Discurso durante a 103ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à proposta da Presidente da República de convocar plebiscito para Constituinte exclusiva para reforma política.

Autor
Ana Amélia (PP - Progressistas/RS)
Nome completo: Ana Amélia de Lemos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA.:
  • Críticas à proposta da Presidente da República de convocar plebiscito para Constituinte exclusiva para reforma política.
Aparteantes
Alvaro Dias, Paulo Paim.
Publicação
Publicação no DSF de 26/06/2013 - Página 39711
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA.
Indexação
  • CRITICA, DILMA ROUSSEFF, PRESIDENTE DA REPUBLICA, PROPOSTA, CONVOCAÇÃO, PLEBISCITO, ASSEMBLEIA CONSTITUINTE, EXCLUSIVIDADE, REFORMA POLITICA.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Caro Presidente Jorge Viana, Srªs e Srs. Senadores, nossos telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, neste momento, eu estou, aqui nesta tribuna, não como Senadora, mas como uma cidadã brasileira, gaúcha com muito orgulho, mas brasileira sobretudo.

            Essa minha manifestação, neste espaço democrático que é o plenário do Senado, é a de preocupação real com os rumos políticos, econômicos e sociais de nosso País, especialmente depois da reunião de ontem no Palácio do Planalto.

            A Presidente da República, Dilma Rousseff, reuniu 27 governadores e 26 prefeitos dos grandes centros urbanos para apresentar, eu diria, um prato feito como resposta às mobilizações populares que sacodem o País. Não houve debate com os convidados, que foram apenas coadjuvantes de um cenário, como dizemos, uma foto de família ou uma foto para a imprensa.

            Na verdade, esse é um exercício que, como eu disse ontem, exige muito diálogo entre as partes envolvidas como resposta a essa crise. O Senador Mozarildo disse há pouco: “Esta crise é de todo Senador”. É de todas as instituições, é do Executivo, é do Legislativo, é do Judiciário, é do próprio serviço público brasileiro, é do Ministério Público, é das Forças Armadas. Todos nós precisamos prestar muita atenção nessa mensagem que chega das ruas.

            Fazer uma reforma política, por exemplo, ou qualquer outra reforma por meio de uma Assembleia Constituinte exclusiva, como foi proposto pela Presidente, é, eu penso, um grave equívoco. É até inconstitucional. É clara a fraude à Lei Suprema do Estado de direito, na tentativa de driblar a ordem jurídica vigente constituída em 1988. Constitucionalistas de várias escolas em todo o País são taxativos: uma Constituinte só pode ser convocada quando há ruptura da ordem jurídica, e a maioria dos juristas discorda, assim como a Ordem dos Advogados do Brasil, a OAB.

            Eu quero apenas ressaltar a palavra usada pela Presidente como indicativa da disposição de diálogo. Ela diz que estava “propondo a abertura de um debate.” Ela não foi taxativa ao dizer que queria isso, mas “a abertura de um debate”. Só que a leitura que fazem os jornalistas é, de imediato, pela crise. A Presidente propôs e disse textualmente: “Estou propondo a abertura de um debate.” Então, nesse aspecto, um ponto para a Presidente da República, mesmo que, no mérito, a proposta tenha essas observações. Aliás, o Vice-Presidente da República, Michel Temer, na condição de professor de Direito Constitucional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, escreveu, em 2007: “É inaceitável a instalação de uma Constituinte exclusiva para propor reforma política, pois não vivemos em um clima de exceção e não podemos banalizar a ideia da Constituinte, seja exclusiva ou não.”

            As regras estabelecidas pelo Poder Constituinte Original, no caso de nossa Constituição, devem ser mantidas, respeitadas. Ontem, o Governo Federal deu um importante passo à frente ao ouvir os movimentos sociais e convocar governadores e prefeitos para firmar acordos e fazer mudanças. O diálogo, a meu ver, deve existir sempre e com todas as instituições interessadas em busca de ações para melhorar a saúde, aumentar o acesso de qualidade à educação e prover o País de infraestrutura eficiente.

            Fazer reforma política por meio de Constituinte exclusiva é um passo atrás, um retrocesso no processo democrático de nosso País. É ouvir as insatisfações do povo, mas não é compreendê-las. Existe uma enorme diferença entre ouvir e compreender ou entender. As pessoas querem ser ouvidas e entendidas, com ações rápidas e eficientes, sem promessas vagas. As vozes que se multiplicam pelo País são apelos por mudanças reais.

           Aliás, o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, que assumirá amanhã, em uma cerimônia, cadeira no Supremo Tribunal Federal, indicado pela Presidente Dilma Rousseff para a Suprema Corte, afirmou, antes de se tornar Ministro, que, abre aspas: “Constituinte com agenda prévia é inconstitucional, pois reforma política poderia ser feita normalmente, sob a Constituição Federal que está em vigor.”

           Como disse, aliás, o Ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, numa entrevista à revista Veja de grande repercussão, e o cumprimento pelo teor e pela opinião expressa nessa entrevista, nesta semana, abre aspas: "Os manifestantes estão protestando contra tudo. E a mensagem que isso passa é que as pessoas querem participar mais e ser ouvidas.”

           É isso que as pessoas querem! Discursos que se transformem em realidade: coerência. Mais ação e menos propaganda. As ruas querem estabilidade, fazer planos com suas famílias e amigos, ter a possibilidade de viver bem o presente, com a esperança de um futuro com mais qualidade e mais segurança.

           Não se faz reforma política da noite para o dia, unilateralmente, sem a participação ativa desta Casa, do Congresso Nacional. Os Parlamentares que aqui estão representam milhões de eleitores de todos os Estados, de diversas classes sociais e dos mais variados setores da sociedade. Para realizar reforma política, não basta invocar uma representação exclusiva, é preciso exercer, na prática, o discurso da reforma.

           O Governo tem hoje, no Congresso, uma das maiores bases aliadas comparada às dos parlamentos do mundo inteiro. Se a reforma política ainda não foi aprovada nos moldes que a democracia aceita é porque o Governo não quis.

           O Senador Francisco Dornelles, meu grande Líder aqui nesta Casa, experiente, que tem, eu diria, no DNA o gene da política, costuma dizer que a Constituinte foi criada para fazer uma nova ordem política e não uma nova ordem econômica ou social. Isso gera mais insegurança política. Aliás, nas crises, Senador Mozarildo Cavalcanti, Senador Alvaro Dias, não se pode combater o fogo com gasolina. Não se joga no colo do Parlamento a responsabilidade que deve ser compartilhada.

           Com muito prazer, concedo um aparte ao Senador Alvaro Dias.

           O Sr. Alvaro Dias (Bloco/PSDB - PR) - Primeiramente, Senadora Ana Amélia, quero cumprimentá-la. É repetitivo afirmar que V. Exª sempre traz à tribuna pronunciamentos com muita competência e profundidade de conteúdo. Eu creio que o que está ocorrendo, essa postura de insegurança, claudicante, mesmo, confusa da Presidente tem a ver, também, com a sua assessoria política. A sua equipe é, simplesmente, sofrível. Na última quinta-feira, quando o Congresso estava ameaçado de invasão, eu assistia ao Jornal Nacional e a repórter, ao vivo, dizia: “Neste momento, a Presidente Dilma está reunida no Palácio do Planalto com duas Ministras.” Eu vou evitar citar os nomes. Aí, eu pensei, pobre Brasil, se depender do talento, do preparo dessa assessoria política, o Brasil está muito mal. Aí, fui verificar quais eram os assessores da área política, chamados Ministros da Casa e mesmo fora da Casa. O Ministério da Justiça sempre com essa responsabilidade de assessorar politicamente os presidentes da República. E fui ver, Juscelino Kubitschek, o jurista Victor Nunes Leal e o diplomata José Sette Câmara Filho, à frente da Casa Civil; João Goulart, o jurista Evandro Lins e Silva e o genial Darcy Ribeiro. Mas nós podemos citar em vários governos, San Tiago Dantas, Paulo Brossard; mesmo nos governos militares, Luís Viana Filho, João Leitão de Abreu, Golbery do Couto e Silva; no Governo Sarney, Marco Maciel. Enfim, personalidades, juristas talentosos, articuladores da maior competência assessorando os presidentes da República. A Presidente Dilma está num deserto de inteligência. Não há como governar o País com 40 ministros, e são 40, 39 mais o ministro do marketing, 40.

(Soa a campainha.)

           O Sr. Alvaro Dias (Bloco/PSDB - PR) - Não é possível governar o País com 40 ministérios, com a competência puxada para baixo. Eu não quero tomar o tempo de V. Exª. Os meus cumprimentos.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Muito obrigada, Senador Alvaro Dias. Eu tenho certeza de que a atitude republicana e atenciosa do nosso Senador Jorge Viana entende o momento que nós estamos vivendo e que nós temos também aqui uma responsabilidade, como teve V. Exª. Eu lhe agradeço muito, quero que seu aparte seja incorporado ao meu pronunciamento, nos Anais do Senado, Senador Alvaro Dias. 

            Calar a voz do Congresso, nesse momento, é reforçar a crise institucional do País e desprezar o necessário equilíbrio de poderes em nossa democracia. É fazer com as demais instituições democráticas, como a imprensa, o que já estão tentando fazer com o Ministério Público com a PEC 37. Proposta de Emenda à Constituição, como todos sabem, espalhada nos cartazes de todo o Brasil, sequer foi citada ontem no pacto proposto pelo Governo. A proposta tramita na Câmara e limita os poderes de investigação do Ministério Público.

            Aliás, os próprios representantes dos policiais federais são contrários à exclusividade da Polícia Federal e Civil para investigar crimes, pois sabem que a cooperação de instituições, como o Ministério Público, é fundamental para dar respostas e solucionar crimes difíceis no Brasil, sobretudo aqueles voltados à investigação da corrupção e do mau uso do recurso público e dar respostas à sociedade sobre as pautas de segurança.

            Eu queria dizer que ontem, o Presidente do Sindicato dos Policiais Federais (Sindipol) no Distrito Federal, Flávio Werneck, disse repudiar a emenda relativa à PEC 37. Parabéns a esses policiais federais por entenderem o espírito institucional e republicano dessa boa convivência.

            Portanto, para finalizar, se o Governo real e sinceramente quisesse aprovar a reforma política como quer a sociedade, certamente isso já teria acontecido. Do pacote apresentado pelo Governo em resposta às manifestações, ficaram dúvidas, por exemplo, sobre o compartilhamento dos recursos e responsabilidades entre os entes federados, a União, os Estados e os Municípios.

(Soa a campainha.)

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - É um sinal de que a reforma urgente corre o risco de, mais uma vez, ser adiada. Seria uma péssima notícia à população que ocupou as ruas.

            A sociedade que vai às ruas está conectada não apenas nas redes sociais, mas também, à realidade e ao dia a dia dos centros urbanos. São brasileiros, mulheres e homens, de todas as idades, que sentem na pele a falta de infraestrutura dos hospitais e unidades de saúde, o sacrifício de muitas horas perdidas no transporte público de má qualidade e também caros, os altos preços dos alimentos e dos serviços e a inflação batendo à porta.

            É uma sociedade solidária, pois vai às ruas para apoiar a causa do outro, sabendo que ao longo de um dia comum de trabalho, todos - ricos, pobres ou da classe média - pagam um elevado preço pela caótica vida nos grandes centros urbanos.

            Sou totalmente contrária à baderna e ao vandalismo como aconteceu ontem em Porto Alegre, bem referido aqui pelo Senador Paulo Paim que falou da primavera, Senador Paulo Paim, e a primavera brasileira chega em pleno inverno. Isso talvez seja o mais bonito. O inverno é um pouco da morte da natureza e a primavera citada belamente na sua poesia é o que estamos vendo na política brasileira.

            Fico feliz em lhe conceder o aparte, Senador Paulo Paim.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Senadora Ana Amélia, tenho certeza de que o Senador Jorge Viana, nesta terça-feira, vai ser tolerante até porque o Plenário...

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Ele sempre é. Ele sempre é tolerante, não é só hoje. Ele sempre é.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Somos poucos aqui no Plenário e V. Exª faz uma reflexao sobre o quadro que se apresenta. Eu entendo o seu pronunciamento como um pronunciamento propositivo, afirmativo. É preciso refletir e avançar sim na reforma política e todos nós, todos nós - Executivo, Legislativo e Judiciário - ouvirmos mais a mensagem que está vindo das ruas, como V. Exª foi feliz aí, simbolicamente falando da PEC nº 37. Quero mais é cumprimentar V. Exª. Por que eu digo isso, Senadora Ana Amélia? Porque, às vezes, quando fazemos uma reflexão um pouco mais aprofundada, alguém sempre diz que estamos contra alguém. Não! V. Exª não está contra ninguém, V. Exª, a exemplo dos Senadores todos que usaram a tribuna nesses dias, é a favor da causa, a favor do Brasil, e quer que o Executivo, o Legislativo e o Judiciário estejam integrados, respondendo, de forma afirmativa, à demanda das ruas. Por isso, meus cumprimentos a V. Exª.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Senador Paim, V. Exª que vem da militância sindical, o entendimento e o diálogo são sempre o melhor remédio, em qualquer momento - de crise ou em momentos de normalidade -, e é exatamente, por isso, que temos que prestar atenção nesse diálogo que a Presidente ontem abriu com os governadores, mas é preciso avançar ainda mais em relação a isso.

            Como eu disse, e V. Exª concorda, somos contra os atos de vandalismo, isso não constrói, isso até contamina de algum modo os movimentos que estão indo às ruas. Até os vândalos, aliás, que são minoria, desprezam a condição de barbárie e destruição. Um dos jovens que depredaram o Palácio do Itamaraty - aliás, um monumento à arquitetura moderna de Oscar Niemeyer, que nos orgulha tanto -, durante o protesto, invadiu o Itamaraty, e, na última quinta-feira, o Samuel Souza de Jesus, de 19 anos, disse estar arrependido dos atos que praticou. Portanto, é um vândalo arrependido; então é esse o sentimento. Está desempregado, mas sonha em fazer um concurso público e admitiu, no depoimento à Polícia, exatamente essa condição de arrependimento do que havia feito impensadamente.

            Nós Senadores também sonhamos, como ele, com uma reforma política verdadeira, mas ela precisa respeitar os princípios democráticos e ter a participação do Congresso Nacional e, claro, também, do Poder Executivo, que tem a liderança sobre o processo administrativo brasileiro. Esse é o caminho mais trabalhoso, mas, não há dúvida, é o caminho mais democrático.

            E poderíamos começar, votando nesta Casa, um dos projetos de sua autoria, o projeto que prevê votação aberta, voto aberto, para todas as votações no Congresso Nacional. Seria o primeiro ato com o qual daríamos satisfação a essas vozes que estão cada vez mais altas e cada vez em maior volume nas ruas do nosso País.

            O Sr. Paulo Paim (Bloco/PT - RS) - Permita-me só dizer que os eletricitários do Rio Grande, do Brasil, saibam que eu e V. Exª dialogamos muito, hoje pela manhã, depois de ambos recebermos uma comissão, marcamos juntos já. Isso mostra unidade para as causas. Que eles sejam recebidos lá no Ministério do Trabalho, e, se for preciso, já combinamos, vamos - eu e V. Exa - pela causa dialogar com o ministro para que eles não tenham prejuízo. É isso que nos aproxima tanto. E como seria bom, eu usando uma palavra sua, diálogo, que todos entendessem isso. Esse é o caminho. Parabéns mais uma vez a V. Exa.

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - Obrigada, Senador Paulo Paim. E que o Antonio Barbedo, Presidente do Senergisul, tenha certeza de que o Senador Paim e eu estamos já empenhados nessa causa, que não é só do Senergisul, que é o Sindicato dos Eletricitários do Rio Grande do Sul, mas é uma causa...

(Soa a campainha.)

            A SRª ANA AMÉLIA (Bloco/PP - RS) - ... dos eletricitários de todo o País, e a ela nós estamos engajados.

            Obrigada, Senador Paim; muito obrigada, Senador Jorge Viana.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/06/2013 - Página 39711