Discurso durante a 111ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a importância das manifestações populares como forma de pressão para as reformas necessárias ao País.

Autor
Ana Rita (PT - Partido dos Trabalhadores/ES)
Nome completo: Ana Rita Esgario
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MANIFESTAÇÃO COLETIVA.:
  • Considerações sobre a importância das manifestações populares como forma de pressão para as reformas necessárias ao País.
Publicação
Publicação no DSF de 06/07/2013 - Página 43420
Assunto
Outros > MANIFESTAÇÃO COLETIVA.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, FATO, POPULAÇÃO, REALIZAÇÃO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, OBJETIVO, COBRANÇA, MELHORIA, SERVIÇO PUBLICO, COMBATE, CORRUPÇÃO, CRITICA, EXCESSO, GASTOS PUBLICOS, CAMPEONATO MUNDIAL, FUTEBOL, DEFESA, NECESSIDADE, IMPLEMENTAÇÃO, REFORMA POLITICA.

            A SRª ANA RITA (Bloco/PT - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, ouvintes da Rádio Senado, telespectadores da TV Senado, venho a esta tribuna, mais uma vez, para falar sobre este momento que estamos vivendo em nosso País. Refiro-me à imensa mobilização que teve como motivação inicial melhorias no transporte público, ampliando-se, extraordinariamente, como resposta a atuação repressiva e de extrema violência das polícias estaduais, especialmente as de São Paulo e Rio de Janeiro, ganhando enorme dimensão, alastrando-se para várias cidades brasileiras.

            Mobilizadas principalmente pelas redes sociais da Internet, essas manifestações se conformaram como atividades descentralizadas, apartidárias, com as mais variadas reivindicações.

            Registra-se também, por parte de amplos setores dos manifestantes, duras críticas aos gastos relacionados à copa mundial de futebol, aos serviços públicos em geral, à corrupção, à forte resistência às organizações e instituições, tanto públicas quanto privadas, destacando-se os partidos, entidades representativas e os grandes veículos comerciais de comunicação.

            Quem, como eu, militante social popular e militante do Partido dos Trabalhadores, nasceu entre os anos setenta e oitenta e, como resultado de manifestações populares contra o aumento do custo de vida, contra a contenção dos salários e o regime ditatorial militar, cresceu com seus militantes participando ativamente nas grandes manifestações populares pelas eleições diretas para a Presidência da República, pela anistia política e pela democratização do País, com ativa e crescente participação nas eleições locais e presidenciais, sempre marcadas por grandes manifestações populares, em alguns casos reunindo mais de um milhão de pessoas, quem, durante a década de 1990, foi muitas vezes às ruas lutar contra os descalabros promovidos pelos governos neoliberais, lutar contra a privatização dos serviços públicos e das estatais, lutar contra as políticas que levaram à falência grande número de empresas nacionais, lutar contra a monopolização da economia brasileira por grandes empresas multinacionais, batalhar contra o desemprego, a pobreza e a miséria e se empenhou na luta contra a corrupção e pela melhoria da educação, da saúde e das condições de vida do povo, quem acredita e sempre participou das lutas e manifestações populares só poderia, como eu, saudar milhares que estão nas ruas entoando as mais variadas palavras de ordem, entre elas “o gigante acordou”, exigindo aprofundamento das mudanças em todo o País. Desta forma, registro que considero bastante positivo e motivo de comemoração a energia popular que vem das ruas.

            Contudo, acho providencial fazer um registro: historicamente, setores e parcelas significativas da nossa sociedade protagonizaram diversas lutas neste País, a exemplo, das inúmeras revoltas no período colonial; das primeiras manifestações do operariado brasileiro; da luta contra a ditadura militar, pela redemocratizaçao do Brasil, com as Diretas Já; do impeachment do ex-Presidente Collor, com destaque para os jovens denominados de caras pintadas; da luta permanente das trabalhadoras e trabalhadores do campo e das cidades, na busca pelo direito à terra, através da luta pela reforma agrária e da luta por melhores salários e condições de trabalho; da luta dos povos indígenas e dos movimentos de direitos humanos; das lutas contra a intolerância, contra o racismo, contra a cultura machista e sexista; e de tantas e tantas outras bandeiras de lutas, empunhadas por milhares de lutadoras e lutadores pelos quatro cantos deste nosso País.

            Portanto, como forma de respeito, para se fazer justiça histórica, acho adequado registrar que inúmeras brasileiras e brasileiros não acordaram agora. Uma parte acordou agora, mas outra parte nunca dormiu.

            De toda forma, as atuais manifestações iniciaram por uma reivindicação específica quanto ao valor das passagens. Entretanto, quando os jovens brasileiros saíram às ruas contra o aumento da tarifa de ônibus, essa reivindicação se traduziu em uma dimensão mais ampla, reafirmando que o transporte público é um serviço essencial na vida das pessoas, não podendo estar aprisionado à lógica do lucro e da acumulação do capitalm, e que o dia a dia dos cidadãos e cidadãs, especialmente daqueles que utilizam o transporte público nas grandes cidades brasileiras, está insuportável e já foi transformado, há muito tempo, em verdadeiro inferno urbano.

            Dessa forma, Sr. Presidente, diferentemente do que muitos afirmam, a fagulha que iniciou essas grandes mobilizações é um tema da mais alta relevância para o conjunto da sociedade brasileira.

            Tenho também percebido que vários analistas políticos e sociais têm apresentado perplexidade quanto ao fato de essas imensas mobilizações ocorrerem justamente em um período de avanços conquistados nos dois últimos mandatos do ex-Presidente Lula e nos dois anos do mandato da Presidenta Dilma. Mas o fato é, que apesar das conquistas alcançadas nos dez últimos anos, permitindo convivermos com um dos menores níveis de desemprego de nossa história e com toda a mobilidade social ocorrida nesta década, o nosso País ainda possui distorções sociais e econômicas gravíssimas e um déficit significativo de democracia.

            A concentração de renda e a concentração de poder político e econômico é gigantesca. A economia, em várias de suas áreas, sofre com a presença de corporações e monopólios privados. O abismo entre pobres e ricos continua constrangedor. É enorme a concentração de terras e de riqueza. Serviços como educação, saúde e habitação, embora o Governo Federal, nos últimos 12 anos, tenha dedicado especial atenção a esses temas, com programas significativos como o Prouni, o Reuni e o Minha Casa, Minha Vida, ainda estão bastante aquém das necessidades do povo brasileiro.

            Em frente desse contexto, é essencial que as mudanças ocorram de maneira muito mais rápida. E aqui entramos na questão que considero fundamental neste debate, pois, para avançarmos nos anseios econômicos e sociais e na democracia, que estão sendo reafirmados pelas ruas, serão necessárias reformas estruturais profundas, que alterem o atual quadro de distribuição do poder no Brasil.

            Para tanto, diante do nível de conservadorismo e de resistência a mudanças, presente visivelmente nos Poderes brasileiros, inclusive nesta Casa, para os que, como eu, compreendem o papel que a luta social pode jogar na transformação da sociedade, é fundamental que o nosso povo, especialmente a juventude, mantenha-se nas ruas, permaneça mobilizado, pressionando e garantindo que as transformações continuem avançando e ocorrendo no País.

            A tão necessária reforma política é um exemplo cristalino do quanto o Congresso brasileiro tem enormes dificuldades de realizar reformas estruturais. Nesse caso, a decisão da Presidenta Dilma de enviar a esta Casa a proposta de realização de um plebiscito para a população opinar sobre os principais pontos de uma reforma política é extremamente acertada e demonstra que ela está sintonizada com os clamores vindos da rua.

            As milhares de pessoas que estão mobilizadas estão dando um recado firme e contundente aos membros dos Poderes brasileiros: “O atual sistema político e eleitoral do Brasil, assentado em financiamento privado, está totalmente esgotado e em dissintonia com as mudanças em curso neste País”.

            Parece-me profundamente contraditório elegermos agentes públicos, tanto para os Legislativos quanto para os Executivos, por meio de pleitos eleitorais fortemente eivados da “mão pesada” do poder econômico, retirando do povo a soberania da decisão e o seu direito legítimo de definir quem deve ou não representá-lo.

            Não por acaso, a pesquisa apresentada nesse 1º de julho pela Fundação Perseu Abramo aponta que a ampla maioria da população brasileira (89%) é favorável a uma reforma política, sendo que três quartos (75%) a considera muito importante. Sessenta e cinco por cento preferem que sejam eleitos novos representantes exclusivamente para fazer a reforma política. Esses dados são muito significativos, pois mostram o anseio por mudanças no sistema político e em suas instituições.

            Por fim, defendemos ainda medidas que fortaleçam as instituições partidárias e as consolidem como organizações programáticas, garantindo a representação do tecido social brasileiro, ampliando significativamente a presença das mulheres, com lista paritária de gênero, e de outros setores sub-representados na política, a exemplo, dos jovens, dos índios e dos negros.

            A reforma política, que é considerada por muitos a mãe de todas as reformas, sem dúvida, é essencial para avançarmos no aprofundamento da democracia brasileira. O plebiscito proposto pela Presidenta Diíma, com toda certeza, é decorrente, em parte, das grandes mobilizações e da presença de povo nas ruas, que estabeleceram um ambiente possível para que medidas de democracia direta fossem apresentadas.

            Assim sendo, reafirmo o que já falei anteriormente: é fundamental que as trabalhadoras e os trabalhadores, que os jovens e os demais segmentos progressistas da nossa sociedade continuem mobilizados e organizados nas ruas, apresentando a todos os governos, aos Legislativos e ao Judiciário suas pautas de reivindicações, para que o nosso País avance nas transformações tão almejadas e tão necessárias à construção do Brasil que sonhamos e por que lutamos.

            Era isso, Sr. Presidente, que eu tinha a dizer no momento. Também agradeço a atenção.

            Muito obrigada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/07/2013 - Página 43420