Discurso durante a 118ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários sobre a situação de Edward Snowden, ex-analista da Agência Nacional de Segurança norte-americana que revelou esquema de espionagem; e outros assuntos.

Autor
Lindbergh Farias (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Luiz Lindbergh Farias Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL. ESTADO DEMOCRATICO.:
  • Comentários sobre a situação de Edward Snowden, ex-analista da Agência Nacional de Segurança norte-americana que revelou esquema de espionagem; e outros assuntos.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 16/07/2013 - Página 47389
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL. ESTADO DEMOCRATICO.
Indexação
  • LEITURA, CARTA, ASSUNTO, ATUAÇÃO, GOVERNO ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), REALIZAÇÃO, ESPIONAGEM, PAIS ESTRANGEIRO.
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, APROVAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, REFERENCIA, AUTORIZAÇÃO, UTILIZAÇÃO, INTERNET, OBJETIVO, AMPLIAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, POPULAÇÃO, ELABORAÇÃO, PROJETO DE LEI, DEMOCRACIA.

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidente, Senadora Ana Amélia, Senador Valdir Raupp, Senador Eduardo Suplicy, eu estou convencido de que o mundo da política vai ter que passar por profundas participações, Senadora Ana Amélia.

            Vimos a participação recente da juventude nas manifestações brasileiras e em todo o mundo; a Primavera Árabe, no Oriente Médio; a mobilização pelas redes sociais, uma forma nova de fazer política. Nós estamos vivendo um momento no mundo de muita politização, na minha avaliação, com exigências de transparência.

            Quero fazer o pronunciamento hoje sobre esse assunto, porque eu acho que isso vai refletir no nosso trabalho no Congresso. Os governos estaduais, as prefeituras municipais vão ter que se abrir a uma participação mais direta por parte das pessoas.

            Nós do PT, Senador Eduardo Suplicy, já tivemos experiências exitosas como o orçamento participativo. E temos que agir agora de outras formas, estando mais abertos a escutar as ruas, a escutar o que os jovens têm a falar pelas redes sociais.

            Vou tocar nessa questão da transparência primeiro por outro lado, Senador Eduardo Suplicy. Quero voltar ao caso de Edward Snowden.

            No domingo passado meu filho, que tem 17 anos, me provocou em casa e quando eu cheguei aqui, na segunda-feira, V. Exª e o Senador Roberto Requião já haviam falado sobre esse jovem de 29 anos.

            Meu filho, de 17 anos, me provocou, dizendo: “Papai, vocês têm que falar alguma coisa, porque esse jovem está lá na Rússia, numa situação difícil, colocou a vida em risco”.

            Nesse fim de semana, navegando na Internet, achei uma carta dele, dessa semana, Senador Eduardo Suplicy.

            Vou ler aqui quatro cartas: uma carta dele; depois uma carta lindíssima de Boaventura de Souza Santos, falando do caso do avião do Presidente Evo Morales, criticando o governo de Portugal; uma carta do Assange e uma carta de Oliver Stone também sobre esse caso.

            Eu quero começar pela carta de Edward Snowden:

Olá. Meu nome é Ed Snowden. Há pouco mais de um mês, eu tinha família, uma casa no paraíso, e vivia com grande conforto. Eu também tinha a capacidade de, sem mandado algum, vasculhar, apreender e ler suas comunicações. A comunicação de qualquer um, a qualquer hora. Esse é o poder mudar o destino das pessoas.

Também é uma grave violação da lei. A 4ª e 5ª Emendas da Constituição do meu país, o Artigo 12 da Declaração Universal dos Direitos Humanos, e diversos estatutos e tratados proibiram sistemas invasivos assim de vigilância em larga escala. Enquanto a Constituição americana estabelece que esses programas são ilegais, meu governo argumenta que decisões judiciais secretas, que o mundo não está autorizado a ver, de algum modo legitimam um tema ilegal. Tais decisões simplesmente corrompem a mais básica noção de Justiça, cujo cuidado deve ser o de assegurá-la. O imoral não pode ser moralizado por meio de uma lei secreta.

Acredito no princípio declarado em Nuremberg, em 1945: ‘Indivíduos têm deveres internacionais que transcendem as obrigações de obediência nacionais. Assim, cidadãos têm o dever de violar leis domésticas para impedir crimes contra a paz e a humanidade de acontecerem.’

Com base nisso, fiz o que eu julgava certo e comecei uma campanha para corrigir esse erro. Não procurava enriquecer, não quis vender segredos dos Estados Unidos da América. Não me aliei a nenhum governo estrangeiro para garantir a minha segurança. Em vez disso, levei o que eu sabia para o público, de forma que aquilo que afeta a todos nós possa ser discutido por nós todos à luz do dia, e pedi justiça ao mundo.

Essa decisão moral de contar ao público sobre a espionagem que atinge a todos nós foi custosa, mas era a coisa certa a se fazer, e eu não me arrependo.

Desde então, o governo e os serviços de inteligência dos Estados Unidos da América têm tentando fazer de mim um exemplo, um alerta a todos que, como eu, podem fazer revelações. Fui transformado em apátrida e caçado por meu ato de expressão política. O governo dos EUA me colocou em listas de pessoas proibidas de voar. Cobrou de Hong Kong que me devolvesse, à margem das leis deles, numa violação direta do princípio de não repulsão -- a Lei das Nações. Ameaçou com sanções países que se levantassem por meus direitos humanos e o sistema de asilo da ONU. Tomou até mesmo a medida inédita de ordenar a aliados militares que pousassem à força o avião de um presidente latino-americano, na busca por um refugiado político.

Essas perigosas escaladas representam uma ameaça não apenas à dignidade da América Latina, mas aos direitos básicos compartilhados por cada pessoa, cada nação de viver livre de perseguições e de buscar e gozar de asilo.

Mesmo diante de tal agressão historicamente desproporcional, países por todo o mundo me ofereceram apoio e asilo. Essas nações -- inclusas a Rússia, a Venezuela, a Bolívia, a Nicarágua e o Equador -- têm minha gratidão e respeito por serem as primeiras a se erguer contra a violação de direitos humanos levada a cabo pelos poderosos, em vez dos desprovidos. Ao se recusarem a aceitar os princípios deles diante das intimidações, eles ganharam o respeito do mundo. É minha intenção viajar a cada um destes países para cumprimentar pessoalmente sua população e seus líderes.

Anuncio hoje minha aceitação formal de todas as ofertas de asilo que me foram oferecidas e todas que me possam oferecer no futuro.

Com a concessão de asilo do Presidente Maduro, da Venezuela, por exemplo, a minha condição de asilo é agora formal, e nenhum Estado tem base para limitar ou interferir no meu direito de desfrutar desse asilo. Como temos visto, porém, alguns governos na Europa Ocidental e de Estados norte-americanos demonstraram disposição de agir fora da lei, e este comportamento continua ainda hoje. Essa ameaça ilegal torna impossível para mim viajar à América Latina e desfrutar do asilo concedido lá de acordo com os nossos direitos humanos.

Essa disposição de agir extralegalmente por parte dos Estados poderosos representa uma ameaça a todos nós e não deve ser permitida. Por isso, peço auxílio em solicitar garantias de passagem segura por parte das nações relevantes na minha viagem à América Latina, além de solicitar asilo na Rússia até lá, enquanto esses Estados garantem que cumprirão a lei, e a minha viagem seja legalmente permitida.

            E continua, Senador Suplicy, dizendo que ia submeter essa, que é uma carta da semana passada, o pedido à Rússia.

            Eu encaro esse jovem como um herói, alguém que está colocando a sua vida em risco -- e colocou em definitivo -- para defender a liberdade de expressão, o nosso direito à privacidade. Eu espero que o governo dos Estados Unidos… E aqui não é nenhuma posição contra os Estados Unidos. Nós declaramos aqui a nossa admiração pelo povo norte-americano, mas eles têm que entender que isso, nesse mundo de hoje, até passa por cima de tudo isso, essa mobilização que está existindo de solidariedade. As pessoas não aceitam isso. Hoje há uma entrevista de um jovem que eu vou citar aqui, na entrevista de segunda-feira da Folha de São Paulo, que criou um movimento Europa contra Facebook, por causa disso, querendo privacidade, segurança, liberdade de expressão. Então, o governo norte-americano tem que revisar essa sua posição, porque vai ser esmagado por uma onda que está surgindo no mundo inteiro, uma juventude que não aceita esse tipo de postura, Senador Eduardo Suplicy.

            Passo para a carta de Boaventura dos Santos, depois concedo, porque eu sei que V. Exª vai reforçar muito, com a sua participação, este meu pronunciamento.

Boaventura de Sousa Santos.

Esperei uma semana que o governo do meu País lhe pedisse formalmente desculpas pelo ato de pirataria aérea e de terrorismo de Estado que cometeu, juntamente com a Espanha, a França e a Itália, ao não autorizar a escala técnica do seu avião no regresso à Bolívia depois de uma reunião em Moscou, ofendendo a dignidade e a soberania do seu país e pondo em risco a sua própria vida [É uma carta dirigida ao Presidente Evo Morales]. Não esperava que o fizesse, pois conheço e sofro o colapso diário da legalidade nacional e internacional em curso no meu país e nos países vizinhos, a mediocridade moral e política das elites que nos governam, e o refúgio precário da dignidade e da esperança nas consciências, nas ruas e nas praças, depois de há muito terem sido expulsas das instituições. Não pediu desculpa. Peço eu, cidadão comum, envergonhado por pertencer a um país e a um continente que são capazes de cometer esta afronta e de o fazer de modo impune, já que nenhuma instância internacional se atreve a enfrentar os autores e os mandantes deste crime internacional.

O meu pedido de desculpas não tem qualquer valor diplomático, mas tem um valor talvez ainda superior, na medida em que, longe de ser um ato individual, é a expressão de um sentimento coletivo, muito mais vasto do que pode imaginar, por parte de cidadãos indignados que todos os dias juntam mais razões para não se sentirem representados pelos seus representantes. O crime cometido contra si foi mais uma dessas razões. Alegramo-nos com seu regresso em segurança a casa e vibramos com a calorosa acolhida que lhe deu o seu povo ao aterrar em El Alto. Creia, senhor Presidente, que, a muitos quilômetros de distância, muitos de nós estávamos lá, embebidos no ar mágico dos Andes.

O senhor Presidente sabe melhor do que qualquer de nós que se tratou de mais um ato de arrogância colonial no seguimento de uma longa e dolorosa história de opressão, violência e supremacia racial. Para a Europa, um Presidente índio é sempre mais índio do que Presidente e, por isso, é de esperar que transporte droga ou terroristas no seu avião presidencial. Uma suspeita de um branco contra um índio é mil vezes mais credível que a suspeita de um índio contra um branco. Lembra-se bem que os europeus, na pessoa do Papa Paulo III, só reconheceram que a gente do seu povo tinha alma humana em 1537, e conseguiram ser tão ignominiosos nos termos em que recusaram esse reconhecimento durante décadas como nos termos em que finalmente o aceitaram. Foram precisos 469 anos para que, na sua pessoa, fosse eleito presidente indígena num país de maioria indígena.

Mas sei que também está atento às diferenças nas continuidades. A humilhação de que foi vítima foi um ato de arrogância colonial ou de subserviência colonial?

Lembremo-nos de um outro incidente recente entre Governantes europeus e latino-americanos. Em 10 de novembro de 2007, durante a 17ª Cúpula Ibero-Americana, realizada no Chile, o Rei da Espanha, desagradado pelo que ouvia do Presidente Hugo Chávez, dirigiu-se, intempestivamente, e mandou-o calar. A frase “por que não te calas?” ficará na história das relações internacionais como símbolo cruelmente revelador das contas por saudar entre as potências ex-colonizadoras e suas colônias. De fato, não se imagina um chefe de estado europeu a dirigir-se, nesses termos, publicamente a um seu congênere europeu, quaisquer que fossem as razões.

O Sr. Presidente foi vítima de uma agressão ainda mais humilhante, mas não lhe escapará o fato de que, no seu caso, a Europa não agiu espontaneamente, o fez a mando dos Estados Unidos, e, ao fazê-lo, submeteu-se à ilegalidade internacional imposta pelo imperialismo norte-americano, tal como nos anos antes o fizera ao autorizar sobrevôo de Guantánamo, em clara violação ao direito internacional.

Sinais dos tempos, Sr. Presidente, a arrogância colonial europeia já não pode ser exercida sem subserviência colonial. Esse continente está a ficar demasiado pequeno para poder grande sem ser aos ombros de outrem. Nada disso absorve as elites europeias, apenas aprofunda a distância entre elas e tantos europeus como eu, que veem na Bolívia um país amigo e respeitam a dignidade do seu povo e a legitimidade de suas autoridades democráticas.

            Sr. Presidente, quero…

            O SR. PRESIDENTE (Eduardo Suplicy. Bloco/PT - SP) - Permita, Senador Lindbergh Farias…

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco/PT - RJ) - Claro.

            O SR. PRESIDENTE (Eduardo Suplicy. Bloco/PT - SP) - …aqui assinalar a presença no plenário do Senado, ali em pé, do lado direito, quase em frente a V. Exª diretamente, do mais jovem Vereador do Estado de São Paulo, João Matheus Bolito, Vereador da Câmara Municipal de Rincão, e que veio hoje visitar o Senado Federal, estudar meios de atender a interesses da população de Rincão, que tem 15 mil habitantes aproximadamente, próximo à região de Araraquara, e que está acompanhando o seu pronunciamento com muita atenção.

            Seja bem-vindo.

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco/PT - RJ) - Jovem Parlamentar. Estamos precisando disso no Brasil e no nosso PT, não é, Senador Eduardo Suplicy?

            Senador, passo agora -- falei que eram três cartas -- para a terceira carta, de Julian Assange.

Faz agora um ano que entrei nesta embaixada, buscando refúgio porque estava sendo perseguido. Resultado dessa decisão, tenho conseguido trabalhar em relativa segurança, protegido contra os agentes dos EUA que investigam uma acusação de espionagem. Mas hoje, está começando o suplício de Edward Snowden.

Dois perigosos processos foram postos em movimento na última década, com consequências fatais para a democracia. O sigilo dos governos expandiu-se numa escala aterrorizante. E, simultaneamente, a privacidade dos seres humanos foi erradicada, em segredo. Há poucas semanas, Edward Snowden revelou ao mundo a existência de um programa secreto -- que envolve o governo Obama, a comunidade de inteligência e gigantescas empresas que vendem serviços de internet -- para espionar todos, em todo o mundo. Resposta automática, como mecanismo de um relógio: Edward Snowden foi acusado de crime de espionagem pelo governo Obama.

O governo dos EUA espiona todos e cada um de nós… Mas é Edward Snowden quem é acusado de espionagem, porque nos alertou. Estamos chegando ao ponto em que a honra internacional por serviços prestados à humanidade não recai sobre quem tem um prêmio Nobel da Paz. Recai, isso sim, sobre quem seja acusado de espionagem pelo Departamento de Justiça dos EUA.

Edward Snowden é o oitavo vazador de informação secreta a ser acusado de espionagem no governo do presidente Obama. Na segunda-feira, o julgamento-show de Bradley Manning entrará na quarta semana. Depois de uma lista enorme de crimes e perversidades cometidas contra ele, o governo dos EUA tenta condená-lo por “ajudar o inimigo”.

A palavra “traidor” foi muito usada nos últimos dias.

(Soa a campainha.)

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco/PT - RJ) -

Mas quem é realmente o traidor, aqui? Quem prometeu “esperança” e “mudança” a uma geração, para imediatamente trair as próprias promessas, dando à população só miséria crescente e estagnação?

Quem jurou defender a Constituição dos EUA, para imediatamente se pôr a alimentar a besta-fera de uma lei secreta, que vai devorando viva a Constituição dos EUA, de dentro para fora?

Que fim levou a promessa de fazer o governo mais transparente da história, mas que não faz outra coisa que perseguir um vazador depois do outro, nessa sequência macabra, esmagando-os sob o peso de acusações de espionagem? Quem assumiu, com mão de ferro, no Executivo, os poderes de acusador, juiz e carrasco, tentando fazer-se de dono do planeta, sobre o qual vai impondo todos esses poderes ilegítimos? Quem se arroga o poder de espionar o Planeta inteiro -- cada um de nós -- e, quando é apanhado com as mãos sujas de sangue, explica que “teremos de escolher”? Quem é esse homem? Não pode haver dúvida alguma sobre quem declaramos “traidor”.

Edward Snowden está conosco. É um de nós. Bradley Manning é um de nós. São jovens interessados em tecnologia, inteligentes: são a própria geração que Barack Obama atraiçoou, traiu. São da geração que cresceu na Internet.

O governo dos EUA sempre carecerá de analistas de inteligência, de administradores de sistemas, e terá de buscá-los nessa geração e nas gerações posteriores. Um dia, essa geração comandará a Agência de Segurança Nacional, a CIA e o FBI. Não é fenômeno passageiro. É absolutamente inevitável. Ao tentar esmagar esses jovens vazadores, acusando-os de espionagem, o governo dos EUA ataca mortalmente uma geração inteira. E essa batalha, os EUA perderão.

Acusar, prender, matar, não é o modo certo de consertar coisa alguma. O único modo de consertar o que deva ser consertado é: mudem suas políticas! Parem de espionar o mundo. Ponham fim às leis secretas. Ponham fim à prisão por tempo indefinido, sem processo e sem acusação. Parem de matar gente. Parem de assassinar. Parem de invadir países e de mandar milhares de jovens norte-americanos para matar e serem mortos. Parem de ocupar terras de outros. Ponham fim às guerras clandestinas. Parem de destruir os jovens: Edward Snowden, Barrett Brown, Jeremy Hammond, Aaron Swartz, Jacob Appelbaum e Bradley Manning.

A acusação formalizada contra Edward Snowden visa a intimidar qualquer país que esteja pensando em ajudá-lo a defender seus direitos.

Todos temos de intensificar os esforços para encontrar país que dê asilo a Edward Snowden. Que país valoroso o defenderá, reconhecendo o inestimável serviço que prestou à humanidade? Diga ao seu governo, onde você estiver, que se apresente. Apresente-se você mesmo. Defenda Snowden.

            E eu quero ler só o último texto para passar a palavra a V. Exª, Senador Eduardo Suplicy. São dois cineastas, Michael Moore e Oliver Stone, que escreveram em conjunto, falando da prisão do Assange que, não sei se os senhores sabem, está hoje em Londres, na Embaixada do Equador.

            Os dois escrevem:

Passamos nossas carreiras de cineastas, sustentando que a mídia norte-americana é frequentemente incapaz de informar os cidadãos sobre as piores ações de nosso governo. Portanto, ficamos profundamente gratos pelas realizações do Wikileaks e aplaudimos a decisão do Equador de garantir asilo diplomático a seu fundador, Julian Assange, que agora vive na Embaixada Equatoriana, em Londres. O Equador agiu de acordo com o importante princípio dos direitos humanos internacionais e nada poderia demonstrar quão apropriada foi sua ação quanto à ameaça do governo britânico de violar um princípio sagrado das relações diplomáticas e invadir a Embaixada para prender Assange.

Desde sua fundação, o WikiLeaks revelou documentos como o assassinato colateral que mostra a matança, aparentemente indiscriminada, de civis de Bagdá por um helicóptero apache, dos Estados Unidos, além de detalhes minuciosos sobre a face verdadeira das guerras contra o Iraque e o Afeganistão; a conspiração entre os Estados Unidos e a Ditadura do Iêmen para esconder nossa responsabilidade sobre os bombardeios no país; a pressão do governo Obama para que outras nações não processem por torturas oficiais da era Bush e muito mais. Como era de prever, foi feroz a resposta daqueles que preferem que os norte-americanos não saibam dessas coisas. Líderes dos dois partidos chamaram Assange de terrorista tecnológico. Uma senadora democrata pela Califórnia, que lidera o comitê do Senado sobre inteligência, exigiu que ele fosse processado por lei de espionagem.

A maioria sabe que a Suécia não acusou formalmente Assange por nenhum crime. Ao invés disso, emitiu um mandado de prisão para interrogá-lo sobre as acusações de agressão sexual em 2010.

Todas essas acusações devem ser cuidadosamente investigadas antes que Assange vá para um país que o tire do alcance do sistema judiciário sueco. Mas são os governos britânico e sueco que atrapalham a investigação, não Assange.

Autoridades suecas sempre viajaram para outros países para fazer interrogatórios quando necessário, e o fundador do WikiLeaks deixou clara sua disposição de ser interrogado em Londres. Além disso, o governo equatoriano fez uma oferta direta à Suécia, permitindo que Assange seja interrogado dentro de sua embaixada em Londres. Estocolmo recusou as duas propostas.

Assange também se comprometeu a viajar para a Suécia imediatamente, caso o governo sueco garanta que não irá extraditá-lo para os Estados Unidos. Autoridades suecas não mostraram interesse em explorar essa proposta, e o ministro de Relações Exteriores declarou inequivocamente a um consultor jurídico de Assange e do WikiLeaks que a Suécia não vai oferecer essa garantia. O governo britânico também teria, de acordo com tratados internacionais, o direito de prevenir a reextradição de Assange da Suécia para os Estados Unidos, mas recusou-se igualmente a garantir que usaria esse poder. As tentativas do Equador para facilitar esse acordo entre os dois governos foram rejeitadas.

Em conjunto, as ações dos governos britânico e sueco sugerem que sua agenda real é levar Assange à Suécia. Por conta de tratados e outras considerações, ele provavelmente poderia ser mais facilmente extraditado de lá para os Estados Unidos. Assange tem todas as razões para temer esses desdobramentos. O Departamento de Justiça recentemente confirmou que continua a investigar o WikiLeaks, e os documentos do governo australiano de fevereiro passado recém-divulgados afirmam que “a investigação dos Estados Unidos sobre a possível conduta criminal de Assange está em curso há mais de um ano”. O próprio WikiLeaks publicou e-mails de uma corporação privada de inteligência segundo os quais um júri já ouviu uma acusação sigilosa contra Assange. E a história indica que a Suécia iria ceder a qualquer pressão dos Estados Unidos para entregar Assange.

Em 2001, o governo sueco entregou à CIA dois egípcios que pediam asilo. A agência norte-americana entregou-os ao regime de Mubarak, que os torturou.

Se Assange for extraditado para os Estados Unidos, as consequências repercutirão por anos, em todo o mundo. Assange não é cidadão estadunidense, e nenhuma de suas ações aconteceu em solo norte-americano. Se Washington puder processar um jornalista nessas circunstâncias, os governos da Rússia ou da China poderão, pela mesma lógica, exigir que repórteres estrangeiros em qualquer lugar do mundo sejam extraditados por violar suas leis. Criar esse precedente deveria preocupar profundamente a todos, admiradores do WikiLeaks ou não.

Conclamamos os povos britânico e sueco a exigir que seus governos respondam algumas questões básicas. Por que as autoridades suecas recusam-se a interrogar Assange em Londres? E por que nenhum dos dois governos pode prometer que Assange não será extraditado para os Estados Unidos? Os cidadãos britânicos e suecos têm uma rara oportunidade de tomar uma posição pela liberdade de expressão, em nome de todo o mundo.

            Senador Eduardo Suplicy, sei que V. Exª está presidindo, mas eu passo a palavra a V. Exª para um aparte.

            Eu queria, depois, falar sobre o projeto do Senador Rodrigo Rollemberg, dar continuidade falando sobre isso. Queria que ele fizesse um aparte sobre esse novo momento.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Quero cumprimentar o Senador Lindbergh Farias por trazer à tribuna do Senado e a todo o Brasil o conhecimento dessas quatro cartas. A primeira, de Edward Snowden, em que ele explica as circunstâncias que o levaram a divulgar informações que ele considerava extremamente importantes, porque significava violação de direitos constitucionais, inclusive nossos, brasileiros, que estavam sendo infringidos, assim como de cidadãos de todo o mundo. Eis por que ele, de fato, prestou um serviço à humanidade. E também as observações do sociólogo, cientista social Boaventura, que, de uma maneira tão clara, explicou as razões, em carta ao Presidente Evo Morales, de porque se sentiu mal com o governo de seu próprio país, Portugal, de não ter respeitado a possibilidade de Evo Morales fazer o pouso de seu avião presidencial quando vindo da Europa para a América Latina, para a Bolívia. Ele poderia perfeitamente passar em Portugal. E tudo isso em decorrência da possibilidade, que nem aconteceu, de Edward Snowden estar no avião que vinha de Moscou. Depois, a carta dos cineastas Oliver Stone e Michael Moore, de uma maneira tão incrível, além da carta de Julian Assange sobre Edward Snowden. E me veio aqui à mente, enquanto V. Exª colocava as considerações dos autores dessas quatro cartas, que nós teremos, na semana que vem, uma oportunidade realmente formidável para que duas autoridades de excepcional peso no mundo, ao se encontrarem, façam um apelo ao Presidente Barack Obama. Obviamente V. Exª já se dá conta de que estou pensando no encontro da Presidenta Dilma com o Papa Francisco, no Rio de Janeiro. Inclusive avalio que alguns Senadores estarão presentes no Rio de Janeiro para estimular que isso venha a acontecer, pois, dadas essas circunstâncias todas, quem sabe o Papa Francisco e a Presidenta Dilma Rousseff façam um apelo ao Presidente Barack Obama sobre a hipótese até de ser concedida anistia aos atos que, segundo as autoridades norte-americanas, teriam significado infringência da lei, por revelarem documentos que eram do seu conhecimento. Mas, na medida em que esses documentos, ou seja, o conteúdo, conforme está na carta de Edward Snowden, das comunicações, telefônicas, por e-mails, pela Internet entre cidadãos do mundo, e na medida em que isso estaria ferindo as constituições e legislações de cada um dos países onde estão esses cidadãos, na verdade, conforme V. Exª salientou, e os missivistas que leu, Edward Snowden prestou um serviço à humanidade, então, fica aqui a minha sugestão. Quem sabe, do encontro do Papa Francisco com a Presidenta Dilma Rousseff surja a possibilidade de um apelo muito forte na linha do que está aí sugerido, de compreensão para aquilo que foi a atitude, a iniciativa de Edward Snowden em prover a informação à humanidade de que as correspondências telefônicas e pela Internet entre cidadãos do mundo estavam sendo averiguadas, conhecidas, sem que essas pessoas disso estivessem sabendo. Meus cumprimentos a V. Exª

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco/PT - RJ) - Eu é que agradeço a V. Exª, que sempre defende todas as causas humanitárias, de liberdade dos povos em todo o mundo. V. Exª é um Senador que tem destacado a sua atuação por esta causa, Senador Eduardo Suplicy. Para mim, é uma honra tê-lo na Bancada do nosso Partido, estar aprendendo nesse diálogo, nessa construção dos nossos mandatos parlamentares aqui.

            E eu, só para entrar no projeto do Senador Rodrigo Rollemberg, que eu acho que é um marco aqui, mas antes eu queria dizer, Senador, que uma entrevista da Folha de segunda-feira é de um jovem de 25 anos que criou um movimento chamado Europa contra o Facebook.

            Ele é um estudante de Direito, em Viena, que evocou as leis europeias de proteção da privacidade para pedir cópia de todas as informações que a rede social guardava sobre ele. A resposta veio em um dossiê de 1222 páginas. Além do que ele compartilhava com os amigos, o site armazenava uma pilha de dados à sua revelia, como a lista de locais de onde acessou o site e os comentários que havia apagado.

            A experiência levou esses jovens a criar o grupo Europa contra o Facebook, que cobra respeito às regras de privacidade dos usuários. A entidade já obteve algumas vitórias, como obrigar o Facebook a desativar uma ferramenta que identificava automaticamente o rosto das pessoas em fotos de terceiros.

(Soa a campainha.)

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco/PT - RJ) - Olha que tipo! O rosto da pessoa em fotos de terceiros!

            Os alertas ganharam importância depois que o jornal britânico The Guardian acusou a rede social de repassar dados para o sistema de espionagem americano denunciado pelo Snowden. Eu só queria registrar um trecho em que ele fala disso:

Descobri que eles também armazenavam informações que já haviam sido deletadas ou que foram produzidas e arquivadas sem meu conhecimento. Essa é a questão mais controversa. O Facebook espiona usuários e não usuários da Rede e tem mais informações do que as pessoas publicam em seus perfis. Eles também recolhem dados sobre você a partir de seus amigos e conseguem descobrir coisas através de sistemas estatísticos que são usados em larga escala.

            Sr. Presidente, nós estamos aqui na discussão do marco civil da Internet, o Deputado Molon tem um texto praticamente pronto para ser votado na Câmara dos Deputados. Hoje, saiu uma matéria no Valor Econômico dizendo que o Brasil quer liderar uma discussão em todo o mundo sobre esse tema: garantia de liberdade de expressão, segurança, direito à privacidade nas telecomunicações, na Internet. De pouco vale termos só isso consagrado no nosso marco civil da Internet, é preciso uma discussão em todo o mundo. Acredito muito na força dessa nova juventude. Acho que este novo momento está se impondo ao mundo.

            Aqui no Congresso Nacional, puxando para o Projeto do Senador Rollemberg, na linha do meu discurso, acho que essas manifestações da juventude vieram para ficar. Acho que estamos vivendo um momento diferente, completamente novo, mas um momento de muito debate político na sociedade, nas ruas e nas redes sociais. As mobilizações foram chamadas pelas redes sociais. As pessoas estão acompanhando tudo, querem transparência, participação, controle social.

(Soa a campainha.)

            O SR. LINBDERGH FARIAS (Bloco/PT - RJ) - Acho que o Congresso Nacional deu um passo importante. Eu tive a honra de ter sido o relator de um Projeto apresentado pelo Senador Rodrigo Rollemberg, que diminuía o número de assinaturas necessárias, de 1% do eleitorado nacional para 0,5%, para projeto de lei de iniciativa popular e criava um instituto novo, que existe em várias Constituições estaduais, iniciativa do Senador Rodrigo Rollemberg, de criar projeto de lei de iniciativa popular para PEC. A minha contribuição foi ter colocado uma emenda permitindo que nós pudéssemos criar a cidadania digital, que pudesse haver a participação das pessoas nesse projeto de lei de iniciativa popular e nesse projeto de lei para PEC pela Internet.

(Soa a campainha.)

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco/PT - RJ) - Mostrei aqui, no debate com os Srs. Senadores, que nós temos instrumentos para garantir a segurança desse processo. Mostrei que o sistema antigo é que não tem segurança.

            Citei aqui, Senador, que o último projeto de lei de iniciativa popular apresentado a esta Casa chegou de forma ridícula ao Parlamento, em carrinhos de supermercado, volumes de assinatura, e o pior, as assinaturas não puderam ser conferidas. Não tinha como haver conferência e segurança. O projeto de lei de iniciativa popular da Ficha Limpa acabou sendo apresentado por um conjunto de Parlamentares.

            Temos condições, a partir desse projeto que vai agora para a Câmara dos Deputados (…)

            E está aqui o Senador Pedro Taques, que é autor de outro projeto, muitíssimo importante. O Senador Pedro Taques é autor de uma PEC que dá poder de urgência constitucional. Ou seja, o povo pode, a partir de assinaturas pela Internet, exigir deste Parlamento…

(Interrupção do som.)

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco/PT - RJ) - … que um determinado assunto venha a pressionar. Quem vai decidir é o Congresso Nacional, os Srs. Senadores e Deputados. Não estamos aqui atropelando a democracia representativa, pelo contrário, estamos favorecendo a democracia representativa. Agora, não dá para funcionar como há 50 anos, achar que se elege um Senador para oito anos e só depois de oito anos vota-se novamente no Senador, com uma prestação de contas completamente defasada. As pessoas querem participar do processo.

            Eu tenho um projeto de alteração, uma resolução do Senado, Senador Pedro Taques, Senador Rodrigo Rollemberg, que garante uma contribuição colaborativa das pessoas pela Internet. Houve um processo muito rico no País na discussão do marco civil da Internet. O Ministério da Justiça abriu uma consulta às pessoas. Houve um debate rico. O que a gente está propondo nesse projeto? Há uma tramitação de determinado projeto na Comissão de Assuntos Econômicos, por exemplo, da qual sou Presidente.

(Soa a campainha.)

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco/PT - RJ) - Há possibilidade de parar aquela tramitação, abrir uma consulta aos internautas, depois de 30 dias você fecha a consulta e o relator daquele projeto leva em conta a opinião dos Senadores, mas leva em conta, também, a opinião das pessoas que se manifestaram naquele processo de consulta colaborativa. Estamos trazendo esse instituto para dentro do projeto legislativo.

            Eu sei que muitas mudanças de uma vez podem assustar aqui. Alguns Senadores, Deputados podem dizer: “Puxa, estão passando por cima da nossa representação”. Não é nada disso. Estou convencido de que estamos fortalecendo a nossa democracia representativa ao nos abrir a esse novo momento, à contemporaneidade, a novas formas de comunicação.

            Encerro fazendo só uma provocação aos Senadores.

            O SR. PRESIDENTE (Eduardo Suplicy. Bloco/PT - SP) - Senador Lindbergh, vou pedir a V. Exª para mais do que encerrar vir aqui à Presidência.

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco/PT - RJ) - Farei isso agora, Senador Suplicy.

            Só fazer uma provocação. Vejo que aqui há muitos candidatos a governadores no Senado, vejo pelo menos dois, com certeza, candidatos a governo de Estado. Temos de criar uma situação nova. As pessoas querem participação. Temos de criar instrumentos de controle social, de mais transparência; temos de criar canais de democracia participativa e direta; formas de existência de consultas; utilização das redes sociais como forma de escutar a opinião das pessoas.

            No Rio de Janeiro tivemos um caso que para mim fala por si. Moradores da favela da Rocinha fizeram manifestação para dizer sabe o que, Senador Pedro Taques? Que não queriam um teleférico lá, que queriam saneamento. O distanciamento da vida real das pessoas não vai ser permitido por essa nova juventude, que está tomando as ruas, que está vivendo a política no seu dia a dia.

            Então, é algo extremamente novo, Senador Pedro Taques, mas os senhores que têm essa tarefa, nós que tentamos olhar o futuro da democracia no nosso País, temos de pensar isso também, nas prefeituras e nos governos dos Estados esse novo desafio.

            Com a palavra Senador Rodrigo Rollemberg e depois o Senador Pedro Taques.

            O SR. PRESIDENTE (Eduardo Suplicy. Bloco/PT - SP) - Você não quer -- estou com uma juíza me esperando desde às 18h30 no gabinete -- dialogar aqui da própria presidência?

            O SR. LINDBERGH FARIAS (Bloco/PT - RJ) - Estou encerrando, para escutar os dois, porque seria importante os dois falarem; vou substituir o Presidente Senador Eduardo Suplicy.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/07/2013 - Página 47389