Discurso durante a 119ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro de solicitação à CRE para que seja realizada audiência pública em memória dos dez anos de falecimento do Sr. Sérgio Vieira de Mello.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Registro de solicitação à CRE para que seja realizada audiência pública em memória dos dez anos de falecimento do Sr. Sérgio Vieira de Mello.
Publicação
Publicação no DSF de 17/07/2013 - Página 47739
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • REGISTRO, SOLICITAÇÃO, REALIZAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, HOMENAGEM POSTUMA, COMISSARIO, DIREITOS HUMANOS, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), ELOGIO, VIDA PUBLICA, DEFESA, DIREITOS E GARANTIAS INDIVIDUAIS, PROMOÇÃO, PAZ, AMBITO INTERNACIONAL.

            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Paulo Paim, hoje encaminhei à Comissão de Relações Exteriores, nos termos do Regimento Interno, art. 93 do Senado, que venhamos a realizar uma audiência pública em memória pelos 10 anos de falecimento do nosso querido Sérgio Vieira de Mello, no exercício do cargo de Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, ocorrido dia 19 de agosto de 2003, em Bagdá, no Iraque, com a presença das seguintes personalidades: os representantes do Ministério das Relações Exteriores do Brasil; da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República; das Organizações das Nações Unidas no Brasil; a Professora Carolina Larriera, que foi a sua companheira nos seus últimos anos de vida.

            E aqui gostaria de justificar que o dia 19 de agosto de 2003 foi uma triste data para o Brasil, para as Nações Unidas e para todos aqueles que acreditam que a paz e a segurança podem ser alcançadas por meio do diálogo e da cooperação internacional. Neste dia, Sérgio Vieira de Mello e 21 de seus colegas foram vítimas de um dos primeiros de uma longa série de atos violentos que caracterizaram a guerra no Iraque.

            Sérgio Vieira de Mello, Alto Comissário de Direitos Humanos da ONU, foi designado para desempenhar missão de representação da ONU no Iraque, com um claro objetivo: auxiliar na promoção da construção da paz daquele país.

            Foi um dos melhores representantes da ONU para a promoção de soluções multilaterais para as inúmeras crises mundiais. Tornou-se um exemplo para muitos. Como negociador da ONU atuou em alguns dos principais conflitos mundiais: em Bangladesh, Camboja, Líbano, Bósnia, Herzegovina, Kosovo, Ruanda e Timor Leste, entre 1999 e 2002, e por fim, no Iraque, onde foi morto durante o ataque suicida ao Hotel Canal, com a explosão provocada por um caminhão-bomba. O Hotel Canal era usado como sede da ONU em Bagdá há mais de uma década.

            Com o cruel desaparecimento de Sérgio Vieira de Mello, o mundo perdeu não só um ardoroso defensor da paz e dos direitos humanos, como também um líder humanitário incansável.

            Vieira de Mello obteve êxito e visibilidade no cenário internacional por sua atividade profissional. Até a sua trágica morte, esteve dedicado a apoiar a reconstrução de comunidades afetadas por guerras e violências extremas.

            A realização da Audiência Pública será uma homenagem a este ilustre brasileiro que dedicou sua vida à promoção da paz mundial por meios pacíficos, à busca da Justiça e que se tornou um exemplo para todos os cidadãos.

            Eu gostaria aqui de lembrar alguns episódios a vida de Sérgio Vieira de Mello. Ele foi filho dos brasileiros Gilda dos Santos e Arnaldo Vieira de Mello, diplomata brasileiro, posteriormente aposentado compulsoriamente pelo regime militar. Sérgio Vieira de Mello acompanhou o seu pai em várias missões pelo mundo. Depois de cursar o colegial no Colégio Franco-Brasileiro do Rio de Janeiro, estudou na Universidade de Paris, na Sorbonne, onde obteve a sua licenciatura e o mestrado para o ensino de Filosofia, em 1969 e 1970, respectivamente.

            Durante os quatro anos que se seguiram, Vieira de Mello prosseguiu seus estudos de Filosofia na Universidade de Paris, (Panthéon-Sorbonne), ao fim dos quais obteve um doutoramento do terceiro ciclo e, em 1985, o doutorado de estado em Letras e Ciências humanas, com a tese Civitas Maxima.

            Tornou-se funcionário da ONU, em 1969 -- mesmo ano em que seu pai, então embaixador, foi aposentado compulsoriamente dos quadros do Ministério das Relações Exteriores do Brasil. Passou a maior parte de sua vida trabalhando no Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, servindo em missões humanitárias e de manutenção da paz: em Bangladesh, durante sua independência, em 1971; no Sudão e em Chipre, após a invasão turca de 1974.

            Por três anos foi responsável pelas operações do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, em Moçambique, durante a guerra civil, que se seguiu à independência do país, em 1975, e depois, no Peru.

            Em 1981 foi nomeado conselheiro político sênior das forças da ONU no Líbano. Em 1982 decepcionou-se com os ataques sistemáticos do Hezbollah a partir do território libanês a Israel, o que acabou por iniciar a Guerra do Líbano, com Israel invadindo o território daquele país visando desarmar o grupo terrorista financiado pelo Irã e apoiado pela Síria. Depois disso, desempenhou diversas funções importantes, de 1983 a 1991. Foi Chefe do Departamento Regional para Ásia e Oceania e Diretor da Divisão de Relações Externas.

            Entre 1991 e 1996 foi enviado especial do Alto Comissário ao Camboja, como Diretor do Repatriamento da Autoridade da ONU de Transição no Camboja, tendo sido o primeiro e único representante da ONU a manter conversações com o Khmer Vermelho. Foi Diretor da United Nations Protection Force, a primeira força de paz na Croácia e na Bósnia e Herzegovina, durante as guerras da Iugoslávia. Foi também coordenador humanitário da ONU na região dos Grandes Lagos Africanos.

            Em 1996 foi nomeado Assistente do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, antes de ser enviado para Nova Iorque, em janeiro de 1998, como Secretário-Geral-Adjunto para Assuntos Humanitários das Nações Unidas.

            Para muitos, o brasileiro era a personificação do que a ONU poderia e deveria ser: com uma disposição fora do comum para ir ao campo de ação, corajoso, carismático, flexível, pragmático e muito eficiente na negociação com governos corruptos e ditadores sanguinários, em busca da paz.

            O Secretário-Geral da ONU, Kofi Annan, afirmava que Sérgio Vieira de Mello era "a pessoa certa para resolver qualquer problema".

            Foi o primeiro brasileiro a atingir o alto escalão da ONU. Como negociador da ONU atuou em alguns dos principais conflitos mundiais aqui já citados. E por fim, no Iraque, onde foi morto durante o ataque suicida ao Hotel Canal, com a explosão provocada por um caminhão-bomba.

            Além dos 22 mortos, cerca de 150 pessoas ficaram feridas no ataque -- o mais violento realizado contra uma missão civil da ONU até então. Atribuído pelos Estados Unidos à rede Al-Qaeda, o ataque provocou a retirada dos funcionários estrangeiros da Organização do território iraquiano.

            Segundo o Ministro de Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, à época, momentos depois da explosão, Vieira de Mello telefonou para a ONU de seu celular, falando sobre a situação. Ele permaneceu preso sob os escombros durante mais de três horas. Entretanto, segundo Samantha Power, que entrevistou mais de 400 pessoas (diversas das quais presentes no local da explosão) para escrever o livro O Homem que Queria Salvar o Mundo, Vieira de Mello comunicou-se apenas com a equipe de resgate através de um buraco nos escombros. Ainda segundo Samantha Power, os contatos telefônicos com a sede da ONU em Nova Iorque partiram de Ramiro Lopes da Silva, vice de Vieira de Mello e funcionário responsável pela segurança. O chefe da administração civil dos EUA no Iraque, Paul Bremer, disse que possivelmente Vieira de Mello teria sido o alvo do atentado. "Tudo aconteceu debaixo da janela de Sérgio Vieira de Mello. Eu acho que ele era o alvo", disse à rede BBC.

            Ele era considerado por muitos o virtual sucessor de Kofi Annan na Secretaria Geral da ONU. Apesar de frequentemente confrontar-se com a impotência da ONU diante de tragédias humanas, sua biografia prova que ainda existe algo a ser defendido na organização.

            Desempenhou temporariamente as funções de representante especial do Secretário-Geral Kofi Annan no Kosovo, quando foi substituído por Bernard Kouchner. De novembro de 1999 a maio de 2002, exerceu o cargo de administrador de transição da ONU em Timor Leste. Em 12 de setembro de 2002, foi nomeado Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos.

            E justamente em maio de 2003 fora indicado pelo Secretário Kofi Annan como seu representante especial durante quatro meses no Iraque.

            Foi nessa época em que eu dialoguei com Sérgio Vieira de Mello, mandei e-mail -- conversamos por telefone, ele, em Bagdá, eu, em São Paulo --, sugerindo que, como o Iraque tinha tamanha reserva petrolífera, pudesse seguir o exemplo do Alaska para prover os seus trinta milhões de habitantes, uma maneira de todos participarem da riqueza da nação, uma forma de democratizar e pacificar o Iraque. E ele avaliou como muito adequada a sugestão e disse que iria transmiti-la às autoridades administrativas do Iraque.

            Paul Bremer, em julho de 2003, na conferência de cúpula realizada em Omã, sugeriu que pudessem os iraquianos seguir o exemplo do Alasca para que todos pudessem sentir uma participação na riqueza do país. E ao relatar isso ao ex- Primeiro-Ministro do Iraque al-Jaafari, em 2007, quando esteve no Brasil, fez questão de que eu pudesse ir ao Iraque para levar essa proposição, o que pude fazer em companhia do nosso Embaixador Bernardo, que estava no Iraque, em janeiro de 2008. E ali estivemos por dois dias transmitindo às autoridades do Iraque aquela proposta. Na oportunidade, também pude fazer uma homenagem a Sérgio Vieira de Mello ao visitar de Mistura, que era o então sucessor de Sérgio Vieira de Mello em Bagdá.

            Acredito que possamos fazer essa homenagem, quem sabe no próprio dia 19 de agosto próximo, que será uma segunda-feira.

            Proponho, portanto, ao Presidente da CRE, Ricardo Ferraço, que possa efetivamente organizar esta homenagem em memória de Sérgio Vieira de Mello, que tão bem honrou o Brasil em sua busca de justiça e de paz para todos os povos no Planeta Terra.

            Muito obrigado, Presidente Paulo Paim.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/07/2013 - Página 47739