Discussão durante a 114ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Referente ao PLS n. 764/2011.

Autor
Aloysio Nunes Ferreira (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/SP)
Nome completo: Aloysio Nunes Ferreira Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discussão
Resumo por assunto
Outros:
  • Referente ao PLS n. 764/2011.
Publicação
Publicação no DSF de 10/07/2013 - Página 45239

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco/PSDB - SP. Para discutir. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, vejo aqui os prefeitos que nos visitam -- sejam bem-vindos à galeria! -- e a Governadora Rosalba, do estado do Rio Grande do Norte.

            Queria, Sr. Presidente, expor meu ponto de vista a respeito dessa proposição que já combati na Comissão de Assuntos Econômicos. Verifiquei, na Comissão, pelo próprio resultado da deliberação, que corresponde ao desejo da maioria da Casa vê-la aprovada. No entanto, Sr. Presidente, faltaria com meu dever parlamentar se não viesse à tribuna para expor ao Senado as minhas objeções, com todo o respeito pela autora, de quem me afasto com dor no coração, e pelo Relator, Senador Jorge Viana.

            Temos, Sr. Presidente, como sabemos, no Brasil, a figura da Zona de Processamento de Exportações, que foi criada já há mais de uma década. A ideia da Zona de Processamento de Exportações consiste em atrair empresas, sobretudo empresas industriais, para promoverem exportações, como o próprio nome indica, com base em vantagens fiscais e em isenções de tributos federais, visando, assim, a gerar empregos, a criar centros dinâmicos de inovação no País que pudessem se propagar a partir da sua instalação por toda região, como círculos concêntricos se propagam na placidez de um lago quando se atira nele uma pedra.

            É uma ideia antiga a da criação de polos de desenvolvimento. Tenho minhas leituras em Economia e me lembro de François Perroux, um eminente economista francês que formulou essa teoria, se não me engano, pela primeira vez, dos polos de desenvolvimento. Na ideia de Perroux, o desenvolvimento se daria -- e ele falava de uma Europa devastada pela guerra -- mediante uma forte intervenção do Estado, com investimentos públicos, para propiciar o surgimento de zonas a partir da instalação de uma empresa piloto, de uma grande empresa, numa área beneficiada por uma estrutura logística abundante ou próxima de fontes de matéria-prima, como, por exemplo, o aço, na siderurgia no vale do Ruhr, ou de centros urbanos muito densos. A partir daí, sempre mediante apoio governamental, essa indústria polo, a indústria matriz, traria para sua órbita outras empresas, que, por sua vez, promoveriam mudanças institucionais, exigências novas de qualificação no mercado de trabalho, num processo virtuoso que pudesse se generalizar na região.

            Bem, as ZPEs, tal como foram concebidas, visavam à exportação. Esse é o objetivo das ZPEs. Trazem-se mercadorias do exterior mediante vantagens fiscais. Elas não pagam tributos federais. Os Municípios e os Estados também podem isentá-las dos tributos de sua competência. Aliás, há uma resolução do Confaz que autoriza os Estados a isentá-las do ICMS, sempre visando à exportação, sempre.

            Foram criadas 24 ZPEs no Brasil, e o último levantamento de que tenho notícia revela que apenas duas foram instaladas, o que não significa que estejam operando, mas já têm sua infraestrutura organizada e já foram autorizadas a operar pela Receita Federal.

            Por que razão esse tipo de empreendimento que foi exitoso em alguns países que, na época dos anos 60 e 70, eram chamados de Tigres Asiáticos não deu certo entre nós? Eles não deram certo, em primeiro lugar, porque esse tipo de intervenção só é eficaz em países cuja estrutura industrial ainda é embrionária, pouco integrada, cujas estruturas industriais carecem de upgrade em matéria de inovação, o que seria propiciado pelos investimentos estrangeiros.

            Ora, o nosso País conseguiu construir -- e creio que esse é um grande legado que a Nação brasileira construiu ao longo de décadas -- uma estrutura industrial relativamente integrada, evidentemente ainda com grandes desigualdades em termos da sua localização regional. Mas temos uma estrutura industrial no País, cadeias produtivas que estavam todas elas aqui instaladas e que agora começam a se desmantelar. Não por causa das ZPEs. Não! As ZPEs não têm nenhuma influência nisso. Essas cadeias produtivas começam a se desmantelar porque vivemos num ambiente econômico que está sufocando a indústria brasileira. A indústria brasileira está derretendo. Essa é que é a realidade dos fatos. Cadeias produtivas estão se dissolvendo, rompendo seus elos.

            Outra razão, no meu entender, da frustração dessas ZPEs é que o comércio internacional, depois da Rodada Uruguai, não é mais o mesmo que era antes dos anos 90. Hoje, há uma tônica no comércio internacional, uma constante, que se generaliza, ainda bem, que é a redução das tarifas alfandegárias. O comércio internacional, depois da Rodada Uruguai, se liberaliza, o doce comércio, que propicia o intercâmbio entre as nações.

            Por isso, o diferencial entre aquilo que se pode produzir no Brasil, o custo da produção brasileira e o custo da produção lá fora não tem mais vigência, até porque o custo Brasil é muito alto, seja fora das ZPEs, seja até dentro delas. A competitividade brasileira, infelizmente, é absolutamente insuficiente para dar sustentação a um projeto de desenvolvimento, seja ele qual for.

            Diante dessa frustração, o que fazem os meus queridos colegas que apoiam esse projeto? Transformam as Zonas de Processamento de Exportação em Zonas de Processamento de Importação, pois é isso que o projeto propõe, ao estabelecer que até 50% da produção das ZPEs, repaginadas, poderão se destinar ao mercado interno.

            Vejam V. Exªs o que nós estamos fazendo: nós estamos fazendo um protecionismo às avessas, um protecionismo contra a indústria brasileira, porque essas ZPEs, voltadas para o mercado interno, só poderão ter êxito quando e na medida em que for grande, e cada vez maior, a diferença entre o custo de produção delas e o custo Brasil, o custo de produção fora delas.

            Dirão: “Bom, quando os produtos das Zonas Francas, repaginadas, forem internalizados, eles recolherão os impostos que não foram recolhidos no início.” Ora, Srs. Senadores, todos sabemos que o custo Brasil não se compõe apenas de tributos. É evidente que os tributos são uma parte substancial do custo Brasil, mas sabemos também dos problemas da infraestrutura, da precariedade da qualificação da mão de obra, da complexidade do sistema tributário e da burocracia infernal.

            Vejam, Srs. Senadores, o último boletim de uma publicação do Banco Mundial chamada Doing Business, diz que o Brasil, em uma escala de 183 países, está em 127º lugar, quando se leva em conta o tempo para a abertura de uma empresa. O México, por exemplo, está em 35º. O nosso, o Brasil, está em 127º lugar! A Rússia, com seu passado czarista, de séculos de seu passado czarista e de 80 anos de governo centralizado soviético, está mais adiantada que nós desse ponto de vista, em 123º. E o Governo do PT, nesse tempo todo, não tomou uma medida sequer para atacar essa burocracia.

            Eu diria, Srs. Senadores, que a burocracia é um custo importante -- esses outros itens a que me referi também --, e o sucesso das ZPEs com essa nova fórmula dependerá do diferencial entre o custo de produção delas e o custo de produção fora delas. Portanto, quanto maior for custo Brasil, maior será o benefício das novas ZPEs.

            Srs. Senadores, entre os custos que pesam sobre a nossa economia, especialmente sobre a nossa indústria, lembraria de debate recente promovido pelo jornal Valor Econômico, com a participação de Edmar Bacha e de Luiz Gonzaga Belluzzo. Desse debate se depreende uma informação assustadora, aterradora: em relação ao custo das empresas industriais brasileiras, 40% vêm de tributos. Quarenta por cento! E o que o Governo do PT faz? Dá incentivos fiscais para empresas que já estão instaladas no Brasil, que não produzem grande coisa em matéria de inovação e que, com isso, além de desfalcarem as finanças dos Estados e dos Municípios, via empobrecimento dos fundos de participação, reduz de tal forma a margem de atuação do Governo, pela ampliação, pelas suas dificuldades fiscais, que torna o Governo impotente para fazer investimentos que seriam do alcance, da alçada dele, Governo Federal, especialmente na área de transporte e de infraestrutura.

            Querer resolver isso com ZPEs? Convenhamos, Srs. Senadores! O Governo fez várias tentativas de política industrial. Não quero negar a história. O Governo criou, mandou para o Congresso, e nós aprovamos, uma série de leis que suspende cobrança de PIS e Cofins para empresas exportadoras, que dá tratamento tributário diferenciado para empresas preponderantemente exportadoras; criou Fundo de Financiamento à Exportação, criou o Reintegra, mas nada disso deu resultado, porque o Governo abdicou de fazer reformas importantes. O Governo mandou para o Congresso Nacional, por exemplo, um ambicioso projeto de reforma tributária, que visava a reduzir todas as alíquotas interestaduais a uma, e depois deixou que os Estados se dilacerassem numa disputa, num ambiente de conflagração federativa que já vinha acontecendo desde a disputa sobre os royalties do petróleo. O Governo abandonou esse projeto, como faziam antigamente mães que não tinham condições de sustentar os seus filhos. Elas depositavam as suas crianças nas rodas dos expostos das Santas Casas de Misericórdia. Foi isso que o Governo fez com o seu projeto de reforma do ICMS. Foi isso que o Governo fez com o projeto de criação de fundos de desenvolvimentos regionais, grande aspiração do País, grande aspiração desta Casa.

(Soa a campainha.)

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco/PSDB - SP) - Um projeto que morreu por abandono; abandono de quem teria a obrigação de liderar a sua maioria, visando à sua aprovação, ou seja, a Presidente da República.

            Agora, Srs. Senadores, propor ZPEs como fórmula milagrosa para promover o desenvolvimento das regiões, francamente, não acredito. Creio que essas ZPEs, se vingarem, serão enclaves. Muitas vezes o PT nos acusou de sermos neoliberais. Esses enclaves são de natureza neocolonial -- desculpe-me imensamente, minha querida Lídice da Mata --, e a sua implementação consistiria num protecionismo às avessas, num protecionismo contra a indústria nacional, que atravessa hoje um dos momentos mais difíceis…

(Interrupção do som.)

            O SR. ALOYSIO NUNES FERREIRA (Bloco/PSDB - SP) … e mais delicados da sua história.

            Por isso, Sr. Presidente, peço a V. Exª que registre meu voto contrário. Essa posição não tem acolhimento unânime da minha bancada. Estou falando aqui como o Senador Aloysio Nunes Ferreira, expondo minha posição. E digo a V. Exª que, por saber que o sentimento da Casa, compartilhado pela grande maioria dos meus colegas, é pela aprovação, não pedirei votação nominal. Limito-me a registrar a minha posição e a pedir a V. Exª, Sr. Presidente Renan Calheiros, que registre o meu voto contrario.

            Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/07/2013 - Página 45239