Discurso durante a 126ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas à possibilidade de negociação entre Brasil e Estados Unidos para a utilização do Centro de Lançamento de Alcântara, no Maranhão.

Autor
Rodrigo Rollemberg (PSB - Partido Socialista Brasileiro/DF)
Nome completo: Rodrigo Sobral Rollemberg
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA NACIONAL.:
  • Críticas à possibilidade de negociação entre Brasil e Estados Unidos para a utilização do Centro de Lançamento de Alcântara, no Maranhão.
Publicação
Publicação no DSF de 09/08/2013 - Página 52357
Assunto
Outros > SEGURANÇA NACIONAL.
Indexação
  • CRITICA, POSSIBILIDADE, NEGOCIAÇÃO, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), RELAÇÃO, UTILIZAÇÃO, CENTRO DE LANÇAMENTO DE ALCANTARA (CLA), ESTADO DO MARANHÃO (MA), REGISTRO, ANUNCIO, ORADOR, APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO DE INFORMAÇÕES, ITAMARATI (MRE), MINISTERIO DA CIENCIA E TECNOLOGIA (MCT), REFERENCIA, ACORDO INTERNACIONAL.

            O SR. RODRIGO ROLLEMBERG (Bloco Governo/PSB - DF. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, Senadora Ana Amélia, Senador Wellington Dias, prezadas Senadoras, prezados Senadores, eu quero iniciar o meu pronunciamento elogiando a decisão da Presidenta da República de ouvir os líderes partidários, construir um ambiente de diálogo sobre temas de interesse nacional que tramitam nas duas Casas: na Câmara dos Deputados e no Senado Federal.

            Eu tenho dito há muito tempo que a política exige um ambiente permanente de diálogo, e esse diálogo, sempre em defesa dos interesses do País, acaba reduzindo as tensões e os problemas para a Presidenta. Se construíssemos um ambiente de entendimento na apreciação de matérias, isso evitaria vários vetos e, ao mesmo tempo, evitaria o constrangimentos de Parlamentares, que muitas vezes aprovam matérias aqui de seu interesse e outras vezes ficam contrariados com alguns vetos apostos pela Presidenta. Se houver um ambiente de diálogo permanente, todas essas questões acabam sendo reduzidas. As reuniões ocorridas nesta semana, com os Líderes, na Câmara e na base no Senado, contribuíram para isso, para construir, pelo menos neste momento, um ambiente de entendimento acerca de temas relevantes para o País.

            Nesse sentido, eu quero trazer um tema que me preocupa pessoalmente, preocupa o PSB, a Liderança do PSB, a fim de que, em função das questões que vou colocar aqui, o Governo possa efetivamente reavaliar a sua posição, se efetivamente as questões que colocarei aqui estiverem sendo articuladas no âmbito do Governo Federal.

            Eu quero dizer que, localizado no Estado do Maranhão, nos limites de um admirável centro histórico, o Centro de Lançamento de Alcântara traduziu, num passado recente, o empenho brasileiro na esfera aeroespacial. Idealizado durante o período da ditadura militar, 1964/1985, o Centro de Lançamento vale-se da proximidade com a linha do Equador, que confere alta economicidade às ações que desenvolve. Teve seu primeiro núcleo ativado em março de 1983, já nos estertores do antigo regime.

            Há vários anos, desde a época em que representava o Distrito Federal na Câmara dos Deputados, venho acompanhando os trabalhos e as iniciativas em torno do Centro de Lançamento de Alcântara. Então, já se manifestava minha profunda preocupação com os termos de um antigo, e ainda não abortado, acordo com os Estados Unidos da América, ora aviventado que em termos objetivos representa abrir mão de parcela de nossa soberania.

            Há pouco mais de uma semana, ocupei esta tribuna para dizer que, por pouco, o Plenário da Câmara dos Deputados não apreciou esse acordo, pois ele chegou a ser incluído na pauta de votações da Câmara dos Deputados, e, em função da manifestação de um líder, ele foi retirado.

            Mas, há pelo menos dez anos, a partir do trágico acidente que subtraiu a vida de dezenas de pessoas em 22 de agosto de 2003, o Centro de Lançamento de Alcântara foi praticamente jogado à margem da imprensa e da opinião pública brasileira. Agora, no final de julho, o jornal O Estado de S. Paulo, Senador Cristovam, publicou longa matéria anunciando a retomada das negociações do Governo brasileiro com os Estados Unidos, que permitiriam o uso da base de Alcântara pelo serviço espacial norte-americano.

            Quase às vésperas da visita de Estado da Presidenta Dilma Rousseff àquele país, o “generoso” gesto da diplomacia brasileira e do Ministério da Defesa causam espécie.

            Convém lembrar que, depois de muitos anos de discreta indiferença, o Vice-Presidente americano, Joe Biden, em recente estada no Rio de Janeiro, afirmou textualmente que "2013 é o início de uma nova era das relações Brasil-Estados Unidos". A questão que emerge, óbvia, está em saber se a facilitação da base de Alcântara integra essa "nova era".

            Observe-se, ainda segundo o Estadão, que o assunto estaria sendo tratado como "secreto" pelo Governo brasileiro - pelo menos até a publicação da matéria, em 29 de julho passado.

            Ainda que se admita a evidente subutilização de Alcântara, não me parece razoável que o Governo, um governo popular e democrático, retome tão polêmico acordo de forma sub-reptícia, ou pelo menos furtiva.

            Nós precisamos saber qual é a opinião do Ministério da Ciência e Tecnologia sobre esse tema, um Ministério que tem um eminente Ministro, um respeitado cientista, Marco Antonio Raupp, ligado à área espacial brasileira. Qual é a opinião da Agência Espacial Brasileira sobre esse tema? Qual é a opinião do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais?

            É relevante aqui registrar a importância de um programa espacial, as diversas aplicações de um programa espacial, aplicações como o controle do espaço aéreo nacional; como as informações obtidas para prospecção do território; o controle das comunicações; o monitoramento das condições meteorológicas, que é importante para a previsibilidade de nossas safras agrícolas; o controle das fronteiras, em um País que tem uma enorme fronteira seca e uma enorme área do pré-sal; as telecomunicações.

            Portanto, as aplicações de um programa espacial são inúmeras e estratégicas para um país.

           Como se sabe, por tradição, os norte-americanos evitam a chamada transferência ou compartilhamento de tecnologias. Nessa linha, a eventual utilização de Alcântara pelos Estados Unidos alcançaria, de maneira direta, nossa soberania.

           O absurdo volume de restrições impostas pelos americanos em temas que envolvem a área militar já fez com que o Congresso Nacional brasileiro deixasse de aprovar, no ano de 2002, o chamado Tratado de Salvaguardas, este a que me referi afirmando que ainda descansa nas gavetas da Comissão de Constituição e Justiça, mas não foi rejeitado definitivamente, o que fez com que entrasse na pauta, há algumas semanas, e fosse apreciado.

           Em Alcântara, temos ainda uma pendência com os ucranianos, aos quais nos associamos no início do Governo Lula, em 2003, para o desenvolvimento de foguetes, quando foi estabelecida a binacional Alcântara Cyclone Space (ACS). O Brasil já investiu 43% dos recursos previstos; a Ucrânia, algo em torno de 19%.

           Outro questionamento refere-se à proposta comercial de nossa única base de lançamentos, justamente a futura ACS. E qual seria essa proposta? Ora, a disputa do mercado internacional de lançamento de satélites, no qual os próprios Estados Unidos são um importante concorrente.

           Com a possível assinatura desse acordo, o Brasil vai apenas transferir aos americanos a economia de 30% nos lançamentos de foguetes. A partir daí, nossos próprios lançamentos vão perder uma extraordinária vantagem competitiva.

            É importante registrar que, em razão da localização de Alcântara, muito próxima à linha do Equador, e em função também do fato de que ela está muito próxima ao mar, podendo lançar os foguetes acompanhando o movimento de rotação da terra, reduz-se em muito a quantidade de combustível necessária para o lançamento do foguete, ou amplia-se em muito a carga útil que pode ser levada em cada foguete. Isso torna a base de Alcântara um dos melhores lugares do mundo para lançamento de foguetes.

            Na verdade, Srªs e Srs Senadores, penso que o Brasil deve, sim, aprofundar as atividades do Centro de Lançamento de Alcântara com a maior brevidade possível, com maior empenho, com mais recursos, com recursos regulares, com formação de recursos humanos. Ou seja, o programa espacial brasileiro deve ser um programa estratégico para o País. O programa espacial brasileiro dever ser visto por todas as aplicações que têm para a melhoria da qualidade de vida, para a prestação de inúmeros serviços. Ao mesmo tempo, para trazer divisas importantes ao País, para garantir a soberania do País e para desenvolver uma área tecnológica que terá consequências em diversas outras atividades industriais.

            Não me anima aqui nenhum traço de espírito xenófobo. Absolutamente. O que não podemos admitir sob hipótese alguma é que o Brasil perca a oportunidade de se transformar em um grande sujeito internacional nessa área. Não podemos abrir mão, ainda que seja em pequena parte, da nossa soberania, entregando de olhos fechados um ponto geopolítico estratégico.

            É importante registrar que nesse acordo, que ainda está na Câmara dos Deputados - e eu disse isso aqui da tribuna -, os brasileiros estariam proibidos de visitar determinadas áreas da base de Alcântara, que estariam abertas apenas para a visita de americanos. Também por aquele acordo, contêineres poderiam ser introduzidos no Brasil sem que nenhuma autoridade brasileira pudesse abri-los para conferir-lhes a mercadoria ou o conteúdo.

            Além disso, não me parece razoável que o País abra mão de excelentes oportunidades de negócio. Cada lançamento oscila entre US$25 milhões a US$30 milhões. Portanto, nós não podemos abrir mão disso.

            Eu quero dizer, Senador Capiberibe, que tema dessa relevância deve submeter-se necessariamente ao debate prévio no âmbito de nossas duas Casas congressuais. Câmara e Senado precisam ser ouvidos sobre essa sensível matéria. Somos a instância natural e incontornável para discussão exaustiva de assunto tão relevante para o presente e para o futuro do Brasil.

            Nesse sentido, eu quero anunciar que, ainda na semana que vem, apresentarei alguns requerimentos de informação. Requerimentos de informação ao Itamaraty sobre qual é o exato estado da arte desse que seria um acordo a ser assinado pela Presidenta Dilma nos Estados Unidos na sua visita em outubro; ao Ministério da Ciência e Tecnologia, se efetivamente há esse acordo, se o Ministério da Ciência e Tecnologia tem participado dessas negociações; qual é a posição da Agência Espacial Brasileira; qual é a posição do Instituto de Pesquisas Espaciais, porque nós não podemos tratar um tema dessa importância, um tema fundamental para a soberania brasileira, sem que o Congresso Nacional esteja participando com profundidade.

            Sabemos que os antecedentes dessa relação com os Estados Unidos na área espacial não foram positivos e engendraram uma grande reação dos meios científicos, da população, dos partidos políticos, quando foram anunciados os termos daquele acordo que ainda está adormecido na Câmara dos Deputados e que ainda não foi sepultado definitivamente. Acordo que, no nosso entendimento, compromete a soberania brasileira.

            Portanto, eu não poderia deixar de fazer este registro no dia de hoje, manifestando a minha profunda preocupação com essa temática.

            O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Governo/PDT - DF) - Senador Rodrigo, eu fico satisfeito que o senhor esteja fazendo isso, mas eu sugiro que vá mais longe. Não é apenas o acordo que a gente precisa analisar. É o estado da arte das pesquisas espaciais no Brasil.

            Vinte anos atrás, ou trinta, nós estávamos em uma posição entre os raros países fora do eixo Europa-Estados Unidos que tinham uma pesquisa.

            De lá para cá, Senador Capiberibe, a China tem enviado mais de uma nave tripulada; a Coreia do Sul e a do Norte, o Paquistão e a Índia. A Índia tem satélites com tripulação. Mandou um satélite não tripulado à lua, que está girando ao redor da lua. E nos aqui patinando há anos, sem lançar um único vetor, veículo. Um único. Há anos e anos. Eu creio que há quase dez anos não lançamos nada. Está parado. Apesar de haver o Inpe, estamos parados.

            Então, o problema do acordo é importante, mas creio que ele se situa dentro de uma coisa maior, que é o desprezo com que o Brasil vem tratando, um país do tamanho do nosso, a nossa necessidade de ter tecnologias próprias na área espacial.

            O SR. RODRIGO ROLLEMBERG (Bloco Governo/PSB - DF) - Senador Cristovam, V. Exª, com sua grande sabedoria, traz uma contribuição muito significativa para este debate. Creio que estamos diante de uma oportunidade, a oportunidade de fazer um grande debate, no Senado, sobre o Programa Espacial Brasileiro.

            E vou acrescentar aos pedidos de informações um requerimento, que quero assinar em conjunto com V. Exª, convido V. Exª para assinarmos juntos, para que possamos fazer uma audiência conjunta da Comissão de Ciência e Tecnologia com a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional para discutir não apenas esta questão específica, mas o Programa Espacial Brasileiro.

            É importante registrar que o Brasil reúne algumas condições que poucos países do mundo têm, se houver efetivamente uma decisão política de fazer com que o Brasil seja um grande sujeito internacional no que se refere à área espacial.

            Nós temos, como acabei de dizer, o melhor local para o lançamento de foguetes. Nós estamos próximos da Linha do Equador. A Guiana, Senador Capiberibe, concorre conosco, porque já tem ali uma base funcionando. Nós temos condições, nós estamos próximos à Linha do Equador, nós podemos lançar em direção ao mar, nós podemos lançar no movimento de rotação da Terra, o que reduz muito a necessidade de combustível, como eu disse, aumenta muito a capacidade de carga dos foguetes brasileiros.

            Nós podemos, por meio de parcerias, como estamos fazendo com a Ucrânia, com a Alcântara Cyclone Space, desenvolver tecnologia de produção de foguetes médios, de foguetes lançadores de satélites. E podemos, por intermédio do Instituto de Pesquisas Espaciais, investindo na formação de recursos humanos, e do ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica), garantir recursos humanos com capacidade também de desenvolver tecnologia para a produção de satélites. Estive visitando o Inpe, e me senti orgulhoso. Portanto, o Brasil tem condições de fazer isso.

            Agora, é importante registrar que os brasileiros envolvidos no programa espacial hoje estão muito envolvidos em função de um grande idealismo, de um grande espírito público, porque não existem condições adequadas. Precisamos garantir a formação de recursos humanos, precisamos ampliar o número de engenheiros na área espacial, precisamos aumentar a nossa capacidade e precisamos garantir um volume maior de recursos, Senador Capiberibe, como também a regularidade desses recursos, porque nós estamos tratando de um programa essencial para a soberania brasileira, e que tem inúmeras aplicações, porque estamos falando de controle de fronteira, estamos falando de controle de safras agrícolas, estamos falando da questão do planejamento territorial, das telecomunicações, da telemedicina, de uma série de aplicações que um programa espacial pode oferecer na área militar e na área civil, em benefício do conjunto da população brasileira.

            Portanto, eu agradeço, Senador Cristovam, a contribuição de V. Exª a ao tema que trago ao plenário do Senado hoje.

            O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Governo/PDT - DF) - Eu creio que não faz mal quebrar um pouco o ritual do Regimento e continuar debatendo. Isso que é muito importante.

            Nós temos aqui no Congresso uma Frente Parlamentar Pró-Antartica, de que o senhor faz parte e sabe como funciona bem.

            Eu não sei se há uma equivalente para a pesquisa espacial. Se há, tem que fazer com que ela funcione. Se não há, eu sugiro que a gente crie uma frente desse tipo para tentar pressionar, ajudar com emendas, enquanto existir emenda, e tentar pressionar o Governo para que ponha em marcha um programa ambicioso.

            Talvez o que esteja faltando no Brasil seja ambição. A gente está imaginando fazer o trem-bala e não gasta um pouquinho de dinheiro para ter o domínio de pesquisas especiais.

            Com o dinheiro de um estádio de futebol da Copa a gente podia fazer algumas atividades especiais, e eu não vou aqui correr o risco de dizer algo que não seja certo, porque eu não sei os detalhes, mas provavelmente é algo muito importante. Não vou dizer para onde a gente conseguiria mandar um veículo com o dinheiro de um estádio, mas poderia se fazer muita coisa.

            Nós estamos canalizando dinheiro errado, sem ambição e sem estratégia de longo prazo. E esta é uma área fundamental, a pesquisa espacial, se o País não quer ficar para trás. Hoje, somos dependentes totalmente, e precisamos de comunicações, precisamos de satélites para comunicações. Precisamos enviar. Até temos tecnologia para fazer satélite, mas não conseguimos mandar. Temos que alugar de outros.

            Então, eu sugiro... Quem sabe o senhor, que já foi do Ministério de Ciência e Tecnologia e que tem estado interessado nisso, não ajuda a fazer para a pesquisa espacial o que nós fizemos - e eu, como Presidente da Proantar -, o que nós estamos fazendo.

            O SR. RODRIGO ROLLEMBERG (Bloco Governo/PSB -DF) - Muito obrigado, Senador Cristovam Buarque, por mais uma contribuição bastante proveitosa que V. Exª dá ao meu pronunciamento.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/08/2013 - Página 52357