Discurso durante a 111ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Relato da participação de S. Exª no Primeiro Encontro sobre Capital Natural, ocorrido em Berlim, na Alemanha.

Autor
João Capiberibe (PSB - Partido Socialista Brasileiro/AP)
Nome completo: João Alberto Rodrigues Capiberibe
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR, POLITICA INTERNACIONAL, POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Relato da participação de S. Exª no Primeiro Encontro sobre Capital Natural, ocorrido em Berlim, na Alemanha.
Publicação
Publicação no DSF de 06/07/2013 - Página 43429
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR, POLITICA INTERNACIONAL, POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • PRESTAÇÃO DE CONTAS, RELAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, ENCONTRO, AMBITO INTERNACIONAL, LOCAL, PAIS ESTRANGEIRO, ALEMANHA, DEBATE, NECESSIDADE, ELABORAÇÃO, PROJETO, REFERENCIA, UTILIZAÇÃO, RECURSOS NATURAIS, OBJETIVO, AVALIAÇÃO, ECONOMIA, PAIS.

            O SR. JOÃO CAPIBERIBE (Bloco/PSB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Paulo Paim, telespectadores da TV Senado, ouvintes da Rádio Senado, senhores e senhoras presentes a esta sessão, vou tratar de fazer um relatório da viagem que fiz a Berlim, no mês passado. Só agora estou fazendo esse relatório, essa prestação de contas, até porque viajei com recursos do Senado, recursos do contribuinte, a quem eu devo satisfação e devo apresentar resultados.

            Já encaminhei o relatório à Presidência da Mesa e, agora, falo desse 1º Encontro sobre Capital Natural, em Berlim, entre os dias 6 e 8 de junho. Eu tive a satisfação de participar, juntamente com a Senadora Vanessa Grazziotin, do PCdoB, ambos representando o Senado, no 1ª Encontro sobre Capital Natural, promovido pela Globe International, uma organização que congrega parlamentares do mundo todo. Na verdade, parece um embrião do que poderá vir a ser a representação de um parlamento global.

            Nós sabemos que caminhamos para essa preocupação global com questões que nos assustam, como as mudanças climáticas, os fenômenos que ocorrem diariamente na natureza, provocados pela pressão humana sobre os nossos ecossistemas.

            A esse encontro também esteve presente o Deputado Márcio Macedo, representando a Câmara dos Deputados.

            O objetivo do encontro foi fornecer aos legisladores participantes -- havia legisladores do mundo todo -- informações sobre a importância de elaborar projetos legislativos que visem incorporar o chamado “capital natural” nos quadros da contabilidade nacional dos nossos governos.

            Por capital natural entende-se a valorização de bens e serviços fornecidos pelos sistemas naturais: o sol, o ar, a água, o solo, a flora, a fauna, os micro-organismos, enfim, os ecossistemas, bem como os processos de produção de energia e transformação de matéria-prima neles existentes.

            Hoje, o sistema de avaliação da riqueza nacional é fundamentalmente baseado em valores econômicos extraídos da contabilidade governamental. Esse avalia a eficiência das políticas de desenvolvimento por meio de índices como PIB, taxas de crescimento, emprego, taxas de juros, importações, exportações, investimentos etc. No entanto, esse sistema de contas não inclui o valor do capital natural e seus cálculos.

            Foram dois dias de muita informação e debate sobre um tema novo, mas que será recorrente sempre que estiver em discussão a relação atual entre produção, consumo e natureza.

            Esse instrumento pretende ajudar os países a superar o tradicional enfoque econômico baseado no PIB, integrando as contas nacionais à riqueza que constitui o capital natural. Em outros termos, garantir que as contabilidades nacionais, usadas para medir e planejar o crescimento econômico, incluam também o valor dos recursos naturais.

            Até porque a gente sabe que, em qualquer bem que a gente adquira, um veículo, um equipamento qualquer, há um valor de amortização, de desgaste natural de uso. A mesma coisa são os recursos da natureza. Há os desgastes. Se nós usamos intensamente o solo, Senador Paulo Paim, uma parte desse solo não se recupera; ele se desertifica. Então, ele se torna inútil à agricultura. E essas perdas não são contabilizadas.

            O PIB leva em consideração apenas o desempenho da economia, e o PIB é uma contabilidade que, muitas das vezes, contraria a prevenção. Por exemplo, não havendo doença, não tem crescimento o PIB. Às vezes, é mais interessante um desastre, porque daí, se você tem um desastre de carro, vai ter que recuperar o carro, vai ter que empregar gente, vai ter que comprar peça, e isso faz o PIB crescer. Quando você prevê e evita os acidentes, o PIB fica… É uma medida um pouco complicada para atender os interesses da qualidade de vida humana.

            O PIB, como disse, só leva em consideração o desempenho econômico. Não diz nada a respeito da riqueza e dos bens subjacentes a essas rendas e a esses produtos. Por exemplo, quando um país explora seus recursos minerais, pesqueiros, hídricos, florestais e outros, na realidade ele está esgotando essas riquezas e não tem amortização. Mas a redução desses bens não aparece no PIB. A redução não é medida pela contabilidade nacional clássica.

            Por essa razão, ao se fazer o cálculo da riqueza, é preciso incluir o valor do capital natural. O processo de desenvolvimento em longo prazo é um processo de acumulação e também de boa gestão de um conjunto de ativos, como o capital manufaturado ou industrial, o capital humano, o financeiro e social, aos quais há de acrescentar o capital natural.

            Eu sou de uma geração em que o embate era entre o capital e o trabalho. Nós, até bem pouco tempo, até a última década do século XX, não cogitávamos do esgotamento dos recursos da natureza. Portanto, eles não entravam nessa disputa entre capital e trabalho. A natureza era como se fosse inesgotável.

            Os serviços prestados pelas florestas, tais como o sequestro de carbono… Se desaparecer a Floresta Amazônica, haveria um risco, eu acho que hoje menor, haveria um processo de desertificação e de mudança do sistema hídrico. Então, as chuvas que hoje caem no Centro-Sul brasileiro são formadas pela evaporação da Floresta Amazônica.

Imagine: se desaparece a floresta, essa desertificação, essas secas se estenderiam não só na Amazônia, mas também se estenderiam ao Centro-Sul brasileiro.

            Voltando, digo que os serviços prestado pelas florestas, tais como o sequestro de carbono e a purificação do ar, não é considerados no cálculo do PIB. Essa ausência de indicadores do capital natural -- ou ambiental ou ecológico -- pode dar uma ideia equivocada quanto ao desempenho da economia e do bem-estar de um país.

            Eu tenho um caso concreto: a mina de manganês do Amapá. Foi explorada de 1956 a 1996. Exaurida a mina, restou a cidade fantasma. As atividades econômicas, todas elas, desapareceram. Então, elas não são sustentáveis, principalmete do ponto de vista econômico, mas também, claro, do ponto de vista social.

            Os ecossistemas estão se deteriorando em todo o Planeta, e essa degradação compromete a capacidade dos países de dar bem- estar à população e manter um crescimento sustentável e capaz de combinar a sustentabilidade econômica com a preservação das riquezas ambientais, do patrimônio ambiental e da equidadade social.

            A incorporação do capital natural ao sistema de contas nacionais pode contribuir para a tomada de decisões. Por exemplo, ao contabilizar a terra ou a água, os países podem melhorar a gestão desses recursos, aumentando a capacidade de produzir energia elétrica ou avaliar os diferentes usos da terra. No caso da biodiversidade, é possível definir uma estratégia de gestão para a agricultura, o ecoturismo, a proteção contra inundações e a recarga dos lençóis freáticos, entre outros.

            No caso específico da biodiversidade amazônica, entre converter um hectare de floresta num campo de soja e usar economicamente essa floresta, é evidente que a opção tem que ser pela preservação do capital natural, pelo capital floresta. Manter, usar economicamente, gerar satisfação social e preservar a floresta.

            Trata-se, assim, de incluir os valores dos serviços prestados pelos ecossistemas e outros recursos naturais, que atualmente não são objeto de mercado e difíceis de medir.

            Ao final do encontro, os participantes, representando o Legislativo de mais de 25 países, redigiram um comunicado cuja finalidade é promover melhor compreensão do capital natural e da importância da sua avaliação.

            Passo, em seguida, a enumerar os principais aspectos do comunicado:

- reconhecer que o PIB é apenas uma medida parcial da riqueza nacional e do bem-estar, mas que não representa adequadamente os benefícios não comerciais dos ecossistemas, tampouco os custos ambientais do crescimento;

- salientar que a instituição TEEB (nome inglês para Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade) estimou que, até 2050, as perdas acumuladas devido à degradação dos ecossistemas será equivalente a 7% do PIB global;

- reconhecer a importância da realização de avaliações nacionais dos ecossistemas, de maneira a determinar os ativos em capital natural, bem como os custos associados à sua destruição;

- solicitar aos governos que, até 2020, incorporem plenamente o valor do capital natural nas contas governamentais, bem como para que as empresas divulguem os impactos ambientais de suas atividades nos balanços anuais aos acionistas.

            O documento traz, ainda, os compromissos assumidos pelos legisladores, a saber:

- promover a conscientização e compreensão da importância da contabilidade do capital natural nos legislativos nacionais;

- melhorar a comunicação entre parlamentares, peritos e outras partes interessadas na contabilidade do capital natural;

- incentivar os governos a prestar contas da gestão do capital natural em seus países;

- organizar reuniões e debates nos parlamentos nacionais com Ministros do Meio Ambiente e Fazenda e Planejamento, para discutir os benefícios e os métodos de incorporação da valorização do capital natural nas contas governamentais e empresariais.

            Em suma, esses foram os temas debatidos durante dois dias, em Berlim. Foram dois dias de intensos debates, dos quais decorreram essas sugestões que apresento a esta Casa e que nós, certamente, haveremos de traduzir em algumas iniciativas de lei, no sentido de forçar os governos a incorporar na contabilidade nacional o capital natural.

            A nossa preocupação é com o presente, mas também com as gerações futuras.

            Era isso, Sr. Presidente.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/07/2013 - Página 43429