Pela Liderança durante a 120ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro de artigo escrito pelo Sr. Fernando Flexa Ribeiro Filho que critica o programa do Governo Federal “Mais Médicos, Mais Saúde”.

Autor
Flexa Ribeiro (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PA)
Nome completo: Fernando de Souza Flexa Ribeiro
Casa
Senado Federal
Tipo
Pela Liderança
Resumo por assunto
PROGRAMA DE GOVERNO, SAUDE.:
  • Registro de artigo escrito pelo Sr. Fernando Flexa Ribeiro Filho que critica o programa do Governo Federal “Mais Médicos, Mais Saúde”.
Publicação
Publicação no DSF de 18/07/2013 - Página 48604
Assunto
Outros > PROGRAMA DE GOVERNO, SAUDE.
Indexação
  • LEITURA, TEXTO, AUTORIA, PROFESSOR ADJUNTO, MEDICINA, UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARA (UFPA), RESPOSTA, PROPOSTA, GOVERNO FEDERAL, CONTRATAÇÃO, MEDICO, ESTRANGEIRO.

            O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco/PSDB - PA. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) - Senadora Ana Amélia, que preside a sessão do Senado, Srªs e Srs. Senadores, assomo à tribuna hoje, Senadora Ana Amélia, para fazer a leitura de um artigo a respeito do programa "Mais Médicos, Mais Saúde". O artigo cuja leitura farei é do meu filho, Fernando Flexa Ribeiro Filho, que é médico, com quase 20 anos de formado, pós-doutorado pela Universidade Federal de São Paulo, Professor-Adjunto da Universidade Federal do Pará e da Universidade Estadual do Pará. O artigo tem como título "Mais respeito, mais verdade: uma análise, baseada em evidências, sobre o programa ‘Mais Médicos, Mais Saúde’". Eu farei a leitura de alguns trechos e pedirei a V. Exª a inserção, na íntegra, do artigo.

            A SRª PRESIDENTE (Ana Amélia. Bloco/PP - RS) - A solicitação de V. Exª será atendida regimentalmente, Senador Flexa Ribeiro.

            O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco/PSDB - PA) - Agradeço a V. Exª.

Ao ouvir a proposta do [aspas] "Pacto pela Saúde" fui procurar o significado das palavras para tentar entender se a abrangência que as palavras despertam eram apenas devaneios de uma mente sonhadora ou se, de fato, o conceito havia sido distorcido; desta forma, pacto, como substantivo, segundo o dicionário Michaelis, significa [aspas] "ajuste, contrato, convenção entre duas ou mais partes" [fecho aspas] e saúde, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), [aspas] "um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afecções e enfermidades" [fecho aspas]. Infelizmente, não se trata de um pacto, visto que é uma proposta unilateral, tampouco pela saúde, já que tem como ponto único, o aumento do número de médicos; esta é a maior e mais grave distorção de todo o processo, com vieses políticos, ideológicos e eleitoreiros, uma manobra com o objetivo de transferir aos médicos toda a responsabilidade da saúde caótica deste país.

(...) Em suma, o programa, já que não preenche requisitos básicos para ser considerado um pacto, propõe 3 medidas para resolver todos os problemas da saúde pública brasileira, todas com o único propósito, quase uma obsessão, de aumentar o número de médicos no país: 1) criação de mais de 11.000 novas vagas em cursos de medicina e em residências médicas pelo país até 2017, 2) aumento da duração do curso de medicina de 6 para 8 anos, com o bônus de estágio obrigatório no SUS nos 2 últimos anos e, 3) contratação imediata de médicos estrangeiros, dispensados da revalidação do diploma, para trabalhar nas áreas mais carentes do SUS.

A criação de 11.447 novas vagas em cursos de medicina até 2017, ou seja, em 5 anos o número de vagas de medicina aumentará em mais de 60%, por si, já representa um absurdo; entretanto, para dar requintes de crueldade, mais da metade nos anos de 2013 e 2014, ou seja, em apenas 18 meses. Em qualquer país com responsabilidade a proposta de ampliação de vagas nesta proporção implica a existência de um projeto pedagógico adequado e a formação de profissionais qualificados, certo? A formação médica no Brasil é precária, dos 141 cursos de medicina avaliados através do Conceito Preliminar de Cursos (CPC), do próprio Ministério da Educação (MEC), 107, ou seja 76%, obtiveram nota menor que 3, considerada o mínimo satisfatório, sendo que destas 22 são federais. (...)

O mais grave é que 10% das novas vagas serão criadas nas universidades federais já existentes. Sou professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), do curso de medicina, com pós-doutorado, com salário bruto de R$5.455,34 (líquido de R$4.105,00) e atividades na graduação com alunos dos 4o e 5o anos de medicina, na residência médica, em projetos de extensão e na assistência a pacientes, e convido representantes do MEC e do ministério da saúde para conhecer a estrutura física, logística e de recursos humanos disponíveis não apenas para o ensino, como para o atendimento aos pacientes. Apenas a título de comparação das discrepâncias existentes em nosso país, uma ex-aluna recém formada, que, infelizmente, não foi aprovada na residência médica, recebe, atuando no Programa de Valorização do Profissional da Atenção Básica (PROVAB), recebe do mesmo governo federal um salário de R$ 8 mil que passará para R$ 10 mil, isto é, um reajuste de 25% em menos de 1 ano, enquanto os professores das universidades federais, após extensa greve no ano de 2012, terão reajuste de 15% até 2015, pois segundo o ministério, o governo não tem recursos para ir além desta proposta; que fique bem claro que o absurdo não é o salário do médico, mas o professor universitário receber metade do recém formado. São nestas universidades que por magia, ou melhor por decreto, surgirão mais de 1.800 vagas nos próximos anos? (...)

Fica nítido o interesse exclusivamente em quantidade, já que a qualidade, já sofrível, ficará cada vez mais sucateada. O fundamento do discurso do governo para subsidiar as propostas é que existe um grande déficit de médicos no país, entretanto relatório da OMS coloca o Brasil entre os países com número adequado de médicos/habitantes até 2015, sendo a taxa de 1,9 médicos/1.000 habitantes superior à média mundial de 1,4 e, nos últimos 10 anos, esta relação aumentou 30%, sendo que em 2020, antes que a primeira turma do novo projeto sequer conclua a graduação, apenas com as vagas já existentes, (...) a relação será de 2,2 médicos/1.000 habitantes (...); apenas para comparação, a razão médicos/1.000 habitantes é de 2,1 no Canadá [Senador Mozarildo] e 2,4 nos Estados Unidos. (...)

Uma simples análise do financiamento da saúde pública no Brasil deixa claro que a comparação de números apresentada pelos ministros é inconsistente, ao comparar o número de médicos no Brasil com outros países e esconder o financiamento público da saúde nos mesmos países.

            Apenas para citar alguns poucos dados, enquanto o Brasil gastou US$721 per capita em saúde; o Canadá gastou US$4.400; os Estados Unidos, US7.100; e a Austrália, US$3.300. Em percentual de PIB, o Brasil teve índice de 8,4%, bem abaixo dos 15% dos Estados Unidos, dos 9,85% do Canadá ou do 11,6% da França.

Apesar do número de médicos ser maior que a média mundial, o gasto total e, especialmente, público com saúde é inferior à média mundial; logo, segundo a OMS, comparando o Brasil com a média mundial o principal problema da saúde pública não é a falta de médicos, mas o subfinanciamento público da saúde. [Esse é o grande problema]. (...) Além de gastar pouco, o viés político ainda faz com que o gasto seja equivocado, concentrado em investimentos, enquanto o custeio fica cada vez mais comprometido e, qualquer pessoa que conheça um mínimo de saúde pública sabe que o custeio é o maior entrave para operacionalização do SUS.

Finalmente, chegando à controversa questão de importação de médicos estrangeiros, todas as entidades médicas são favoráveis, desde que estes médicos se submetam à revalidação do diploma, coordenada pelo MEC em parceria com os ministérios da Saúde e de Relações Exteriores, além da Associação Nacional de Dirigentes de Instituições Federais de Ensino (Andifes), como acontece em qualquer país que preze pela saúde de sua população. (...) Quanto ao tema da remuneração, segundo seus critérios, o médico "importado", sem diploma validado, vale mais que o professor universitário federal com doutorado ou o médico residente, seguindo a lógica de quanto menor a qualificação, melhor a remuneração aplicada atualmente; sem considerar que a partir de 2015, segundo a proposta, será bem mais fácil, rápido e economicamente viável estudar medicina, por exemplo, na Bolívia e vir trabalhar no Brasil que se graduar no país.

(...)

Abaixo, uma humilde contribuição deste cidadão brasileiro sobre as questões abordadas no Pacto pela Saúde (...):

1. Reforma do currículo do curso de medicina, assim como de todos os outros cursos da área da saúde, valorizando a formação nas 5 áreas básicas e a efetiva participação no SUS, com supervisão profissional adequada e em locais com infraestrutura para o aprendizado, com ampla discussão com as entidades envolvidas e não apenas técnicos de gabinete, distanciados das mazelas do mundo real;

2. Revisão do modelo atual de revalidação do diploma médico obtido no exterior, incluindo não apenas prova teórica, mas obrigatoriedade de estágio, não inferior a 12 meses, supervisionado por universidades federais;

            (Soa a campainha.)

            O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco/PSDB - PA) -

3. Criação do Plano de Carreira para todos os profissionais da área de saúde nos moldes dos planos já existentes no judiciário;

4. Aumento do gasto público, especialmente relacionado ao custeio, através do reajuste da tabela do SUS e correção anual conforme índices estabelecidos, tais como a variação do PIB e índices de inflação, permitindo um atendimento digno, sem a necessidade de estados, municípios e entidades filantrópicas ficarem reféns, de pires nas mãos;

5. Valorização da carreira docente em todos os cursos da área de saúde, não apenas com remuneração compatível com a responsabilidade, mas principalmente, com condições de trabalho adequadas;

6. Ampliação e universalização dos medicamentos distribuídos através do programa Farmácia Popular, atuaíizado para as novas diretrizes baseadas em evidências das sociedades de especialidades;

7. Investimentos primordiais na atenção primária e na média complexidade que se bem estruturadas e funcionantes...

(Interrupção do som.)

            O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco/PSDB - PA) - Já concluo.

...são capazes de atender mais de 90% da demanda da população a um custo bem inferior às estruturas hospitalares;

8. Parcerias com entidades privadas de reconhecida competência, para capacitação e administração de serviços de saúde públicos através de Organizações Sociais, por exemplo, cabendo ao governo fiscalizar e cobrar as metas quantitativas e qualitativas acordadas, permitindo que os serviços tenham mais agilidade no atendimento das demandas da população;

9. Fiscalização e cobrança dos cursos da área de saúde, públicos e privados, em relação à qualidade da formação dos alunos egressos, ao invés de preconizar exclusivamente quantidade;

10. Revisão do conceito de saúde do governo e estímulo ao trabalho multidisciplinar e não apenas de uma categoria.

            Concluindo, Srª Presidente, o artigo termina dizendo:

Sou um médico que atendo gente todos os dias, gente que não tem dinheiro para comer,...

(Soa a campainha.)

            O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco/PSDB - PA) -

...para pegar um ônibus e, por isso, muitas vezes não consegue comprar o remédio indicado; gente que os técnicos de gabinete que elaboram planos fantasioss não conhecem. Assim convido seus ministros para virem assistir uma aula e participar de um ambulatório, com alunos, residentes e muita gente doente, não no interior, mas em um dos hospitais universitários federais, e, se, ao final, avaliarem que as condições são ideais, serei o primeiro a aderir integralmente ao plano apresentado. Queria, ainda, sua colaboração para lançar, com a mesma velocidade, os demais pactos pela saúde que sugiro o nome de [aspas] "Mais Tudo para Mais Saúde" [fecho aspas] ou "Mais Enfermeiros, Nutricionistas, Psicólogos, Odontólogos, Farmacêuticos, Assistentes Sociais, Biomédicos, Biólogos, (...) mais leitos, remédios, exames diagnósticos e salários" [fecho aspas].

Desculpe finalizar aqui, mas com minha indignação já perdi muitas horas de trabalho...

(Interrupção do som.)

(Soa a campainha.)

O SR. FLEXA RIBEIRO (Bloco/PSDB - PA) -

...nestes últimos dias e, tenho de preparar aulas, atender pacientes, escrever capítulos de livros, elaborar projetos de pesquisa, enfim, trabalhar no mundo real.

            Srª Presidente, Senadora Ana Amélia, esse é o artigo de um médico indignado com o programa que vai ser discutido na Medida Provisória nº 621, que deveria ser instalada hoje, mas me parece que não o será - só no dia 07. E lá nós iremos debater, como disse o Senador Figueiró, ao relatar aqui o artigo de outro médico.

            O que estamos vendo pelo Brasil afora são todos os médicos se colocando contrários não ao atendimento qualificado da saúde para os brasileiros, mas à forma midiática de resolver a questão da saúde, que é crônica no nosso Brasil, através de uma pura medida provisória.

            Nós não concordamos com essa forma. Vamos debater profundamente com os artigos que aqui foram lidos e outros que estão sendo escritos nos jornais de circulação pelo Brasil todo e fazer audiências públicas com todas as entidades para que possamos, então, esclarecer. Tenho certeza absoluta de que V. Exª, ligada às questões sociais, irá compartilhar a discussão dessa medida provisória para aperfeiçoá-la, porque todos nós, Parlamentares, queremos uma saúde melhor para todos os brasileiros.

            Muito obrigado.

 

DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR FLEXA RIBEIRO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Incluído nos termos do art. 210, inciso I, §2º, do Regimento Interno.)

Matéria referida:

- Mais Respeito, Mais Verdade: uma análise, baseada em evidências, sobre o programa “Mais Médicos, Mais saúde”


Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/07/2013 - Página 48604