Discurso durante a 123ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Leitura e comentários sobre artigo do filósofo Leonardo Boff.

Autor
Ricardo Ferraço (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Ricardo de Rezende Ferraço
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO.:
  • Leitura e comentários sobre artigo do filósofo Leonardo Boff.
Publicação
Publicação no DSF de 06/08/2013 - Página 51178
Assunto
Outros > SENADO.
Indexação
  • LEITURA, TEXTO, AUTORIA, PROFESSOR, FILOSOFIA, ASSUNTO, ATUAÇÃO, PESSOA FISICA, RELAÇÃO, CRISE, REGISTRO, EXPECTATIVA, ORADOR, REFERENCIA, TRABALHO, SENADO.

            O SR. RICARDO FERRAÇO (Ricardo Ferraço. Bloco/PMDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, trago à reflexão, nesta tarde, artigo publicado pelo teólogo, pelo filósofo Leonardo Boff, pela profundidade, pela capacidade analítica que o professor, que o teólogo, que o filósofo Leonardo Boff traz à população brasileira. Julguei da maior importância que nós refletíssemos e que fizéssemos ecoar, no Plenário do Senado, estas reflexões relacionadas como Cinco atitudes face à crise atual do mundo:

Ninguém, face à crise, pode ficar indiferente. Urge uma decisão e encontrar uma saída libertadora. É aqui que se encontram várias atitudes para ver qual delas é a mais adequada, a fim de evitarmos enganos. A primeira é a dos catastrofistas, a fuga para o fundo. Estes enfatizam o lado de caos que toda crise encerra. Veem a crise como catástrofe, decomposição e fim da ordem vigente. Para eles, a crise é algo anormal que devemos evitar a todo [e qualquer] custo. Só aceitam certos ajustes e mudanças dentro da mesma estrutura, mas o fazem com tantos senões, que desfibram qualquer irrupção inovadora.

Contra estes catastrofistas, já dizia o bom Papa João XXII,I referindo-se à Igreja, mas valendo para qualquer campo: “A vida concreta não é uma coleção de antiguidades. Não se trata de visitar um museu ou uma academia do passado. Vive-se para progredir, embora tirando proveito das experiências do passado, mas para ir sempre mais longe".

A crise generalizada não precisa ser uma queda para o abismo. Vale o que escreveu um suíço que muito ama o Brasil, o filósofo e pedagogo Pierre Furter: "Caracterizar a crise como sinal de um colapso universal é uma maneira sutil e pérfida dos poderosos e dos privilegiados de impedirem, a priori, as mudanças, desvalorizando-as de antemão".

A segunda atitude é a dos conservadores: a fuga para trás. Estes se orientam pelo passado, olhando pelo retrovisor. Ao invés de explorar as forças positivas contidas na crise atual, fogem para o passado e buscam nas velhas fórmulas soluções para os problemas novos. Por isso são arcaizantes e ineficazes.

Grande parte das instituições políticas e dos organismos econômicos mundiais, como o FMI, o Banco Mundial, a OMC, os G-20, e também a maioria das igrejas e das religiões, procuram dar solução para os graves problemas mundiais com as mesmas concepções. Favorecem a inércia e freiam soluções inovadoras. Deixar as coisas como estão fatalmente nos levará ao fracasso, se não a uma crise ecológica e humanitária inimaginável. Como as fórmulas passadas esgotaram sua força de convencimento e de inovação, acabam transformando a crise numa tragédia.

A terceira atitude é a dos utopistas: fuga para frente. Estes pensam resolver a situação de crise fugindo para o futuro. Eles se situam dentro do mesmo horizonte que os conservadores, apenas numa direção contrária. Por isso, podem facilmente fazer acordos entre si.

Geralmente, são voluntaristas e se esquecem de que na história só se fazem as revoluções que se fazem.

            O último slogan não é um pensamento novo. Os críticos mais audazes podem ser também os mais estéreis. Não raro, a audácia contestatória não passa de evasão do confronto duro com a realidade.

            Circulam atualmente utopias futuristas de todo tipo, muitas de caráter esotérico, como as quais falam de alinhamento de energias cósmicas que estão afetando nossas mentes. Outros projetam utopias fundadas no sonho de que a biotecnologia e a nanotecnologia poderão resolver todos os problemas e tornar imortal a vida humana.

            Uma quarta atitude é a dos escapistas: aqueles que fogem para dentro. Estes se dão conta do obscurecimento do horizonte e do conjunto das convicções fundamentais. Mas fazem ouvidos moucos ao alarme ecológico e aos gritos dos oprimidos. Evitam o confronto, preferem não saber, não ouvir, não ler e não se questionar. As pessoas já não querem conviver. Preferem a solidão do indivíduo, mas geralmente plugados na internet e nas redes sociais.

            Por fim, há uma quinta atitude, a dos responsáveis: enfrentam o aqui e agora. São aqueles que elaboram uma resposta; por isso os chamo de responsáveis. Não temem, nem fogem, nem se omitem, mas assumem o risco de abrir caminhos. Buscam fortalecer as forças positivas contidas na crise e formulam respostas para os problemas. Não rejeitam o passado por ser passado. Aprendem dele como de um repositório das grandes experiências que não devem ser desperdiçadas, sem porém se eximir de fazer as suas próprias experiências.

            Os responsáveis se definem por um a favor e não simplesmente por um contra. Também não se perdem em polêmicas estéreis. Mas trabalham e se engajam profundamente na realização de um modelo que corresponda às necessidades do tempo, aberto à crítica à autocrítica, dispostos sempre a aprender. O que mais se exige hoje são políticos, líderes, grupos, pessoas que se sintam responsáveis e forcem a passagem do velho ao novo tempo.

            São reflexões que me parecem absolutamente oportunas, tempestivas, neste momento em que nós estamos, por assim dizer, iniciando o segundo tempo, a segunda jornada do ano legislativo, diante de um conjunto de desafios, um conjunto de incertezas que se apresentam ao mundo, mas se apresentam ao nosso País e se apresentam ao Congresso brasileiro, por que não dizer ao Senado da República, aos nossos partidos, aos nossos mandatos e à representação política democrática, ou à democracia representativa brasileira, diante desta quadra de tantos e importantes desafios que nós teremos pela frente ao longo do semestre.

            É hora de concitarmos o Senado da República a cumprir com suas responsabilidades. É hora de nós convocarmos o Senado para que ele possa responder positivamente ao enfrentamento de tantas importantes e inadiáveis questões que serão debatidas nas próximas semanas e nos próximos meses.

            É seguramente este o papel do Senado, para que nós possamos fazer aquilo que disse, recentemente, nessa extraordinária passagem que teve pelo País o Papa Francisco I, entre tantas, entre tantas falas maravilhosas, extraordinárias que inundaram o coração dos brasileiros, não apenas dos brasileiros católicos como eu, mas dos brasileiros cristãos, para a necessidade, entre tantas coisas, de resgatarmos a política, a política com P maiúsculo, a política como ferramenta de mudança e transformação, a política como mecanismo de encaminhamento das grandes questões coletivas da sociedade. Mas esta é a política, enfim, com P maiúsculo. É aquela política que produz como objeto o fazer o bem sem dizer a quem. A política que prioriza o debate e o enfrentamento das questões essenciais e que não dá valor às questões assessórias.

            Essa é a minha expectativa como Senador da República, como representante do Espírito Santo, neste segundo semestre no Senado Federal, em que temas da maior relevância, da maior importância terão que ser enfrentados por todos nós brasileiros que representam aqui os seus Estados. A nossa responsabilidade de dar o nosso esforço e a nossa contribuição para a recuperação da política.

            Façamos o nosso trabalho. Estejamos aqui dispostos e atuantes para que o Senado da República possa trabalhar nessa direção.

            É essa a minha expectativa, é essa a minha confiança, e, mais do que isso, é essa a minha esperança.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/08/2013 - Página 51178