇÃO, COMBATE, CORRUPÇÃO, MELHORIA, TRANSPORTE COLETIVO, SAUDE, EDUCAÇÃO, SEGURANÇA, QUALIDADE DE VIDA, CRITICA, ATUAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, MOTIVO, REMARCAÇÃO, DATA, VOTAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, REFERENCIA, LIMITAÇÃO, PODER, MINISTERIO PUBLICO, RELAÇÃO, INVESTIGAÇÃO, CRIME.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, talvez seja lugar comum nesta tribuna que tantos já falaram sobre os notórios acontecimentos das manifestações populares no Brasil, mas, nesta hora, não me vejo... Seria um pouco desencontrado que alguém não se pronunciasse sobre o que está acontecendo.

            O SR. PRESIDENTE (Magno Malta. Bloco/PR - ES) - Com certeza.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Nesse momento, às 20h08, nós temos as recentes notícias do que tem acontecido no País, que é muito além do resultado de Brasil 2 e México 0. Aliás, Sr. Presidente, há muito tempo neste País, acho que nunca na história deste País, literalmente, houve um jogo da seleção em que a pauta central, por onde se andava, não era o jogo, mas o que estava acontecendo pelo Brasil.

            Às 20 horas da data de hoje, as mobilizações pelo Brasil recebem a notícia de que o Prefeito de São Paulo, junto com o Governador Geraldo Alckmin, ainda há pouco anunciou o recuo no aumento da tarifa do transporte coletivo naquela cidade. É, desta feita, o 13º prefeito de capital que ou reduz a tarifa de transporte urbano que tinha reajustado ou reduz a tarifa que já estava estabelecida. Nesta hora também eu trago a notícia de que, às várias cidades do País que no dia de hoje seguiram o rol de manifestações que está acontecendo por todo o Brasil, incorporou-se a capital do meu Estado, Macapá.

            Segundo informações que tenho, a manifestação em Macapá teve a participação de mais 15 mil pessoas e, como tantas outras ocorridas no País, foi dominada majoritariamente pela juventude, a juventude da geração dos meus filhos, Presidente. Os meus filhos, Gabriel, de 18 anos, e Taís, de 17, participaram das manifestações de hoje.

            Anteontem eu falava com Gabriel e dizia-lhe que a geração dele demorou a reencontrar as ruas. São vinte anos que separam a minha geração, quando esteve nas ruas, nas manifestações de que participei, da geração que promove as manifestações que hoje ocorrem, as maiores da história nacional desde as mobilizações dos caras-pintadas, de 1992, das quais eu tenho a honra de ter participado no plenário deste Senado, ao lado do Senador Lindbergh Farias.

            Tenho notícias nesta noite das manifestações ocorridas na capital do meu Estado: mais de 15 mil pessoas, repito, na manifestação cuidada e coordenada hegemonicamente pela juventude. Lamentavelmente, as informações mais recentes que tenho dão conta, Senador Paim, de que a manifestação acabou terminando com a atuação de um grupo - é bom que se diga, Senador Magno e Senador Paim -, um grupo isolado, contrário ao desejo da ampla maioria dos manifestantes, que também se excedeu e praticou atos que nada têm a ver com os reclamos dessa juventude que vai à rua, que não representa essa juventude que está indo à rua e que não representa essas gerações que estão tomando de novo as ruas não só de Macapá, mas de todas as capitais brasileiras.

            Tenho notícia da conclusão da manifestação em Macapá, que é lamentavelmente de confrontos. E este é o primeiro aspecto a ser dito: tem de se estar preparado. É uma realidade, primeiro, que o movimento tem de tomar consciência para neutralizar essas minorias que nada representam a posição dos movimentos. E, por outro lado, o Estado tem de estar preparado, as polícias têm de estar preparadas para se relacionar com essa nova realidade. Não é a reação com arma em punho que resolve, não é a reação com pelotões do Bope que resolverá também. As polícias têm de estar preparadas concretamente para essa nova realidade.

            O SR. PRESIDENTE (Magno Malta. Bloco/PR - ES) - Senador Randolfe, e, muitas vezes, a inteligência da política, porque, na maioria dos casos, são pessoas infiltradas para desmoralizar o movimento.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Perfeitamente. Então, as polícias têm de estar preparadas para essa nova realidade.

            Eu lembro, Senador Paim, que, na semana passada - V. Exª estava lembrando agora -, nós estávamos aqui, num fim de expediente como este. Eu subi à tribuna e V. Exª estava na Presidência, na quarta-feira, e nós estávamos um dia após as manifestações que tinham ocorrido em São Paulo.

            Nós - eu e V. Exª - destacamos exatamente a contradição, porque o foco estava sendo somente o seguinte: primeiro, os atos de vandalismo que tinham sido praticados; segundo, o absurdo de tudo aquilo só por vinte centavos. Nós - eu e V. Exª - navegamos contra a maré do que estava sendo dito, inclusive por alguns colegas aqui.

            Primeiro, dissemos a velha frase: “Muito está se falando da violência do Rio, mas pouco se fala da violência das margens que oprimem.” Ou seja, falava-se da violência, mas não se falava da violência que eram os empresários de transporte coletivo, sob os auspícios dos governos municipais, sob a autorização dos governos municipais, terem reajustado as tarifas de transporte coletivo por todo o País.

            Segundo, nós dizíamos: “Parece que está latente um movimento que não é só pelos 0,20 centavos. É muito mais do que isso.” Ainda bem, Senador Paim, que os dias que se seguiram... Não é sempre que a história caminha... Não é sempre que fazemos a aposta do lado da história e a história caminha ao seu lado. Mas nós, eu e V. Exª, que temos uma tradição vinda da luta social, compreendemos a máxima da poesia de Chico Buarque: “A história é um trem alegre que atropela indiferente todo aquele que a negue.”

            Nós sentimos que, concretamente, havia uma pressão social que estava em ebulição. Alguns podem estar se perguntando: “Mas por quê? Por que no Brasil, que de fato avançou na redução da desigualdade? Por que agora tudo isso está acontecendo? Por que no Brasil?

            Li várias das centenas de artigos que têm circulado para tentar entender o que está acontecendo no País neste momento. Quem me parece que melhor descreveu foi um articulista espanhol do El País, Juan Arias. As perguntas que ele fez foram exatamente estas: por que o Brasil? Por que agora? Ele começa dizendo o seguinte:

Surgiu um movimento de protesto parecido com os que estão ocorrendo em diversos países, nos últimos dez anos. O Brasil viveu anestesiado pelo seu êxito compartilhado e aplaudido mundialmente. O Brasil [pergunta Juan Arias no artigo] está pior hoje do que nos últimos dez anos? Não. Está melhor. Pelo menos é mais rico, há menos pobres e cresce o número de milionários. É mais democrático, é menos desigual. Mas por que saíram às ruas para protestar contra o aumento das passagens do transporte público exatamente os jovens que normalmente não usam esse meio de transporte porque têm carro? Algo impensável há dez anos.

            Ele faz uma série de perguntas que mostram a contradição diante das conquistas que o País teve, que de fato teve, nesses últimos dez anos. Contentam-me - pois com elas me identifico porque me representam - as formas como ele responde. Ele responde, dizendo o seguinte:

Em primeiro lugar, poder-se-ia dizer que, paradoxalmente, a culpa é de quem deu aos pobres um mínimo de dignidade, uma renda não miserável, a possibilidade de ter uma conta bancária e também o acesso ao crédito para adquirir o que sempre foi um sonho para eles, como eletrodomésticos, motos e carros.

            Mais adiante, encontro as respostas. A resposta diretamente colocada me parece, Senador Magno, Senador Paulo Paim, recai sobre o que as pessoas conquistaram dentro de casa, mas que não veem refletido fora de casa. Ora, conquistaram dentro de casa, houve a ascensão de uma nova camada social, embora isso seja questionado por alguns economistas, por alguns sociólogos. Enfim, há algumas condições que me parecem menos desiguais do que no passado, mas, fora de casa, a realidade é outra.

            Esse artigo do Juan Arias é ilustrado por uma foto de uma das manifestações que sintetiza o porquê das manifestações: “Queremos escolas e hospitais no padrão FIFA”. Esse é um dos vários cartazes que têm surgido nas diferentes manifestações. O problema é o seguinte…

            E eu quero concordar com V. Exª, Senador Paim. Hoje o Senado fez um belo gesto: nós continuamos trabalhando aqui. No horário do jogo do Brasil, eu estava em audiência com a Ministra Marta sobre temas como, por exemplo, a democratização da gestão coletiva do direito autoral. Depois, estive aqui. O plenário do Senado esteve funcionando. Houve, inclusive, votação nominal. Fez um belo gesto. Mas nós precisamos dar mais gestos.

            A Câmara, por exemplo, parece-me que fez um gesto não positivo: desmarcou, para a semana que vem, a votação da PEC nº 37. Quase que nesta condição e circunstância: “Nós vamos perder o jogo; então, já que vamos perder o jogo, vamos mudar a data do jogo, para que possamos ter uma condição melhor”.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Permita-me só, sem fazer aparte longo.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Senador Paim, por favor.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Só para concordar com V. Exª. A Câmara tinha que fazer exatamente o contrário.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Claro.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Bota em votação a PEC nº 37, e cada um mostra a sua cara para o País.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Exatamente.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Nós três que estamos aqui temos uma posição clara e definida: nós votaríamos contra a PEC nº 37.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Exatamente.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Essa transparência que pode ganhar o entendimento com as ruas.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Claro. E é analogia com o futebol. É a mesma coisa de estar marcada uma partida de futebol, aí o time que está em condição desfavorável resolve desmarcar a partida. É um pouco assim: estaria marcado Brasil e México hoje; o México saberia que está em condição desvantajosa em relação à Seleção Brasileira; aí desmarca o jogo, que é no campo do Brasil, e marca para o território dele na altitude. O que a Câmara fez foi isso na prática. Está querendo remarcar um jogo para que esteja em condições melhores e de preferência com a altitude favorável, para poder ganhar. Isso é ganhar? Isso é ganhar na marmelada.

            Só que é o seguinte: não se pense... O velho trecho do Lincoln vale para isso: pode-se enganar parte do povo parte do tempo; mas não se engana todo o povo todo tempo. Desmarcou a votação? Vai querer votar em outro momento?

            Reitero, como disse o Senador Paulo Paim aqui: se votar isso e se limitar o poder de investigação de instituições, num Brasil que precisa de instituições combatendo a corrupção, vai dar um tiro no pé. Depois, não perguntem por que o povo quer invadir o Congresso Nacional. Depois, ficam perguntando: “Mas que absurdo! Querem invadir o Congresso Nacional”. Querem limitar o poder de investigação de instituições, em um País onde a corrupção parece que é ato sequente, parece que a corrupção é regra, e não exceção. Aí se perguntam depois o porquê das manifestações.

            Eu entendo aqueles que não entendem o que está acontecendo no Brasil. É porque, como diz a música, a belíssima música de Renato Russo, eles não estão entendendo nada do que eu digo, eles não estão entendendo nada do que a juventude brasileira, do que o povo brasileiro hoje, concretamente, está dizendo, porque sempre esteve distante.

            Ora, por que estão na rua? Nós aqui, Senador Magno Malta, a maioria parlamentar -, não é o caso dos parlamentares que estão agora no plenário do Senado, de mim, de V. Exª, Senador Paulo Paim - votou...

            O SR. PRESIDENTE (Magno Malta. Bloco/PR - ES) - Nós três, porque só há três mesmo.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP) - ... contra os 10% da receita bruta da União para a saúde, e nós temos uma crise na saúde pública. “Ah, por que isso está acontecendo?” Ora, está acontecendo porque nós votamos contra.

            Queremos votar, querem votar a PEC nº 37, limitando o poder de investigação de instituições. Ora, por que está acontecendo isso? Porque nós queremos favorecer a corrupção, reduzindo o poder de investigação.

            Ora, por que está acontecendo isso? Editada uma medida provisória, por parte da Presidente da República, reduzindo, desonerando, tributariamente, empresas de transporte coletivo, tirando PIS e Cofins. As empresas fazem o quê? Imediatamente, o que as empresas fazem? Reajustam a tarifa, pedem dos prefeitos reajuste de tarifas.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Permite-me, Senador?

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP) - Por favor.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Inclusive, duas, porque a outra desonera da parte do trabalhador, porque os 20% que iriam para a Previdência baixaram para 1,5% sobre o faturamento.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP) - Sim! Desoneração total.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Total. Duas MPs para ajudá-los. Qual é a contrapartida? Aumenta o preço. É como V. Exª disse. Quanto à questão da saúde, com muito orgulho, votamos “sim”, a favor dos 10%.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP) - Estivemos juntos.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Com certeza.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP) - Aliás, V. Exª...

            O SR. PRESIDENTE (Magno Malta. Bloco/PR - ES) - Senador Randolfe, me permita.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP) - Senador Magno Malta, por favor.

            O SR. PRESIDENTE (Magno Malta. Bloco/PR - ES) - Virou um debate. Para o Brasil saber, só estamos nós três mesmo aqui. É porque não se estão mostrando as cadeiras vazias. É o seguinte: é para o povo saber. Só estamos nós três mesmo aqui. Não tem que contar mentira. Só estamos nós três.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (PSOL - AP) - Verdade.

            O SR. PRESIDENTE (Magno Malta. Bloco/PR - ES) - Isso é chamado “mão de gato”. O que essa manifestação veio revelar? Veio revelar a “mão de gato”. A medida provisória desonerou; os caras aproveitaram isso, a desoneração, que já é um lucro; aumentaram o preço da passagem. Quer dizer, o troço saiu de 100% para ir para 200, 300, 2.000... Entendeu? E essa manifestação nas ruas revelou essa mão de gato. Aí é só choradeira de empresários, é só choradeira de empresas: “Nós estamos quebrando; nós não podemos investir.”

            Sabe que nós, muitos de nós aqui no Parlamento, fomos apanhados de surpresa, porque,quando se vota uma medida provisória dessas - não é, Senador Paim? -, e há a desoneração, você fica feliz porque vai chegar à ponta. É aquela brincadeira que fizeram aí sobre diminuir a conta de luz, mas foi aumentada a gasolina. Então, você sorri aqui, mas nem acaba chorando na ponta, porque não se entendeu o que foi feito. E a manifestação, pedindo a redução das passagens, revelou essa mão de gato.

            Agora, qual é o papel do Governo? Chamar agora essas empresas favorecidas por essa medida provisória, para pô-las no lugar ou mandar uma medida provisória desfazendo aquela, porque esse gesto é absolutamente criminoso.

            Peço desculpas por ter entrado em seu pronunciamento assim. Foi o espírito do Senador Mão Santa que fazia esse negócio de presidir e entrar no debate dos outros.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Não, mas V. Exª... Como V. Exª disse, estamos só nós três aqui. Então, é importante que o Brasil saiba, com a possibilidade de nossos debates, as nossas opiniões. Não há nenhuma restrição e nenhum Regimento que nos restrinja com relação a isso. E o que ocorre...

            O SR. PRESIDENTE (Magno Malta. Bloco/PR - ES) - Até porque nem marquei o tempo de V. Exª. Então, V. Exª fique à vontade.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Pronto... Então, já estou favorecido.

            Então, além disso, o que é que nós temos assistido das decisões de anteontem para hoje em relação à redução da tarifa? Alguns prefeitos dizem: “Vamos reduzir a tarifa”. Outro prefeito vai lá e diz: “Vamos reduzir a tarifa, e eu vou desonerar as empresas do ISS.”

            Mas, veja, eles já foram desonerados do PIS, já foram desonerados da Cofins. O Senador Paim está dizendo que já foram desonerados da Previdência, o que vai ser um problema para a seguridade social. E o prefeito ainda reduz a tarifa e diz: “Vamos desonerá-los do ISS.” Eu não vi um prefeito dizendo o seguinte: “Quero uma auditoria dessa planilha para saber se é essa mesmo a tarifa. Quero fazer auditoria nessa planilha!”

            Ou seja: sempre acaba sobrando para o cidadão, porque, quando se desonera tributariamente, diminui-se a capacidade de arrecadação do Estado, do poder público, o que faltará para algum serviço público; ou seja, ninguém diz: “Empresário, vamos reduzir os lucros? É um momento de sacrifício e de esforço. Vamos reduzir os lucros? Olha, cada um cede um pouco. Não coloque a corda sempre para arrebentar do lado mais fraco.”

            Veja, o Congresso Nacional desmarca a votação da PEC 37; alguns prefeitos reduzem a tarifa de transporte coletivo, mas reduzem fazendo novas desonerações tributárias além daquelas que já estavam acontecendo. Aqui, nós não votamos os 10% da receita bruta da saúde. O Plano Nacional da Educação vem da Câmara com 10% do Produto Interno Bruto para ser investido na educação pública. Chega ao Senado, mudam, para não ser investido somente na educação pública. E aí se perguntam.

            Os escândalos de corrupção permeiam por tudo quanto é lado. E aí quem é perseguido, quem começa a ser achincalhado, quem começa a ser atingido são aqueles que combatem a corrupção. São as instituições sérias do País e os poucos parlamentares que combatem a corrupção. E aí ficam sem entender o que está acontecendo.

            É claro que não entendem o que está acontecendo. Há uma distância enorme entre o que é feito aqui neste plenário e no plenário da Câmara, o que as maiorias parlamentares impõem, e a realidade concreta. Não há diálogo entre o que acontece aqui e a realidade concreta.

            A máxima que está circulando é que esta geração que está nas ruas é uma geração, Senador Paim, diferente das nossas. Nós estamos na quarta geração de grandes mobilizações de massa no Brasil, desde a última quarta-feira, e eu e V. Exª anunciamos isso. Estamos na quarta geração.

            A primeira geração foi a geração dos anos 60, de 1968, pautada pelo desejo pela redemocratização. Aquela geração foi derrotada pelo Ato Institucional nº 5 e pelo recrudescimento da ditadura.

            A geração seguinte é a geração pela luta da anistia ampla, geral e irrestrita e dos colossais comícios das Diretas Já, que resultaram no fim da ditadura militar.

            A terceira geração, da qual tenho a honra de ter participado, é a dos caras-pintadas, que resultou no impeachment de um Presidente da República.

            Agora, esta quarta geração vem a um ciclo. Tudo muda, o tempo todo, no mundo. Eu estou consciente de que o Brasil não é o mesmo depois desse ciclo de manifestações.

            E não adianta! Eu vi alguns, quase que patéticos, dizendo: “Queremos receber vocês nos gabinetes, queremos receber a liderança”. Quem é a liderança? O movimento é difuso. O movimento não tem uma liderança definida, como essas manifestações dos tempos anteriores que nós vimos.

            Essa geração está pautada por impor a pauta, ou seja, ouça o barulho das ruas e imponha a pauta. Essa geração é a geração que nasceu nos últimos 20 anos. É uma meninada que tem uma média de idade de 17, 18 anos.

            E essa geração veio depois da redemocratização, depois da consolidação da democracia no País, e se acostumou, essa geração, a ver eleições de dois em dois anos, mas também se acostumou a ver eleições a cada dois anos e a ver o que elegia não ser representante dos anseios que eles depositavam nas urnas. Então, agora, concretamente, essa geração disse: “Bom, só votar não adianta, tenho que ir para a rua dizer o que quero e exigir concretamente o que quero.” É a superação do voto representativo.

            Nenhum daqui tente ir para as manifestações. Nenhum partido levante a bandeira nas manifestações. E não levante mesmo a bandeira nas manifestações, porque os partidos foram derrotados. Nenhum partido está representando. Isso é perigoso por um lado para a democracia, mas, por outro lado, é fundamental para a democracia o povo na rua.

            Este País só avançou quando o povo se mobilizou e foi para a rua. Por isso eu não temo. Não adianta quererem colocar rótulo na meninada aí na rua. Eu ouvi, cheguei a ouvir aqui nesta semana: “Não, essas manifestações são de direita.” Como de direita? Raquearam o site da revista Veja.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Acho que eles se enganaram. Eles quiseram dizer: “São de direito.” É o direito deles.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Deve ter sido. 

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - É o direito deles de se mobilizarem. 

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Deve ter sido esse equívoco, Senador Paulo Paim. 

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Não é possível. Permita-me só um aparte a mais.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Pois não, Senador. 

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - O que a gente percebe? Para nós, que já participamos de movimentos sociais ao longo das nossas vidas, esse não deixa de ser um grande movimento liderado pela juventude, mas os de cabelos brancos estão acompanhando, não pensem que não, porque estão.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Com certeza.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Quantos homens e mulheres de cabelos brancos me dizem: “Meu filho está lá.” E dizem com orgulho: “Meus filhos estão lá.”

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Eu comecei este pronunciamento dizendo isso.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Exatamente isso. 

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Isso nos orgulha. 

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Quer dizer, nós estamos nessa linha. Então é preciso que o Executivo, o Legislativo e o Judiciário parem de dizer o seguinte: olha, essa é a pauta, essa á pauta, essa é a pauta. E ouçam a pauta, como V. Exª colocou muito bem. E casualmente eu escrevi num livro, há três anos, o barulho do rufar dos tambores nas ruas. O nome do livro é “O rufar dos tambores”. Nós que reclamávamos tanto, que nos sentíamos isolados, sem o apoio do movimento social, agora não podemos reclamar, pelo contrário, temos que cumprimentá-los e exigir que o Executivo comece a pautar aquilo que eles estão apresentando, que o Senado também, que a Câmara também e que o Judiciário também.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Senador Paim, eles estão vindo em nosso socorro.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Eu diria que sim.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Eles vêm em socorro das bandeiras que temos pautado. Ah sim, não têm bandeira? É claro que têm bandeira.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Claro que têm, todo mundo sabe quais são. 

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Redução da tarifa, já estão conquistando, mas não querem só isso, querem o fim da corrupção, isso é uma bandeira concreta.

            E querem mais. Olhe o que dizem os cartazes: Eu quero o padrão FIFA nos hospitais e...

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Saúde, educação.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - ... e na saúde pública e na educação.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Combate à violência.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Eles têm uma bandeira concreta.

            O SR. PRESIDENTE (Magno Malta. Bloco/PR - ES) - Havia um cartaz que dizia: Eu quero um presidente que exija igual ao Blatter. Porque o Blatter, o Presidente da FIFA, é exigente; ele colocou para fazer o que ele queria.

            Mas sabe de uma coisa, são todas questões que nos unem. Por exemplo, nessa manifestação, lá no meio dela havia gente que era contra a marcha da maconha e gente a favor da marcha da maconha, porque alguma coisa os une em favor do País. Lá há gente que é a favor do aborto e gente contra o aborto; estava todo mundo junto, está certo, todo mundo junto. Quer dizer, lá há gente que odeia futebol e gente que ama futebol. As pessoas, na diversidade, na pluralidade de uma democracia - você pode ser a favor ou contra o que você quiser -, mas a coisa nesse País, o bem estar nos une. O bem-estar nos une; o bem-estar uniu todo mundo. Você podia ver rostos lá de gente completamente contra a posição do outro que estava ali, mas reivindicando o bem-estar para todos.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - E Magno, veja; permita-me, Senador Magno.

            O SR. PRESIDENTE (Magno Malta. Bloco/PR - ES) - Magno. Aliás, eu queria perguntar a V. Exª, porque V. Exª falou que tem um filho com 18 anos. O seu ministério de fazer filho começou com que idade?

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Começou com 21 anos. É porque eu comecei cedo, entendeu?

            O SR. PRESIDENTE (Magno Malta. Bloco/PR - ES) - Ah, sim, porque eu sempre acho que erraram na idade de V. Exª para deixar que fosse candidato a Senador.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Veja, Senador Magno, o que ocorre concretamente é que nós temos que dar resposta - nós, aqui, o Parlamento - temos que dar resposta com gestos. Porque as perguntas que estão sendo feitas são as seguintes: Se um País como este pode, em um prazo recorde, com regime de contratação diferenciado - aprovado por este Plenário do Senado, flexibilizando a Lei de Licitações, subvertendo o art. 37 da Constituição, que reza que a moralidade é um dos princípios da Administração Pública -, se este Plenário aprova o regime diferenciado de contratação para construir monumentos como este que vemos aqui em Brasília, em tão pouco tempo - como é o Estádio Nacional Mané Garrincha -, com orçamentos bilionários, então esse mesmo País pode construir um hospital ou um centro de saúde nos bairros com o mesmo padrão do Mané Garrincha; pode fazer novos hospitais e novas escolas com o padrão do Maracanã. É esta contradição que está sendo chamada; é esta contradição! As pessoas olham para esses monumentos e dizem: “Por que eu não tenho esse monumento para garantir o que a Constituição me diz a que eu tenho direito, que é o direito à saúde como universal e com eficiência como princípio?”

            O SR. PRESIDENTE (Magno Malta. Bloco/PR - ES) - Eu digo a V. Exª que eu tenho feito uma guerra já há muitos anos com a Bancada do meu Estado pelo aeroporto do meu Estado.

            O meu Estado tem mais uma rodoviária de avião e não consegue desencalacrar essa desgraça, não consegue, de jeito nenhum. E aí vejo esses estádios subindo em Estados que não têm futebol para chamar a atenção da sua própria população, com todo o respeito. Depois, quero ver o que eles vão fazer com isso, deve virar dormida de mendigo, lugar de fumar crack.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Vinham os estádios e vinha um legado. Está aí o estádio, e onde está o legado? Essa pergunta não sou eu quem está fazendo, essa é a pergunta das ruas, essa é a pergunta da meninada na rua.

            O que ocorre, concretamente, é que temos de ter resposta com gestos, Senador Magno Malta, Senador Paim, não adiantam palavras. Repito um trecho de Lênin, inspirador: palavras convencem, exemplos arrastam. Tem de haver gestos, tem de votar a reforma política de verdade, ampliando a participação popular, resolvendo o plano de financiamento de campanha, por exemplo. Tem de, além disso, ampliar os investimentos na saúde pública, tem de garantir 10% do PIB para a educação. O Congresso tem de fazer esses gestos. Tem de rejeitar a Proposta de Emenda Constitucional nº 37.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Permita-me, antes que V. Exª conclua, pois sei que vai avançar mais?

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Pois não, Senador.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Tem que haver um olhar para os idosos do nosso País. Não é possível...

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Tem de acabar com o fator previdenciário.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Esse fator maldito, que confisca o salário das pessoas pela metade e dos que mais precisam, daqueles que ganham um pouco mais que um salário mínimo. Quem ganha salário mínimo, inflação mais PIB; acima do salário mínimo, pega o fator, corta pela metade, e não tem reajuste. Isso repercute em todas as residências do País. Nós estamos há 12 anos denunciando isso e parece que alguns fazem o que chamam de “ouvido de mercador”, fazem de conta que não estão ouvindo.

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Senador Paim, V. Exª me lembra, no Twitter, de uma imagem que foi postada nesses dias, uma Senhora de 101 anos dizendo, quando começaram a dizer que era uma manifestação por R$0,20. A senhora, de cabelos brancos, aparecia dizendo. “Deixa eu falar para vocês. Participei da Revolução Constitucionalista, em 1932; eu lutei contra a Ditadura Militar; participei das Diretas Já e acompanhei a luta pelo impeachment e lhes digo uma coisa, não é pelos R$0,20.” É porque o aposentado tem inibido do seu rendimento um tal de fator - e V. Exª tem sido a maior autoridade na defesa para acabar com isso - que só atende ao mercado financeiro. Aliás, essa é outra, é a maior bolsa do País, é a bolsa banqueiro, porque toda vez que a taxa de juros é reajustada em 0,25% são bilhões para eles. A gente proclama a alegria do Bolsa Família com alguns milhões, mas os banqueiros ganham bilhões, e não encontram alternativas, outros meios, de combate à inflação, como, por exemplo, o depósito compulsório dos bancos, porque ele inibe os lucros dos bancos.

            É que a verdade é que existe uma hegemonia no País de três grandes: do mercado financeiro, das grandes empreiteiras e do agronegócio. Existe uma ofensiva desses três e não existe a disposição de colocar o dedo nessa ferida.

            Mas eu espero, Sr. Presidente, para concluir, Senador Paulo Paim, que se tenham, de nossa parte, aqui no Parlamento, gestos, ações concretas; do Governo Federal, gestos. Não adianta fazer discurso, pronunciamento somente de solidariedade, como se não tivesse nada a ver com o que está acontecendo. Não basta isso, tem que ter ações e gestos concretos, tem que reduzir tarifa, tem que rejeitar propostas que limitem o poder de investigação de instituições, tem que ampliar os mecanismos de transparência, por parte do cidadão, sobre a atuação dos Parlamentares e dos políticos em geral, tem que avançar na democracia participativa, têm que ser gestos. Depois, não venham me perguntar por que querem invadir o Congresso Nacional.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - V. Exª, que fez diversas citações, permita-me que eu diga uma que é antiga, mas eu gosto muito dela, que é aquela do Gandhi, que disse: Mais vale um gesto que mil discursos. Parabéns pelo seu pronunciamento!

            O SR. RANDOLFE RODRIGUES (Bloco/PSOL - AP) - Senador Paulo Paim, de fato para concluir. Quero concluir com dois trechos. O primeiro é como Juan Arias conclui o seu artigo. Ele conclui dizendo o seguinte:

Um cartaz de manifestante dizia: “País mudo é um País que não muda.” Outro, este dirigido à polícia, acrescentava: “Não dispare contra os meus sonhos.” Alguém [em sã consciência] pode negar a um jovem o direito de sonhar?

            Eu aprendi, desde os 20 anos, nas manifestações de que participei, que esse direito não pode ser negado.

            Por fim, Senador Paim, trago-lhe uma notícia e um abraço de alguém de quem V. Exª é fã, aliás, nós todos somos fãs dele: Thiago de Mello. Estive na última segunda-feira com ele, em Belém. Permita-me, todo honrado e garboso, dizer que recebi dele esse belo presente: A Floresta Vê o Homem, com uma dedicatória lindíssima dele. Thiago, sempre atual, mais jovem que todos nós, sempre jovem, termina esse livro com uma poesia que diz muito do momento. Diz Thiago:

Ventos do mundo sopram; quando sopram, aí, vão varrendo, vão, vão carregando e desfazendo tudo o que de humano existe erguido e porventura grande, mas frágil, mas finito como as dores, porque ainda não ficando -- qual bandeira feita de sangue, sonho, barro e cântico -- no próprio coração da eternidade.

            Thiago, sempre atual, descreve com a poesia o pulsar deste momento.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/06/2013 - Página 38450