Discurso durante a 111ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Manifestação contrária à aprovação de projeto de lei que estabelece critérios para a criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de municípios; e outro assunto.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA POLITICA. ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.:
  • Manifestação contrária à aprovação de projeto de lei que estabelece critérios para a criação, a incorporação, a fusão e o desmembramento de municípios; e outro assunto.
Publicação
Publicação no DSF de 06/07/2013 - Página 43423
Assunto
Outros > REFORMA POLITICA. ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, APROVAÇÃO, PROPOSTA, AUTORIA, PAULO PAIM, SENADOR, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), EXTINÇÃO, VOTO SECRETO.
  • DEFESA, REJEIÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, REFERENCIA, FACILITAÇÃO, PROCESSO, CRIAÇÃO, MUNICIPIOS, COMENTARIO, RESULTADO, PESQUISA, AUTORIA, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), RELAÇÃO, AUMENTO, GASTOS PUBLICOS, ADMINISTRAÇÃO MUNICIPAL, PAGAMENTO, PESSOAL.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, meu caro Senador Paulo Paim, dificilmente, eu discordo de V. Exª, mas agora vou discordar.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Só a discordância de V. Exª se dirigindo a mim já é uma satisfação enorme.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - E quero crer que, ao fim, seremos militantes, até porque V. Exª é o protagonista inicial dessa grande causa.

            Parece-me que o voto aberto, a radicalização em torno da transparência é um caminho sem volta. Já votamos aqui o regime de urgência.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Que Deus ajude que V. Exª tenha razão! Eu, que estava meio pessimista, começo agora a me animar de novo. Que bela discordância de V. Exª em relação a mim!

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - O debate foi feito de forma entusiasmada na Comissão de Constituição e Justiça. V. Exª lidera essa militância no Senado há alguns anos, acho que ainda na Câmara, no Congresso Nacional.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Desde a Constituinte, brigo por esse sonho.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - O tema foi debatido à exaustão na Comissão de Constituição e Justiça. O regime de urgência foi aprovado em plenário. Portanto, parece-me ser essa uma decisão sem volta, até por conta da convicção de que o voto aberto, em toda e qualquer circunstância, é uma proteção, para que nós possamos prestar contas à sociedade das nossas decisões no plenário do Senado, até porque mandato parlamentar, mandato público, mandato político não é propriedade particular de quem o exerce. Portanto, a transparência no voto me parece um imperativo, parece-me uma necessidade.

            O eleitor, sim, todos nós como cidadãos precisamos do sigilo do nosso voto, mas o representante popular que se elege nas ruas, que se elege pela vontade popular, deve, sim, prestar contas dos seus atos. Já tivemos aqui oportunidade de discutir esse tema.

            Não tenho qualquer tipo de receio quanto ao voto aberto. Há o comentário de que, se você votar abertamente contra uma eventual autoridade que vai para o Supremo Tribunal Federal, amanhã você poderá ser submetido a essa ou àquela perseguição.

Para mim, isso não diz nada. O voto aberto é uma proteção para que a sociedade e a população possam saber como se manifestou o seu representante.

            Portanto, eu estou ao lado de V. Exª e sempre entusiasmado. E acho que o Senado não pode dar esse passo atrás. Será um retrocesso frente às importantes medidas que nós adotamos nos últimos dias.

            É verdade, Presidente Paulo Paim, que nós precisamos fazer aqui o mea-culpa, que nós precisamos fazer uso da humildade e reconhecer que muitas das mudanças que nos últimos dias foram votadas se efetivaram em razão das movimentações populares. A Casa reagiu, reagiu positivamente, mas essa reação não pode ser uma reação conjuntural. Precisa ser uma reação estrutural. Precisamos continuar, acho eu -- este é o meu juízo de valor --, perseverando nessa direção, para que a Casa se afirme junto à população brasileira, manifestando não apenas o desejo, mas a determinação de fazer as mudanças que são absolutamente necessárias no processo parlamentar, no processo de representação política.

            Eu quero crer que, já na segunda-feira, nós precisamos voltar ao tema. Um dia sim, o outro também. Água mole em pedra dura tanto bate até que fura. E precisamos, sim, votar a proposta de S. Exª, que foi relatada e foi votada à unanimidade na Comissão de Constituição e Justiça, inclusive com regime de urgência.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PMDB - RS) - Senador Ricardo Ferraço, só uma frase. Eu fiz uma pequena pesquisa, e em inúmeros países do mundo não há mais voto secreto. Nos Estados Unidos, os Ministros da Suprema Corte são escolhidos com voto aberto. Impeachment de Presidente, voto aberto; inclusive vetos, voto aberto. Cada um diz a sua posição, e acabou.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - Claro!

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PMDB - RS) - Quero só cumprimentar V. Exª, porque agora fiquei mais otimista, a partir do seu discurso.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - “Não posso votar aberto porque, se votar contra um veto que venha da Presidência, eu serei perseguido por isso ou por aquilo.” Eu não posso ser perseguido é pela população.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PMDB - RS) - Muito bem.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - Às favas essa coisa de que não vou contrariar Presidente de plantão. O que eu não posso contrariar é a população brasileira; no meu caso específico, a população capixaba, que me colocou aqui e que precisa ter, sim, controle social sobre a forma com que me manifesto e a forma com que exerço aqui este mandato de Senador, volto a frisar, que não me pertence. Pertence à população capixaba e à população brasileira.

            Portanto, na segunda-feira, nós precisamos retomar a nossa militância nesta Casa, porque isso não pode ser estratégia de discurso. Isso tem que ser prática política, e nós estaremos juntos. Tenho certeza de que a maioria dos Srs. Senadores e das Srªs Senadoras estarão engajados conosco, com V. Exª, que é o autor dessa proposta que, seguramente, marcará um novo tempo no Senado da República.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Cumprimento V. Exª. Pode ter certeza, em nome do povo brasileiro. A pesquisa mostra que 99% do povo são a favor da posição que V. Exª defende.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Bloco/PMDB - ES) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

            Sr. Presidente, a Câmara dos Deputados votou, um dia desses, decidiu de maneira majoritária por um caminho que me parece extremamente na contramão da conjuntura do nosso País. Decidiu a Câmara dos Deputados, por sua maioria, criar facilidades, portas e janelas, para a criação de novos Municípios no Brasil. A minha manifestação é para condenar essa iniciativa, inadequada, insensata e fora de hora, Sr. Presidente.

            O IBGE, Sr. Presidente, relata, através de números inclusive divulgados hoje, no jornal A Gazeta, do meu Estado, que houve um aumento de aproximadamente 32% no número de servidores das prefeituras municipais entre 2005 e 2012. E essa é seguramente uma das causas -- não a causa, mas uma das causas -- das dificuldades financeiras e até econômicas enfrentadas pelos nossos Municípios. Nem as restrições ao gasto com pessoal, previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal, impediram muito mais do que um mar, um oceano de contratações, Sr. Presidente.

            Foram mais de 1,5 milhão funcionários contratados nesse período por esse conjunto de prefeituras municipais do nosso País. Imagina-se que em algumas prefeituras os limites de caixa foram mais duros do que a Lei de Responsabilidade.

            Em 2005, os servidores municipais correspondiam a 2,6% dos 183.400 habitantes do País. Em 2012, esse número saltou para 3,2%, cuja população era estimada em 196 milhões de pessoas.

            O crescimento percentual levanta suspeitas sobre o custo/benefício, ou seja, a melhoria dos serviços prestados à população, indicando, seguramente, a má gestão dos recursos públicos.

            O IBGE também constata que os Municípios com população entre 100 mil e 500 mil habitantes foram os que mais ampliaram os quadros de servidores. O crescimento médio atingiu 47%, considerando trabalhadores envolvidos de forma direta ou indireta na Administração Pública.

            Esses dados, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sinalizam, deixam clara a necessidade de o Senado Federal…

             Aqui, manifesto o meu posicionamento contra essa matéria.

            Novos Municípios significam, na prática, novos cargos de prefeitos, secretários, vereadores, servidores, foros municpais, dinheiro do sofrido contibuinte brasileiro, para ser gasto em atividade meio, quando o que nós precisamos é trabalhar com austeridade, com economia, para que nós possamos ampliar a capacidade de investimento da máquina pública brasileira, não importa se em nível federal, em nível estadual ou em nível municipal, ou seja, mais despesas, mais gordura para uma máquina pública que já peca no atendimento deficitário e deficiente ao conjunto das demandas da população brasileira.

            Temos hoje, Sr. Presidente, 5.578 cidades no Brasil. Mesmo estabelecendo condições de certa forma rigorosas para o desmembramento dos atuais Municípios, estima-se que as novas regras aprovadas pelos Srs. Deputados Federais poderão resultar na criação -- imaginem, imaginem e pasmem! -- de pelo menos mais 400 ou 500 Municípios em nosso País.

            Qual é, de fato, a vantagem? Quais são, de fato, os benefícios para os moradores e para os contribuintes brasileiros?

            É preciso registrar que, em cerca de 4 mil dos nossos Municípios, há hoje menos de 20 mil habitantes, e não há arrecadação tributária suficiente para atender às necessidades mínimas de sua população, ou seja, são Municípios que foram criados e que dependem fundamentalmente de transferência de recursos ou do Governo Estadual, ou mesmo do Governo Federal.

            Essa é uma situação que, obviamente, só tende a se agravar com a criação de novos Municípios.

            Ora, Sr. Presidente, é preciso um mínimo de responsabilidade, de sensatez, de razoabilidade num momento como este, sobretudo quando a população está dizendo ao setor público, está dizendo a todos nós que precisamos melhorar a eficiência, a eficácia, o alcance, a universalização do acesso aos serviços públicos.

            Portanto, parece-me essa uma medida absolutamente equivocada. Sinceramente, só vejo uma motivação e um sentido nisso: o interesse político, ou melhor, o interesse da política de baixa qualidade na manutenção de currais eleitorais, para que esses políticos possam se perpetuar ou conduzir seus mandatos com essas manobras.

            O que infelizmente nos parece é que os interesses políticos e eleitorais costumam falar mais alto do que os interesses da população. É o que estamos aqui condenando.

            Entre 1988 e 2000, a brecha aberta pela Constituição para que as assembleias legislativas estaduais encaminhassem processos de emancipação de novos Municípios resultou na criação de pelo menos mais 1,5 mil, 1,4 mil Municípios em nosso País. Pois é, entre 1988 e 2000!

            Mesmo diante dessa realidade, decidem os Srs. Deputados Federais ampliar as condições, flexibilizando, para que cerca de 400 a 500 Municípios possam ser criados, a partir dessa que foi uma decisão tomada pela Câmara. Quero crer que o Senado não vai avalizar, por tudo que representa de prejuízo para o conjunto da população brasileira.

            Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é inaceitável colocarmos agora mais lenha nessa fogueira, que só vai deteriorar e prejudicar a vida do contribuinte brasileiro.

            Números recentes divulgados pela imprensa apontam, Sr. Presidente, mais de 984 mil servidores federais só para movimentar os nossos 39 Ministérios. O custeio de todas essas Pastas do Executivo ultrapassa R$600 bilhões! Está muito caro, está muito pesado para o contribuinte brasileiro, para o trabalhador brasileiro sustentar uma atividade meio como essa, que vem sendo reprovada pela população brasileira, inclusive nas últimas manifestações.

            Por isso tudo, Sr. Presidente, quero já deixar aqui a minha manifestação. Se essa proposta tramitar por esta Casa terá a minha oposição, e quero crer que eu não serei, como se diz, andorinha de voo sozinho. Nós teremos a companhia de um conjunto muito grande de Senadores, de modo a barrar essa iniciativa clientelista e eleitoreira, até porque é o Senado Federal a Casa Revisora, mas não apenas a Casa Revisora; é o Senado Federal a Casa que deve preservar o interesse da Federação brasileira.

            Esse tipo de iniciativa, com certeza, descaracteriza e enfraquece a possibilidade de o Poder Público brasileiro continuar oferecendo resultados à população brasileira. Sejamos aqui muito sinceros: os resultados estão sendo muito questionados. O nosso País, o setor público brasileiro, em todos os sentidos, inclusive o setor político estão sob manutenção, precisando reavaliar toda a sua construção, toda a sua jornada, para que esse movimento que inunda e incendeia o coração dos brasileiros possa, na prática, fazer com que a ficha tenha que cair por parte daqueles que têm o dever e a responsabilidade de representar o sentimento da população brasileira.

            Muito obrigado, Srªs e Srs. Senadores.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/07/2013 - Página 43423