Discurso durante a 98ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Reflexão a respeito dos protestos realizados em diversas cidades do País.

Autor
Flexa Ribeiro (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PA)
Nome completo: Fernando de Souza Flexa Ribeiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MANIFESTAÇÃO COLETIVA.:
  • Reflexão a respeito dos protestos realizados em diversas cidades do País.
Publicação
Publicação no DSF de 19/06/2013 - Página 37987
Assunto
Outros > MANIFESTAÇÃO COLETIVA.
Indexação
  • ANALISE, DEFESA, REALIZAÇÃO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, PAIS, NECESSIDADE, REFORMA POLITICA.

            O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco/PSDB - PA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Presidente, Senador Paulo Paim, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, hoje é um dia de reflexão, um dia em que os brasileiros leem as manchetes dos jornais e sentem orgulho daquilo que fizeram. E tudo organizado pelos cidadãos, sem qualquer interferência de partidos políticos e sindicatos, mostrando que estamos num momento novo e que nós, como representantes eleitos por esses mesmos cidadãos, precisamos refletir, compreender e buscar sintonia com o pensamento e as vozes múltiplas das ruas.

            Ontem, dia 17 de junho de 2013, foi um dia histórico. Um dia em que as pessoas comuns escreveram um capítulo da história deste País, uma história escrita de baixo para cima, como poucas vezes vimos no Brasil. Um capítulo que não terminou, mas está apenas começando.

            Segundo a imprensa, mais de 250 mil pessoas foram às ruas pelos mais diversos motivos, em 12 capitais e pelo menos 16 municípios do interior. Num ato democrático e de pleno exercício da cidadania, as ruas de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Belo Horizonte., Salvador, Curitiba, Porto Alegre, Maceió, Fortaleza, Recife e Vitória e da minha Belém foram tomadas por protestos pacíficos - na sua ampla maioria pacíficos -, nos quais a população mostrou a sua indignação com relação aos serviços públicos, em diversas áreas, como transporte, saúde, educação e segurança pública. Também foram manifestações contra os custos da Copa das Confederações e da Copa do Mundo, contra a impunidade e a corrupção, entre tantas outras reivindicações - todas elas legítimas - e que expressam a opinião pública na sua essência. Uma opinião pública não apenas de uma classe, mas de pessoas com menor poder aquisitivo e a chamada classe média, ou seja, daqueles que sentem na pele a inflação e a falta de uma política econômica que gere mais emprego e renda de forma sustentável e duradoura. De pessoas que pagam seus impostos, mas não recebem nenhuma contrapartida com serviços públicos de qualidade.

            Uma opinião pública, portanto, na sua essência e que é expressa na forma mais pública possível: nas ruas, na autentica esfera pública. Quase vinte anos depois da chegada ao Brasil da Internet, o uso das ferramentas tecnológicas teve um amadurecimento natural, por iniciativa das próprias pessoas que as utilizam. As ferramentas são hoje usadas como forma de mobilização, sem qualquer conotação, repito, partidária.

            A diversidade de opiniões e a contestação difusa não diminuem o fato. Ao contrário, mostram que os protestos foram, sobretudo, em defesa do Brasil e dos brasileiros e não a favor de uma causa corporativa ou partido específico.

            É esta reflexão que nós, representantes, devemos fazer, sem dar margem a pensamentos oportunistas. Em diversas locais, os próprios manifestantes não permitiram que bandeiras de partidos fossem levantadas. O que se viu foi a defesas de causas difusas, públicas, como disse, não de partidos.

            Gostaria de citar, nessa reflexão que estamos a fazer, algumas considerações fundamentais para compreendermos este momento.

Na medida em que as pessoas se conectam, vivenciam compromissos que não são estáveis, permanentes, mas abrem espaço para todo tipo de debate e participação. É uma sociedade que debate. Mas a forma de debater é outra. O debate é pluritemático e intermitente. Tudo isso cria um novo espaço público onde nada está predefinido. A própria arena em que se dá o debate está sendo configurada à medida que a conversa se espalha.

No modelo antigo, a arena estava definida. O debate se dava nos partidos, no Congresso e, no limite, nos movimentos sociais.

            Presidente Paulo Paim, diz ainda o autor desta reflexão: "Longos períodos de aparente calmaria podem ser, de repente, interrompidos por momentos de grande efervescência".

            Essas palavras, Presidente Paulo Paim, são do sociólogo Fernando Henrique Cardoso, no livro A Soma e o Resto. A reflexão foi escrita bem antes do que estamos presenciando hoje, no Brasil. A reflexão do acadêmico deve ser considerada por todos nós, deixando de lado a ligação partidária e sua experiência como presidente. No pensamento do sociólogo Fernando Henrique Cardoso, emerge o acadêmico que, com muita lucidez, aos seus 82 anos, justamente neste 18 de junho, observa nossa contemporaneidade, Senadora Lúcia Vânia.

            É absolutamente isto que estamos vivendo. Essas manifestações não têm um líder e se construíram e foram costuradas à revelia dos partidos políticos, dos sindicatos, da Igreja, das associações comunitárias de todo tipo.

            Srªs e Srs. Senadores, vejam só o caso dos protestos aqui em Brasília. Estamos na Praça dos Três Poderes, esse conjunto arquitetônico que integra as sedes dos Poderes Executivo, Judiciário e Legislativo. E qual a casa escolhida pelos manifestantes para protestar? A sede do Legislativo. A sede daqueles que estão aqui para representar os Estados e a população. A sede da democracia, com todos os partidos e segmentos da sociedade. O grito é contra todos, contra tudo.

            Aqui quero deixar um breve registro, cumprimentando os policiais legislativos, que mantiveram a ordem sem recorrer à violência e permitiram a manifestação pacífica, apesar da provocação de um pequeno grupo que não representa a massa das pessoas que aqui estiveram ontem para mostrar sua indignação sem qualquer atitude desrespeitosa. É assim que deve ser, como também ocorreu em Belém, para citar meu Estado, onde nenhum incidente, graças a Deus, foi registrado.

            A manifestação pacífica e forte faz barulho. Um barulho que ainda ecoa pelas galerias deste plenário e pelos corredores do Congresso. Um barulho que deixa uma mensagem positiva, Senador Valadares. É positiva, sim, se fizermos a reflexão correta. E mesmo esta reflexão ainda está em construção, tanto por pesquisadores, observadores, governantes e até pelas pessoas que ajudaram a gritar essa mensagem,

            Uma coisa, porém, é certa: o partido político que buscar se apoderar dessas manifestações será tão rechaçado quanto for seu senso rasteiro de oportunismo. A crítica, repito, é contra um sistema que inverteu prioridades, deixando a população sem saúde, educação e segurança. E um sistema que não pune os responsáveis por essas mazelas.

            Durante as transmissões das manifestações, vi um cartaz que dizia "Vote em ideias, não em pessoas". Isso deixa claro que as pessoas querem mudanças na nossa representação. Sem dúvida, isso não é algo novo. A substância da crítica, a crise da representatividade, é antiga. O que mudou foi o aparato tecnológico que permitiu às pessoas se organizaram e irem às ruas, sem mais necessidade de organização através de reuniões sindicais ou partidárias.

            O Legislativo deve perceber isso. Aqui circulam projetos de lei que são a materialização de ideias e muitos desses projetos, Presidente Paulo Paim, são votados de acordo com conveniências partidárias, muitas vezes sem conhecimento de causa. É isto que deve mudar. Como já foi dito, a sigla dos Estados - e eu tenho repetido aqui isso -, isto é, a da população desses Estados deve estar sempre à frente da sigla partidária.

            Talvez seja a hora de revermos e encararmos, de uma vez por todas, a tão falada e pouco realizada reforma política. Que ela não seja construída sobre as bases dos partidos, que buscam apenas beneficiar-se e que apenas podem piorar essa crise de representação. Que seja feita com base numa ampla auscultação à sociedade civil. Que sejam consideradas as tecnologias à nossa disposição para, efetivamente, termos a inclusão das pessoas na vida política do País. Que debates como do voto distrital sejam levados a sério. Que nessa reforma os partidos políticos entendam que seus projetos devem estar pautados pela melhoria da estrutura que serve à população, e não a estrutura que serve a seus correligionários. Que aqueles governantes que estão no poder sejam transparentes a ponto de admitir o que podem ou não realizar, sem criar expectativas na população, com propaganda que nada muda de efetivo na vida das pessoas.

(Soa a campainha.)

            O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco/PSDB - PA) - Que o barulho das ruas mostre que nossa democracia, ainda jovem, pode melhorar. Que os cidadãos possam, efetivamente, se sentir representados pelos seus representantes. Que a tecnologia possa ser usada para isso, da mesma forma como foi usada para mobilizar tanta gente e em tantas cidades ao mesmo tempo.

            Essa tecnologia permite que, hoje, as decisões de governo possam ser tomadas com base em dados que expressam, de forma mais fiel, o verdadeiro sentimento da população, de uma forma muito mais direta e ampla do que os restritos gabinetes refrigerados de Brasília ou mesmo as convenções partidárias ou reuniões sindicais.

            Acho que essa reflexão é ainda pequena diante da multiplicidade de opiniões e pensamentos, Senador Ivo Cassol, mas ela é necessária e apenas levanto essa questão nesta Casa.

            O certo é que essa revolução das ruas é apartidária. E ela justamente cumpre seu papel ao fazer com que todos nós possamos refletir. Refletir não apenas em pensamento e internamente, mas, sobretudo, refletir no sentido de que esta Casa seja, nas suas ações, um reflexo daquilo que emerge das ruas. Que o três Poderes acertem os passos e, enfim, encontrem sintonia com os anseios da população não nos discursos, mas principalmente, nas atitudes de todos nós.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 19/06/2013 - Página 37987