Pronunciamento de Eduardo Suplicy em 12/07/2013
Discurso durante a 117ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Reflexão sobre recentes manifestações no Brasil e em outros países; e outros assuntos.
- Autor
- Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
- Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
MANIFESTAÇÃO COLETIVA.:
- Reflexão sobre recentes manifestações no Brasil e em outros países; e outros assuntos.
- Publicação
- Publicação no DSF de 13/07/2013 - Página 47124
- Assunto
- Outros > MANIFESTAÇÃO COLETIVA.
- Indexação
-
- ANALISE, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, PAIS, MUNDO, MOBILIZAÇÃO, SOCIEDADE CIVIL, UTILIZAÇÃO, COMPUTADOR, INTERNET.
- APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, AUTORIA, ORADOR, INSERÇÃO, ATA, VOTO DE PESAR, MORTE, METALURGICO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP).
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Paulo Paim, em primeiro lugar, quero aqui dizer que o Brasil nunca mais será o mesmo depois desse mês de junho, em que jovens, adultos, crianças tomaram as ruas do Brasil para expressar o seu descontentamento quanto à maneira como têm sido tratados pelos poderes institucionais. Não querem mais do que aquilo que lhes era devido, negado negligentemente por aqueles que têm ocupado o Poder Executivo, Legislativo e Judiciário, tudo tomando um grande tempo para decisões. Por isso os jovens foram às ruas e apressaram enormemente as decisões que têm que ser tomadas. E isso continua até hoje.
Ainda ontem, aconteceu um fato relevante. A sociedade organizada, através dos sindicatos, dos movimentos sociais, das organizações de trabalhadores rurais, os camponeses, saiu ontem às ruas com as mesmas reivindicações, muito próxima daquelas que, por exemplo, foram expressas pelo movimento passe livre.
Mais interessante é comparar essas manifestações que estão acontecendo no Brasil com as outras que estão acontecendo em outras partes do mundo. Por motivos diferenciados, as sociedades árabes procuram a sua independência política e econômica. Na Europa, os indignados têm rejeitado o que lhes tem sido imposto pelos donos do poder. E, nos Estados Unidos, nestes anos recentes, aconteceram também movimentos importantes, como a ocupação de Wall Street e outros. Em vários outros países, os povos continuam a expressar, com muita assertividade e firmeza, a sua opinião. No Brasil, o dia de ontem foi marcado pelas organizações sindicais, que expressaram o seu sentimento e assumiram bandeiras semelhantes às daqueles jovens.
Todos esses movimentos, cada um diferente do outro, têm um fundo comum: o uso da tecnologia à velocidade da luz para atuarem nos movimentos de mudança em tempo real, o que lhes aumenta muito o poder. No Brasil, as reivindicações têm assim se caracterizado. Mas, no Brasil, salvo alguns episódios menores, não ocorreram as cenas de violência que aconteceram em outros lugares do mundo ou, pelo menos, não com grande intensidade. Foram mais pacíficas, mais maduras do que as que observamos, por exemplo, no mundo árabe.
Ainda não acabamos de viver esta última revolução digital. A nossa está transformando a natureza do poder, justamente porque não é violenta. Isso pôde ainda ser objeto de reflexão, por ocasião da reunião requerida pelo Senador Paulo Paim, em que, ontem pela manhã, ouvimos os representantes dos diversos movimentos sociais, como o do Passe Livre e outros. Mas ainda não atinge toda a população.
O mundo está se transformando de uma maneira exponencial. O Brasil, no próximo ano, e o resto dos continentes não voltarão a ser o que eram. As massas finalmente tomaram consciência do seu poder: o poder das ruas, que é mais forte do que o poder das instituições. E temos certeza de que a população continuará nas ruas até conseguir tudo o que quer: acabar com a corrupção, melhorar a Justiça, melhorar a remuneração das pessoas. Além disso, o povo inteiro luta principalmente por serviços de atendimento à saúde, à educação, pontos nos quais estamos muito atrasados, por décadas.
Já estão claras as transformações que vão se dar no meio médico, no meio educacional, na abertura para a construção de moradias para os Municípios, como foi anunciada, em termos da sua liberação, pela Presidenta Dilma Rousseff, no encontro com os prefeitos nesta semana.
As populações continuam mais atentas do que nunca, as promessas agora são muito grandes. A Presidenta Dilma Rousseff tem condições excepcionais, por sua história, por seus compromissos, de colocar em prática o cumprimento dos anseios e sonhos de todos os brasileiros.
Gostaria aqui de dizer da importância do encontro que está se realizando hoje em Montevidéu, sob a gentileza do Presidente José Mujica, do Uruguai, que está recebendo os presidentes dos países que formam o Mercosul, mas há algo muito importante que vai acontecer diante do episódio decorrente das informações que foram prestadas ao mundo pelo Sr. Edward Snowden.
Quero aqui apoiar a postura da Presidente Dilma Rousseff que, juntamente com os demais presidentes dos países do Mercosul, salientarão a importância da concessão de asilo ao Sr. Edward Snowden em qualquer dos países do Mercosul, inclusive, se possível, em toda a América do Sul, possam os Estados Unidos, o Presidente Barack Obama compreender que o Sr. Edward Snowden resolveu prestar um serviço à humanidade, dando uma informação muito relevante.
E é importante transmitirmos ao Presidente Barack Obama que seria adequado que compreendesse o sentido de proteção aos direitos das pessoas em todo o mundo que estavam sendo violados. Esse fato levou o Sr. Edward Snowden a fazer a revelação, uma vez que ele tinha o conhecimento de que o seu país estava agindo dessa maneira para tomar ciência das comunicações por telefonemas, por e-mail, pela Internet, obviamente descumprindo, violando aquilo que, por exemplo, está tão bem expresso no art. 5º, inciso XII de nossa Constituição, que diz com clareza que as comunicações por telefone, pela Internet não podem ser objeto de conhecimento, a não ser por decisão judicial.
Então, que a Presidenta Dilma, a Presidenta Cristina Kirchner, o Presidente Maduro, o Presidente José Mujica, o Presidente do Paraguai e todos os do Mercosul venham a transmitir essa decisão importante para que possa o Sr. Edward Snowden ter o devido direito de asilo nos países do Mercosul.
Eu gostaria também, Presidente Paulo Paim, de requerer -- já entreguei à Mesa --, nos termos do art. 218 do Regimento Interno do Senado Federal, inserção em ata de voto de pesar pelo falecimento de Rubens Teodoro de Arruda, o Rubão, aos 75 anos, ocorrido no dia 9 de junho, de falência múltipla dos órgãos, bem como a apresentação de condolências à sua esposa, Maria Aparecida, e aos três filhos, Mônica, Magda e Rubens, e aos seus quatro netos.
Rubão nasceu em Araçatuba, interior de São Paulo, em 1938. Teve uma infância com muitas dificuldades e superações. Começou a trabalhar aos dez anos de idade como ajudante de encanador. Após a morte do pai, aos treze anos, assassinado quando tentava apartar uma briga de um charreteiro, ele assumiu a responsabilidade financeira da casa e ajudou a mãe a criar os quatro irmãos.
Em 1959, veio para São Paulo, onde tinha um irmão funileiro. Trabalhou como pedreiro até conseguir emprego na Mercedes Benz, em 1960, como aprendiz.
Chegou à diretoria do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema em 1967, no cargo de suplente, que ocupou até 1969. Depois ficou os três anos seguintes no Conselho Fiscal da entidade. Em 1972, foi eleito Vice-Presidente de Paulo Vidal.
Nos dois anos seguintes, de 1975 a 1981, justamente a época em que conheci o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o próprio Rubão, ele foi Vice-Presidente de Luiz Inácio da Silva, o Lula.
Foi um dos líderes metalúrgicos cassados em 1980 durante a greve de 41 dias feita pela categoria. Com ele foram presos o Lula e um total de 13 diretores, acusados de infringirem a Lei de Segurança Nacional.
Na época, eu era Deputado Estadual, Senador Paulo Paim, e, então, resolvi fazer uma entrevista com cada um daqueles 13 diretores dos sindicatos metalúrgicos. Fiz um pronunciamento na Assembleia Legislativa, que resultou em uma publicação sobre a vida daqueles 13 líderes sindicais, justamente em solidariedade a eles que estavam incursos na Lei de Segurança Nacional. Felizmente, depois foram todos anistiados.
Quero aqui até lembrar que, na oportunidade, o jurista Dalmo de Abreu Dallari se ofereceu para defender o direito de o Presidente Lula e o de os demais líderes sindicais expressarem o seu direito de greve, permitido pela Constituição brasileira.
E eis que, Presidente Paulo Paim, no mesmo momento em que o Presidente Lula, Djalma Bom, Devanir Ribeiro, Wagner Lino Alves, Rubão e outros foram detidos, foi também detido, nada mais, nada menos, aquele jurista, professor da Universidade de São Paulo de Direito Constitucional, que havia procurado defender os trabalhadores. E, quando Dalmo da Abreu Dallari chegou ao Dops, os sindicalistas pensaram: “Chegou o advogado.” Ele falou: “Não, eu também estou preso com vocês.”
Coincide, Sr. Presidente, que hoje aqui me honra com a sua presença Mônica Bohomoletz de Abreu Dallari, que está no plenário assistindo. Quero aqui lembrar-me desse episódio justamente porque Mônica está escrevendo um livro sobre a história de seu pai e veio a Brasília nesta semana para, junto ao Arquivo Nacional, encontrar todos os dados referentes à história de seu pai, inclusive nesses episódios.
Então, Rubão era um dos líderes sindicais que estava ali detido.
O forte de Rubão era atuar na retaguarda, mobilizando e articulando os grandes movimentos de luta da classe, apesar de algumas vezes ter que subir no palanque e falar com os grevistas.
Ficou na Mercedes como supervisor de produção até maio de 1980, quando seu salário era de Cr$ 42 mil. Dispensado da Mercedes após a greve, não conseguiu emprego. Abriu uma pequena mercearia em São Bernardo, onde trabalhou com a mulher e os três filhos.
Em abril de 2005, Rubão deu um depoimento publicado no site do sindicato, em que comentava sobre a diretoria de 1975 até 1980, e a parceria que teve com a esposa e, à época, com Lula, já Presidente da República, E Rubão disse -- abro aspas:
“Lula privilegiou a porta de fábrica. A diretoria de 1975 teve sua importância e mostra que o Lula não dirigiu sozinho o sindicato. Eu me sindicalizei em 1967 e durante 12 anos fui diretor. Nos dois mandatos de Lula fui vice-presidente. Acho a homenagem muito boa para que as pessoas não esqueçam essa parte da história. Fomos presos e muitos sindicalistas chegaram a sumir do país.
É bom reunir essa diretoria para mostrar que o pessoal está vivo e que a coisa não acabou. Lula colocou um administrador para tocar o sindicato e privilegiou o trabalho na porta da fábrica. Ele nem gostava de ficar segurando papéis. Ficava batendo o papel na mesa, impaciente.
Lula era uma pessoa inteligente, simpática e com pouco tempo de conversa convencia os trabalhadores. É difícil explicar esse carisma. Era um dos poucos que fazia as pessoas ficarem em silêncio quando falava.
Trabalhei como retificador na Mercedes, e a repressão era total. Se a gente conversava com um companheiro, o chefe reclamava que não havia produção, e se a gente fosse para outra seção, o chefe de lá dizia que a gente atrapalhava.
Nessa época, a gente já contava com carros com alto-falante para o trabalho na porta de fábrica. Éramos poucos para esse trabalho, apenas 24 diretores, mas mesmo assim o trabalho de conscientização evoluiu e, em 1978, a partir da greve na Scania, o estouro da boiada aconteceu” -- fecho aspas.
Após uma vida de lutas e de histórias, Rubão, já aposentado, dedicou seus úitimos anos à preservação da memória da luta dos trabalhadores.
Assina comigo o Senador Paulo Paim.
Portanto, quero transmitir a Maria Aparecida, a Mônica, a Magda e ao Rubens e a todos os companheiros do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC a minha solidariedade e o meu pesar pelo falecimento do companheiro Rubens Teodoro de Arruda, o Rubão.
Muito obrigado, Senador Paulo Paim.