Pronunciamento de Roberto Requião em 01/08/2013
Discurso durante a 121ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Defesa de maior protagonismo do PMDB na política nacional; e outros assuntos.
- Autor
- Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
- Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
POLITICA SOCIO ECONOMICA.
IGREJA CATOLICA.:
- Defesa de maior protagonismo do PMDB na política nacional; e outros assuntos.
- Aparteantes
- Cristovam Buarque, Eduardo Suplicy.
- Publicação
- Publicação no DSF de 02/08/2013 - Página 49347
- Assunto
- Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA. IGREJA CATOLICA.
- Indexação
-
- DEFESA, ORADOR, AUMENTO, PARTICIPAÇÃO, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), DEBATE, SOLUÇÃO, PROBLEMA, GESTÃO, PAIS, COMENTARIO, CRISE, SOCIEDADE, ECONOMIA, POLITICA, BRASIL.
- COMENTARIO, VISITA, PAPA, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).
O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Renan Calheiros, que preside esta sessão, neste início do segundo semestre de atividades legislativas deste ano, eu venho à tribuna para ter uma conversa franca com a nossa Presidenta e com o meu Partido, o PMDB.
Com a alma aberta e com absoluta franqueza, inicio este meu pronunciamento, à moda da nossa época de política universitária, com a citação da primeira estrofe do poema Nosso Tempo, de Carlos Drummond:
Esse é tempo de partido,
tempo de homens partidos.
Em vão percorremos volumes,
viajamos e nos colorimos.
A hora pressentida esmigalha-se em pó na rua.
Os homens pedem carne. Fogo. Sapatos.
As leis não bastam. Os lírios não nascem
da lei. Meu nome é tumulto, e escreve-se
na pedra.
É como vejo o momento político atual. Confesso que esperei com certa ansiedade tanto a reação do Governo como a da oposição às jornadas de junho. Dupla decepção. A oposição, que a cada dia mais aposta na retórica udenomoralista, não emitiu um pio em relação à encrenca econômica, e o máximo que ousou, para se alinhar às ruas, foi sugerir à Presidente corte no número de ministérios, revelando seu lado austero, sua predileção por choques de gestão, para botar o País nos eixos. Já o Governo - pois é, o Governo - saiu à procura de médicos, o que é bom. Mas, Senador Cristovam, como diria Vladimir, aquele Vladimir, Vladimir Ilitch, “o inferno está povoado de bem-intencionados”.
Srªs e Srs. Senadores, meus irmãos, minhas irmãs, brasileiros que nos acompanham na TV Senado e na Rádio Senado, se eu fosse dar um título a esta fala da tribuna hoje, eu a chamaria de “A República em risco e a passividade do PMDB”. Ainda hoje de manhã, pensei: eu gostaria que este fosse o meu primeiro pronunciamento no Senado da República, na expectativa de que, pela novidade, merecesse a atenção plena do Senado e do povo brasileiro.
A frequência na tribuna, Presidente Renan, que reflete o exercício necessário e indispensável de prestar contas ao povo na atividade parlamentar, tem como contrapartida o risco da banalização do discurso. É por isso que eu gostaria de pedir uma atenção especial pelo que proponho sustentar aqui hoje, porque, brasileiros, a República está sob ameaça. Isso não é figura de retórica ou simples força de expressão. É um fato, como eu pretendo demonstrar.
A primeira grande ameaça que recai sobre a sociedade brasileira é a indiferença da classe política ao nosso destino como Nação. E é uma culpa coletiva. Como classe política - e muitos de nós na condição de base do Governo -, deixamos o barco da República desgovernar-se pelos descaminhos de uma política econômica absolutamente inconsequente, uma política que, pela valorização do câmbio e pelo aumento dos juros, nos empurrou lenta e gradualmente para a desindustrialização, para o desequilíbrio do balanço de pagamentos, para a sangria das remessas de lucros ao exterior e para a ameaça já visível do desemprego, depois de um ciclo continuado de desqualificação do emprego.
A segunda grande ameaça é a política econômica de redução sistemática do investimento público sob a esperança de que o investidor privado venha substituí-lo. Esquecemos uma lição elementar dos livros de Introdução à Economia, nos quais se ensina que, no capitalismo, é o investimento público que puxa o investimento privado, não o contrário. Nós simplesmente matamos o investimento público na medida em que o PAC não cumpriu sua missão de acelerar o crescimento. Até mesmo no setor de transporte, que havia alcançado grandes taxas de investimento nos últimos dois anos do Governo Lula, os investimentos minguaram e quase desapareceram.
A esperança da Presidente seria a retomada dos investimentos por intermédio de Parcerias Público-Privadas, as PPPs, segundo o conselho de alguns empresários que se tornaram de sua íntima confiança. No entanto, duas tentativas de licitar a conservação de 7,5 mil quilômetros de rodovias fracassaram, como fracassou mais uma tentativa de manter viva a fantasia do trem-bala. E, ainda assim, não desistem desse delírio.
As PPPs seriam a esperança de lançamento de grandes obras em ano eleitoral. Nada contra. Acho que ano eleitoral, como qualquer ano, também é um bom ano para se lançarem obras e investimentos, mas PPPs em rodovias pedagiadas? Além do que, depois de que algumas dezenas de milhares de jovens e de caminhoneiros foram para as ruas protestar também contras as tarifas escorchantes que se cobram nos pedágios do Brasil, duvido que algum empresário tenha a coragem de assumir obrigações de longo prazo para fazer esse tipo de investimento, que se tornou tão inseguro.
Enfim, os protestos serviram para acordar governos e tribunais, Tribunais de Contas estaduais, que, de repente, despertaram para o assalto que se perpetra contra os brasileiros em cada uma das cabines de cobrança de pedágio espalhadas pelas estradas do País.
A terceira grande ameaça é o despreparo do Governo brasileiro para estabelecer uma estratégia de enfrentamento da crise mundial, sobretudo da crise europeia. Estamos reagindo topicamente, tangendo a economia a golpes de desonerações fiscais que já esgotaram sua capacidade de estimular o consumo e o investimento e que não têm qualquer outro efeito, a não ser o de favorecer o lucro das empresas, estrangeiras principalmente, e a remessa de lucros para o exterior.
Observem nossas contas correntes externas. É espantosa a enxurrada de dólares que, neste último ano, temos exportado sob a rubrica de lucros e juros, coincidindo com a exacerbação das exonerações fiscais, além do que, em obediência a compromissos com o mercado, vamos entregar o fantástico Campo de Libra, na área do pré-sal, ao cartel internacional do petróleo, para fazer frente ao famoso superávit primário.
Hoje, quando país algum do Planeta Terra obriga-se a cumprir meta de superávit primário, a não ser que esteja sob o tacão do Fundo Monetário Internacional, nós vamos alienar riqueza portentosa para afagar e agradar o mercado.
A quarta ameaça é o risco de uma crise cambial a prazo muito curto. O Congresso Nacional e grande parte dos brasileiros não parecem acreditar na possibilidade de uma crise cambial em face do alto nível de reservas de que dispomos: mais de US$350 bilhões. Entretanto, Senador Agripino, nenhum nível de reservas, mesmo elevado, resiste ao efeito combinado de déficit comercial, déficit em conta corrente, crescente volume de remessa de lucros e juros para o exterior e redução dos investimentos externos em consequência da desconfiança por isso gerada e, por fim, ao enfraquecimento da capacidade exportadora de manufaturas e produtos primários.
Quer dizer, nosso retorno aos braços do Fundo Monetário Internacional, com as consequências sabidas, não é apenas mais uma hipótese fora de propósito. O próprio Governo, notadamente o Banco Central, já percebeu essa vulnerabilidade. É por isso - e não para combater a inflação, que é o menor de nossos problemas - que o Banco Central voltou a aumentar a taxa de juros. Quer dizer, regressamos ao ciclo traiçoeiro de ter que alimentar a especulação externa a custos extremamente pesados para a economia e a sociedade, elevando os juros a fim de atrair aplicações financeiras. Com isso, estamos ingressando no pior dos mundos. Vamos revalorizar a nossa moeda e, em consequência, dar continuidade ao processo de desindustrialização e da consequente redução de possibilidades de retomada das exportações de manufaturados, agravando o círculo vicioso da crise externa.
Entretanto, dessas ameaças, quero acentuar uma que se sobrepõe a todas, que é a ameaça representada pela crise dos países industrializados, sobretudo dos europeus, sobre a nossa economia. As consequências dessa crise sobre os países do Sul, entre eles, destacadamente, o nosso Brasil, são inevitáveis. No entanto, estamos assistindo a essa crise como se estivéssemos imunes a ela, intangíveis.
Fechamos os olhos ao fato de que já está nos atingindo, e não é mais uma marolinha, pois basta ver o desempenho de nossa balança comercial para comprovar.
Na verdade, Srªs e Srs. Senadores, estamos diante de um vendaval que sopra cada vez mais forte e que poderá nos arrastar, caso não tenhamos a responsabilidade de traçar uma estratégia de enfrentamento, uma estratégia de enfrentamento acima dos partidos, pelo povo e pela Pátria, embora pouco se espere da oposição, mais preocupada com o número de ministérios, com os gastos públicos, com os desvios de funções dos jatinhos da FAB e com os preços do penteado e da segurança da nossa Presidente.
É certo que uma estratégia de enfrentamento da crise não pode ser feita nas ruas, mas a rua pode exigir nossas cabeças. Espero que não as nossas cabeças físicas, como na Revolução Francesa, mas as nossas cabeças políticas, caso fracassemos na elaboração e na execução de uma alternativa.
O velho Carlos, aquele, Senador Cristovam, o Carlos Marx, tão citado desde a debacle de 2008, disse que nenhuma sociedade coloca para si desafios que não possa superar. Logo, se tivermos disposição política para encontrar um ponto de consenso na formulação de objetivos estratégicos, poderemos superar a crise. Contudo, temos que nos esvaziar de pretensões egoísticas e oportunistas. No entanto, não nos moveremos para lado algum se não identificarmos claramente a natureza da crise econômica, que atinge os países avançados. Sempre teremos a tendência de acreditar que, como em outras crises, esse é o vale de um ciclo que acabará entrando num processo de retomada por vias naturais, arrastando-nos, na retomada, juntos. É um engano.
A crise na Europa e nos Estados Unidos é uma crise essencialmente política e duradoura. No passado, as crises cíclicas do capitalismo eram revertidas mediante políticas fiscais e monetárias expansivas. Agora, o sistema resiste em adotar políticas fiscais expansivas, enquanto as monetárias, como em outras épocas, tornaram-se ineficazes pelo efeito chamado por Keynes de armadilha da liquidez.
As empresas têm dinheiro abundante para investir, mas não investem; e não investem porque não há demanda. Para estimular a demanda, num primeiro momento, só a política fiscal, ou seja, a expansão dos gastos públicos. Acontece que, para salvar os bancos da crise especulativa gerada pelo setor privado nos Estados Unidos e na Europa, os governos europeus tiveram de endividar-se violentamente, o que fez uma crise financeira privada tornar-se uma crise fiscal.
No início da crise, independentemente desse endividamento, os países atingidos continuaram a fazer déficits até o início de 2010. Como resposta, em fins de 2009, a economia mundial dava sinais de recuperação. Então, a Alemanha de Merkel, a França de Sarcozy e a Inglaterra de Cameron decidiram juntas impor ao resto da Europa, como condição para empréstimos de emergência ao seu sistema bancário vulnerável, violentas políticas de contração fiscal que resultaram numa travada da retomada e em recessão ou depressão generalizadas.
Essa política de contração, formulada conjuntamente pela Comissão Europeia, FMI e Banco Central Europeu, a malfadada troika, não vai mudar em prazo razoável ou mesmo em prazo visível.
Essa política - é bom lembrar - ancora-se nos tratados constituintes do sistema europeu e na carta de diretivas do Fundo Monetário Internacional. Em razão disso, a Europa do euro só tem uma saída para buscar a retomada: aumentar as exportações e o superávit comercial, a fim de substituir a demanda interna contraída pelas chamadas políticas de austeridade. Isso, contudo, é virtualmente impossível no nível da taxa de câmbio do euro, extremamente valorizado para os países em crise. Assim, o que provavelmente ocorrerá é um agravamento contínuo da situação social com perspectivas de graves convulsões sociais. Resultado: como ato de desespero, a Europa está tentando fazer superávit comercial a todo transe, inclusive conosco, deflacionando os custos, sobretudo trabalhistas, de suas economias.
Os Estados Unidos, por sua vez, prosseguem e perseguem uma estratégia, anunciada por Obama, de dobrar as exportações a cada cinco anos. O Japão está com uma política cambial agressiva para aumentar exportações. A China continuará com seu modelo exportador e de superávit comercial. Quer dizer, tudo conduz a que soframos um ataque em várias frentes no nosso sistema comercial. Os países industrializados avançados, de forma combinada, procurarão sobretudo os mercados emergentes, pois entre eles mesmos os mercados estão retraídos. E isso no momento em que, depois de 19 anos de superávit comercial, nós, brasileiros, passamos a fazer déficits comerciais e déficits em contas correntes recorrentes.
Qual é a estratégia proposta pelo Governo diante disso tudo? Não vejo nenhuma estratégia, e os movimentos táticos das desonerações se estiolaram. É evidente que não pode ser uma estratégia de acordos bilaterais de livre comércio com países desenvolvidos avançados, pois isso seria como colocar o Maguila para lutar com o Mike Tyson. A estratégia possível é visível e óbvia: temos que procurar, com nossos vizinhos sul-americanos, que enfrentam o mesmo drama que nós, um meio de aprofundar a integração produtiva e econômica da América do Sul como eixo central para a retomada do nosso desenvolvimento. Como bloco, podemos nos defender do verdadeiro dumping comercial que já se coloca para nós como realidade efetiva. Em outras palavras, podemos proteger nossos mercados domésticos de uma competição que se põe predatória.
É importante notar que, desta vez, o declínio da indústria manufatureira em toda a América do Sul não será compensado pelo aumento das exportações de commodities, como ocorreu nos anos 2000 até a crise. Afinal, a China, a grande fonte de absorção de commodities, cuja demanda de importações implicou e explicou grande parte do aumento de preços e quantidades exportadas pela América do Sul, está também em desaceleração. Isso já se reflete em toda a Ásia, e reflete-se também nos balanços de pagamento de praticamente todos os países exportadores de commodities da região, além do Brasil.
É nesse sentido que sustento que estamos todos no mesmo barco, o que pressiona por uma estratégia comum de saída, em especial se houver decidida liderança brasileira nesse processo.
Contudo, em tempos contemporâneos, nenhum país projeta, delineia uma grande estratégia fora do contexto de um pacto social que mobilize a sociedade inteira em torno de objetivos de interesse comum.
O que, no caso, implica resposta a uma pergunta simples: que tipo de sociedade queremos construir? Que grau de solidariedade interna vamos valorizar para ter verdadeira justiça social?
No passado, a resposta a essas questões era definida no nível das oligarquias, que projetavam os próprios interesses como interesses gerais. Eram democracias - ou ditaduras - de cidadania restrita. Hoje caminhamos para a consolidação de uma democracia de cidadania ampliada, cuja expressão singular pudemos ver nas recentes manifestações populares.
Contudo, Senadores, as ruas não ditam estratégias. As ruas manifestam o descontentamento, fazem pressão e ditam objetivos gerais. Mas a formulação de estratégia é um dever da liderança política.
A rua manifesta sua desconformidade ou conformidade...
(Soa a campainha.)
O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - ... com os objetivos políticos estabelecidos pela liderança política.
E isso acentua a necessidade de darmos respostas imediatas aos reclamos das ruas; separar o que é justo do que é injusto; estabelecer uma linha divisória entre o que são interesses legítimos do conjunto da sociedade do que não passa de lobbies, de interesses particulares; o que são demandas justas do que é apenas provocação.
Sem essa visão clara, será a balbúrdia e o caos, a insegurança e a ausência de rumos.
Srªs e Srs. Senadores, Presidente Renan, falo agora do meu, do nosso Partido, o PMDB.
Tenho acompanhado a Liderança do PMDB na maioria das iniciativas de apoio ao Governo Dilma, assim como fui, como governador, um aliado do Presidente Lula. Mas isso não quer dizer que, ontem, como hoje, tenha ficado omisso diante de fatos e iniciativas governamentais com as quais não concordo. Tenho sido, pois, um aliado crítico, às vezes mais crítico que a própria oposição institucional, já que o que condeno, muitas vezes, é justamente aquilo que coincide com o pensamento neoliberal incorporado às pregações da oposição institucional.
Gostaria de ver meu Partido na mesma posição de aliado crítico, pois isso ajudaria o Governo a se encontrar no meio das turbulências contemporâneas.
Tendo sido o grande condutor da transição democrática brasileira, o PMDB tem raízes históricas que o credenciam para se tornar o condutor da transição da democracia política para a democracia social; ou seja, para ser um instrumento de efetiva radicalização da democracia política na construção da democracia social brasileira. Esse objetivo não é estranho ao Partido. Está em seus documentos constitutivos, em seus anais históricos, no Projeto Brasil, no Programa e nos Estatutos. Está na ativa participação que o Partido teve na elaboração da Constituição cidadã, não obstante a desfiguração posterior a que foi submetida por governos liberais.
O velho e bom PMDB que se definia como o partido das classes populares, desvinculado do capital financeiro e do interesse dos grandes conglomerados, o partido dos estudantes e da juventude, o partido das mulheres e das minorias, o partido dos funcionários e dos intelectuais. É deste PMDB, original, genuíno e autêntico, de que falo. Mas, hoje, quais seriam os objetivos políticos do nosso PMDB, aos quais se aplicaria uma nova e grande estratégia nacional?
Entendo que esses objetivos deveriam corresponder a direitos sociais muito concretos, acima de querelas ideológicas, e que correspondessem à vontade objetiva do povo, segundo o que temos percebido nos movimentos sociais.
Falo, Senador Cristovam, do direito universal à saúde de qualidade; direito à educação universal de qualidade; direito a um sistema previdenciário justo; direito à sobrevivência para os que se encontram em nível de pobreza absoluta; direito à mobilidade urbana e a custo justo ou pelo passe livre; direito à renda mínima,...
(Soa a campainha.)
O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - … como há muitos anos quer o nosso Senador Suplicy.
O cidadão ou cidadã devem ter cobertura de direitos básicos e universais desde o momento da concepção até à morte. A mulher deve ter proteção especial do Estado na sua condição de mãe, amparada por uma rede de creches, e de atendimento especializado em cuidados com a primeira infância. Daí em diante, a escola pública tem que ter condições adequadas para colher toda a demanda infantojuvenil.
É indispensável dizer que esse tipo de Estado exige uma economia forte. Mas uma economia que se fortaleça com distribuição e não com concentração da renda.
Aparentemente avançamos na distribuição de renda, mas se trata ou não de uma ilusão? As estatísticas...
(Interrupção do som.)
O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) -... do IBGE, não sei por qual razão, não incluem a renda do capital quando calculam a distribuição. Assim, tivemos uma (Fora do microfone.) melhora de distribuição, sim, nos últimos anos, mas uma distribuição que se aplica sobretudo à renda do trabalho, excluindo a renda do capital.
Os trabalhadores rurais, por sua vez, devem ter acesso a meios de produção e ajuda governamental, o que significa a radicalização do processo de reforma agrária e da assistência rural a pequenos e médios produtores.
Nada seria mais importante, do ponto de vista da atualização da nossa economia a padrões internacionais capitalistas, do que uma reforma financeira profunda, que reduzisse a uma dimensão razoável a participação, hoje, Senador Renan, de quase 20% dos juros na renda nacional. Isso caracteriza uma verdadeira expropriação do setor produtivo, em especial da renda do trabalho em detrimento da cidadania.
Não sou contra banqueiros, em princípio pelo menos. Não sou contra financistas, não sou contra aplicadores. Contudo, acho que extrapolamos os privilégios dados a essas categorias de rentistas, em detrimento da produção nacional.
A verdadeira democracia social é incompatível com essa situação. Tal realidade deve mudar de uma forma muito concreta, a partir da redução drástica da taxa de juros chamada Selic - instrumento de transferência de renda pública para o setor rentista -, e pelo uso sistemático dos bancos públicos na pressão pela queda das taxas de juros de aplicação.
Destaco o seguinte: as duas economias de melhor desempenho no mundo, atualmente, a China e a Índia, com taxas de crescimento de mais de 6%, têm como principais características um sistema de planejamento centralizado, um sistema bancário quase totalmente estatizado e grandes empresas estatais estratégicas no campo produtivo.
Isso, Srs. Senadores, não é ideologia. São fatos, apenas fatos.
A Índia é uma economia capitalista de caráter social. A China é uma economia socialista de caráter capitalista. O segredo de seu excepcional funcionamento é que há uma instância comum, sob coordenação do Estado, que planeja, financia e executa. O desenvolvimento não fica a cargo dos rumores do mercado. Numa época em que se manifesta, de forma inequívoca, a necessidade do gasto público estratégico, para reverter a recessão econômica, não podemos fechar os olhos a essa realidade estrutural das economias, hoje, mais dinâmicas do Planeta.
Não minimizo as resistências ao estabelecimento de restrições ao setor financeiro. A reforma necessária só pode ser feita no âmbito de uma profunda mudança de nossas instituições econômicas, ou seja, no contexto da radicalização da democracia política.
Recentemente, vimos o poderio quase irresistível desse segmento, catapultado pela grande mídia que lhe é subserviente e da qual tem sido o grande anunciante.
Lembram-se? Lembra-se, Senador Renan? Inconformado com a redução da taxa básica de juros esboçada pelo Governo Dilma, o setor financeiro arquitetou...
(Soa a campainha.)
O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - ... o perigo fabricado de uma aceleração da inflação, na época oscilando na segunda casa decimal da meta governamental, para justificar a retomada do aumento dos juros.
E o nosso Governo capitulou, pressionado também pela necessidade que ele próprio criou de captar recursos especulativos externos para ajudar a fechar o balanço de pagamentos, como já mencionei.
Ecoam, ainda, por esta Casa os discursos inflacionários da nossa oposição. Meu Deus! Parecia que estávamos às vésperas do apocalipse. Mas veio o aumento de juros, não se falou mais nisso e, de novo, reinou a paz no plenário e na mídia.
Srªs e Srs. Senadoras e Senadores, brasileiros, estou delineando, em...
(Interrupção do som.)
O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - ... traços bem sumários, o que seria, no Brasil, um Estado de bem-estar social, esse tipo de Estado que foi a vanguarda da civilização na Europa e que agora está sendo destruído pelas políticas neoliberais.
Não creio que venha a ser uma derrota definitiva no caso do velho continente. Cedo ou tarde, as multidões europeias se levantarão para exigir a retomada do curso histórico de seu regime social. Para nós, independentemente do que está ocorrendo do outro lado do Atlântico hoje, esse regime sempre será uma inspiração. Se fizerem um levantamento dos cartazes que foram ou estão sendo levantados nas manifestações publicas em nossas cidades verão que a essência, 90% deles, falam em (Fora do microfone.) direitos sociais básicos. Não vi nenhum falando em reforma política e em plebiscito. Absolutamente inconsistentes.
É o que o povo quer. É o que, como líderes políticos, devemos querer, em sintonia com o povo. Os partidos políticos, como eixos do processo democrático, têm a responsabilidade de estabelecer essa sintonia. E aqui devo me concentrar nas responsabilidades específicas de nosso Partido, de meu Partido, do velho MDB de guerra, que carrega o privilégio e o desafio de ser o maior partido no Parlamento brasileiro.
A aliança com o PT reforçou, em tese, nossos compromissos com o campo de esquerda, fez com que partilhássemos importantes conquistas sociais no Governo e colocou sob nosso controle uma parte da máquina do Estado.
Contudo, essa aliança identifica-nos também com os fracassos governamentais, sobretudo na economia, e sobretudo com a falta de uma diretiva estratégica de Estado que só o Governo pode dar.
Isso significa que o PMDB deve avaliar - ou reavaliar - seu sistema de alianças, alianças partidárias, optando por frentes não mais em torno de conveniências eleitorais imediatas, que podem se esvanecer como resultado da própria crise, mas tendo em vista os interesses de fundo da sociedade brasileira, à qual historicamente nos associamos.
Em outras palavras, temos que assumir nossa condição de maior partido político brasileiro, para apontar um rumo político e econômico ao País, mesmo que isso represente risco que, para mim, parece mínimo.
Assim, proponho para o PMDB uma convenção nacional, extraordinária e urgente, para debater esses temas e estabelecer uma diretiva em consonância com os brasileiros, com os ouvidos e o coração aberto para as vozes das ruas. Do contrário, corremos o risco de caminharmos para a irrelevância e sermos definitivamente varridos, aos poucos, para o segundo plano da História. Convenção nacional extraordinária para adotar um programa mínimo e tática para implantá-lo.
Perplexo e dividido pela contradição entre ser Governo - um Governo conservador - e suas raízes historicamente populares, o PT ainda não se recobrou do atordoamento das jornadas de junho.
Já o PSDB, mais uma vez, revelou o tamanho do seu vazio rotundo, profundo. Sua insistente prédica em favor de "choques de gestão”, "austeridade", "cortes de gastos" e seus já tediosos sermões contra a ineficiência do Estado têm um bafo de naftalina e apenas faz a alegria daqueles 592 especialistas que frequentam a Globo News, o Jornal Nacional e a CBN.
Em qualquer outro país, por menor, pobre ou insignificante que seja, em qualquer outro país, o maior partido nacional tem o papel de protagonista. Menos entre nós. De que serve a nossa força? Para negociar ministérios e posições na Administração Pública nacional? Para acomodar correligionários?
(Soa a campainha.)
O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Para dirigir as duas Casas do Congresso? Para garantir emendas e outras quimeras aos nossos prefeitos e filiados?
É pouco. É ridiculamente, pateticamente pouco.
Em vez de assumir a progenitura, o PMDB se conforma ao papel de linha auxiliar e não é ouvido para nada, como os fatos na sequência das manifestações de junho deixaram constrangedoramente evidentes. Já estávamos afastados da condução da política econômica, nunca fomos ouvidos, e agora somos também menosprezados como parceiros políticos, quando o País enfrenta um dos momentos mais graves de sua história.
Meu amigo Tarso Genro, dizendo que a aliança com o PMDB é mais prejudicial do que positiva, a meu ver, faz um aceno para a militância do seu Partido na disputa da liderança interna para consecução dos cargos hoje miseravelmente ocupados pelo velho MDB de guerra.
Não estou propondo romper aliança que formamos com o PT. Proponho, isto sim, que sejamos vozes ativas nesse condomínio.
Srªs e Srs. Senadores, diversas vezes ocupei esta tribuna para apontar irregularidades, desvios e atos de corrupção em diferentes níveis da Administração Pública. Não é o que faço hoje. Hoje, minha preocupação não é com a desarrumação da sala de estar do navio, mas com o estado da casa de máquinas que está sendo inundada. Não que a corrupção tenha acabado, ou que tenha diminuído substancialmente. Acontece que as instituições republicanas que combatem a corrupção estão funcionando. Não há uma semana sem que a Polícia Federal, o Ministério Público, a Procuradoria da República, o Tribunal de Contas da União ou as polícias estaduais não ofereçam à sociedade a visão televisiva de quadrilhas de corruptos sendo presas, denunciadas e julgadas.
Ao contrário do que se dizia com frequência no passado, não há mais um clima de impunidade no País. Há uma certa lentidão no processo judicial, mas impunidade não.
Digo isso porque não devemos fugir dos temas expostos, e que representam reais desafios para a regeneração da Nação. Além disso, não devemos nos enganar pela natureza ubíqua da corrupção no sistema capitalista: nossa situação não é melhor ou pior do que na maioria dos países desenvolvidos. Veja, Senador Renan, o que está acontecendo nos Estados Unidos: os dois maiores conglomerados bancários do país, o Bank of America e o Citigroup, concordaram em pagar multas de US$20 bilhões cada um para escapar de processos criminais relativos à fraude de milhões de hipotecas no mercado imobiliário. E a maior agência de risco, a Poor's, está sob investigação.
Ainda mais significativa foi a fraude da Libor, a taxa de juros que regula a maioria dos empréstimos internacionais, por parte dos maiores bancos do Planeta. São bilhões e bilhões em prejuízos. O efeito de toda a corrupção havida no Brasil, ao longo de décadas, não se compara a um único ano desses episódios vergonhosos da história recente do capitalismo.
Cuidemos, portanto, dos interesses fundamentais da Pátria e procuremos reagir a denúncias em proporção a seus fundamentos reais, não à sua forma ridícula como espetáculo público.
(Soa a campainha)
A imprensa escandalosa, a imprensa superficial, a imprensa especializada em transformar pequenos desvios em grandes escândalos, magnificados por manchetes e primeiras páginas, por certo continuará a prestar um desserviço à Nação, usando episódios individuais para denegrir instituições.
Esse tipo de imprensa é tão perniciosa para o País quanto os arruaceiros e vândalos que distorcem as manifestações em nossos espaços públicos. E claro que isso é facilitado pela monopolização dos meios de comunicação, cujo controle deve entrar na pauta da proposição básica aqui colocada de radicalização da democracia brasileira.
O que acabo de dizer, Srªs e Srs. Senadores, é resultado de muito pensar e de muito discutir por muitos companheiros e muitos assessores. É o resultado de um compromisso radical com a defesa do interesse público, que tem me orientado por mais de 40 anos de vida parlamentar e no Executivo.
Nunca me afastei desses compromissos. E, hoje, tendo a percepção dos riscos que a República enfrenta - e gostaria de estar errado, mas infelizmente todos os indicadores vão à direção oposta - anima-me, mais uma vez, a determinação de buscar novos caminhos para a superação das crises. Não de forma solitária ou quixotesca, mas contando com a ajuda e a força de meus Pares. Não sou ingênuo. Não temos mares tranquilos à frente. Contudo, como líderes políticos, temos o dever moral de agir a fim de superar as dificuldades. Espero que o mesmo espírito mova as decisões das Srªs e dos Srs. Senadores. Especialmente, espero que o mesmo espírito acicate ao ânimo de meu Partido desperte-o para a realidade de seu tamanho, de sua influência e de sua história.
Como dizem os paulistas - não é isso, Senador Eduardo Suplicy? -: ducor, non duco. Ou como gritam os paraibanos: Nego!
Por fim, para tranquilizar muitos amigos, e entre eles meu filho Maurício, que me vigiam, pois dizem que sempre tendo a um certo catastrofismo, digo a eles que os perigos da crise são reais e que minha fala aqui, hoje, mais que desgraças, acena esperanças.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª me permite?
O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Presidenta Dilma e companheiros do PMDB, “Nosso Tempo”, de Drummond de Andrade:
Este é tempo de partido,
tempo de homens partidos.
Em vão percorremos volumes,
viajamos e nos colorimos.
A hora pressentida esmigalha-se em pó na rua.
Os homens pedem carne. Fogo. Sapatos.
As leis não bastam. Os lírios não nascem da lei.
Meu nome é tumulto, e escreve-se na pedra.
Se a Mesa me permite, com o máximo prazer, dou um aparte ao Senador Suplicy, que pediu em primeiro lugar, e posteriormente ao Senador Cristovam Buarque.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - O Senador Cristovam pediu em primeiro...
O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Senador Cristovam.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - ... e eu quero respeitá-lo.
O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Não só deve querer, mas deve respeitá-lo efetivamente.
Parabéns, Senador!
O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Senador Requião, a gente fica aqui nesta Casa durante oito anos - alguns mais do que isso -, mas de tudo que a gente faz aqui, algumas coisas são determinantes; algumas ficam. Este seu discurso fica.
(Interrupção do som.)
O Sr. Cristovam Buarque (Bloco/PDT - DF) - Primeiro porque o que fica grande é aquilo que vem quando a crise é grande em um país. É muito raro um grande líder se afirmar em momentos de tranquilidade. Aí a gente põe técnicos. Eles gerenciam. É nos momentos de crise que se afirmam os políticos e se fazem mais do que isso, se fazem líderes e estadistas. O senhor pegou uma crise, como o senhor mesmo disse, que é das maiores que o País já viveu, e traz um discurso que acena, em primeiro lugar, o alerta e depois o rumo. Eu não vou discutir os detalhes da análise econômica. Eu gostaria até que a gente usasse este seu discurso para debater na subcomissão em que eu sou o Presidente e o Senador Suplicy é o Vice, uma subcomissão da Comissão de Assuntos Econômicos, para discutir o longo prazo. Seria muito bom analisarmos os seus pontos. O que eu quero falar é sobre dois aspectos. Primeiro, o senhor fala do destino da Nação; essa é a responsabilidade da gente. Mas como o senhor mesmo disse, o destino da Nação tem estado ausente da prática política dos últimos anos, ou talvez décadas, no Brasil. Nós discutimos as migalhas da política, política com “p” pequeno. Nós não discutimos a estrutura da política com “P” maiúsculo. O senhor trouxe algo que falta, que é despertar para a necessidade de sermos aqui os grandes preocupados, permanentemente, com o destino desta Nação. Segundo, é que o senhor traz - e talvez nem tenha falado explicitamente - a ideia de que o Brasil precisa ter um projeto nacional para levar ao destino. Nos últimos anos, ou décadas também, o neoliberalismo borrou a expressão projeto nacional. Talvez nunca tenha sido importante como agora. Obviamente, num momento em que o mundo está tão integrado, o projeto nacional não pode ser isolacionista; tem que ser integrado, e tem que haver um projeto nacional. A outra coisa que o senhor colocou é o risco das nossas cabeças, e eu também estou de acordo que não vai acontecer o que aconteceu com Luiz XVI - é metaforicamente, mas eu vou radicalizar. Nessas férias, eu li um livro que tinha que ter lido quando adolescente ou jovem, que é o livro do escritor Ivan Turgueniev, o russo, sobre a crise na Rússia, no século XIX. Chama-se Pais e Filhos, pelo choque de gerações. E há uma frase, Senador, que vai além da cabeça, uma frase em que ele diz que há momentos que os homens que têm atividade pública deveriam saber que está na hora de comprar o seu caixão. Às vezes, eu acho que nós estamos precisando comprar os nossos caixões se não formos capazes de nos ressuscitarmos e pensarmos os destinos da Nação e pensarmos um projeto de Nação. E o senhor colocou aí o que é que a gente tem que trabalhar. Esta parte do seu discurso, eu gostaria até, se o senhor estiver aqui amanhã, de repercutirmos juntos, em que o senhor fala que o Brasil precisa dessa economia comprometida, humanista - aliás, como disse o Papa Francisco. Esses pontos que o senhor trouxe são fundamentais, e é por aí. Não se tem que buscar muito mais coisa não. Está aí a linha. O justo e não o injusto. É o longo prazo e não o imediato. É a estrutura e não a.... É a estratégia e não a tática. É a democracia aberta e não fechada. Se não fizermos isso, repetindo o que o senhor falou, nós não estaremos à altura deste momento, e o País vai pagar um grande preço. Nós não temos o direito de nos apequenarmos. Temos que estar à altura desta crise, e o senhor demonstrou, no seu discurso, que o senhor está a essa altura. Espero que nós outros também estejamos à altura.
O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Senador Suplicy.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Eu vou cumprimentá-lo, Senador Roberto Requião.
Eu acho que V. Exª presta um serviço ao seu partido, à Nação brasileira, à Presidenta Dilma e a nós, seus Colegas no Senado, e também aos jovens, pois V. Exª, que tem uma idade próxima a minha, pode ser considerado como daquela categoria dos avós que foram homenageados pelo Papa Francisco, quando este disse o quão importante é que os jovens possam nos ouvir e quão importante é para um melhor destino das sociedades que esses dois lados, os avós e os jovens, dialoguem para encontrar soluções. V. Exª fez uma análise, depois de um largo período de estudo e de reflexão, que será importantíssima para a continuação de nosso diálogo aqui. V. Exª mencionou a China e a Índia, que, muitas vezes, têm dado exemplos de coragem. Queria até lhe dar uma noticia: a Índia realizou uma reflexão, num grande simpósio nos dias 30 e 31 de maio, comparando a experiência de seis mil pessoas, que receberam por 18 meses uma renda básica modesta, à de outras seis mil que não receberam, a fim de ver como poderão avançar na direção de um eventual desafio para os 1,3 milhão de indianos receberem, um dia, uma renda básica de cidadania. Há pouco mais de um mês encaminhei à Presidenta Dilma sugestão no sentido de ela formar um grupo de trabalho para ver como se dará a transição do programa Bolsa Família para um dia termos a renda básica universal, e V. Exª, ao abraçar também esse tema, essa meta em suas colocações, merece todo o meu respeito e o meu cumprimento entusiasmado. Parabéns!
O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Senador Renan, os nossos aparteantes se referiram ao Papa.
Achei extremamente interessante a presença do Papa e o seu raciocínio sobre a crise, a sua interpretação. O Papa disse que não conseguia entender em profundidade o que queria a juventude, mas estabeleceu o seu respeito à mobilização.
Na verdade, o Papa assumiu uma posição hegeliana: a luta de gerações, os novos querendo mudar o que os velhos já fizeram. Mas o Papa, do ponto de vista da Igreja, assumiu uma posição neo-hegeliana de direita em relação à manutenção de todos os dogmas; e, politicamente, ele foi ao neo-hegelianismo de esquerda ao fazer a crítica da atitude de alguns membros da Igreja e a crítica do capital financeiro. Ele praticamente repetiu a Bíblia: “Não se pode servir a Deus e a Mamon”.
Faltou o Papa dizer que não acreditaria que um rentista passasse pelo buraco de uma agulha, sendo entendida a agulha como aquelas passagens por onde passava, nas muralhas de uma cidade protegida, um homem, mas não passava um camelo. Essa era a maneira de deixar a muralha aberta para a população que vivia dentro de fora dela, mas fechada para a passagem de um exército.
O Papa se colocou, a meu ver, em uma posição muito clara contra o capital. E a grande disputa de hoje talvez seja a defesa do capital produtivo e do trabalho em contraposição ao capital vadio, o capital financeiro, que não produz um botão, a peça de uma máquina, uma agulha, mas que vive da usura, condenada desde a Bíblia a todas as visões filosóficas, de todas as religiões que já passaram pelo mundo.
A passagem do Papa foi interessantíssima!
(Soa a campainha.)
O SR. ROBERTO REQUIÃO (Bloco/PMDB - PR) - Conservador do ponto de vista dogmático - e muitas vezes ser conservador, em determinadas situações, pode ser revolucionário também - e extremamente progressista em relação à política e ao domínio do capital financeiro no mundo.
Senador Renan, eu agradeço pela tolerância com o tempo. Eu quase me senti na tribuna, hoje, como um Aécio Neves, tendo o tempo disponível para colocar as suas idéias e as suas análises sobre a economia financeira do Brasil.
Muito obrigado, porque ao Aécio é dada sempre essa permissão que não é a permissão dada ao comum dos Srs. Senadores.